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5.1. A arquitetura de interiores
para as pessoas fundamentada na neurociência, a segunda parte da pesquisa se dedica ao entendimento da área de arquitetura de interiores, da neuroarquitetura e esferas que envolvem a neuroarquitetura na busca por proporcionar uma experiência transformadora entre o homem e o ambiente, sendo abordadas a arquitetura biofílica, a arquitetura sensorial e a psicologia ambiental.
5.1. A arquitetura de interiores
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História
Não é recente o campo da arquitetura de interiores, na antiguidade, embora não existisse a função de arquiteto ou designer de interiores propriamente dita, há evidências obtidas através de exploração arqueológica constatando como os ambientes eram tratados nesse período. No Antigo Egito, é notável a ornamentação das paredes e tetos que recebem formas esculpidas e pintadas na pedra, retratando a vida cotidiana dos egípcios. Os hieróglifos também eram utilizados como escrita pictográfica nas paredes e tinham um significado sagrado. Percebe-se nesses ambientes a rigidez da forma. (Figura 10)
Na Grécia antiga, embora muito pouco tenha restado das construções da época, as ruínas possibilitam perceber os grandes monumentos e a preocupação com
Figura 10: Tumba de Ramsés VI, no Vale dos Reis Fonte: O Globo
a proporcionalidade, conhecida como proporção áurea, e a adoção de formas rígidas, colunas esculpidas, ornamentações e frisos, além de indícios do uso de pedras de mármore e revestimento de ouro nos espaços internos. Os templos eram erguidos para adoração aos deuses. (Figura 11).
Figura 11: Ruínas do templo de Erecteion erguido para adorar ao deus Poseidon Fonte: Educa Mais Brasil
Na Roma Antiga, as construções também tinham o caráter monumental e o uso de colunas. Esse período foi marcado pela descoberta de novas formas que rompiam com a rigidez das linhas retas, com o descobrimento de técnicas para a estruturação do arco e da cúpula. Existiam construções de tijolos e argamassa, cujo cimento era obtido a partir da pozolana (cinzas vulcânicas). Segundo o site Portal Educação “Os romanos deram um passo a mais no desenvolvimento do design de interiores, pois foram os pioneiros em se preocupar com o conforto dos espaços” .
Os romanos aprenderam a técnica de imitar os revestimentos por meio de mármores coloridos e se mostraram despreocupados em adotar as medidas áureas nas construções. Nesse período três construções foram muito marcantes: O Panteão (templo de adoração aos deuses), o coliseu (anfiteatro para realização de espetáculos) e as termas (local de banho público). (Figura 12)
As antigas residências romanas conhecidas como domus localizadas em Pompéia, possuíam dois pátios, onde um era constituído pelo átrio para coleta de águas pluviais e o outro denominado peristilo era circundado por colunas e dispunha
de um jardim no centro em uma área descoberta. Por esses pátios as residências recebiam ventilação e iluminação. As paredes eram decoradas com afrescos3 e as aberturas geralmente eram posicionadas para o interior das casas. (Figura 11-B)
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Figura 12: A – Coliseu de Roma; B – Domus de Pompéia; C – Panteão de Roma; D – Termas de Bath Romana Fonte: A – Toda Matéria; B – National Geographic; C – ArchDaily; D – Blog da Janela
A idade média teve duração entre os séculos V e XV foi marcada por imponentes castelos e igrejas suntuosas. Os castelos eram decorados com tapeçaria e recebiam móveis em madeira natural. As igrejas bizantinas utilizavam amplamente os mosaicos. As igrejas góticas eram delineadas por arcos ogivais, grandes vitrais e acentuadas linhas verticais, direcionando o olhar para o alto, e o teto era formado por abóbadas cruzadas. Enquanto as igrejas românicas tinham proximidade com o estilo romano por causa dos arcos e das colunas, e os corredores longitudinais eram ladeados por colunas. Percebe-se o estabelecimento de um eixo de simetria na nave central da igreja, a qual os lados esquerdo e direito dos ambientes são semelhantes e um parece ser o reflexo do outro. (Figura 13)
3 Dicionário: Arte ou método de pintura mural que consiste em aplicar cores diluídas em água sobre um revestimento de argamassa ainda fresco, de modo a facilitar o embebimento da tinta.
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Figura 13: A – Castelo de Haddon Hall na Inglaterra; B – Catedral de Durham na Inglaterra (Românico); C – Basílica de Saint Denis em Paris (Gótico); D - Catedral do Sangue Derramado na Rússia (Bizantino). Fonte: Google Imagens
Figura 14: Palazzo Medici Riccardi na Itália Fonte: Google Imagens
No período renascentista, os espaços interiores também se caracterizavam pelos afrescos, decoração em estuque, o uso de arabescos com uma combinação de formas que se assemelhavam às ramificações de plantas, além de ser um espaço provido de ampla iluminação. (Figura 14)
No barroco, os interiores das igrejas e palácios eram expressivos, denotava uma teatralidade e exuberância de ornamentos. As pinturas demonstravam uma noção de profundidade, havia um contraste entre claro e escuro, luz e sombra, o uso de cores vibrantes e obras escultóricas com movimento nos traços. Já o rococó, um pouco menos adornado e cores que remetiam a natureza. (Figura 15)
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Figura 15: A – Sala dos espelhos do Palácio de Versalhes; B – Palacio de Caserta na Itália Fonte: Google Imagens
O Art Nouveau (1890-1918) foi um movimento que teve início na França, expandiu por toda a Europa e depois se tornou um estilo internacional. Ele é reconhecido pela sua assimetria, formas curvilíneas, orgânicas, distorcidas e fluídas que remetem a natureza. Houve uma articulação entre a arte simbólica e expressiva aliada a produção industrial com o uso do ferro e do vidro. Enquanto que o Art Decó surgiu posteriormente e tinha como características opostas o uso de linhas retas, formas geométricas simples, materiais nobres e exóticos que transparecia um aspecto de requinte e luxúria de modo exagerado. Ambos os movimentos se destinavam às classes mais abastadas. (Figura 16)
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Figura 16: A - Casa Batló de Antoni Galdí em Barcelona; B - Edifício Chrysler de William Van Alen em Nova York Fonte: Google Imagens
O modernismo surgiu no século XX e apresentou duas correntes. De um lado uma arquitetura de interiores orgânica, pautada pela presença de revestimentos naturais, como a pedra, o tijolo e a madeira em sua forma bruta. Nota-se uma integração entre os elementos naturais e os industriais como o vidro e o aço, onde um se complementa no outro, há uma continuidade entre o espaço construído e a natureza que o circunda, uma preocupação com o bem estar humano. Enquanto que do outro lado, temos uma arquitetura minimalista que presa pelo funcionalismo, a racionalidade da composição, sem excessos, desprovido de qualquer ornamentação, ambientes com poucas informações, as superfícies dos pisos, paredes e teto são lisas e possuem tonalidades claras, o arranjo é simples e limpo. O mobiliário aparece sendo estruturado por peças metálicas tubulares. A característica mais em comum que ambas as correntes compartilham é a amplitude dos espaços com a ausência de paredes ou divisórias separando as funções, havendo uma integração entre as áreas sociais desses ambientes. (Figura 17)
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Figura 17: A – Casa da Cascata Frank Lloyd Right na Pennsylvania, Estados Unidos; B – Casa Farnsworth de Mies van der Rohe em Illinois, Estados Unidos Fonte: Google Imagens
Na contemporaneidade, há uma variedade de materiais, tonalidades, mobiliário e outros componentes que integram a composição arquitetônica dos espaços interiores. Nota-se uma grande preocupação em inserir elementos naturais não somente através dos revestimentos, mas pelo uso de plantas, além de uma necessidade de dispor aberturas e privilegiar a iluminação e a ventilação naturais. Os objetos decorativos são inseridos para complementarem os ambientes. Há uma liberdade compositiva, uma mistura de elementos na busca pelo equilíbrio e por tornar os espaços mais intimistas e pessoais, transmitindo a sensação de serem despojados e dinâmicos, rompendo com padrões e regras. (Figura 18)
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Figura 18: A – Ambiente produzido pela arquiteta Flávia Roscoe para a CASACOR Brasília 2019; B – Ambiente produzido pelo escritório Choque Arquitetura e Design para a CASACOR Minas Gerais 2019. Fonte: casacor.abril.com.br
Aqui foram apresentados alguns dos períodos que transformaram a arquitetura de interiores até a atualidade. É possível perceber que a arquitetura foi sendo moldada em cada época de acordo com a simbologia, a cultura, as técnicas aprendidas, o advento da indústria e os materiais desenvolvidos. Cada ambiente através de sua linguagem passava uma mensagem, um pensamento de determinada época, um significado que foi materializado. É importante ressaltar que a arquitetura nunca é definitiva, está sempre se transformando, se reinventando em busca de realizar os anseios de uma sociedade.
Conceitos
Com a especialização nas mais diferentes áreas, há três termos comumente confundidos e que precisam ser diferenciados: Arquitetura de Interiores, design de ambientes, design de interiores e decoração de interiores.
A dissertação de mestrado em desing de Marjorie Lemos Gubert (2011) faz um paralelo entre as áreas, expondo suas especificidades. Ao traçar um comparativo entre as profissões é perceptível que a arquitetura de interiores é a área mais abrangente entre as demais que lida com problemas estruturais, ambientais e de manutenção, resolução de layout, planejamento interno, circulação de pessoas, podendo desenvolver projetos de grandes escalas como museus e prédios públicos. Enquanto que o design de interiores está envolvido com projetos de menor escala, se preocupando em conceber uma atmosfera articulada com a identidade adotada para o projeto por meio de linhas, volumes, cores, texturas, mobiliário, ou seja, a criação de uma composição ambiental que satisfaça o cliente nos quesitos funcionalidade, estética e o bem estar psicológico. O design de interiores se diferencia do design de ambientes por este último compreender as áreas externas que se relacionam com o paisagismo. Já a decoração de interiores se encarrega de intervenções nos espaços internos e externos, no que se refere à ornamentação, a iluminação, mobiliário, materiais de acabamento e ajardinamento. Segundo BROOKER e STONE apud GUBERT (2011):
Arquitetura de interiores se preocupa com a remodelação das construções, com o desenvolvimento de espaços e estruturas existentes, a construção, a reutilização e os princípios organizacionais. Ele compreende as práticas de design de interiores e arquitetura, muitas vezes, lida com problemas estruturais complexos, ambientais e de manutenção. Esta prática abrange uma grande variedade de tipos de projeto, de museus, galerias e prédios públicos, através de escritórios de arquitetura. Design de interiores é uma prática interdisciplinar preocupada com a criação de uma gama de ambientes interiores que articulam a identidade e a atmosfera por meio da manipulação do volume espacial, a colocação de elementos específicos, tais como mobiliário e tratamento de superfícies. De modo geral, descreve os projetos que requerem pouca ou nenhuma mudança estrutural da construção existente, embora haja muitas exceções a este. Há situações em que a estrutura original é mantida e o interior novo é inserido dentro dela. Muitas vezes tem uma qualidade efêmera e, normalmente, engloba projetos como o de lojas, exposições, residências e empresas. Decoração de interiores é a arte de decorar os espaços interiores ou salas para conferir um caráter especial que se encaixa bem com a arquitetura existente. Decoração de interiores está preocupada com questões tais como superfícies padrão, ornamentação, mobiliário, decoração de interiores, iluminação e materiais. Geralmente lida apenas com pequenas alterações estruturais do edifício existente. São exemplos típicos dessa prática o design de residências, hotéis e restaurantes. (BROOKER e STONE, apud GUBERT, 2011, p.28, grifo da autora)
Independente da qualificação ser arquitetura de interiores, design de interiores, design de ambientes ou decorador de ambientes, todos esses profissionais precisam estar comprometidos com as normas e legislação vigentes, a criatividade, a sustentabilidade, a ergonomia, a acessibilidade, a funcionalidade dos espaços e o mais importante que concebam espaços que despertem sensações positivas, sejam multissensoriais, estimulantes, ativos e que transformem a experiência de interação dos usuários com o lugar, promovendo uma atmosfera que emocione as pessoas.
Metodologia de projeto
A dissertação de mestrado em Design de Lílian Lago (2017), aborda o processo de projeto desde métodos tradicionais até os métodos contemporâneos. Primeiro, é necessário entender o significado de metodologia que pode ser entendida como o estudo dos métodos a serem seguidos em um determinado processo, sendo que os métodos envolvem um conjunto de procedimentos ou etapas que visam atender um objetivo. Enquanto que o processo consiste em uma sequência contínua de operações para chegar a um resultado. Sendo assim, a metodologia é o caminho guiado pelo profissional do início ao fim de um projeto. Existem diversas metodologias de processo de projeto e cada profissional utiliza aquela que melhor se adapta à sua rotina de trabalho.
Na trajetória da metodologia de projeto é observada que os processos modernistas tinham por objetivo solucionar problemas e se adequar ao processo industrial que presavam pelo funcionalismo, otimização do processo e agilidade na execução de tarefas. Então as metodologias eram lineares, rígidas e simplificadas, cujo foco era atingir o resultado final. Além disso, os aspectos semânticos, as dimensões estéticas e psicológicas eram descartadas por serem consideradas supérfluas. O método mais representativo desse período foi o proposto pelo artista e designer italiano Bruno Munari (1907-1998).
Já na contemporaneidade há um entendimento acerca da complexibilidade do contexto do projeto que envolve as subjetividades das pessoas e aspectos culturais, sociais, ambientais e econômicos. Esse entendimento acerca dos profissionais estarem lidando com um cenário complexo, assim como a neurociência, é determinante que seja estabelecida a interdisciplinaridade, multidisciplinaridade e