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OS PRODUTOS QUÍMICOS VS MERCADORIAS PERIGOSAS PRESENTES NAS ESCOLAS: O QUE SABER?

Isabel Galhardo - Conselheira de Segurança, Formadora e Consultora

Numa perspetiva global, podemos dizer que os produtos químicos se encontram presentes na nossa vida quotidiana e profissional. Precisamos deles para viver, e nós, enquanto seres humanos, somos “química”, não nos devendo esquecer disso.

Quando abordamos a temática dos produtos químicos e das mercadorias perigosas nas escolas, começamos a entrar num campo um pouco sensível.

Sensível porquê?

Porque, na grande maioria das vezes, temos pessoas altamente competentes, com uma formação académica e profissional extremamente válida que, estando no “ensino”, focam-se apenas na disciplina e na atividade a desenvolver na aula, isto é, no seu trabalho, e não pensam de uma forma mais abrangente, como o perigo das substâncias e/ou misturas perigosas e o risco que as mesmas representam.

Efetivamente, na União Europeia (UE), a legislação relacionada com os produtos químicos tem vindo a alterar nos últimos anos. Criada em 2007, a Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA) tem como objetivo principal a proteção da saúde humana e do ambiente, passando pela regulamentação deste tipo de produtos. Contribui assim para a competitividade da indústria química europeia, o bom funcionamento do mercado interno, e a sua inovação, não deixando de lado a questão da reciclagem, incentivando a indústria a desenvolver alternativas mais seguras.

O Regulamento (CE) 1907/2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos (REACH — Registration, Evaluation and Authorization of Chemicals) continua a ter um grande impacto na vida das empresas e de todos nós. O Regulamento (CE) 1272/2008, relativo à classificação, rotulagem e embalagem de substâncias e misturas (CLP — Classification, Labelling and Packaging) igualmente. A comunicação dos perigos na cadeia de abastecimento é uma realidade e traz muitas responsabilidades aos vários intervenientes. Contudo, não existem apenas estes dois Regulamentos com impacto nas nossas vidas e nas vidas das empresas, há mais alguns e estão interligados e em permanente atualização.

E a nível escolar, onde podemos encontrar produtos químicos perigosos?

Por exemplo nas aulas de físico-química, nas quais até se fazem umas “experiências” e se lida diretamente com os produtos. Em alguns casos (muitos), os alunos nem tão pouco têm disponível equipamentos de proteção individual (EPI) adequados para o manuseamento e/ou contacto/exposição com o(s) mesmo(s). Refiro-me, no mínimo, a luvas com proteção química e a óculos de proteção. A máscara de proteção respiratória, com filtros adequados a poeiras, vapores e/ou gases, só em alguns casos é disponibilizada, dependendo do grau de ensino e da escola ou universidade. Preocupante, não?

Num laboratório podemos muito facilmente encontrar produtos inflamáveis, corrosivos, comburentes, tóxicos, infeciosos, radioativos, quimicamente instáveis e até “apenas” perigosos para o ambiente.

Aliado a estas características, podemos ter outras (que temos), que afetam o património genético, que podem provocar doenças respiratórias crónicas, que podem ter efeitos tóxicos na reprodução e até os que podem afetar órgãos após exposição prolongada ou repetida, os denominados CMR (cancerígenos, mutagénicos e tóxicos para a reprodução).

Alguns exemplos de produtos químicos perigosos presentes em laboratórios em contexto escolar são:

— Etanol (Álcool etílico);

— Isopropanol (Álcool isopropílico);

— Hidróxido de sódio;

— Ácido Nítrico;

— Metanol;

— Cianetos;

— Nitrato de Prata;

— Ácido sulfúrico;

— Ácido fluorídrico;

— Potássio;

— Magnésio;

— Kits químicos (vários);

— Crómio.

E no que se refere à forma como estes produtos são acondicionados, será que são tidos cuidados? Refiro-me à embalagem e à rotulagem. Muitas embalagens de produtos químicos perigosos, que já não se encontram nas perfeitas condições de segurança, são encontradas nos armários dos laboratórios, porque… podem ser precisas. Noutras, o rótulo é tão antigo ou inexistente, que não indica nenhum perigo, e o produto até pode ser bastante perigoso.

Em laboratório verifica-se igualmente que, e com regularidade, muitos produtos quimicamente incompatíveis são armazenados em conjunto, estando muitas vezes as suas embalagens também mal empilhadas/arrumadas por falta de espaço ou porque foi o primeiro local onde foram colocadas após terem sido utilizadas.

O pior verifica-se ainda no que aos resíduos dos produtos químicos diz respeito. Também estes devem ser acondicionados e classificados corretamente. É prática habitual

de Mercadoria Perigosa por estrada, quando nos referimos ao transporte rodoviário.

Mas o que são mercadorias perigosas?

A definição de “mercadorias perigosas” nos regulamentos de transporte é: As matérias e objetos cujo transporte é proibido segundo o ADR ou autorizado apenas nas condições aí previstas, mas, podemos completar e dizer que são matérias ou objetos que, pelas suas características físico-químicas, podem provocar danos às pessoas, aos bens ou ao ambiente

Neste âmbito, e a nível escolar, encontram-se enquadrados: os gases utilizados em laboratório, tais como azoto liquefeito refrigerado, acetileno, protóxido de azoto ou oxigénio; os reagentes, quando adquiridos; os kits químicos; alguns produtos de limpeza; desinfetantes; alguns medicamentos ou fármacos; as placas de petri contaminadas; os objetos cortantes e contaminados com substâncias suscetíveis de provocar doenças no ser humano e nos animais, com especial relevância nos laboratórios veterinários; bem como os resíduos, onde se incluem os produtos químicos pós experiência, os absorventes contaminados, ácidos, bases, solventes, tóxicos, águas de lavagem contaminadas, embalagens contaminadas, entre outros.

Destes materiais, à exceção das situações em que um veículo-cisterna com N2 abastece os vários recipientes criogénicos, e no caso de mercadorias rececionadas, a sua grande maioria encontra-se ao abrigo das isenções previstas no ADR, nomeadamente ao abrigo das Quantidades Limitadas. No entanto, mesmo ao abrigo desta “isenção”, há disposições a cumprir.

Por sua vez, quando nos deparamos com mercadoria perigosa para expedir, como resíduos ou até amostras para ensaios laboratoriais, há necessidade de observar com o que cumprir: — Classificação (atribuição de Número ONU);

— Verificar se está autorizado para transporte;

— Forma de acondicionamento (tipo de embalagem, homologação e/ou características, quantidade máxima permitida por embalagem);

— Identificação da embalagem: rotulagem, marcação e etiquetagem;

— Preparação para expedição;

— Elaboração do documento de acompanhamento (guia de acompanhamento, eGAR, carta de porte, etc.);

— Informação a transmitir ao transportador/operador de resíduos;

— Carregamento, estiva da mercadoria;

— Outras situações mais específicas (por exemplo licenças, etc.).

Ao abrigo do ADR, são 13 as classes de perigo, cuja classificação pode ser atribuída à mercadoria perigosa a transportar tendo em consideração o estado físico e as suas características físico-químicas.

Atualmente, há uma maior consciência ambiental e de responsabilidade social. No entanto, ainda há um longo caminho a percorrer, especialmente nos níveis escolares mais baixos, em relação às regras a cumprir com as mercadorias perigosas.

Necessitamos de mais formação, divulgação e sensibilização sobre os perigos e riscos destes produtos. É importante entender o que pode acontecer em caso de projeção, derrame, inalação ou ingestão involuntária.

É nosso dever levar mais segurança às escolas, institutos, universidades e à comunidade em geral. •

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