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Propensão para a radicalidade e para a luta

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ÍNDICE DE LUGARES

ÍNDICE DE LUGARES

Daí nasceu em mim um gosto de analisar tudo segundo a ordem, e não segundo o que me agrada, e amar o que é conforme à lógica, e a não querer o que não for conforme a lógica. O gostoso ou não gostoso representa algum papel na vida de um bom gastrônomo, como fui a vida inteira. Mas é um papel de quinta categoria. Posso apreciar e elogiar muito um prato, mas isto para mim se passa nos arrabaldes, nos subúrbios da existência. A minha reação é realmente ver se determinada coisa está conforme o bem, se está conforme a ordem, se concorre para a ordenação geral adequada das coisas ou não concorre. Agora, tinha de ser, nessa ordem de coisas, que eu fosse desde logo muito propenso ao princípio de autoridade, por ser este princípio, segundo a noção de ordem, incumbido de manter a ordem no lugar. Portanto, para mim, todo o detentor da autoridade – ainda mais naquele tempo, em que as coisas estavam longe de estar deterioradas como hoje – eu o sentia como um aliado contra as possíveis desordens que havia. Daí a minha propensão contínua a reverenciar o princípio do respeito à autoridade. E também, em consequência, a ter uma admiração muito grande pela elevação, pela coisa alta que é a autoridade. Era o próprio princípio do amor à ordem levando ao amor do que é mais alto, porque a ordem se mantém secundariamente pelos seus agentes subalternos, mas ela é mantida principalmente pelos seus agentes supremos. Donde, para mim, aquele que está investido de uma supremacia, deve ser objeto de um respeito especial, de uma adesão especial, de uma elevação especial e de uma admiração especial. Saber que existe a autoridade, e que a autoridade deve exercer-se como eu via que ela era exercida naquele tempo, me enchia de regalo. Assim como uma pessoa com uma sensibilidade decorativa muito forte pode regalar-se considerando uma sala muito bem florida, assim também a vida humana tem os seus adornos. E o mais belo dos adornos da vida humana é o esplendor da autoridade que rege a vida98 .

Propensão para a radicalidade e para a luta

Olhando para fotografias minhas do tempo de pequeno, noto essa espécie de empuxe primeiro contra toda forma de mal, e de preferir, a qualquer comodidade, a destruição desse mal.

98 Chá SB 22/5/91

Lembro-me de mim mesmo raciocinando, vendo como um lado era bom e o outro lado era ruim, e combatendo a preguiça de ser como devia, para fazer a vontade de Deus. Foi dos combates duros de minha vida. Foi porque resolvi entregar-me inteiramente, pela graça de Nossa Senhora, aos pendores bons de minha alma, que combati muita coisa. E espero de Nossa Senhora a graça para combater muito mais99 . Há outras fotografias – parece incrível, mas com dois ou três anos de idade – em que estou com uma cara desconfiada. Não é um olhar de quem diz: “Você tem alguma coisa feia na alma de que estou desconfiado”. Mas é uma fisionomia interrogativa de quem indaga: “Como é este? O que dará aquele?” Numa dessas fotografias estou sentado em uma espécie de cadeira para menino, com os braços colocados no apoio da cadeira e com o olho atento no fotógrafo: “O que é que vai sair daí?” Graças a Nossa Senhora, nativamente meu temperamento era: “Cuidado, cuidado, que de qualquer coisa sai qualquer coisa, e é preciso prestar atenção”. Uma atenção, como já se vê naquelas fotografias, calma, fixa e analítica100 .

Em várias ocasiões, alguns dos senhores me fizeram perguntas muito curiosas, quase sobre bagatelas de meu dia a dia, que respondi evidentemente com bonomia e boa vontade. Por exemplo, certa vez perguntaram-me por que nos dias de calor eu tomava chá e leite quente, e não suco ou algo frio. E porque gostava de comer torradas de duas em duas. Quanto a tomar chá e leite quente em dias de calor, o fato é que a coisa muito fria não me refresca, e a coisa muito quente não me aquece. É quase o contrário. Tomando uma coisa muito quente, sinto-me refrigerado em face do ambiente. Quer dizer, uma coisa mais quente do que o ambiente, me faz sentir o ambiente mais suportável. É um modo de reagir que não tem nada de psicológico. É puramente físico. Talvez haja nisso um princípio, que é o amor à radicalidade. Quer dizer, reagir pela radicalidade: se está muito quente, vou tomar calor maior e me sentir arejado101 .

99 Jantar EANS 4/5/92 100 Jantar EANS 13/10/91 101 Chá SRM 15/11/90

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