12 minute read

cattleya à deriva

Sentada confortavelmente em sua cama, a vaidosa Cattleya afirma que hoje, vive um relacionamento pleno e saudável, mas quem acompanha seu histórico amoroso, sabe o quanto ela já sofreu para chegar onde está.

Advertisement

Lembrando-se da infância, quando a violência começou, Cattleya conta que nunca foi uma criança “fácil de lidar”, e assume que desenvolveu um sentimento de revolta por não ter uma figura paterna presente em sua vida. “Não fui criada com o meu pai, minha mãe foi amante dele por 15 anos e, nesse meio tempo, ela me teve. Então, eu era muito revoltada por não tê-lo presente. Acabei crescendo rebelde e isso fez com que eu casasse muito cedo”, recorda. Por serem menores de idade, ela e A. precisaram que os pais assinassem um termo de autorização para que o casamento acontecesse.

A flor conta que apesar de A. tê-la agredido inúmeras vezes, ele não foi o seu primeiro abusador. Revoltada, ela afirma que aos cinco anos de idade sua mãe trabalhava muito e por isso, tinha o costume de deixá-la com a vizinha. Porém, em um determinado dia, a mulher que cuidava de Cattleya precisou sair para resolver alguns problemas pessoais, e acabou deixando-a sozinha com o marido. “Eu lembro claramente, ele me pegou do sofá, era um sofá azul”, afirma. “Ele me colocou na cama, abaixou a minha calcinha e esfregou o pênis em mim”, revela, angustiada.

Cattleya lembra que apesar do pai não ter sido presente em sua vida, ele a visitava a cada 15 dias. Durante uma noite, dias após o ocorrido, ela avistou seu pai deitado na cama com a mãe, “eles não estavam fazendo nada, mas eu falei assim: ‘Pai, o S. tentou fazer comigo, isso que você está fazendo com a mamãe’, eu lembro exatamente as palavras”, conta, imersa nas lembranças daquele dia. “Ele levantou correndo, tentou pegar o revólver que guardava no armário de casa, mas a minha mãe não deixou e isso me revoltou”, com isso, a mulher salienta que nunca teve um relacionamento saudável com a mãe.

De volta à adolescência, Cattleya afirma ter perdido a virgindade ainda muito nova, e que na época em que se casou com A., ela já

estava grávida de seu primeiro filho. “Eu perdi a virgindade cedo e quando aconteceu, minha mãe brigou muito comigo, ela dizia: ‘Homem nenhum vai querer você agora’”, lembra.

Cattleya conta que, além de A. ter abusado psicologicamente dela durante o tempo em que ficaram juntos, ele também a agrediu fisicamente durante os seus cinco meses de gestação. “Ele me segurou pela garganta e eu caí no chão, quase perdi o bebê. Eu fui parar no hospital e depois disso minha mãe se mudou para perto de mim”, relata. “Ele amanhecia na rua e teve um filho fora do casamento”. Ela acrescenta ainda que, depois desse episódio, terminaram e reataram o relacionamento mais sete vezes, até terminarem de vez.

Dois anos após ter se divorciado de A., Cattleya se envolveu com N., o seu terceiro abusador e pai de sua segunda filha, Dália.

Ela revela que em pouco tempo de relacionamento, acabou engravidando, “eu pensei em abortar, cheguei a comprar os comprimidos, mas Deus falou comigo para eu não fazer isso, então devolvi o remédio”, admite. “Tive a Dália e morei com o cara, e ele foi o pior. Ele me arrastava na rua pelos cabelos. Ao mesmo tempo em que eu estava grávida, ele engravidou mais outras três mulheres”, desabafa, lembrando que não manteve o relacionamento por muito tempo.

A mulher assume que passava pouco tempo solteira, engatando um relacionamento atrás do outro, e dessa forma começou a namorar outro rapaz. “Nós namoramos por quatro anos”, conta. Segundo Cattleya, ele era muito bom e ela o amava, “sabe aquele homem bom que faz de tudo por você? Ele era assim”. Porém, a fase lua de mel entre o casal não durou muito tempo. De acordo com a moça, ele abusou de Dália. “Ele fez ela tocar no órgão genital dele”, desabafa com o semblante triste.

Após o fim desse relacionamento, Cattleya permaneceu solteira durante cinco anos e segundo com ela, passou esse tempo envolvida nos ministérios da igreja e servindo a Deus. Foi somente em 2010 que conheceu J., pai de seu filho mais novo.

Ambos prezavam muito pelos costumes cristãos e o que começou como amizade, resultou em um casamento. “Ele tem seis filhas, cinco com a ex-esposa e uma com a irmã dela e eu não me atentei a isso, o medo de ficar sozinha era tanto! Já que eu vinha de outros di-

vórcios. Quando apareceu alguém da igreja, eu achei que era o meu príncipe encantado”, desabafa.

Hoje, Cattleya assume que o relacionamento nunca deveria ter evoluído e admite que todos à sua volta aconselhavam para que ela não se casasse com J. “Eu queria que não tivesse acontecido e que eu não passasse por nada disso. Eu queria ter escutado as pessoas”, salienta.

Ela afirma que o casamento quase não ocorreu porque J. alegava estar em dúvida. Cattleya conta que chamou seu pastor e um diácono para convencê-lo a se casar e, por fim, J. acabou cedendo tendo em visto que toda a cerimônia já estava paga. “Eu não sabia que estava grávida, mas se ele insistisse em não casar, eu teria evitado tudo isso”, desabafa, dizendo que durante o tempo em que ficaram juntos, sempre acreditou que Deus poderia mudá-lo.

Grávida, ela afirma que no início da relação tudo ocorria bem e que Magnólia e Anis, as duas filhas de J., também se mudaram para a sua residência.

No dia do parto do bebê, tudo aconteceu como o planejado, mas na quarentena, Cattleya teve complicações causadas pelo estresse em casa. Ela diz que, a partir do nascimento do filho do casal, o clima da casa começou a mudar. Devido às constantes discussões, todos viviam sob estresse, e com isso, J. voltou a beber e a frequentar prostíbulos. “Ele frequentava um monte de casa de prostituição que tinha aqui, eu não sei se ele me traiu, isso eu não posso falar com certeza, mas algumas amigas minhas disseram que viram ele andando com mulher na garupa da moto, mas ele só tinha filha mulher, então não posso afirmar”, admite.

As enteadas de Cattleya não gostavam de como o pai tratava sua nova esposa. “Elas falavam: ‘Não é justo o que o meu pai fez com a minha mãe e agora ele está fazendo com você’, e eu respondia: ‘Não, ele vai mudar, vamos ter paciência e permanecer orando’”, desabafa lembrando que o relacionamento dos dois começou porque J. a fez crer que o antigo casamento dele havia acabado por traição. “Eu acreditei que a ex esposa o havia traído, mas ela foi embora por causa da violência que sofreu durante 20 anos”.

A partir deste momento, J. passou a demonstrar o seu lado abusi-

vo cada vez mais. “Ele não comprava nada para a casa, alegava não achar justo que ele chegasse do trabalho e não tivesse outras opções de comida para ele. Mas, com quatro crianças, como sobraria? Não tinha como”, conta indignada, acrescentando que chegou a faltar até arroz e feijão em sua casa.

Para resolver essa situação, depois de 18 meses do nascimento do filho mais novo, Cattleya decidiu ir atrás de um emprego, mas, para a sua surpresa, J. não a deixou trabalhar em lugares frequentados por homens, então começou a trabalhar como merendeira em uma creche. “Eu tenho profissão, sou formada em radiologia, sou vendedora, que é menos pesado que trabalhar com cozinha ou como empregada doméstica, mas fui, pois ele não me deixava voltar a trabalhar onde eu trabalhava antes”, conta. Ela permaneceu naquele emprego por cerca de dois anos, mas todo o salário que recebia, ia direto para as mãos de J., que não usava para pagar as despesas da casa, mas sim em bares e prostíbulos. Ela conta que durante muitas vezes, a água e a luz foram cortadas e a prestação da casa estava sempre atrasada.

Em determinada ocasião, J. emprestou dinheiro de sua mãe para construir um quarto no quintal da casa, já que as crianças dormiam na sala. Cattleya não questionou, pois sua casa sempre foi pequena e para ela seria vantajoso um espaço maior para as crianças, mas ela explica que esse quarto nunca foi feito. “Em vez de comprar o material com o dinheiro, ele comprou uma moto quase zerada”, relata. “Lembro que ele só me ligou e perguntou: ‘Que cor você acha mais bonita para moto?’, e eu respondi: ‘Eu gosto de dourado’, eu não sabia que ele iria comprar”, acrescenta, com indignação.

Dado isso, Cattleya o confrontou questionando o porquê dele não ter agido conforme o combinado, e ele afirmou que como a residência não o pertencia, não faria nada ali. A mulher conta que a partir desse momento, J. passou a insultá-la constantemente.

Um dia, quando o homem chegou de madrugada em casa, Cattleya esclareceu que estava insatisfeita com aquela situação, “e ele falou: ‘Eu não quero mesmo estar com você, eu casei com você por dó, por pena, você para mim é um lixo. Antes eu tivesse casado com uma prostituta, do que você’”, conta com dificuldade, acrescentando que após a discussão, ela já não conseguia mais dormir ao lado dele.

Porém, o ápice para Cattleya foi quando seu filho mais novo ficou doente e o casal precisou passar horas no pronto-atendimento. Quando voltaram pra casa, J. avisou que sairia para comprar o almoço. Na casa, não havia nada mais do que arroz, e Cattleya não havia dinheiro para alimentar as crianças, já que J. pegava todo o seu salário.

A flor relembra que várias horas se passaram, e o homem não voltava com a comida. Cattleya havia telefonado diversas vezes para J. com o intuito de saber do seu paradeiro. Irritado, o homem continuava a mandando esperar, não informando quando voltaria. Angustiada pela situação, a mulher resolveu juntar as economias de J., as quais ele mantinha engavetadas com um cadeado. “Ele colocava o cadeado em todas as gavetas, mas havia uma que eu conseguia abrir um pouco e pegar umas moedas. Eu comprei pão e ovo, então comemos junto com o arroz”, relata.

A mulher então, esperou impaciente pela chegada do marido em casa, que só retornou horas mais tarde. “Ele chegou com um botijão de gás em mãos, dizendo que jogaria em mim. Ele não atacou, mas saiu com um punhal de prata e disse que iria me matar naquele dia, por eu ter telefonado para ele o dia inteiro”, relembra com pesar.

Cattleya não sabe explicar como, já que tudo aconteceu muito rápido, mas quando J. tentou golpeá-la no estômago com o punhal, tudo o que ele conseguiu, foi rasgar um pedaço de sua roupa. “O nosso filho viu tudo, ele não fala mais sobre isso hoje, mas antigamente, quando falavam sobre o pai dele, ele dizia: ‘O meu pai tentou matar a minha mãe com faca’”, lamenta. Ela reforça que não teve tempo de pensar em telefonar para a polícia e, quando se deu conta, J. já havia entrado em seu carro e ido embora.

O homem, no entanto, retornou para casa por volta das três horas da manhã, Cattleya alega que ele deitou ao seu lado na cama e que, naquele momento, sentiu muito medo do que poderia acontecer. “Eu só pensei ‘Deus, você já me guardou tantas vezes, se for o dia de partir, partirei’”, desabafa.

Após o ocorrido, amigas próximas tentaram convencê-la a se separar, “elas disseram: ‘Esse cara não gosta de você, ele não te respeita’, mas eu não queria, eu acreditava que Deus ia fazer ele mudar”, admite. Cattleya afirma que mantinha a sua fé intacta, porque não

queria enfrentar mais um divórcio. Porém, cansada da situação, a mulher decidiu ter uma conversa honesta com J. “Eu disse: ‘Eu não quero mais, desse jeito não, eu quero me separar de você’, eu sugeri e ele disse: ‘Tudo bem, daqui a pouco eu volto para pegar as minhas coisas’”. Depois dessa conversa, J. realmente foi embora, levando consigo alguns pertences da casa, alegando serem seus. Suas filhas do outro casamento também foram embora com o pai.

Após o término, Cattleya precisou se esconder de J. inúmeras vezes, visto que ele ainda a ameaçava de morte. “Eu fiquei uns dias na casa do pastor e também de uma moça que participava de um ministério feminino da igreja; eu nem conhecia ela, mas fui dormir lá uns dias. Eu tive que sumir de perto dele, porque ele queria me matar a todo custo, ele ia atrás de mim”, desabafa.

A mulher admite que, mesmo com o fim do relacionamento, ela passou sete meses usando a aliança em seu dedo, “eu não queria me divorciar de novo, mais uma vez, com mais um filho no braço e de novo sozinha”, salienta.

Depois de um tempo, Cattleya e J. marcaram uma reunião com o pastor da igreja que frequentavam a fim de resolverem a situação. Ao ouvir novamente de J. que ele só havia se casado com ela por dó, seu líder religioso aconselhou que ela se divorciasse de fato. “Ele bateu na mesa e disse: ‘Eu vou deixar meu título pastoral aqui na mesa. Não fique mais com ele, ele não quer saber de você’, e eu respondi, olhando para o J.: ‘Se eu tirar essa aliança, eu nunca mais volto com você’”, lembra. Como resposta, J. ordenou que ela retirasse, acrescentando que, para ele, ela não prestava. “Então eu tirei a aliança e fui embora para casa”, relata.

Durante o tempo do divórcio, Cattleya conta que conheceu o seu atual marido, com o qual vive um relacionamento feliz. “Quando estava no processo de divórcio, eu já tinha conhecido o meu atual marido onde trabalhava. Nós começamos a conversar, mas ainda não namorávamos, só fomos namorar quatro meses depois que eu havia tirado a aliança do dedo”, conta. “Quando saiu o divórcio, um mês depois, nos casamos”, acrescenta.

Cattleya admite, por fim, com a voz embargada pelo choro, que o seu relacionamento com J., foi o que mais a machucou.

Como mensagem final, ela ressalta a importância de ouvir as pessoas à sua volta e repensar suas ações. “Principalmente se uma te mãe falar: ‘Não fique com ele, não case’, então não case, pois vai dar errado, não adianta”, aconselha. “O pastor que fez o meu casamento com J., tremia no púlpito, ele não sentia paz, ficou perturbado o dia todo. Naquele dia caiu um pé d’água que atrasou tudo, mal acabou o casamento e já foram apagando as luzes e expulsando os convidados, eles não queriam aquele casamento”, lembra de todos os sinais que recebeu, mas ignorou, pelo medo de ficar solteira.

violência sexual

This article is from: