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Entrevista
by Prod
Uma entrevista com Emanuel Dias
» Professor Adjunto de Cirurgia e Traumatologia
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Bucomaxilofacial – Universidade de Pernambuco. » Chefe do Setor de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial – Hospital Universitário Oswaldo Cruz. » Ex-Reitor da Universidade de Pernambuco (1999-2006). » Ex-Presidente do Colégio Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (2001-2003). » Ex-Vice-Presidente do Conselho Federal de Odontologia (CFO) (2008-2012). » Ex-Presidente da Comissão de Ensino do Conselho Federal de Odontologia (CFO) (2003-2013). » Professor dos Programas de Mestrado, Doutorado e
Pós-Doutorado da Universidade de Pernambuco (UPE).
Como citar: Dias E, Porto GG. Interview with Emanuel Dias. J Braz Coll Oral Maxillofac Surg. 2019 Sept-Dec;5(3):14-6. DOI: https://doi.org/10.14436/2358-2782.5.3.014-016.oar
Prof. Emanuel Dias, cirurgião bucomaxilofacial há 38 anos, já ocupou cargos de grande relevância para a especialidade, quando lutou e contribuiu para sua consolidação no Brasil. Seu olhar sensato e verdadeiro sobre a especialidade, em especial no que diz respeito ao ensino e ao contínuo fortalecimento da cirurgia BMF, é relatado em breves palavras na entrevista concedida a seguir. A Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial vem desenvolvendo, particularmente nos últimos 40 anos, um avanço científico e assistencial extremamente importante. Conseguiu associar, através das grandes escolas de Odontologia, o ensino de graduação e pós-graduação ao seu desenvolvimento nos grandes centros hospitalares. Começou a entender que a especialidade se desenvolveria naturalmente como todas as especialidades cirúrgicas médicas dentro dos grandes ambientes hospitalares, o que obrigou, naturalmente, os profissionais da especialidade, especialmente os professores, a entender que a multiprofissionalidade e a multidisciplinaridade da cirurgia BMF são fatores inquestionáveis. Impossível se discutir e avançar a CTBMF sem pensar nesses aspectos.
A cirurgia BMF e a multidisciplinaridade
Esse ambiente que envolve outras profissões proporcionou e proporciona, através dos grandes hospitais de ensino, a formação em longo prazo. As grandes residências de CTBMF se desenvolvem hoje em 3 anos de atividade em período integral, fazendo com que os residentes fiquem ligados a outras residências e circulem em ambientes com diversas especialidades, particularmente médicas. Também há a relação com o exame geral do paciente, tais como internamento, UTI, enfermarias, recursos de enfermagem, exames complementares, a admissibilidade de outros pacientes com doenças de base ou doenças graves, infectocontagiosas ou câncer bucal, o que os obriga a uma preparação muito maior. Há, também, a relação da cirurgia BMF com outras especialidades odontológicas que são absolutamente relevantes, embora a maioria seja clínica, ou seja, corresponde-se através das clínicas e consultórios.
É importante que a Cirurgia entenda que estamos no Brasil e que temos doenças próprias ou muito clássicas do país. Temos muitos pacientes com alterações
15 metabólicas importantes, sendo algumas características das nossas doenças tropicais. Ainda assim, temos um povo que, como dizia Darcy Ribeiro, formou “uma espécie de nova Roma”, uma mistura de raças que determina um padrão estético facial extremamente personalizado. É preciso aprender a não copiar de maneira irrestrita modelos externos; é preciso trazer o conhecimento para aplicabilidade interna, para que possamos consagrar resultados dentro de uma percepção funcional estética do tipo de pessoas com as quais nós convivemos.
Um fator importante dentro da especialidade que precisa ser melhor trabalhado nas residências é o capítulo de tumores, as grandes ressecções, as substituições teciduais, a possibilidade de se trabalhar com pacientes transplantados ou com doenças irreversíveis, como AIDS. Há muitos pacientes que trabalham com protocolo de câncer com quimioterapia ou radioterapia, os quais precisamos compreender mais para, assim, participar deles ativamente.
Fortalecimento da especialidade
Ainda é preciso discutir que estamos num país onde mais de 50 mil pessoas morrem por ano e decorrência de acidentes. Estamos em um país onde a maioria dos grandes hospitais públicos tem em sua equipe de pronto atendimento um cirurgião BMF, o que foi uma extraordinária conquista. Precisamos estar envolvidos nos movimentos nacionais que trabalham na prevenção do trauma, a sua etiologia e os mecanismos do trauma.
É uma especialidade grande, que tem uma equipe diferente das outras especialidades odontológicas, porque precisamos necessariamente de um anestesista, de todos os elementos de suporte de internamento hospitalar, da colaboração dos médicos uteístas, precisamos da Cardiologia, Hematologia, Infectologia, hospitais que trabalhem com laboratórios 24 horas, bancos de sangue. Essa dimensão não pode ser desprezada nem colocada em segundo plano, porque alguns querem fazer procedimentos que podem transformar a CTBMF em subárea, com importância limitada.
Acredito que a Cirurgia é uma só: começa nos estudos do tipo de paciente, tipos de doenças, bases de técnicas operatórias, desde a anestesiologia até os grandes estudos de técnicas das grandes disfunções craniofaciais, e precisamos estar envolvidos com tudo isso.
A tecnologia e a boa prática clínica
A velocidade de construção do conhecimento tem sido tão rápida que alguns profissionais que procuram esse conhecimento, que pode ser adquirido também de forma rápida através das tecnologias disponíveis, negligenciam, de certa forma, a experiência clínica. Naturalmente, a aplicação tecnológica, os conhecimentos e a velocidade com que se adquire esses conhecimentos só estarão associados à boa prática clínica se houver experiência clínica. Isso quer dizer que é preciso tempo, é preciso operar, atender os pacientes, é preciso estar nos meios que possibilitem uma movimentação importante de pacientes para que a tecnologia moderna se associe com a experiência de cada de um nós. Uma coisa depende da outra. É preciso estar atualizado e ter o tempo para utilizar essa atuação. O tempo define muito a qualidade de quem está fazendo e aplicando essa tecnologia. Operar sempre, tratar sempre e estar em grandes centros que possibilitam o exame de vários doentes com ambulatórios com atividades preenchidas dará uma prática enorme. Opinião de quem entende do assunto
Defendo que a CTBMF se desenvolva não só sob os aspectos de metodologia moderna e pedagógica moderna para o ensino e aprendizado, mas também que novos modelos sejam aplicados na graduação e na pós-graduação. Discutir convênios e internacionalização me parece uma prática absolutamente irreversível. Defendo, ainda, que os grandes centros de treinamento ocupem particularmente esses grandes espaços multiprofissionais. Não acredito na formação temporal do especialista com pouco tempo. São necessários, no mínimo, 3 anos dentro de grandes ambientes hospitalares com boas equipes, o que permite um aprendizado sólido, que fatalmente formará a base de qualquer cirurgião para o futuro. Essa é a minha expectativa; isso não é uma visão momentânea, e sim a opinião de alguém que está exercendo a especialidade há mais de 38 anos e que já ocupou todos os espaços possíveis em relação ao ensino e à assistência.
Profa. Dra. Gabriela Granja Porto
- Editora-Chefe do JBCOMS - Journal of the Brazilian College of Oral and Maxillofacial Surgery.