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ENTREVISTA AO INTENDENTE HUGO GUINOTE

Maria João Cavaco & Susana Casinha - APSEI

SEGURANÇA EM EDIFÍCIOS ESCOLARES — PROGRAMA ESCOLA SEGURA

O Programa Escola Segura ao serviço da comunidade escolar desde 1992 é o programa de policiamento de proximidade mais antigo e dos mais bemsucedidos em Portugal.

O Despacho nº 8927/2017, de 10 de outubro define as regras do Programa Escola Segura, descrevendo-o como um programa de âmbito nacional, incluindo todos os estabelecimentos de ensino não superior, públicos, privados e cooperativos, que visa garantir a segurança do meio escolar e sua envolvente, prevenindo comportamentos de risco e reduzindo os atos geradores de insegurança em meio escolar, atribuindo competências às Forças de segurança.

O Intendente Hugo Guinote, Oficial de Direitos Humanos da Polícia de Segurança Pública, Chefe de Divisão de Prevenção Pública e Proximidade e Investigador Colaborador do ISCPSI, falou com a Revista Proteger sobre o Programa Escola Segura e a Segurança em Edifícios Escolares.

O Programa Escola Segura tem como objetivo garantir a segurança no meio escolar e nas suas imediações prevenindo comportamentos de risco e reduzindo os atos geradores de insegurança. Quais são as principais ações planeadas para o futuro neste âmbito?

O Programa Escola Segura teve origem num protocolo celebrado no início da década de 90, e que envolve dois Ministérios: o Ministério da Administração Interna , responsável pela alocação das forças de segurança (PSP, GNR), e o Ministério da Educação, que integra as escolas no programa. Este projeto distingue-se pelo seu formato singular, uma vez que a responsabilidade pela sua implementação não recai exclusivamente sobre uma área governativa. Em vez disso, baseia-se numa dinâmica

forte, desenvolvida localmente através da articulação entre as forças policiais e, principalmente, as direções das escolas e dos agrupamentos escolares.

Os objetivos que as Forças de Segurança estabelecem para cada ano letivo são, particularmente no caso da PSP, programados e definidos numa diretiva anual a qual é difundida por todos os nossos comandos em território nacional (continente e ilhas).

Esta diretiva é válida para todas as escolas sob a nossa responsabilidade e difundida durante o mês de agosto para facilitar que, no início do ano letivo, em setembro, o planeamento seja logo feito entre os agentes e as direções dos agrupamentos e/ou das escolas. Este planeamento inclui a realização de 11 a 12 operações nacionais, sempre associadas a temáticas de determinadas efemérides, como por exemplo, o Dia Internacional dos Direitos da Criança, o Dia da Prevenção do Bullying, o Dia Internacional da Vítima de Crime, o Dia dos Namorados (para prevenir a violência no namoro), o Dia da Criança, a abertura e o encerramento das atividades escolares e o Dia da segurança na Internet. Assim, aproveitamos a calendarização dessas efemérides para realizar estas operações.

Para além das ações de sensibilização, definidas a nível nacional, cada equipa da Escola Segura tem a capacidade de flexibilizar, com as escolas, a realização de ações de sensibilização que pontualmente as escolas possam entender como necessárias, fruto de algum tipo de evento, de episódios, ou às vezes de projetos que os próprios alunos estejam a desenvolver naquele ano e que queiram reforçar através da presença dos polícias.

Complementarmente, para além das ações de sensibilização e visitas quer dos Polícias às Escolas, quer dos alunos às Esquadras, existe também um outro indicador importante: os contatos individuais de segurança. Estes contatos são reuniões que os Polícias realizam com as Escolas, com os familiares, com psicólogos, que visam abordar individualmente os problemas de cada aluno. Por vezes, estas reuniões são realizadas em articulação com as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens ou com os tribunais.

Em resumo, estes são os dois principais grupos de indicadores que nós temos nas intervenções nas Escolas.

No âmbito do Programa Escola Segura, a PSP tem desempenhado um papel fundamental desde 1992. Fale-nos um pouco desta vossa participação, nomeadamente das lições aprendidas e das medidas que trouxeram melhores resultados.

Numa fase inicial, o programa começou com apenas 11 ou 12 escolas. Mais tarde, o programa foi alargado a pouco mais de 30 escolas. Com o tempo, ficou claro que o projeto era muito importante para colmatar necessidades sentidas pelas direções das escolas e dos agrupamentos escolares. Ao mesmo tempo, o número de vigilantes nas escolas diminuiu, o que levou a um reforço da presença policial e a uma melhor articulação com as escolas.

A partir de determinada altura, o projeto foi implementado em todo o território nacional, e neste momento já contamos com 3 décadas de experiência. Este projeto, ao contrário daquilo que possamos pensar, é raro no mundo tendo apenas os países membros da CPLP adotado este modelo como boa prática. Não temos conhecimento de outro país com um protocolo semelhante, envolvendo duas áreas governativas. Os nossos colegas internacionais ficam surpreendidos quando apresentamos o projeto como parte da nossa rotina policial. Nós assinalamos, de facto, alguns momentos importantes no trajeto do Programa Escola Segura, como o grupo coordenador do Programa Escola Segura, que hoje funciona perfeitamente e que garante que à mesma mesa se sentam o Ministério da Administração Interna, a PSP, a GNR, o Ministério da Educação e a DGEsTE . e outra do próprio Ministério da Educação. Este diálogo é muito produtivo e garante a articulação necessária para responder, em tempo útil, aos principais problemas de insegurança nas escolas.

Depois outro projeto que em concreto a PSP teve oportunidade de implementar, a partir de 2012/2013, foi o Projeto do Falco, este projeto permitiu alargar a faixa etária de intervenção para incluir o Pré-Escolar e, sobretudo, o 1º Ciclo, que nós sentimos que era uma lacuna porque não tínhamos materiais pedagógicos específicos para chegar a esse grupo, e a comunidade científica cada vez mais apontava como prioritário antecipar a intervenção, identificar o risco que as crianças estavam a correr e, sobretudo, antecipar uma intervenção multidisciplinar.

A criação destas ferramentas permitiu desenvolver materiais educativos inovadores, como desenhos animados, em colaboração com a Fundação Altice . Estes materiais têm tido um impacto muito positivo, com centenas de milhares de visualizações nas redes sociais e continuam a ser relevantes anualmente, pois os alunos renovam-se a cada ciclo letivo.

Um dos exemplos que nós gostamos de referir como um bom exemplo do sucesso do Programa Escola Segura, foi quando há uns anos em Portugal tivemos, na altura da Troika, manifestações que colocaram aproximadamente 1 milhão de pessoas na rua. Assinalamos com uma nota de especial agrado que muitos dos manifestantes eram jovens, conhecidos normalmente por serem mais irreverentes. A verdade é que, com 10% da população a manifestar-se na rua, não tivemos qualquer incidente durante essas manifestações, tendo sido vários os exemplos mediatizados da boa relação e respeito mútuo entre os jovens e a Polícia, o que só se consegue como resultado da relação diária de respeito construída desde o Pré-Escolar até ao 1º Ciclo. Em outros países europeus, a polícia só entra nas escolas em situações específicas de crime, mas em Portugal optamos por uma atuação preventiva e promotora da cidadania. Acreditamos que estamos no caminho certo.

Aproximando-nos agora um pouco de uma das áreas da segurança que a APSEI representa, de que forma é que as soluções de videovigilância e de controlo de acessos podem contribuir para a segurança nos recintos escolares? Qual é a vossa perceção dos resultados desta implementação?

A nossa avaliação do uso destas tecnologias é sempre muito positiva, pois garantem que apenas os alunos da escola entram nas instalações, evitando a presença de pessoas estranhas. Estes equipamentos são essenciais para monitorizar os diferentes espaços, especialmente as áreas semipúblicas dentro do recinto escolar, mas fora das salas de aula. Todos reconhecemos que, atualmente, é humanamente impossível ter um funcionário em cada esquina da escola. Quando ocorrem incidentes, é natural procurarmos entender o que falhou.

A videovigilância é um indicador muito positivo na prevenção de comportamentos criminais e auxilia numa intervenção mais rápida. Se alguém a monitorizar os circuitos perceber um ajuntamento suspeito, pode comunicar rapidamente com os colegas da escola. Muitas vezes, nem é necessária a presença da polícia; os próprios funcionários podem intervir mais cedo. Se houver alguma agitação entre os alunos, podem comunicar aos funcionários para se dirigirem ao local antes que algo aconteça. E se precisarem da nossa intervenção, podemos agir rapidamente. A PSP, há alguns anos, desenvolveu uma ficha de diagnóstico de segurança para os estabelecimentos de ensino, que inclui cerca de 65 indicadores. Estes indicadores são dos primeiros que analisamos para avaliar e propor a implementação de medidas como a videovigilância.

Uma vez que os recursos humanos nem sempre são suficientes, como estava a indicar, a PSP ministra formação aos funcionários das escolas?

Sim, quando solicitado. No passado, já organizámos formações para os funcionários das escolas. Atualmente, o responsável pelo Gabinete de Segurança Escolar na DGEsTE é um Comissário da PSP. Ele dispõe dos materiais necessários para que a sua equipa possa fornecer a formação que consideram necessária de forma autónoma. No entanto, estamos sempre disponíveis para colaborar, como é evidente.

Na escola, realizam inclusivamente algumas ações para os migrantes.

Sim, essa é uma das áreas em que atuamos. Temos dezenas de temas que abordamos nas escolas, e atualmente, a diversidade cultural e de nacionalidades é muito grande. Na maioria dos estabelecimentos de ensino há entre 30 a 40 nacionalidades diferentes entre os alunos. É essencial trabalhar com essa diversidade.

Que melhorias se têm verificado na evolução tecnológica dos sistemas de videovigilância e quais destas poderiam ser implementadas nas escolas? Qual é a fiabilidade que estes equipamentos devem garantir?

De dia e de noite, efetivamente, são poucas as ocorrências que nós temos em termos de criminalidade patrimonial nas escolas. Este trabalho preventivo é feito pelas escolas, que inclusivamente, organizam aulas específicas onde os equipamentos mais onerosos são guardados. As salas de química e salas de informática são sempre reforçadas ao nível da segurança e, portanto, são poucas as ocorrências registadas. Pontualmente acontecem, mas são poucas. Não obstante, a presença deste tipo de tecnologia é particularmente útil, mas é essencial que a qualidade da imagem, quando formos visionar as gravações, permita identificar rostos e detalhes como vestuário, tatuagens e brincos, porque a utilização de máscaras ou capuzes pode dificultar a identificação, mas uma maior definição da imagem ajuda nesse processo. Para além disso, a capacidade de detetar outros materiais que possam ser introduzidos nas escolas também pode ser interessante.

Como é que a direção de uma escola pode aderir ao Programa Escola Segura?

A escola não precisa de aderir, pois já está automaticamente abrangida pelo programa. As escolas não têm de se inscrever. Por defeito, o programa abrange a nível nacional, estabelecimentos públicos e privados, desde o 1º Ciclo, até ao 12º ano.

Neste momento, as Forças de Segurança estão a implementar, em algumas áreas como projeto piloto e noutras de forma mais desenvolvida, o Projeto Universidade Segura, que é uma extensão do programa para os estabelecimentos de ensino universitário. No entanto, os Estabelecimentos de Ensino Universitário são geridos por outro Ministério que não o da Educação, e por isso é que ainda não está formado o protocolo. Não obstante, há mais de 20 anos que existe uma colaboração quer no Pólo do Porto, quer aqui em Lisboa, e que atualmente já se estende a outras universidades ou politécnicos, precisamente para garantir a segurança dos estudantes universitários. É muito importante, especialmente durante eventos como receções aos caloiros e Queimas das Fitas, onde a segurança pode estar comprometida. Inicialmente, as associações académicas resistiam ao contacto com a polícia mas, atualmente, reconhecem que essa colaboração é benéfica, pois todos trabalhamos para o mesmo objetivo: garantir que todos se divirtam de forma segura.

As escolas podem solicitar formação na área da Segurança, à DireçãoGeral dos Estabelecimentos Escolares (DGEsTE) que tem competência para gerir a segurança no interior de estabelecimentos de ensino. Porém, podem também comunicar diretamente com a polícia para qualquer necessidade, seja para o agendamento de ações de sensibilização, para a denúncia da prática de crimes, seja para uma mera marcação de reuniões de qualquer índole. Podem fazê-lo presencialmente com os agentes do Programa Escola Segura, que periodicamente visitam a escola, podem contactar as esquadras através dos contatos diretos ou podem utilizar o nosso e-mail que é o escolasegura@psp.pt .

Relativamente à abrangência do programa… O programa sempre abrangeu todos os níveis de escolaridade, Ensino Público e Privado, até ao 12º ano. Mas aquilo que nós polícias não tínhamos, eram materiais pedagógicos construídos para o público do 1º ciclo e do Pré-Escolar. Já tínhamos muitas apresentações, mas a linguagem é diferente, os materiais e as metodologias em sala têm de ser diferentes. A interação com os professores e auxiliares de educação tem de ser adaptada.

O alargamento ao Ensino Superior, é uma medida que está incluída na Estratégia Integrada de Segurança Urbana . Foi um projeto iniciado pelo anterior governo, mas que se mantém ativo.

É uma das medidas propostas para ser implementada e, na verdade, já está em vigor em várias universidades. O que ainda não existe é uma portaria que regule a sua criação e funcionamento, ao contrário do Programa Escola Segura, que foi formalizado através de um protocolo e publicado em portaria e decreto-lei.

A ficha de avaliação é para utilização dos polícias e contém indicadores simples de serem avaliados.

Esta ficha de diagnóstico de segurança de estabelecimentos de ensino divide-se entre a caracterização da ameaça e a caracterização da vulnerabilidade. A ameaça refere-se às ocorrências criminais que monitorizamos, enquanto a vulnerabilidade está relacionada com a estrutura física da escola.

Esta ficha de diagnóstico de segurança de estabelecimentos de ensino divide-se entre a caracterização da ameaça e a caracterização da vulnerabilidade. A ameaça refere-se às ocorrências criminais que monitorizamos, enquanto a vulnerabilidade está relacionada com a estrutura física da escola.

Na área do perímetro, aparecem indicadores como os sistemas de videovigilância e de controlo de acessos, que já utilizamos há alguns anos. Os polícias avaliam estes indicadores e atribuem cotações. No final, somam as cotações para obter uma nota de risco do estabelecimento.

Em conclusão, que mensagem gostariam de deixar às escolas?

Que nós devemos continuar esta boa relação de parceria entre as polícias e as escolas. Julgo que a sociedade tem a ganhar com a presença de profissionais que se podem tornar referências institucionais para os alunos e o próprio trabalho do professor não pode passar por policiar os alunos, nem os assistentes que estão nos espaços exteriores à sala de aula podem estar a vigiar alunos e preocupados com a ocorrência de crimes. Neste aspeto, os recursos tecnológicos são, de facto, uma ajuda relevante e a articulação com os órgãos de polícia criminal tem de existir. Não podemos pedir aos professores que assumam o papel de polícias, pois não têm a formação técnica nem a autoridade legal para o fazer, o que pode levar a práticas incorretas e à confusão de papéis. Isto também pode colocar os professores em risco. As famílias também beneficiam com a intervenção de profissionais especializados em cada área. A relação de confiança entre polícias, professores e diretores de cada escola deve ser mantida e reforçada, pois quem mais ganha são os alunos. Como se costuma dizer, as crianças de hoje são os adultos de amanhã, e a sociedade como um todo lucra com esta parceria. •

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