REVISTA ENERGIA 90

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Última página Por Luisa Caleffi Pereira Jornalista formada pela Universidade Federal de Uberlândia

ATCHIM! Saúde. Amém. Obrigado. A moça assentiu com a cabeça e eu

L

continuei minha leitura: “Um espirro é um lençol”

i isso dia desses, enquanto procurava não sei o quê

As minhas idas ao mercado estavam sempre relacionadas a mo-

e acabei encontrando essas coisas que a gente acha

mentos felizes porque eu tive a oportunidade de ir ao mercado, fazer compras, levar para casa, abastecer a geladeira, os armários, a fome e a gula. Os poucos dias de férias e feriados só eram especiais e diferentes porque eu tinha a opção de não trabalhar, de não estudar, de viajar, de conhecer e desfrutar. A realidade dos insensíveis lençóis 500 fios. Um espirro, uma explosão súbita de ar ou muco expelido da boca e do nariz e pronto: me rendeu reflexões, enjoo e formulações de teorias para o resto do dia. A bem da verdade, para o resto da vida. Continuei minha leitura, o texto ainda era interessante e não havia olhado para o relógio. O próximo parágrafo dizia que para parar uma crise de espirros é preciso lavar o rosto e limpar o nariz com soro fisiológico, e que isso deve acabar com o desconforto – mas em momento nenhum garante que a prática impede uma nova crise. Um espirro não é, só, um lençol. Um espirro é a realidade fria e áspera, disfarçada em lençóis bonitos e confortáveis em comercias de amaciantes. 

sem querer na internet – e quando olha para o relógio, se dá conta que perdeu hora (não tempo). Segundo o texto, através de filmagens, pesquisadores descobriram que o espirro forma uma camada de gotículas

como se fosse um lençol caindo. Um lençol caindo. A imagem que antes estava associada às propagandas de ama-

ciantes, que tinham o poder de nos fazer sorrir e querer quase que instantaneamente uma cama com um lençol limpo e cheiroso, agora, assim explicada, é muito mais nojenta do que bonita. E o texto não poderia ter aparecido em melhor hora. O que antes era sinônimo de aconchego e conforto, agora é desagradável. As minhas idas ao mercado estavam sempre relacionadas a momentos felizes, e hoje são regadas a desconfiança e vulnerabilidade. Os poucos dias de férias e feriados que eram especiais, diferentes, se transformaram em rotina monótona e cansativa. Mas lembrei das gotículas do espirro, e do enjoo. A lembrança não poderia ter aparecido em melhor hora. O estranhamento acontece porque tira você da zona de conforto. Comigo foi assim, e só me dei conta quando senti que aquele lençol quentinho, cheiroso e macio estava disfarçado. A realidade é fria, áspera.

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“O que antes era sinônimo de aconchego e conforto, agora é desagradável”


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