Fervo

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Edição1_Ano1_Maio_2021






vem quente Carol A Fervo é fervo, é incendiária, é explosiva, é quente. Aqui na revista vamos falar de tabus, trazer reflexões sobre aquelas perguntas que você não quer fazer para a sua família e jogar na roda os impulsos incendiários e incontroláveis da adolescência, ou seja, vamos colocar o papo em dia. Pensada por jovens para jovens. a Fervo chegou e está pronta para ser sua melhor amiga, aquela companheira de todas as horas. Cada edição vai falar sobre um impulso, desses que vem entre uns 14/16 anos tipo sexo, drogas, redes sociais, etc. Mas, na queridíssima primeira edição, o assunto da vez é o nosso bom e velho sexo. O tesão acumulado na quarentena, novos jeitos de sentir prazer e dicas amigas para aqueles momentos de desespero são alguns dos assuntos saídos do forno que estão te esperando bem quentinhos, do jeito que a gente gosta. Estamos aqui para te ajudar a entender suas vontades e saciá-las com responsabilidade e segurança, sem críticas ou julgamentos. A gente sabe o que você tá passando, que você não é criança, nem é perfeito, nem tragédia. Tamo junto!

siga a playlist da Fervo no Spotify

Giulia

Lucas



CAPA:

conceito FOTO: Fernanda Liberti

Edição1_Maio 2021

Colaboradores

R$ 3,00

PROJETO: Eletronic Beats Baile Santo Amaro, 2020

ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING

Graduação em Design Turma DSG 3A 2021/1 PROJETO III

Marise De Chirico PRODUÇÃO GRÁFICA

Mara Martha Roberto

RYOT

CATARINA BESSEL

EDDY CHEN

RENATA AMERLIN

FERNANDA LIBERTI

THIAGO BORGES

quadrinista, venceu Troféu HQ Mix de melhor webquadrinho com "RyotIRAS"

artista visual, ilustradora e designer, compõe principalmente com colagens

MARKETING ESTRATÉGICO

Leonardo Aureliano da Silva FINANÇAS

Alexandre Ripamonti COR E PERCEPÇÃO VISUAL

Paula Csillag ERGONOMIA

Matheus Pássaro Auresnede Stephan

fotógrafo oficial de Euphoria, fundou o coletivo criativo StillSync Photography

fotógrafa de diversos eventos culturais sobre literatura periférica

CONSULTORIA LOGO

Marcos Mello PROJETO GRÁFICO E EDITORIAL

Carol Naspitz Giulia Doria Lucas Neopmann

fotógrafa de ensaios sobre corpos reais trazendo à tona a diversidade

jornalista, fotógrafo e co-fundador do grupo Periferia em Movimento


maio abril2021 2021

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10 ESQUENTA notas rápidas

12 É O QUE?

se toca mulher pós-pornô

16 PAPO RETO

sejam autênticos!

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SEXTECH: CONHEÇA O NOVO SEXO DO FUTURO

38 SE CUIDA

transei, e agora? bota essa capa! tá, mas e a AIDS?

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‘EUPHORIA’ E AS EXCITAÇÕES DA JUVENTUDE

48 NOVOS CAMINHOS DO PRAZER: ELAS DESISTIRAM DE VER PORNÔ?


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MANDA NUDES: A TECNOLOGIA ESTÁ MUDANDO A PORNOGRAFIA

62 SACA SÓ

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POÉTICA PERIFÉRICA E SUA IMPORTÂNCIA NAS QUEBRADAS

a categoria é: POSE

TOP 10

checklist

70 LANSA A BRABA

preferem a internet a sexo – hm e daí gineologísta? saúde vs. tabu sexo e a geração Z: a nova pornografia

78 ARTE

MCF8 e a pandemia

88 DROGAS

enfermeiro do rolê

92 MODA

recicla o kit

98 ALIMENTAÇÃO movimento PANC

102 INTERNET

algoritmo é padrão

106 PEGA A VISÃO horóscopo

108 VOA

#MeNotaLynne _bora programar!ˆ


ESQUENTA_by @consumoteca Divulgação

VEM DE LIPS

Por muitas décadas o sexo foi atrelado a uma imagem de pecado e promiscuidade, como se fosse errado falar sobre relações sexuais. E por esse ser um problema bem recorrente, Lips é a nova rede social que trás uma proposta inovadora para falar sobre sexualidade sem tabus, preconceitos ou censura, desmistificando todas as mentiras que sempre nos contaram.

AI AI O DESEJO…

As Relações Beta não têm muito começo nem fim bem definidos. Precisamos sempre estar atentos para parecer interessantes ao @ nas redes sociais e, assim, sermos desejados. Assim, sentimos que somos alguém no mundo. Alguém que impacta pessoas e que, de algum modo, pertence a algo. Sabe qual é o melhor jeito de não nos decepcionarmos com nós mesmos?

VEGANES EM PESO

“Ser vegano/vegetariano é muito caro”. Essa com certeza é uma frase que todo simpatizante desse movimento já ouviu. Isso porque tem pessoas têm a ideia de que alimentos sem carne são mais caros. No entanto, o veganismo político contribuiu para que informação se tornasse mais acessível, de modo a ampliar bastante as zonas de contato. Então se você quer saber mais sobre o assunto, vale uma olhada nesse perfil: @veganoperiferico

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PIX É O NOVO TINDER?

A nova forma de transferência de dinheiro, o PIX, está sendo muito mais útil do que imaginávamos. E na internet, você sabe, as coisas fluem mais rápido. Provavelmete você já deve ter visto esses memes também. “aceito prova de amor a partir de um PIX de 50 reais”. Pois é, Parece que a desmaterialização mudou até forma como puxamos assunto com o crush, né more?

BRECHÓZANDO

Até uns anos atrás, a ideia de comprar roupas antigas em brechós era de cara rejeitada. O que as pessoas real queriam eram peças novas, dentro da moda mais atual. Mas o que era visto como brega, agora já é vintage e cool. Se liga, que hoje já tem uma galera de olho nessa tendência, então vem!

FLERTANDO NA PANDEMIA

O sucesso ou insucesso dos nossos encontros sempre foram pautados em interesses emcomum e visões de mundo semelhantes. Agora, além de tudo isso, a gente também avalia se a pessoa age de acordo com as nomas de segurança no mesmo grau que nós estamos com relação ao corona. É por essas e por outras que flertar online tem sido um desafio.

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É O QUE?

se toca, mulher! A influenciadora Juliana Santana e a sexóloga Sônia Eustáquia contam porque a mulher deve sim explorar sua sexualidade sem sentir culpa

2020 e ainda tem muita mulher que não explora o próprio corpo, né? Como pode? A masturbação feminina continua sendo tabu para muitas, já para outras, o que está difícil mesmo é ter imaginação para construir momentos de prazer sozinha em tempos de isolamento na pandemia. Foi pensando nisso que nós, da Máxima Digital, conversamos com a ativista body positive Juliana Santana e com a psicóloga especialista em sexualidade humana Sônia Eustáquia para falar sobre leitura de contos eróticos, e podcasts como alternativa ao alto consumo de pornografia. Para Juliana, o prazer feminino sempre foi mal visto. “Tudo o que tem a ver com a sexualidade feminina é um tabu ainda porque o direito de sentirmos prazer foi negado por muito tempo. A mulher que

tinha prazer era taxada de que não era para casar e todas essas caixinhas que vão nos colocando. Agora, começamos a entender que a nossa sexualidade é também uma vertente da saúde. A saúde feminina e a sexualidade estão super ligadas e quando falamos sobre masturbação e orgasmos vemos que só há benefícios. Precisamos entender que isso tem que estar na rotina da mulher, inserido no conhecimento do próprio corpo dela”, refletiu a profissional. Segundo a sexóloga, o tabu começa na infância. “A masturbação é proibida desde cedo na vida de todas as mulheres.


Fernanda Liberti

Ao tocar os genitais, a menina é reprimida pelos pais e dá um significado que fica gravado nos seus registros emocionais que essa prática não é boa. Ela ainda nem sabe que esse contato com o corpo está lhe trazendo o prazer, mas esse registro mais tarde se soma a toda uma cultura que não privilegia o sexo para as mulheres.” “Explorar a sexualidade é necessário pela questão do conhecimento do corpo e também para tentarmos mudar a forma como o sexo ainda é feito. O prazer do homem é muito priorizado justamente porque vemos isso na pornografia. Então, quando trazemos o conto erótico para

Agora, começamos a entender que a nossa sexualidade é também uma questão de saúde

a nossa rotina, temos muitas possibilidades para explorar, nossa imaginação flui, faz bem para a nossa mente. Sem contar que ganhamos mais liberdade para tentar coisas novas e não ficar somente na mesmice, aquilo que aprendemos no pornô”, afirmou a criadora de conteúdo. Sônia entende que o consumo de contos eróticos é super positivo: “A importância da mulher conhecer o próprio corpo está em explorá-lo e ir descobrindo seus tempos, suas geografias e nuances para que consiga aproveitar ao máximo disso que é dela. Para mim, conto erótico como forma de mobilização do prazer é uma ótima alternativa à pornografia, já que na última, já está tudo pronto, mas o conto permite a utilização de fantasias, que por diversas vezes, são pouco exploradas.” O não conhecimento do próprio corpo por grande parte das garotas é uma situação muito presente na sociedade, por conta dos ensinamentos sobre o sexo como algo sujo ou até impuro

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É O QUE?

pós-pornô Contra o sexo comercial, machista e heteronormativo feito pela indústria pornô, o movimento pós-pornô propõe que se faça uma pornografia mais diversa e experimental

“QUARTA-FEIRA, 1 de julho, às 19 horas da noite.

O pós-pornô chega até as Sociais, passeia pelos corredores da faculdade e vai sexualizando tudo ao seu redor. Uma proposta para ampliar o imaginário pornográfico e experimentar outras formas sexualizadas de habitar o espaço universitário”, era o que estava escrito no folheto de divulgação que circulou pela Universidade de Buenos Aires, na Argentina. Somente cerca de 30 pessoas viram a performance e o debate que ocorreu em seguida. Mas as notícias de mulheres, sobre nudez, sexo e sadomasoquismo que ocuparam uma das mais prestigiosas universidades do país correram as redes sociais e a imprensa como um raio. “Entendemos o pós-pornô como uma plataforma artistíca e política que permite

experimentar, viabilizar e tornar desejáveis diversidades de corpos e práticas sexuais não convencionais”, disse pouco depois Laura Milano, investigadora e jornalista argentina que participou da ação ocorrida. O pós-pornô surgiu em meados dos anos 80, quando a ex-atriz pornô Annie Sprinkle se insurgiu contra as condições de trabalho e o machismo da indústria. Considerada a mãe do movimento, Annie Sprinkle passou a idealizar, dirigir e criar seus próprios filmes e performances. Em uma delas, com uma lingerie preta e sapatos de salto alto, ela abre as pernas,


O pós-pornô traz uma nova forma para pensar as relacões pessoais com sexualidade, além de abrir espaço para corpos e desejos antes ignorados

Fernanda Liberti

insere um espéculo na vagina e convida homens e mulheres a olhar o seu colo do útero. “A vagina ou o colo de útero não têm dentes”, diz Annie, numa provocação aos machistas e/ou mulheres que têm vergonha de seu corpo. Cerca de vinte anos depois, coletivos feministas ao redor do mundo retomam a ideia. São grupos que, ao não se verem representados na pornografia comercial, propõem novas práticas – ao invés de As criações que surgem desse trabalho porechaçar a pornografia como um todo. dem ser várias: filmes, fotos, intervenções, Definir o que seriam estas práticas, no debates, textos, audios e composições. entanto, já é tarefa mais complicada, já A pluralidade das formas de ação do que existem inúmeros coletivos indepen- pós-pornô evidencia que não estamos dentes criando cada um suas narrativas diante de um movimento unificado ou de em torno do tema. Mas o primeiro passo um gênero com códigos estabelecidos. é afirmar o que o pós-pornô não quer ser. “Grande parte do discurso pornô que se Aproveitando as novas tecnologias cada produz segue reproduzindo a heteronorvez mais acessíveis, esses grupos femi- matividade e colabora para alimentar um nistas criam e consomem suas produções imaginário limitado, regrado e que hierarpós-pornográficas. Mas, ao contrário da quiza as experiências sexuais em torno indústria, suas produções são coletivas, das pessoas”, afirma a jornalista Laura. Para Eliane Robert Morais, professora autogestionadas e sem fins comerciais. da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em literatura erótica, a pornografia comercial tenta se impor de maneira única sobre desejos que são singulares, produzindo “uma sexualidade conformada às exigências da ordem social; um erotismo reduzido às demandas da utilidade. A tralha midiática oferece um repertório fechado e pronto de imagens, que banaliza e reduz o poder subversivo do sexo.”

Kristina Shakht

O ideal de que todos os corpos são desejáveis é algo que está muito presente no conceito pós-pornográfico

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PAPO RETO

sejam autênticos! Conversando com a gente, Ludmilla manda o papo reto: fala sobre representatividade, preconceito, resistência, e amor, contando sobre o relacionamento com a Brunna Fotos do INSTAGRAM @LUDMILLA


É inegável o poder que o nome de Ludmilla tem no mainstream da cultura pop contemporânea: é a segunda mulher brasileira mais ouvida no Spotify. Com seu jeitinho de menina carioca, cheia de gingado e boa postura, a cantora não demorou para conquistar milhares de corações ao redor do país que a levaram para dentro de suas vidas por meio de muita música e arte. Depois que assumiu seu romance com a bailarina Brunna Gonçalves – que hoje é sua esposa – em 2019, Ludmilla relembra ter se surpreendido com a aceitação e o carinho demonstrada por seu público. Claro que curiosidades sobre a cantora também foram garimpadas ao longo do bate-papo, onde revelou qual o date mais romântico que teve com a Brunna, como se sente sendo referência, e reflete sobre como se enxerga daqui a alguns anos.

Aceitar minha condição sexual e de fato me reconhecer como uma mulher negra são as duas coisas que mais me transformaram

Qual foi o momento da sua vida em que você percebeu que se atraia por mulheres? Como ocorreu essa realização e descoberta? Cara, quando eu estudava. Eu acho que tinha uns 16 anos e soube que uma amiga beijou uma menina. Eu fiquei olhando pra essa garota e passei a vê-la diferente. Foi simples assim. Como é pra qualquer ser humano quando se descobre tendo atração por outra pessoa! Como você abriu essa questão sobre você com a sua família? Sentiu medo em algum momento? Lógico que sim, eu era uma menina da Baixada e sentia muito medo da minha mãe. Na real, eu já achava que ela tinha descoberto. Foi sinistro. Mas o tempo cura os medos e prova pra gente que ser quem a gente é, sempre é melhor, não é? Como rolou o primeiro beijo entre você e a Brunna, e quem falou as três palavrinhas mágicas primeiro? Foi na casa de uma amiga, eu tinha acabado de lançar o clipe de “Cheguei”. Fui lá, cheguei e dei um beijo nela (risos). E quem disse te amo primeiro? Foi ela!

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PAPO RETO

A tamanha aceitação do seu público foi algo que você esperava, ou te pegou de surpresa? Caraca, me pegou de surpresa sim. Porque a crítica a uma mulher preta como eu sempre existiu. Também tinha essa crítica pelo meu jeito de me vestir, pelas minhas atitudes. Então, de alguma forma, eu esperava mais críticas e achei que meus fãs pudessem não entender. E foi uma surpresa foda! Com os meus fãs eu entendo todo dia o poder de ser transparente. Isso me faz crescer e experimentar a liberdade. E liberdade e respeito é algo que toda mulher, seja negra ou lésbica quer. Eu me orgulho de ser cada dia mais transparente comigo e com meu público. Chegou a notar alguma diferença de tratamento depois de se assumir publicamente? De que maneira essa revelação mexeu com a Ludmilla como pessoa? Como eu disse na pergunta anterior, foi uma surpresa boa. Passei a ser tratada melhor, com mais gente dizendo se inspirar em mim, algo é incrível. Ao parar de esconder minha intimidade eu ganhei também mais responsabilidade. Se isso me assusta? Não mais! Isso me dá força! Em uma entrevista, a Brunna disse que gostaria de ter um filho até os 30 e que até ano que vem isso aconteceria. A ideia continua a mesma! (risos)

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Ao parar de esconder minha intimidade eu ganhei também mais responsabilidade. Se isso me assusta? Não mais! Isso me dá força! Ludmilla e Brunna Gonçalves, (abaixo) a dançarina da sua equipe de shows que se tornou sua esposa em dezembro Ludmilla (na página da direita) no ensaio fotográfico para a divulgação do seu novo EP “Numanice” lançado em 2020


Além da sua sexualidade, você também é uma mulher negra. Como é ser hoje uma das principais representantes de ambos os movimentos? Aceitar minha condição sexual e me reconhecer como mulher negra são duas coisas que me transformaram real. Eu sei que inspiro e espero poder fazer mais, porque isso é o que chamamos de representatividade. Isso é muito importante. Eu sempre fui uma mulher negra. E existir e fazer sucesso como mulher negra já é um afronta nesse país. Como mulher lésbica eu sei que também posso inspirar as pessoas. Mas cara, mais que um ato político, falar sobre o meu casamento é falar sobre amor, entende? Pode parecer bobo, mas falar de amor nos dias de hoje também é sobre ter uma coragem. Pode acreditar! O funk é ainda um gênero musical extremamente heterossexualizado. Depois que você assumiu sua orientação, se tornou uma das poucas artistas mulheres LGBTQ+ na cena. Como essa quebra de barreiras vem te inspirando? O funk, em sua maioria, é masculino. Muitas mulheres vem quebrando essa barreira e fico feliz de ver e participar disso. Fico feliz de notar meu sucesso sabendo de onde eu vim. O funk fala sempre sobre liberdade e, por mais machista que ele possa ter sido, ainda é muito sobre liberdade. Que bom que hoje eu posso me expressar com a minha música no funk abertamente, porque tem muita gente que vive sufocada, com medo de gritar. Eu não poderia ser quem eu sou hoje se não pudesse me expressar.

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PAPO RETO

Postagem de Ludmilla no Instagram: “Eu nasci pra fazer tudo aquilo que dizem que mulher não pode, amém?”

Infelizmente, ninguém está imune ao discurso de ódio muitas vezes trazido pela internet. Como lidar com as mensagens negativos e o preconceito online? O que fazer para não pirar com a ignorância alheia? Tenho a solução pra isso, não. Tem horas que me influencio, sim. Mas com o tempo tenho aprendido a olhar também para os “lovers”, saca? Não só os haters. Porque tem muita gente que manda amor pra gente o tempo inteiro. São essas pessoas que, cada dia mais, me chamam atenção. Qual foi o date mais romântico e inesquecível que você teve com a Brunna? O que seria um dia ideal na vida do casal? Cara, a gente é romântica o tempo inteiro. Juro! Mas olha, nosso primeiro dia dos namorados, em Angra dos Reis, depois de assumir a Brunna para o Brasil, esse foi inesquecível. Afinal, estávamos livres, né? Como você se enxerga daqui 5 anos? Quais os planos? Montada na grana e fazendo festa no meu iate (risos). Brincadeira! Na real eu espero estar com mais um punhado de hits! Que tipo de mensagem você espera passar para seus fãs tanto com o seu trabalho, como, também, com a sua coragem de ser verdadeira à quem realmente é? Eu diria para que eles jamais se curvem ao julgamento de ninguém. E que sejam livres, sejam autênticos, sejam quem tiverem de ser. É isso!

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Jamais se curvem ao julgamento de ninguém. Sejam livres, sejam autênticos, sejam quem tiverem de ser. É isso!



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‘EUPHORIA’ E AS EXCITAÇÕES DA JUVENTUDE A série da HBO ficou conhecida por ser polêmica e trazer a tona assuntos tabu presentes na vida da maioria dos jovens de forma mais explícita e real Texto por SAULO TAFARELO Fotografias por EDDY CHEN


uphoria estreou em 16 de junho na HBO e, em pouco tempo, conseguiu se transformar numa série de sucesso e recheada de polêmicas. A trama adolescente mostrou ao longo de sua primeira temporada traz cenas com diversos pênis, micropênis, sexo explícito e uso de drogas sem pudor ou censura. Além de todos esses temas pouco explorados (e exibidos) na televisão, o seriado adolescente também tocou em assuntos importantes do mundo jovem de forma compreensiva e pela visão deles, como depressão, masculinidade tóxica, baixa autoestima e libertação sexual. Porém, com todos esses conteúdos sendo exibidos de maneira explícita e, em muitas vezes, de um jeito chocante, Euphoria rendeu várias controvérsias, já que a série foi alvo até de petições que pediam seu cancelamento. Logo após o primeiro episódio, o Conselho de Pais da TV americana pediu a retirada da série do ar com um comunicado público, sob alegação de que o conteúdo mostrado é visto como uma má influência aos jovens. Zendaya, que interpreta a personagem principal Rue, teve de recorrer às suas redes sociais para alertar sobre o conteúdo mostrado. Ela interpreta uma adolescente que volta para casa depois de meses na reabilitação, indo parar lá por conta de uma overdose de drogas. Ela escreveu que Euphoria faz “um retrato bruto e honesto de vícios, da ansiedade e das dificuldade dos dias atuais”. Dirigida por Sam Levinson, a série terá uma segunda temporada, provando que, mesmo com as polêmicas, a série despertou uma certa curiosidade nas pessoas .

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Depressão

A depressão entre os jovens é um dos assuntos explorados e exibidos na série. Ao longo dos episódios, algumas das personagens podem ser identificadas com traços de depressão ou revelam que já tiveram a doença psiquiátrica no passado. A depressão de Rue (Zendaya) é retratada no sétimo episódio, no qual ela se isola em seu quarto por alguns dias, deitada debaixo das cobertas, e revela que assistiu a 22 horas de Love Island, um reality show . Rue fala sobre sua depressão, e como ela chega a impedir de levantar e ir ao banheiro para fazer suas necessidades. Ela reclama de dor na bexiga, por conta da quantidade de toxinas que não foram liberadas, e acredita que seria mais fácil ir ao banheiro de uma vez, mas seu cérebro e seus músculos não a deixam movimentar-se. No mesmo episódio, ela diz que se sente presa num tempo que é muito confuso, dentro de sua própria cabeça. A depressão é uma das doenças que mais atinge pessoas no mundo e os jovens são os indivíduos com umas das maiores taxas de incidência da doença psiquiátrica. Considerada o “mal do século” pela Organização Mundial da Saúde, estudos

vêm comprovando que ultimamente o aumento dos quadros de depressão entre os jovens têm sido causados pelo uso das redes sociais. Em Euphoria, Rue é retratada também com ansiedade, provocada pela lembrança de momentos desagradáveis, já que ela sabe que os momentos bons são poucos e que logo eles vão embora para dar lugar aos momentos ruins que virão.

Masculinidade Tóxica

Mais um dos temas centrais de Euphoria. As personagens Cal Jacobs (Eric Dane) e Nate Jacobs (Jacob Elordi) são pai e filho na trama. Ambos exercem sua masculinidade de maneira compulsória e altamente tóxica nas telinhas. A começar por Cal, o qual é tido como um “pai de família” e um dos mais respeitados empresários da cidade, que trai a esposa com personagens LGBTs, fazendo tudo isso às escondidas. Ele faz uso do poder e influência para comprar o silêncio dos parceiros sexuais, chegando a ter dezenas de conteúdos pornográficos gravados em DVDs dentro de seu escritório para alimentar sua personalidade. No primeiro episódio, Cal se autodenomina num app de paquera como

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A série acerta em tratar desse tipo de comportamento de uma maneira brutal, mantendo a fidelidade com o tipo de situação que ocorre fora da ficção.

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DominantDaddy (Papai dominante, em tradução livre) e acaba tendo uma relação sexual com Jules (Hunter Schafer), uma adolescente trans que estuda na mesma escola de seu filho Nate e que acaba conhecendo e tendo contato com os seus mesmos círculos sociais de amigos. Tal pai tal filho, Nate acabou sendo treinado para desenvolver a mesma fome de controle que seu pai. Além de namorar Maddy (Alexa Demie) e ter uma relação abusiva com ela, chegando até a estrangulá-la, ele tenta controlar a tudo e a todos, sempre virando o jogo para si. Na trama, Nate cria um usuário em um aplicativo de paquera LGBT+ e acaba se passando por outra pessoa, nomeando-se de Tyler. Pelo app, acaba seduzindo Jules, a qual envia fotos nua para ele, sem saber que Tyler é na verdade um dos meninos que ela mais acha repugnantes, arrumando confusão com ele no primeiro episódio. Ao longo da narrativa, Nate revela ser o cara do app que Jules se apaixonou e, em troca de seu silêncio e como forma de manipulação, ele ameaça entregar suas fotos para a polícia para ficar registrada para sempre nos arquivos de crimes sexuais, já que Jules é menor de idade. Nesta situação, as personagens são retratadas como espelho uma da outra, repetindo constantemente ciclos abusivos com seus familiares e amigos. A série acerta em tratar desse tipo de comportamento de uma maneira brutal, mantendo a fidelidade com o tipo de situação que ocorre fora da ficção. Sob a ordem de ameaças e do uso inconsequente do poder e da influência, as personagens vão manipulando uma as outras como bem entenderem.


Nesta cena do primeiro episódio da série, Rue vai a uma festa e usa diversas substâncias psicoativas. É neste momento que o expectador entende o vício da personagem

Uso e abuso de drogas na adolescência Vários dos personagens adolescentes na série foram retratados consumindo drogas das mais diversas, desde maconha e cocaína até anfetamina e remédios fortes que geram efeito depressivo. Na série, o consumo foi retratado dentro de casa, em festas e entre amigos da escola. Porém, o abuso de drogas se restringe à personagem central Rue, na qual a narrativa gira em torno de sua volta para casa depois de um tempo na reabilitação após uma overdose. Ela tenta lidar com a sobriedade ao longo da trama mas falha em vários momentos, chegando a ficar mais de 24 horas desacordada devido ao uso de uma forte substancia em um dos episódios. Em Euphoria, Rue assume que a vida com as drogas é complicada e revela que seu consumo se iniciou após a morte do seu pai, que faleceu devido a um câncer. A história é fiel ao retratar jovens experimentando ou abusando de drogas na adolescência, mas não trata isso como algo totalmente bom e legítimo. Ao decorrer dos episódios, as personagens dizem que cometeram erros ao consumir determinadas drogas e podemos ver que Rue luta contra a tentação de se viciar novamente ao aderir às reuniões dos Narcóticos Anônimos, e chegou a impedir que sua irmã usasse drogas entre os amigos.

Dominação Financeira

No mundo dos fetiches e do BDSM, o termo Findom, ou dominação financeira, é quando um indivíduo domina um submisso mediante ao pagamento de certas quantias de dinheiro. A prática faz parte da submissão e da dominação consensual entre os indivíduos e, na maioria das vezes é feita para fins de gerar prazer sexual. Como é mostrado na série, não é necessário que os indivíduos tenham uma relação física para chegar ao prazer. Kat (Barbie Ferreira) liberta seu lado sexual e vira uma dominatrix na internet, exigindo mimos e altas quantias de dinheiro enquanto humilha homens pela webcam. A humilhação é uma exigência dos homens, fazendo parte do jogo da submissão e da dominação, na qual eles sentem prazer em se sentirem “inferiores” à dominatrix. Não há pudores em Euphoria quanto a esse tema e às cenas que o retratam. Em um dos episódios, um micropênis é mostrado de forma explícita através do computador de Kat enquanto ela está humilhando ao máximo o homem do outro lado da webcam, na qual ele sente prazer total por conta dos xingamentos feitos por ela. Com suas sessões pela webcam, ela ganha ao mínimo 300 dólares por meia hora e acaba desenvolvendo sua mais nova personalidade de dominadora através de suas atitudes autoritárias, da mascara de gatinha e das roupas de látex.

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Sexo explícito

Maddy preparada para o baile da escola. A personagem lida com complicações durante a série por conta de um namoro abusivo, expondo assim a realidade de uma relação nem um pouco saúdavel

Diferentemente de outras séries, que mostram relações sexuais encobertas ou apenas partes do ato, Euphoria mostra o sexo de maneira mais nua e crua. Para além do ato sexual, a série mostra explicitamente partes do corpo como seios, nádegas e até pênis (e micropênis). As partes mais íntimas dos homens são geralmente exibidas de maneira explícita apenas em filmes e séries com cunho pornográfico, mas em Euphoria elas são exibidas mesmo assim. Em quase todos os episódios há cenas com pênis à mostra, gerando polêmicas atrás de polêmicas na internet. Logo no primeiro episódio, o pênis da personagem Cal é exibido sem censura e, ainda por cima, ereto. Já no segundo episódio, uma das cenas iniciais se passa num vestiário masculino, na qual aparecem mais de trinta pênis que podem ser contados. Além dos pênis, um micropênis, como descrito na própria série, é mostrado enquanto Kat humilha o homem por trás da webcam. Nada disso impede que Euphoria transmita o choque imediato, mas também conta sua narrativa de maneira mais proxima ao mundo real possível.

A série conta sua narrativa de forma mais proxima ao mundo real possível

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Pornografia como um app para se trocar “nudes”, asAs personagens da série veem pornogra- pecto também explorado na série, e o fia e são retratadas como adolescentes Tumblr é onde os adolescentes podem que usam a pornografia como um guia preencher suas necessidades de condo que fazer na vida real. Não somente teúdos pornográficos. Logo, o sexo e a os adolescentes na série, mas também pornografia andam lado a lado, não sendo os adultos, consomem e reproduzem a mais aspectos íntimos mas sim públicos. Assim, os temas tidos como tabu são violência marcada dos conteúdos pornográficos. Cal possui uma coleção de colocados a prova de uma maneira, radical DVDs com conteúdo erótico que fazem e bruta em Euphoria. Tratados como se parte do seu rol de fetiches e de estilo ocorressem de fato com as personagens de vida. Eventualmente, seu filho Nate na vida real, a série busca estabelecer um acaba tendo contato com esses DVDs e diálogo com a geração Z ao não julgá-la nem apoiá-la em seus atos cotidianos. alimentando um desejo igual ao do pai. Segundo o próprio Sam Levinson, direMaddy, namorada de Jacob, assiste portor da série, a história é baseada em suas nografia não para ter um prazer sozinha, mas sim para treinar as atuações e as próprias experiências como adolescente. posições mais sensuais e grotescas para Ao The Hollywood Reporter, ele diz: “Acho conseguir surpreender o seu namorado. que estamos sendo autênticos à experiênComo já dito anteriormente, Kat desen- cia de ser jovem. Não queríamos segurar volve seu lado dominador e acaba tendo nada, não queríamos que parecesse que uma página num site pornográfico onde estávamos escondendo algo dos outros”. pode se exibir e contatar submissos disDe fato, Euphoria não esconde nada do postos a pagá-la para humilhá-los. Porém, espectador, nem as partes mais íntimas antes disso, um vídeo seu não consentido, das personagens são deixadas de lado. em que transava com dois garotos, foi para um site pornô, ganhando muitas visualizações e chamando a atenção dos usuários. Assim como nos círculos adolescentes de hoje em dia, o Snapchat é retratado

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O QUE É SEXTECH? VEJA O NOVO SEXO DO FUTURO Robôs idênticos a seu ídolo favorito e aparelhos que te fazem sentir carícias de forma cem por cento remota. A linha entre o sexo real e o virtual está desaparecendo Por ITZIAR MATAMOROS


Fernando Scrood

Os robôs não são os únicos brinquedos sexuais inteligentes que transformarão toda a vida sexual no futuro

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ano é 2045, um em cada cinco jovens fará sexo com um ou mais robôs de forma totalmente habitual, dizem estudos. Cientistas como o dr. Ian Pearson vão ainda mais longe e garantem que, a essa altura, serão mais frequentes as relações sexuais entre humano e androide (ou ginoide, quando têm a aparência de mulher) do que entre pessoas. O sexo de amanhã será cada vez mais tecnológico, mas não só porque se popularizarão os bonecos com formato humanoide equipados com Inteligência Artificial e sistemas operacionais sofisticados. Teremos também a possibilidade de acariciar nosso par mesmo que esteja a centenas de quilômetros de distância, imprimir em 3D uma réplica exata dos órgãos genitais de outro ser humano e depois coordenar seus movimentos com um aplicativo móvel ou utilizar tecnologia que nos faz sentir em nosso próprio corpo o orgasmo de várias pessoas . O sextech, a união entre tecnologia e sexo, nos permitirá em apenas uma ou duas décadas explorar universos íntimos ainda difíceis de imaginar. Se a década de 70 do século XX trouxe uma nova sexualidade e desafiou tabus arraigados, estamos no alvorecer de uma revolução muito maior: uma que se impregnará em nossos lençóis, e mais uma vez com a tecnologia no comando, como sempre. Daqui a 20 anos esse mercado seja três vezes maior do que é hoje e possa se multiplicar por sete até 2050. “Estamos prestes a testemunhar o crescimento dos digisexuais: pessoas que fazem sexo quase exclusivamente com máquinas”, segundo Neil McArthur, professor universitário canadense com livros dedicados ao assunto.


Victoria Castello

Podemos ver e ouvir as outras pessoas em tempo real, até mesmo fazer sexo sincronizado à distância graças aos produtos da teledildônica

‘Sex toys’ inteligentes

No ano de 2035, na maioria dos quartos dos países desenvolvidos haverá brinquedos sexuais, geralmente para serem usados em ambientes de realidade virtual. O cientista Ian Pearson, um dos futurologistas líderes neste campo, distingue três tecnologias importantes que irão ter impacto no segmento: Inteligência Artificial, robótica e tecnologia active skin. Esta última “fará com que dispositivos microscópicos sejam inseridos na pele humana, muito perto dos vasos sanguíneos e dos nervos, o que permitirá a uma Inteligência Artificial externa receber informações sobre as respostas sexuais da pessoa, podendo registrar e reproduzir sensações”, conta este especialista. No caso dos robôs ou androides, “eles podem usar essa tecnologia para estimular diretamente o sistema nervoso, ajustar suas atividades às técnicas ou fantasias de que a pessoa mais gosta, com informações baseadas em uma reação muito precisa em tempo real, que será muito mais eficaz do que a intuição que as pessoas agora usam para tentar perceber o que agrada ao parceiro durante a relação sexual”, acrescenta. O especialista está convencido de que “depois de algumas sessões em que a máquina tiver aprendido

e criado uma biblioteca de diferentes sensações sobre o usuário, fazer sexo com um robô equipado com Inteligência Artificial será muitíssimo mais gratificante do que com qualquer ser humano que ja existiu.”. Em contraposição a essa afirmação, a sexóloga e psicóloga Laura Morán diz por que considera que essas invenções não serão capazes de substituir os humanos no médio prazo: “É improvável que um robô saiba atender às demandas eróticas e afetivas tão próprias das pessoas”.

Adeus às barreiras físicas

Pessoas que mantêm relacionamentos a distância hoje têm muito mais facilidade para esse envolvimento do que os casais de uma ou duas décadas atrás. vibradores inteligentes, interativos ou masturbadores masculinos que vão permitir sincronizar sobre o pênis os movimentos exatos de um vídeo. Existem almofadas que reproduzem os batimentos cardíacos do parceiro ou aparelhos, capazes de aproximar dos nossos lábios, através de sensores de força mesmo a longínquas distâncias.

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Rafael Alcaide

Já existem vaginas e pênis criados em laboratórios e wearables capazes de medir a velocidade e o número exato de repetições durante uma relação sexual

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No entanto, em breve, moldar-nos a isso será algo quase antiquado: já estão em desenvolvimento aparelhos sexuais tão avançados que nos farão sentir as carícias de nosso parceiro de forma cem por cento remota e impressoras que nos permitirão reproduzir, de nossa casa, suas partes íntimas em 3D para senti-las conosco o tempo todo. E ainda haverá os trajes hápticos que nos farão sentir todos os tipos de impulsos eróticos em qualquer zona erógena do corpo. O sexting também dará uma guinada de 360 graus: os aplicativos e redes sociais não servirão apenas para compartilhar conteúdo ou conhecer pessoas, mas também será possível manter 100% da relação sexual dentro do próprio software. Isso será feito porque os aparelhos não só vão transmitir imagens e sons como agora, mas também reproduzirão no cérebro a ilusão de compartilhar aromas e carícias, variações de temperatura ou diferentes níveis de força, contando com muita contribuição de outras disciplinas. As inovações no campo da realidade virtual permitirão recriar cenários eróticos interativos, participar de jogos sexuais online com vários participantes ou criar avatares sexuais. Será possível fazer sexo totalmente à la carte: escolher o local onde queremos que o encontro aconteça, as características físicas, a voz, as roupas, até mesmo a personalidade ou posições sexuais que queremos que nossos parceiros adotem. Prevê-se que os hologramas melhorem drasticamente nos próximos anos. A linha entre sexo real e virtual está condenada a desaparecer.


Algumas métricas que são relacionadas ao prazer, teremos, aparelhos que fazem medições bem mais confiáveis e que irão desafiar os limites do nosso próprio prazer “Faltam apenas alguns anos para que se possa pagar a uma estrela pornô ou outra pessoa para que nos ofereça uma sessão de sexo oral virtual que, graças a um dispositivo especialmente projetado para esse fim, proporcione a mesma sensação física que se teria se o ato estivesse sendo praticado na completa e pura realidade “, diz a terapeuta sexual Bryony Cole.

O uso da Inteligência Artificial para o prazer O sexo dos tempos futuros, segundo o mesmo relatório, passará por tecnologias que meçam com precisão nosso grau de satisfação, descobrindo padrões em nosso desejo sexual. Uma combinação de Inteligência Artificial e tecnologia sexual poderia ter a capacidade de melhorar muito a qualidade de nossos orgasmos. A estimulação mecânica poderia nos dar maior controle sobre o prazer do que a humana. Será possível pré-configurar cada clímax: determinar o tempo que queremos dedicar ao prazer, a intensidade, até cruzar esses dados com os do nosso parceiro ou parceiros para ter como resultado

um encontro sexual muito mais agradável.Tanto realidade aumentada quanto o entretenimento imersivo também contribuirão muito para mudar as relações sexuais ainda por cima em uma situação de pandemia, em que o simples contato físico é algo perigoso e não permitido. E pensando nisso o mundo e a tecnologia continuam a se desenvolver para suprir diversas necessidades existentes à tempos. O sexo de amanhã realmente mudará tanto? Devemos ficar alarmados quando constatamos que os millennials, a geração digital, também são os que fazem menos sexo com outras pessoas do que seus antecessores? Se há uma coisa em que todos os especialistas concordam, porém, é o seguinte: a civilização pós-Satisfyer não conceberá o sexo sem ter as máquinas presentes, de uma forma ou de outra.

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transei, e agora? A primeira transa envolve muitas questões além do desejo em si. Maturidade, autoconhecimento, entender o próprio corpo, a sensualidade e o seu erotismo

é importante saber quais os cuidados devemos ter com nosso corpo. E sabe o que faz diferença em tudo isso? Ter informação confiável para poder fazer suas escolhas. Muitas garotas não têm o costume de se tocar, de conhecer cada partezinha do corpo, cada detalhe de que ela é dona. É observando-o e sentindo-o que você percebe que ele não é mais infantil e passa a entender quais os seus reais desejos e as suas zonas de prazer como bem entender. Sim, estamos falando de masturbação! Não tenha vergonha. É o momento de você conhecer o seu erotismo e se satisfazer. . É algo super saudável, pois sabendo ter prazer consigo mesma é mais tranquilo ter prazer com o outro. Daí você vai entender que o seu corpo está realmente amadurecido e já pronto para uma relação sexual.

É um grande mito dizer que ao entrar na fase da menstruação, automaticamente a garota está pronta para a primeira relação sexual. Não é nem um pouco assim viu?! Tem muitas meninas que menstruam muito jovens, com 10 anos, por exemplo. O momento certo é quando você já está bem principalmente com o seu corpo e a sua mente e se sente pronta para ter esse tipo de intimidade com outra pessoa. Ninguém precisa ter medo, não! Mas É importante saber que há alguns riscos envolvidos no sexo. Sim, estamos falando


O início da vida sexual, tanto para a menina, quanto para o menino, não é algo somente hormonal. Os fatores emocionais também são muito importantes!

de gravidez não intencional e infecções sexualmente transmissíveis. O negócio para lidar com isso é ser consciente. Sabendo dos riscos, você pode preveni-los. A pessoa com quem você mais deve se preocupar no sexo não é o outro e sim você mesma. E ser responsável com você passa por um monte de coisas: desde se informar para tomar os cuidados necessários para ter uma vida sexual agradável quanto a camisinha tradicional. Ela ainda e saudável, até respeitar os seus limites. é pouco conhecida, por isso há pouca Além disso, a responsabilidade na cama demanda, então não é difícil de encontrar, passa pela vida fora dela. Um bom exem- até em pontos de distribuição gratuita. plo é a relação ao uso da pílula anticonE sem esquecer quando rola aquele cepcional. Não tem essa de não querer apelo emocional. Um papo do garoto de usar preservativo! É algo extremamente “Ah, se você quer mesmo ficar comigo…” necessário. Seja namoro, seja mais casual, ou “Se você me ama…”. Não caia nessa! ou não, a camisinha sempre vai ser a peça Ame o seu corpo em primeiro. Esse papo fundamental em uma relação sexual. Se o é abusivo além de não estar com nada! Se me ama, a prova de amor é o uso do garoto não quiser usar, você pode usar a camisinha feminina que vai ser tão eficaz preservativo. Se recusar a transar com preservativo é sinal de que esse cara não é a pessoa pra você, hein?! Provavelmente ele já fez isso ou faz isso com outras garotas. Não entre nessa furada e mais importante, não coloque seu corpo em risco. Você já deve ter ouvido que “é normal” doer na primeira vez. Mas não. O sexo não pode ser algo doloroso, mesmo que na primeira vez. É um grande mito. Pode ser

João Almeida

Muitas meninas começam a tomar a pílula e acabam esquecendo às vezes, o que deixa a pílula bem menos eficaz e aumenta os possiveis riscos a saúde

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Marco Assis

que se sinta um certo desconforto, mas não dor. Daí a importância de você estar bem preparada, conhecendo o seu corpo e sabendo da existência um hímen, podendo romper, ou não, necessariamente. A dor, muitas vezes, acontece quando não há uma lubrificação adequada – e às vezes é preciso tempo mesmo para que a vagina fique lubrificada. O importante é estar tranquila, sem pressa e sempre respeitando o tempo do seu próprio corpo. Claro que um pouco de nervosismo e ansiedade vão estar presentes. Daí uma saída é usar um lubrificante à base de água para ajudar. Mas tem que tirar esse mito de que a primeira vez dói. Se está ruim, doendo ou desconfortável, não é obrigação sua continuar só para agradar a outra pessoa. Nesse momento, a parte de conhecer seu corpo é muito importante: assim você saberá dizer do que realmente gosta e assim, ajudar o seu parceiro ou parceira a te proporcionar prazer também. Pode ser que algum cara tente te convencer a fazer sexo oral “para não perder a virgindade”. Nessas horas é importante saber que sexo oral é sexo também. A confidencialidade deve ser uma escolha sua! Pode ser bom compartilhar um momento

importante da sua vida, com uma amiga íntima, melhor amiga, sua mãe ou alguém em quem confie muito. É um grande sinal de que você tem as pessoas que fazem parte da sua vida e que são importantes para você e é principalmente recíproco. É normal estar um pouco nervosa e ansiosa. Para isso é importante que você tenha intimidade e confie bastante na pessoa que estará com você, para que saiba entender e respeitar a sua decisão. Não entre na onda da pressão ou piada das outras pessoas. Vai ter gente dizendo que você devia transar logo ou que você devia se guardar. Mas a única opinião que conta nessa hora é a sua. Não faça ou deixe de fazer nada nunca pelos outros.

Vale lembrar que o sexo deve ser prazeroso para todos os que estão envolvidos, sempre


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bota essa capa! Apesar de vários alertas de que o preservativo evita ISTs ou gravidez indesejada, muitas justificativas das mais diversas aparecem e a ausência da camisinha vira hábito

PARA ter uma ideia, uma pesquisa do Ministério da Saúde mostrou que 9 em cada 10 jovens de 15 a 19 anos sabem que usar camisinha é o melhor jeito de evitar HIV, mas mesmo assim, 6 em cada 10 destes adolescentes não usaram preservativo em alguma relação sexual no último ano. Nem aqueles que são ainda mais jovens e estão no início da vida sexual dão atenção para o preservativo. A Pense (Pesquisa Nacional de Saúde Escolar), publicada pelo IBGE, mostrou que em 2015, 33,8% dos adolescentes entre 13 e 17 anos que já tinham começado sua vida sexual não usou camisinha na última transa o índice é nove pontos maior do que no ano de 2012. Quando perguntados sobre, as justificativas para deixar de lado a proteção mesclam a falta de preocupação e o descuido.

“Na hora não penso nisso” Um dos obstáculos que deixa os jovens mais distantes da camisinha é a falta comunicação direta. Antigamente, uma propaganda na televisão conseguia atingir toda a população e deixar claro a importância da prevenção. Hoje em dia, o jovem já não passa muito tempo assistindo canais de TV aberta e passa muitas horas grudado no celular. “O mundo e as conversas mudaram, as campanhas pelo uso da camisinha têm que evoluir”, diz Adele Benzaken, diretoria do Departamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis, Aids e Hepatites


Virais do Ministério da Saúde. Uma das tentativas do Ministério de modernizar o diálogo aconteceu nas Olimpíadas e as Paraolimpíadas no Rio de Janeiro. Usando o aplicativo de paquera “Hornet”, voluntários tiraram dúvidas sobre prevenção, diagnóstico e tratamento de DSTs. Mais de mil mensagens foram trocadas durante os 49 dias do projeto, chamado #CloseCerto. “Falta usar mais essa criatividade nas campanhas. Tem que ser menos careta, mais frequente. As campanhas estão sumindo e o jovem não está percebendo a vulnerabilidade que tem”, comenta Roseli Tardelli, editora-executiva da Agência Aids. Outro fator que diminui o receio da geração é não ter vivenciado o período em que muitos famosos ficaram doentes e morreram por conta da doença. É aquela história de que eles não perderam ídolos ou conhecidos para a doença e por isso não acham o diagnóstico preocupante.

Marcelo Krasilcic

Os jovens passaram a se importar cada vez menos com tais métodos contraceptivos e, por conta disso, houve um cresecnte aumento de ISTs

“No começo da epidemia de Aids, ao descobrir um soro positivo você praticamente anunciava a morte. O sofrimento era enorme, marcou a população, mas 30 anos depois esse medo se esfarelou. Adele Benzaken, diretora do Ministério da Saúde Além disso, também houve certa banalização quanto ao tratamento da doença. A euforia com um remédio que controla os riscos passou uma mensagem de que tudo bem se infectar. “A culpa também é dos profissionais na saúde. Ficamos animados com o tratamento fantástico, os benefícios do remédio apareceram mais do que a preocupação com a transmissão”, afirma Benzaken.É preciso deixar claro que o impacto da AIDS mudou, ficou menos assustador, mas o vírus HIV é o mesmo e continua grave apesar das quedas de mortalidade, de acordo com Artur Kalichman, coordenador adjunto do Programa DST/ Aids de São Paulo. «Quem tem HIV terá a doença pairando sua vida para sempre. A informação do tratamento eficaz tem de ser espalhada, é ótimo, mas ser infectado não é tão simples com se diz.

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Carol Iplinsky

A proteção por meio da camisinha masculina é um dos métodos mais conhecidos, porém não é o único

O cuidado é necessário até porque a transmissão não se limita nas ‘partes íntimas’, o papilomavírus também pode ser transmitido pelo sexo oral e levar ao desenvolvimento do câncer de garganta. Um exemplo são os casos de câncer de amídala a incidência do HPV, que cresceram de 25%, há 20 anos, para 80% em 2015, de acordo com estudo feito pela geneticista Sílvia Regina Rogatto, da Unesp (Universidade Estadual Paulista). Vale lembrar que já há vacina contra alguns tipos de HPV. No caso do HIV, o boletim epidemiológico 2016 mostra que as taxas de detecção do vírus naqueles de 15 a 19 anos aumentaram. De 2006 para 2015 o número entre os homens mais que triplicou, de 2,4 foi para 6,9 casos por 100 mil habitantes. Entre as mulheres também há preocupação. Os dados mostram que a taxa de detecção aumentou 12,9% nas adolescentes com a mesma faixa etária, no mesmo período. Quando o assunto é sífilis, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, admitiu em outubro de 2016 que o país vive uma epidemia. Em 2011, o boletim epidemiológico mostrou que 7% dos jovens de 13 a 19 anos foram diagnosticados com a doença. Em 2016, esse número subiu para quase 11,0.

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“Quando namoro confio e não uso camisinha” Confiança à parte, não é recomendado deixar o uso de camisinha mesmo com os cônjuges (exceto se há vontade de engravidar, é claro). Atualmente os jovens têm um cardápio muito variado para escolher parceiros. As estratégias vão do clássico bar aos aplicativos, como Tinder e Happn. Esta facilidade promove o aumento do sexo com parceiros casuais e, por tabela, aumenta as chances de contágio caso não haja uso de camisinha. De acordo com Caio Oliveira, especialista em saúde coletiva e oficial de HIV/Aids do Unicef, há fortissimos indícios de uma relação entre o uso crescente dos apps de encontros, o grande aumento do número de parceiros casuais e do crescimento. “É difícil fazer alguma regra para todo mundo usar sempre camisinha. Então é bom dar as opções preventivas além da camisinha”, diz Benzaken. Um dos exemplos é a PEP (Profilaxia Pós-Exposição), um tratamento de 28 dias para quem teve uma relação de risco. A terapia antirretroviral, que é oferecida pela rede pública, evita a sobrevivência, a permanência e a multiplicação do vírus HIV no organismo.


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tá, mas e a AIDS? Falar sobre AIDS ainda é um tabu. O assunto geralmente surge no carnaval, com campanhas para uso de proteção, mas todo o resto do ano pouco se lembra que ela existe

em dezembro, é celebrado o Dia Mundial de Combate à AIDS, e eu escolhi trazer esse tema para o blog para lembrar da importância dos cuidados com a saúde sexual. Segundo dados do UNAIDS (programa da ONU especializada na doença), o país tem andado na contramão da média mundial. Entre 2010 e 2018 houve um aumento de 21% em novas infecções por HIV, sendo que, no mundo, a doença chegou a registrar uma queda de 16% em novos casos. Fala-se muito pouco sobre o HIV e a AIDS nas mídias, nas escolas, nas famílias e no governo, com isso, vemos desinformações e perpetuação de vários mitos e tabus relacionados a formas de contaminação, quem está sujeito a contaminação e como funciona esse tipo de tratamento O uso da camisinha masculina e feminina deveria ser um hábito automático,

mas poucos filmes, séries e novelas (que tanto falam de sexo) mostram o uso da camisinha. muitas pessoas ainda acham que existe um grupo de risco específico estereotipado, e que quem está fora está a salvo. Como felizmente o Brasil tem um tratamento aos soropositivos de referência mundial, o número de mortes decorrentes da doença diminuiu, o que é ótimo, claro. Porém, por outro lado, principalmente os jovens, não viram os seus ídolos morrendo e sofrendo muito em função da AIDS e assim acham que não é mais uma doença grave e se descuidam.


Luis Garrido

Falta prevenção combinada – como a testagem regular para o HIV, que pode ser realizada gratuitamente no SUS; a prevenção da transmissão vertical (quando o vírus é transmitido para o bebê durante a gravidez); o tratamento das infecções sexualmente transmissíveis e das hepatites virais; a imunização para as hepatites A e B; programas de redução de danos para usuários de álcool e outras substâncias; profilaxia pré-exposição (PrEP); profilaxia pós-exposição (PEP); e o tratamento de pessoas que já vivem com HIV. É bom lembrar que uma pessoa com boa adesão ao tratamento atinge níveis de carga viral tão baixos que é praticamente nula a chance de transmitir o vírus para outros. Todos esses métodos podem ser utilizados isoladamente ou como combinados.

A falta de informação a respeito da AIDS é um dos motivos mais alarmantes pelo qual as pessoas, especialmente os jovens, se tornam soropositivos sem ter tal consciência da gravidade

Kristina Shakht

Além do pouco incentivo ao uso dos preservativos, é preciso que este foco não seja apenas no “use camisinha”. É preciso trazer conhecimento (informação + afeto + valores) de como usar, em que momento usar, qual tipo, em que modalidade sexual (oral, vaginal, anal). Autoestima, autoconhecimento e respeito também são temas que não podem ser esquecidos. Muitas vezes a falta do uso do preservativo acontece por não se conseguir ter um espaço para dizer “não” a um/uma parceiro(a) que faz chantagem emocional, ou por medo de perder a ereção e o clima da relação. muitos jovens e adultos não usam preservativo por estarem sob o consumo de drogas, incluindo o álcool (muito comum nas baladas, raves, HPs – house partys, festas em casa) e não lembrarem, ou mesmo ignorarem a importância da proteção. Falar sobre a AIDS e o HIV é tão importante quanto se prevenir. temos de educar crianças e adolescente sobre o uso da camisinha, que não é apenas uma forma de evitar a gravidez, mas sim várias IST’s!

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NOVOS CAMINHOS DO PRAZER: ELAS DESISTIRAM DE VER PORNÔ? Quais são os problemas de se consumir pornografia? Como deixar de alimentar essa indústria para conhecer alternativas prazerosas e conscientes? Texto por TINA BORBA Fotografias por CHARLES DELUVIO


Pesquisa feita pela USP indica que 40% das brasileiras não se masturbam, evidenciando uma grande diferença entre os comportamentos sexuais

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ada vez mais mulheres estão tendo uma postura crítica em relação aos filmes pornôs tradicionais: afinal, são muitas cenas em que a mulher é objetificada, levando a uma perpetuação da cultura do estupro e a uma representação equivocada do sexo. Ok, esses filmes não nos representam. Mas e aí, quais são as alternativas de estímulo para o tesão quando você não quer consumir mais a “pornografia tradicional”? Universa conversou com leitoras sobre o tema. Os relatos de quem não usa mais o pornô tradicional como estímulo para a masturbação, por exemplo, indicam um maior uso de fotos e ilustrações sensuais, da imaginação, da leitura de contos eróticos e de estímulos sonoros. Já quem disse que ainda apela para vídeos de sexo explícito, relata preocupação e cuidado na escolha dos vídeos. “Não assisto sempre, mas, quando vejo, escolho um vídeo que eu me sinta mais confortável. Reconheço que a maioria coloca a mulher num lugar que eu não me sinto confortável nem de assistir”, diz Josi Skieresinski. Também é como se sente Diessica Flores, designer de interiores, que se diz incomodada em consumir de uma indústria que incita a cultura do estupro. “Tem toda uma indústria que estimula isso, e saber que muitas daquelas mulheres foram fazer aquilo por não terem uma alternativa... eu não queria ser uma das pessoas que incentivam isso. Até procuro outros tipos de pornô, de estúdios que se preocupam. Não dá pra dizer que é um cenário perfeito, mas quando eu consumo tento procurar algo que não seja dessa cultura grotesca”, fala Diessica.


O que fazer se você não quer consumir pornô? Mariana Stock, fundadora do espaço Prazerela e terapeuta orgástica, classifica a pornografia como um recurso facilmente comercializável e questiona a maneira como a mulher é normalmente representada. Ela acredita que o prazer está no corpo inteiro e vai muito além de estímulos visuais. “90% da pornografia mainstream é um entretenimento às custas de estupro. O corpo feminino se tornou esse simulacro de estupros, e todo mundo usa isso pra se excitar”, explica a profissional. Mariana é dona de um espaço que se dedica à ampliação do repertório de prazer das mulheres por meio de cursos, reflexões e práticas. Desde a criação desse espaço, ela já ajudou mais de 5000 pessoas. Mulheres que têm geralmente entre 20 e 60 anos e que buscam autoconhecimento e um maior desenvolvimento e entendimento da própria potência sexual. Segundo a terapeuta, pela sexualidade ainda ser um tabu, nós optamos por um estímulo que nos “sequestra do nosso corpo”, nos leva a imaginar estar em outro

lugar onde não estamos, e passamos a sentir somente com a mente. “Somos tão reprimidas que é um jeito de sair e de não sentir o próprio corpo. Quando a gente amplia a consciência corporal, percebe que o orgasmo não precisa vir só da nossa genital”, esclarece Mariana. “Eu acho que pra quem busca o autoconhecimento e também a potência sexual, a pornografia é sem sentido. Além de estimular o machismo e ser viciante, o orgasmo do pornô é uma descarguinha, um espirro. Mas pra quem usa isso da mesma forma que come um sanduiche, tudo bem, quem sou eu pra moralizar e dizer que está fazendo de maneira errada”.

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Segundo estudos, a masturbação feminina tráz muitos benefícios para a saúde, entre eles permitir a liberação do hormônio endorfina, responsável pela tranquilização

A gente está dentro de um sistema capitalista opressor. Não acho que a resposta é necessariamente parar de consumir pornografia. O fundamental é pensar como se consome e o que se consome. Eu sempre recomendo que elas testem várias coisas. Tem o estímulo auditivo por exemplo. Ouvir e ler contos eróticos, como o Tela Preta, também é muito excitante. A arte erótica te desperta tesão e desejo”. Estímulos sonoros também são uma boa opção A plataforma Tela Preta, citada pela Luana, oferece áudios de contos eróticos narrados por onze vozes diferentes, nas mais variadas categorias. A plataforma foi lançada em meio à pandemia, em abril do ano passado, e cerca de três mil pessoas já tiveram contato e acompanham os mais de 160 áudios disponíveis. Universa conversou com Fábio Chap e Laís Conter, dois dos quatro sócios da iniciativa que são bem diretos e abertos quanto ao objetivo do negócio. “A gente não tem vergonha. O objetivo dos nossos áudios é molhar a calcinha e deixar de pau duro mesmo”, afirma Laís. Na plataforma, há a preocupação de não descrever os corpos para que ninguém se sinta excluído/excluída e para estimular a imaginação. Aliás, esse é um dos diferenciais. “É bacana pra pessoa imaginar e se colocar naquela cena. Esse e o principal diferencial, sair da pornografia comum que entrega tudo mastigadinho. Com o áudio, tu precisa trabalhar a imaginação, tu acabas trabalhando outros sentidos”, explica.

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Não acho que a resposta é parar de consumir a pornografia. Acredito que o fundamental é entender como e o que se está consumindo. Ela relata que sempre preferiu a imaginação e a memória como companheiras dos momentos de prazer. Então o uso da pornografia nunca foi uma questão. Já o Fábio relata estar em um momento de transição pessoal. “A gente sente que é uma mudança gradual. No meu caso, eu tenho 34 anos dos quais 23 consumindo pornografia tradicional. É muito tempo da minha vida consumindo pornô visual. Isso é uma coisa que atrapalha muito o homem, que se acostuma a bater uma e gozar em dois minutos. É uma transição boaa, e a gente fica feliz de passar por ela”. Ele comenta ainda que o retorno vem sendo muito positivo. Dentre os muitos relatos recebidos, um deles foi especial. “A gente se emocionou com uma usuária que contou que passou por um processo depressivo, ficou por muito tempo sem tesão e, quando começou a ouvir a Tela Preta, foi recuperando gradualmente a libido que fazia anos que ela não tinha. Tem sido uma revolução, algo que a gente não esperava”, afirma.

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Conhecer e tocar em suas partes íntimas ainda é um tabu que está presente na vida da maioria das mulheres do mundo, por conta de ideais patriarcais da sociedade

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É desafiador buscar opções para o pornô, mas vale a pena Fran Bortolotto foi uma das pessoas que disseram não usar mais a pornografia na masturbação. “É desafiador sair do pornô, mas se você está em busca de prazer, mais energia e um sexo muito mais proveitoso para você e para as outras pessoas, vale a pena”, comenta Fran. Feminista, Fran começou a se questionar sobre o uso da pornografia há uns 10 anos, quando começou a estudar mais sobre o movimento, energia e tantra. “A pornografia estimula o machismo. Eu até já usei, mas eu nunca consegui me excitar completamente porque chegava um certo momento que eu percebia que aquilo não estava bom pra ela (a mulher no vídeo). Era muito esgaçamento, não tinha enredo, era só ‘meteção’”, pontua. Atualmente, Fran ministra aulas virtuais de yoga no seu perfil no Instagram e faz atendimentos em ginecologia natural. Ela compartilhou um ritual que pode ser útil para quem vem tentando fugir do pornô sem sucesso. Porém, lembre-se que cada corpo é diferente do outro. Tudo bem se não funcionar para você, mas vale tentar: — Tire um tempo para cuidar de si — Tome um banho demorado, descubra cada cantinho do seu corpo e use o chuveirinho (se tiver) — Prepare um drink que você goste, acenda uma vela, coloque uma música gostosa e vá para a cama — Com o auxílio de um vibrador, ou com as mãos mesmo, toque outras partes do corpo que não as genitais, aproveite o toque e relaxe — Em um dado momento você escorrega para o clitóris e pronto, seja feliz.


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MANDA NUDES: A TECNOLOGIA ESTÁ MUDANDO A PORNOGRAFIA Ainda fazemos sexo à moda antiga, pele com pele e tudo mais, e os bebês ainda são concebidos como antigamente. Porém, nem o erotismo nem a pornografia são os mesmos na atualidade Texto por ELISABETE ALEXANDRE


Kevin Aguiar

stamos em 2032. A troca de fluidos corporais (leia-se: sexo) é proibida por lei. Um simples beijo também é crime grave. Quer filhos? A fecundação humana é permitida somente em laboratório. Então, isso quer dizer que ninguém mais transa? Claro que transa! Só que agora as pessoas usam a tecnologia. Batizado de Vir-Sex, que conecta os envolvidos neurologicamente e produz ondas alpha, promovendo a transferência de energias sexuais. não há contato físico. O futuro distópico descrito acima está no filme O Demolidor (se lembra das três conchinhas?), ficção científica lançada em 1993 com Sylvester Stallone, Wesley Snipes e Sandra Bullock no elenco. Hoje as mulheres não só atuam em frente às câmeras na indústria pornográfica, mas também são diretoras dos filmes. O feminismo e a liberdade sexual fizeram com que as publicações eróticas do passado se tornassem obsoletas (para não dizer machistas), e o “manda nudes” é a banalidade do flerte, além de uma boa oportunidade de difundir arte para muitos. Há ainda as produções independentes e caseiras de conteúdo digital que podem render uma boa grana. E, como se não bastasse, uma empresa canadense dedica-se à produção de conteúdo adulto usando realidade virtual e gamification. Bem-vindo ao novo pornô.

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Bel Andrade

Pós-Pornô

Manda nudes

Segundo relatório de 2019 do Pornhub – Letícia Gicovate é uma das criadoras da um dos maiores portais de pornografia da revista de arte erótica brasileira Nin e, há internet –, 36% dos seus visitantes são do dois anos, iniciou um projeto batizado sexo feminino. Mesmo assim, a produção de #anoninmous. Nele, pessoas comuns audiovisual pornográfica é, histórica e fazem e mandam nudes para que sejam majoritariamente, feita por homens e para publicados no perfil da revista no Instahomens. O que ficou conhecido como gram. As fotos são caseiras, na maioria pornô-feminista andou perdendo força, das vezes feitas com o celular e sempre mas isso não é algo negativo. Pelo con- de forma que o rosto da pessoa não possa trário, a novas formas de fazer pornografia ser identificado (daí o nome do projeto). Porém, surgiram obstáculos. Devido à saem do nicho e chegam ao mainstream. A tendência divide opiniões, principal- política da rede social, a conta foi excluída mente entre mulheres. Enquanto há quem permanentemente. Sem esperanças de defenda o fim, de fato, da pornografia, sob recuperar o perfil com cerca de 90 mil seo argumento de ser algo prejudicial para guidores, Letícia pensou em uma nova soa saúde mental e que exacerba precon- lução: em vez dos nudes, agora ela convida ceitos, outros acham que proibir não é a os seguidores a enviarem alguns contos solução mais correta e sensata a se tomar. eróticos, fantasias sexuais e sextings de Já que a pornografia nunca deixará de maneira totalmente segura no anonimato. existir, a melhor saída é reinventá-la. Quem Deu certo. Ela tem recebido inúmeros pensa assim é a diretora e produtora da #anoninmoustales – novo nome do proindústria pornô Lívia Cheibub, que se diz jeto. Contudo, os nudes não foram deixa“experimentando a pós-pornografia”. O dos de lado. O número de fotos enviadas termo é relativo a um movimento na indús- aumentou exponencialmente durante a tria audiovisual de produção de conteúdo pandemia e o isolamento social, e Letícia adulto. inovando algo que era sempre mais planeja lançar um livro, no formato coffee do mesmo há muitos e muitos anos. table, com uma seleção das imagens.

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Alessandra Arquelino

Monetização e profissionalização

O app é o “queridinha” do momento para os que querem monetizar o conteúdo adulto feito de forma caseira

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O OnlyFans é uma rede social criada para que o produtor ou influenciador digital receba pagamentos em dinheiro pelo conteúdo que expõe. Criada em 2016, a empresa, com sede em Londres, permite todo e qualquer tipo de publicação, desde aulas de ginástica, cursos de maquiagem, até consultoria de moda. Mas o que predomina e é o mais rentável, são os perfis com o conteúdo adulto. Para ter acesso às publicações, o usuário deve cadastrar uma forma de pagamento, mesmo que ele acesse o conteúdo gratuito da plataforma, que é bastante limitado. Depois, a compra pode variar de individual – uma foto ou vídeo, por exemplo – até assinaturas de acesso ilimitado por período, que podem chegar a US$ 120. Há também a possibilidade de fazer pedidos exclusivos aos criadores, como solicitar que uma modelo se vista com determinada roupa e faça uma foto só para você. No caso, o valor é negociado diretamente. A OnlyFans repassa 80% do lucro aos criadores de conteúdo. De Perth, Austrália, Jem Wolfie possui a conta com o maior número de assinantes da rede. Com planos que começam em US$ 5 (30 dias de acesso na promoção) e alcançam o valor máximo, a influencer fitness que posta fotos provocantes em outra rede social promete conteúdo exclusivo e até a possibilidade de um bate-papo virtual. “Com o Instagram cada vez mais limitado nas postagens, assine aqui para entretenimento infinito e sem restrições”, é o que o perfil de Jem no OnlyFans. Todavia, as redes sociais também tem seus entraves. Ela não possui aplicativo disponível para download na App Store, com o acesso somente pelo navegador da internet. Financeiramente falando, ainda não é viável,


Só sabemos de uma coisa: dentro ou fora da tela, somos os mesmos com nossos impulsos, desejos e questionamentos.

Pornografia do futuro

Holodexxx é uma empresa com sede em Toronto (Canadá), criadora de conteúdo adulto que utiliza realidade aumentada com interatividade dos usuários. Imagine a tecnologia do Pokémon GO levada para dentro da indústria pornográfica. Essa coisa funciona da seguinte forma: uma atriz pornô é digitalizada e cria-se um avatar em certas posições: andando, dançando e até mesmo reagindo a estímulos. A tecnologia de realidade aumentada está sendo cada vez mais utilizada em games, proporcionando a sensação de pertencimento ao usuário. Essa premissa foi levada para a criação de um conteúdo adulto dentro da plataforma de jogos pela Holodexxx, que já lançou seis episódios

para download (sistema operacional Windows), cada um com uma atriz diferente como protagonista, a preços a partir de US$ 5. Neles, os usuários interagem com as personagens, podendo deixá-las nuas, trocar suas roupas e controlar suas ações. E é aí que a ética interfere na tecnologia. Apesar da atriz não ter sido exposta aos mesmos riscos de um filme comum, está ali a dominação do homem sobre a mulher, apontada por feministas, criando um ambiente tóxico que pode influenciar a vida cotidiana. Também há quem diga que é muitíssimo melhor que essas certas atitudes ocorram no virtual que no real.

Kevin Aguiar

uma vez que a Apple arrecada 30% do valor total de todas as vendas realizadas através dos aplicativos de sua loja. Além disso, o conteúdo adulto predominante da plataforma é um problema para a empresa da maçã, que o restringe por ser um material em sua totalidade explicito sexual. Um perfil como o de Jem, por exemplo, que traz essa sensação de proximidade com o usuário, transforma fotos, vídeos e conversas em cerca de incríveis US$ 100 mil/mês, com 10 mil assinantes assíduos, de acordo com dados vindos da empresa.

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SACA SÓ

a categoria é: POSE Ambientada no final da década de 1980, a série resgata o cenário dos antigos bailes da comunidade LGBTQ+ de Nova York, símbolos de arte, luta e principalmente, resistência

disponível no catálogo da Netflix, “Pose” é mais uma produção de Ryan Murphy em parceria com Brad Falchuk. E é importante lembrar que a colaboração entre eles já nos rendeu grandes sucessos mundiais como “Glee”, “American Horror Story”, “Scream Queens” e “The Politician”. Agora, “Pose” se junta à essa categoria de sucessos. Mais uma vez, Murphy utiliza a cultura pop como ferramenta para contar história. A escolha para esse contexto, no entanto, volta-se para um público bem específico, embora o drama que os permeia seja universal. A história retratada é a estimada – e antiga – trama de superação com personagens extremamente cativantes que fisgam o público assim que aparecem. Estão presentes temas como rejeição, invisibilidade social, prostituição e a

descoberta do HIV. Aqui, Murphy deixa o humor debochado parcialmente de lado para aprofundar-se em pontos de tensão que não são limitados ao nicho da série, mas que também atingiam e atingem até hoje diversas parcelas da sociedade, seja por conflitos ideológicos, políticos ou afetivos, que é a proposta dessa produção. Apesar de imergir no ambiente de festividades, a produção capta temas delicados. Há várias subtramas e, em cada uma, uma voz que necessita ser ouvida.


verossimilhança nas interpretações, afinal, a trajetória das personagens se assemelha com a realidade de muitas artistas trans fora dos holofotes. As escalações com MJ Rodriguez, Indya Moore, Dominique Jackson, Hailie Sahar e Angelica Ross salientam o cuidado e acerto na escolha do casting, pois todas brilham em cena e entregam personagens tridimensionais com textos ricos e muito interessantes. Há espaço também para a presença de homens negros e homossexuais: Ryan Jamaal Swain, Dyllón Burnside e Billy Porter interpretam personagens renegados pela sociedade da época e buscam nos bailes um refúgio distante da discriminação. Eles são peças fundamentais para o envolvimento emocional da narrativa. Swain e Porter protagonizam, em momentos distintos, cenas capazes de evocar sentimentos de revolta e impotência no espectador. Uma delas, no episódio “O amor é o remédio”, rendeu a Billy Porter o Emmy de Melhor Ator em Série deste ano.

Elektra Abundance

Umas das subtramas que mais chama atenção é a da epidemia de HIV. De forma sensata, sem romantizar ou explorar a dor, “Pose” discute a presença do vírus em um momento que contraí-lo era sentença de solidão e morte. Murphy parte de um princípio diferente do que escolhera em “The Normal Heart”, longa que evidenciava o quão destruidor foi o vírus na década de 1980. Em “Pose”, sua mensagem volta-se para a convivência rotineira com o vírus de forma otimista, como as suas produções costumam ser. Ainda sim, traz um dos episódios mais bonitos e emocionantes dos últimos tempos: “O amor é a mensagem”. “Pose” irá se destacar não apenas por abordar a comunidade LGBTQ+, mas trazê-la para dentro da produção: a produção escalou o maior elenco regular gay e transexual da história da TV norte-americana. Por conta disso, há bastante

São abordadas questões tangentes à comunidade LGBTQ+ da época, “Pose”conduz o público à imersão nesse universo assim como a desenvolver empatia por todas as pessoas

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SACA SÓ

“Pose” oferece voz às minorias, apresentando nas telas suas vivências, dramas, dificuldades, dilemas e, principalmente, com eles mesmos como intérpretes.

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Angel Evangelista

Como toda produção de Ryan Murphy, a série carrega várias referências. Dessa vez, o showrunner destaca os anos 80 e a cultura LGBTQ+. A própria estrutura dos bailes aponta didaticamente como a história da comunidade foi fomentada durante os anos 80: os hits do momento, desfiles por categoria, notas de jurados. Entre as produções homenageadas pela série está o documentário “Paris is Burning”, que segue como icônico registro da cultura gay e voguing de Nova York, e cuja influência ainda reverbera. Hoje, por exemplo, é possível reconhecer muitos de tais elementos no famoso reality show RuPaul’s Drag Race, principalmente nos bordões utilizados por Mama RuPaul. Com figurinos muito bem trabalhados e fotografia que resgata o ambiente dos

anos 80, o resultado é uma obra de arte magnífica e autoral. Esse é o projeto mais audacioso de Ryan Murphy, e olha que estamos falando de um artista que passeia por vários gêneros e sempre entrega produções fenomenais. Em “Pose”, Murphy cria um universo particular: planos mais longos, cortes bruscos e enquadramentos particulares enriquecem a narrativa. A obra nunca esquece que a comunidade para qual se volta é carregada de afeto, animação e superação, algo que marca todos os episódios da narrativa. Sem dúvida, “Pose” é um close mais que certíssimo, vale a pena contemplar.


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livros

título Quando sentir, escreva título O Sol também é uma Estrela escritora Gabriela Araujo escritora Nicola Yoon editora Record editora Arqueiro gênero Mulheres em literatura e ficção gênero Romance lançamento 1ª edição 2020 lançamento 1ª edição 2019 resenha resenha O livro reúne poemas, prosas e citações Poderia ser um clichê simples da garota poéticas baseadas em feridas da autora nerd se apaixonar pelo popular (ou vice-eque se abriram e cicatrizaram. É sobre tra- -versa). Mas tem situações de amadurecivar batalhas internas contra sentimentos mento e de questionamentos. A escrita é autodepreciativos, contra a depressão, muito envolvente. Vemos uma garota da ansiedade e medo e também passa uma ciência e um garoto poeta que se enconmensagem de esperança, mostrando que tram entre coincidência e destino. História é possível superar essa realidade sombria. facinante e personagens encantadores.

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título Entre Estantes escritora Olívia Pilar editora autopublicação gênero Record lançamento 1ª edição 2017 resenha Esse livro conta a história da Isabel: uma adolescente que acabou de sair do Ensino Médio e ingressar na Universidade. Um dia, se refugia na biblioteca e vê, entre as estantes, a Helena, uma garota que chama sua atenção e faz com que ela questione, desconstrua conceitos e começe a descobrir e compreender sua bissexualidade.

título As mulheres primeiro escritor Ian Kerner editora Sextante gênero Saúde da Mulher lançamento 1ª edição 2020 resenha Divertido, informativo e rico em ilustrações, este livro derruba mitos e tabus sobre a sexualidade. É uma verdadeira enciclopédia do prazer, com dezenas de técnicas testadas e aprovadas para garantir a satisfação do casal e ajudar você e sua parceira a terem uma vida sexual mais gratificante e feliz para ambos ou ambas! título Com amor, Simon escritora Becky Albertalli editora Intrínseca gênero Romance lançamento 1ª edição: 2018 resenha Simon tem dezesseis anos e é gay, mas não conversa sobre isso com ninguém. Ele não vê problemas em sua orientação sexual, mas rejeita ter que ficar dando explicação para as pessoas . Trocando e-mails com um garoto misterioso, Simon vai enfrentar, além de suas dúvidas e inseguranças, uma chantagem inesperada.

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filmes e séries

título Me chame pelo seu nome diretor Luca Guadagnino distribuição Sony Pictures Classics gênero Românce/Drama lançamento 18 de janeiro de 2018 sinopse O jovem Elio está enfrentando outro verão preguiçoso na casa de seus pais na bela e lânguida paisagem italiana. Mas tudo muda com a chegada de Oliver, um jovem acadêmico que passa meses em sua casa para ajudar a pesquisa de seu pai.

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título Sex Education diretor Laurie Nuun distribuição Netflix gênero Comédia Erótica lançamento 11 de janeiro de 2019 sinopse O inseguro Otis tem resposta para todas as questões sobre sexo, graças à sua mãe que é terapeuta sexual, apesar de ainda não ter perdido sua virgindade. Por isso, juntamente com Maeve, uma colega de turma rebelde, ele resolve montar a sua própria clínica de saúde sexual na escola para ajudar os outros estudantes.


título Cidade de Deus diretor Fernando Meirelles e Kátia Lund distribuição Lumière Brasil gênero Drama/Ação lançamento 30 de agosto de 2002 sinopse Buscapé é um jovem pobre, negro e sensível, que cresce em um universo de muita violência. Ele é salvo de seu destino por causa de seu talento como fotógrafo, o qual permite que siga carreira na profissão. É por meio de seu olhar atrás da câmera que ele analisa o dia a dia da favela em que vive, onde a violência aparenta ser infinita.

título Hoje eu quero voltar sozinho diretor Daniel Ribeiro distribuição Vitrine Filmes gênero Drama/Romance lançamento 10 de abril de 2014 sinopse Leonardo, um adolescente cego, tenta lidar com a mãe superprotetora ao mesmo tempo em que busca sua independência. Quando Gabriel chega em seu colégio, novos sentimentos começam a surgir em Leonardo, fazendo com que ele descubra mais sobre si mesmo e sua sexualidade.

título As vantagens de ser invisível diretor Stephen Chbosky distribuição Summit Entertainment gênero Drama/Comédia/Romance lançamento 19 de outubro de 2012 sinopse Charlie é um jovem tímido que se esconde em seu próprio mundo até conhecer dois irmãos que o ajudam a viver novas experiências. Embora esteja feliz nessa nova fase, ele não esquece as tristezas do passado, que têm origem em uma chocante e intrigante revelação.

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preferem internet à sexo – hm, e daí? O que aconteceu com a cultura dos garotos obcecados por sexo das gerações anteriores e como novos interesses podem equilibrar essa balança, que é mais um turbilhão? Por THIAGO RYO Tirinha por RICARDO TOKUMOTO VIA RYOTIRAS/FACEBOOK


Facebook @thiagoryo.oficial

“esses virgens indo antras de pegar Poké-

Era a máfia do machão copulante. Se você não fizesse igual, era então chamado de ‘viadinho’ do grupo

mon… eu prefiro pegar é uma bu$&T@” diz Jovem transante. Quando eu era pirralho, meus amigos faziam um alvoroço quando passava uma mulher por perto. “Caralho que rabão!”. Mais de uma década depois, me enconSeus pescoços viravam como a menina tro no meio de um grupo de amigos do do Exorcista, eles trocavam soquinhos e WhatsApp. Percebo que pouca coisa então comemoravam a grande conquista mudou. São homens que enviam fotos e de ter olhado para uma bunda que nunca vídeos pornô por mensagem para deixar iriam tocar. Legal. E eu ficava sem enten- outros homens excitados, provando assim der. Não porque eu não curtisse, mas só a sua masculinidade. Oi? É isso mesmo? não fazia sentido. A internet tinha coisa Também lembro da polêmica gerada em muito melhor e mais explícita, por exemplo. cima de um projeto onde diversos ilustraEu já percebia que aquilo era um compor- dores foram chamados de “virgens” pela tamento automático, implantado como fundadora-de-uma-revista-de-ilustraçãoreflexo dos outros jovens mais velhos que, -cujo-nome-não-vou- dizer. O motivo? Eles por sua vez, copiavam seus próprios pais. estavam “perdendo tempo” fazendo uma Era a máfia do machão copulante. Se você colaboração para desenhar personagens não fizesse igual, então era um “viadinho”. de anime. Eu fico inconformado, porque E eu, como um clássico pisciano apai- nada disso faz sentido. Já temos mais de 7 xonado por alguma garota, não entendia bilhões de pessoas no planeta e, se nada qual era dessa tal necessidade por provar deu muito certo até agora, não faz sentido a sua sexualidade. Para mim, aquilo não continuar (literalmente) reproduzindo os era gostar de mulher. Não era como se eles nossos erros. Por que essa obcessão? E claro que sexo é bom. Sexo é ótimo! estivessem aprimorando seus rituais de acasalamento ou algo parecido. Afinal de Mas na prática, é só mais alguma atividade contas, alguma mulher aqui gosta de ser (bem) prazerosa do seu dia a dia. Ela não tratada como um pedaço de bife? te impede de fazer outras coisas inúteis, ainda mais durando em média 5 minutos. É irônico viver em uma sociedade sexista onde mais de 30% das mulheres precisam fingir o orgasmo. Ou pior, perceber que grande parte da insatisfação sexual das mulheres se dá ao fato de seus parceiros nunca terem conhecido o tal Clítoris. Jovens preferem internet sobre sexo? Ótimo. Pelo menos teremos uma geração um pouco mais sincera. E quem sabe assim eles não pesquisem mais sobre como satisfazer suas parceiras? E se você ainda está incomodado(a) com a preferência alheia, recomendo que vá encontrar um grande jardim para capinar.

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ginecologista? saúde vs. tabu Quando devo começar a ir ao ginecologista? Como posso superar as dificuldades que vou encontrar ao defender minha saúde sexual? Por ELÂNIA FRANCISCA


Marcelo Justo/UOL

desde 2010 me dedico às atividades educativas sobre o desenvolvimento sexual saudável de crianças e adolescentes, especialmente àquelas que residem nas periferias da cidade de São Paulo. Fazemos rodas de conversa, vivências de autocuidado e diálogos com familiares e educadores que atuam e/ou convivem com pessoas de zero a dezoito anos. Entre as dúvidas das jovens, tem a que aparece com maior frequência: quando se deve iniciar a ida à consulta ginecológica? Antes de responder, deixei o grupo pensar na resposta para ter uma ideia do imaginário das pessoas sobre corpo e autocuidado. Selecionei respostas campeãs: 1. Não, você deve ir à consulta ginecológica só depois que começa a fazer sexo. 2. Ginecologista é só para pessoas grávidas, para acompanhamento da gestação. 3. Ginecologista? Deus me livre ficar deitada parecendo um frango, pelada! Com cuidado informo que o ideal é começar a ida ao ginecologista após a primeira menstruação, ou agendar a consulta ainda antes de menstruar, para tirar dúvidas, criar uma relação de confiança e aproximação com a pessoa que vai te atender. Quanto antes, menos inibição.

Ginecologista? Deus me livre ficar deitada que nem um frango, e ainda ficar pelada! Infelizmente, uma dificuldade constante no trabalho com adolescentes é a sensibilização dos adultos responsáveis. Comumente me deparo com adolescentes relatando que, infelizmente, ao pedir para agendar consulta ginecológica, a família se recusou, pois entende que quem não faz sexo, não precisa ir ao ginecologista. No momento em que convido as famílias para conversar sobre a importância da consulta ginecológica na adolescência, descubro que boa parte das mães iniciou seu percurso de cuidado ginecológico somente quando engravidaram ou sua última consulta foi no pós-parto da filha, que hoje já é adolescente. Ou seja, a ida tardia ao ginecologista faz parte de um ciclo longo e ancestral que envolve várias gerações, e não apenas adolescentes. Desse modo devemos contribuir para o rompimento desse movimento que torna pessoas menstruantes alienadas ao fluxo de sua própria corporeidade tão essencial. Existem muitas barreiras que dificultam o acesso de adolescentes ao ginecologista, como a falta de profissionais dessa área nas UBS, o tabu de se falar sobre sexualidade e menstruação, o incentivo ao medo de estar numa sala com alguém que vai abrir suas pernas e colocar coisas na sua genitália. É preciso desconstruir. Acredito que precisamos dialogar mais sobre ginecologia, ciclos menstruais e a importância dessa especialidade no cultivo do autocuidado, confiança e autoamor. Construir uma cultura de autocuidado entre corpos menstruantes é contribuir para a promoção da saúde sexual de adolescentes e autoconhecimento.

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sexo e a geração Z: a nova pornografia Que pornografia a gente tá consumindo? Como ela é diferente dos conteúdos que as outras gerações preferem e que impactos isso pode ter na sociedade? Por MARINA ROALE


Instagram @marinaroale

Títulos com termos que não humilham e ofendem são os que mais fazem sucesso

muitos acreditam que a forma como a geração Z vê o sexo é muito diferente das outras gerações. Essa observação é parte verdade, parte mentira. Vamos analisar! As relações das gerações mais novas são completamente mais liberais e desJá estamos cansados de saber que o construídas do que dos Boomers, por TikTok é a cara da geração Z. Não fique exemplo. Mas quando se trata apenas surpreso se o Pornhub, uma das maiores do consumo de pornografia, os jovens Z’s marcas dentro desse setor, disponibiliaparecem com muito mais intensidade. zasse conteúdos mais com a cara tiktoker. De todas as vendas no xHamster PreOs termos “poligamia”, “bissexuais” e mium, 48% são feitas por pessoas com “trans” foram os que mais cresceram, remenos de 35 anos. Apenas 18% das vendas forçando a fluidez e abertura da geração. A diferença é até mesmo semântica: títusão para pessoas com 45 anos ou mais. Apesar de serem as gerações com los com termos que não humilham nem menos grana, os jovens geração Z e os ofendem são os que mais fazem sucesso. Millennials estão comprando mais porA Vice Media é a primeira editora a nografia (conteúdo exclusivo) do que os entrar no OnlyFans com um conteúdo Boomers. O que realmente tem mudado gastronômico diferenciado. Dentro da dentro desse hábito não tem a ver com plataforma, mediante o pagamento de o conteúdo, mas sim com a plataforma. aproximadamente 5 dólares, a pessoa Realmente, os Z’s não se identificariam pode ter acesso exclusivo aos vídeos seletanto com os formatos mais tradicionais, cionados e matérias da Vice sobre o tema. por isso, há uma tendência de modernizar A OnlyFans tem, em média, 500 mil insa forma como a pornografia chega para critos todos os meses. Por mais que esta os jovens. Os conteúdos mais procurados plataforma não tenha o mesmo alcance entre jovens de 18 a 24 anos são live cams que o YouTube ou o Instagram, gera toda de plataformas como Twitch ao FaceTime, uma nova forma de se pensar a produção é interação o que eles estão procurando. de conteúdo para um público específico. Essa plataforma é uma alternativa com outro propósito, o de fornecer conteúdo que atenda a seguidores hiper fiéis de alguns de seus conteúdos mais particulares. A ideia desse projeto não é ter bilhões de acessos aleatórios, mas alguns milhares continuamente. Até então, estamos acostumados a ver plataformas fornecendo um conteúdo gratuito, porém, mais raso. Apesar de todo cenário político social em que vemos, o pornô está mudando do seu tradicional lugar de escape para representar conforto e validação, com ideias e ambientes mais saudáveis e menos exageradas ou violentas sobre o sexo.

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ARTE

MC F8 e a pandemia Divulgação

Música que foi lançada durante a quarentena alcançou mais de 60 mil acessos nas plataformas digitais em Suzano, em São Paulo e o sucesso do funkeiro não para


Renan Omura/Agência Mural

após encerrar o expediente de oito horas

de trabalho, o lavador de carros Fabrício Aparecido Gabriel, 23, retorna à casa no bairro Jardim Casa Branca, na periferia de Suzano, na Grande São Paulo, e parte para a próxima jornada. Durante a noite, usa o celular para escrever e gravar músicas. Fabrício começou a produzir as próprias canções em 2014, porém foi na pandemia de Covid-19 que o MC ganhou destaque no cenário musical em Suzano. Até o momento ele lançou três músicas e um videoclipe, que somando os acessos chegam a 70 mil visualizações no canal do Youtube. “Diferente dos anos anteriores, decidi que 2020 iria me empenhar mais no funk. Mesmo em uma crise, temos que ficar atentos as portas abertas”, afirma Fabrício, que passou a ser conhecido como MC F8. Apesar da pandemia do novo coronavírus ter causado prejuízo, Fabrício encontrou oportunidades em meio à crise. Após ter o serviço formal de lavador de carro paralisado até o mês de julho, aproveitou o

Fabrício na preparação de seu primeiro clipe da música “Favela Venceu”, que foi gravado no bairro Casa Branca, em que o cantor nasceu e mora até hoje

tempo vago para dedicar-se integralmente ao funk e escrever diversas letras novas. “Na maioria das vezes a música já sai pronta da minha cabeça com o refrão. Outras vezes, busco referências e vejo o que está em alta para compor”, explica. Foi em quarentena que ele compôs e gravou a canção “África Twin” com o DJ CK. A música tem mais de 12 mil visualizações no canal principal e 40 mil acessos em outras plataformas digitais. “Foi a primeira música que gravei em um estúdio profissional”, conta F8, que acabou se surpreendendo com o ótimo resultado que teve. Por conta da crise causada pela pandemia do novo Coronavirus, o preço de locação dos estúdios reduziu drasticamente. Aproveitando essa oportunidade, um amigo de Fabrício pagou além da gravação, a produção da música “África Twin”.

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ARTE

Temos que tomar os cuidados por causa desse vírus, mas não podemos deixar os nossos sonhos morrerem

Apesar de ter voltado ao serviço de lavador de carro, ele está compondo diariamente para montar um repertório. O principal objetivo do MC é começar a fazer shows logo após o quadro da pandemia normalizar. E para isso, pretende gravar mais músicas em estúdios profissionais. “Meu sonho é viver do funk. Tenho que correr atrás. Temos que tomar os cuidados por causa desse vírus, mas nós não podemos deixar os nossos sonhos morrerem”, afirma MC F8 que mantém sua esperança.

MC F8 foi considerado uma promessa da cena musical de Suzano, cidade onde mora, no estado de São Paulo

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“Quando entrei no estúdio profissional eu fiquei nervoso, mas depois me soltei e foi. No final a qualidade nem se compara com as gravações caseiras que eu fazia”, conta o cantor entusiasmado com isso. Um mês depois do lançamento do primeiro hit, F8 recebeu uma promoção de uma produtora para produzir um clipe. O vídeo da música “Favela Venceu” foi gravada no bairro Casa Branca, local onde o MC mora atualmente e o mesmo contou com a participação de alguns amigos. “Nas minhas músicas eu sempre tento passar uma mensagem de superação para os jovens da quebrada. ‘Favela venceu’ é isso. Temos que correr atrás dos nossos sonhos e nunca desistir”, ressalta o MC. A terceira canção lançada por F8 é a “Lacoste”. Postada no final de agosto, ela conta com mais de 3.500 visualizações. “Fico muito feliz quando vejo a população suzanense curtindo o meu som. Isso me motivou bastante”, ele também comenta.


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POÉTICA PERIFÉRICA E SUA IMPORTÂNCIA NAS QUEBRADAS Criado em 2001, o saráu cooperifa atua à 20 anos na periferia de São Paulo unindo seus participantes pela dor, pela cor e pelo amor Texto por ROSELI LOTURCO Fotografia por RENATA ARMELIM


o princípio, era o Sarau da Cooperifa (Cooperativa dos Poetas da Periferia), em São Paulo. Hoje, 20 anos depois, a poética periférica se espalhou pelo país. À frente das ações, estão muitos artistas que ganham voz e identidade em centenas de eventos, sarais, slams e outros produtos culturais. Nascidos nas quebradas, rimam contra o que vivem: exclusão social, homofobia, genocídio, racismo, feminicídio, entre outras mazelas. Com isso, atraem cada vez mais espectadores para dois eventos: o sarau, reunião em que poetas e escritores declamam ou leem suas obras, e o slam, que é a competição de poesia falada que traz do rap, musica popular brasileira, até o funk. O Sarau da Cooperifa, berço desse movimento, continua lotando toda terça-feira o Bar do Zé Batidão, no Jardim Guarujá, extremo sul da capital paulistana. “No primeiro sarau deste ano, havia mais de 300 pessoas, mas a média geralmente fica entre 120 e 150 inscritos”, conta o poeta Sergio Vaz, um de seus primeiros criadores. Uma das maiores conquistas alcançadas pelo movimento foi incitar seus protagonistas a viverem de sua arte. É o caso de Kimani, nome artístico de Cinthya da Silva Santos, de 27 anos, moradora do Grajaú, no limite sul da capital paulista. Além de tirar seu sustento do que cria como poeta e rapper, trabalha produzindo artistas que também vieram de bairros distantes do centro. Com pelo menos três slams por semana e dois saraus por mês na agenda, ela venceu o Slam SP, Slam BR e participou do evento global de Slam, realizado online, em maio.

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Participante do evento segurando dois cadernos com a nota 100 para os slammers que se apresentaram

“O slam foi o principal palco para as SLAM DAS MINAS minhas descobertas e meu fortalecimento. “No slam, quem vence é a poesia!”, é uma Eu me vejo nos outros e isso cura a gente. das frases repetidas pelas participantes A gente sempre fala de coisas que mexem nas disputas exclusivas de mulheres (cis e com os outros e ouve coisas que mexem trans) da periferia, negras na maioria. Nascom a gente”, traz Kimani emocionada. cidas em 2016, com o precursor Slam das Assíduo na Cooperifa, o poeta Márcio Minas SP – criado pelas poetas, Carolina Ricardo, de 29 anos, aprendeu a rimar aos Peixoto, Mel Duarte, Luz Ribeiro e Pam seis anos. Morador do Grajaú, é rapper, Araújo –, as arenas femininas se firmaram tem quatro CDs gravados e já fez mais de pelo país como uma resposta aos commil palestras em escolas públicas e priva- portamentos machistas nas competições. das. “Vivo da arte, da poesia e da música. O movimento se organizou em 19 Estados Não é fácil, mas a gente tem de acreditar e conta com nomes como a cantora de no nosso sonho”, afirma o autor do livro hip hop Nega Fya, em Salvador, e Shaira Felicidade Brasileira, publicado em 2013. Mana Josy, do Slam das Minas de Belém Mas o palco não é só para quem escreve do Pará, que é poeta desde seus 15 anos e poesia. Dona Edite, de 77 anos, começou a que também escreveu seu livro Po Eu Sia. frequentar a Cooperifa, em 2006, e sentiu como se estive recuperando a visão. Vítima de um glaucoma, é sempre recebida no palco do sarau com aplausos e gritos da plateia: “Uhuu, dona Edite!”. Os fãs silenciam logo para ouvir sua voz forte e bem entoada declamando. Além do sarau, ela participa de outros eventos culturais e dá palestras em universidades, casas de cultura, unidades do Sesc, teatros e escolas públicas. “Teve muita coisa que mudou a partir da Cooperifa. Eu nunca pensei que ia chegar aonde cheguei.”

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(acima) Algumas participantes do Slam das Minas em um Sarau Cooperifa. As garotas conquistaram esse espaço e trazem para ele diversas pautas ligadas à luta da população feminina Nos eventos todo mundo se trata família, criando uma relação de muita proximidade e de parceria. Lá, todos se reconhecem como iguais, lutando nas mesmas causas

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Ao discutir sobre a importância do sarau da Cooperifa é necessário ver que lá muita gente da periferia descobriu que tem voz e ela é ouvida. Sergio Vaz diz que “Todo mundo ensina e aprende. Tiramos a poesia do pedestal e abraçamos os pés da comunidade. Descobrimos que somos artistas e cidadãos. A gente resgata as tradições antigas. Foi a palavra que nos levou à literatura, não o livro. Toda terça, trabalhadores e trabalhadoras se reúnem para falar de poesia. É uma revolução. A autoestima está no sentido de ‘eu tenho o que falar porque tem gente para ouvir’. Por muito tempo a periferia ficou ouvindo a voz da classe média. Agora não. A partir do hip hop a gente começa a falar o nosso dialeto, o jeito de fazer teatro, dança e poesia. Isso é autoestima. A gente se reconhece como povo. Quando eu era mais jovem, não tinha referência literária do bairro. O hip hop inaugura isso. Ídolos que moram no Capão Redondo, Itaquera, Jardim Guarujá, não são ídolos, eles são seus parceiros.” Ele também traz que a Cooperifa surgiu primeiro. Depois veio o Sarau em um galpão de uma antiga fábrica, em Taboão da Serra. Realizavam eventos parecidos com a Mostra Cultural que fazem hoje. Fundou o Sarau em outubro de 2001, com o Pezão, para falar e ouvir poesia. Ficaram um ano e meio em Taboão e, em 2002, foram para o Bar do Zé Batidão, no Jardim Guarujá. Para surpresa deles, os poetas começaram a chegar de todos os lugares. Todo mundo tinha poesia, mas não tinha espaço.


Teve muita coisa que mudou a partir da Cooperifa. Eu nunca pensei que ia chegar aonde cheguei Sobre as mudanças desde sua criação até os dias atuais é percebido que muitos jovens que passaram por lá hoje são formados, com mestrado ou doutorado, além daqueles que escreveram livro ali. Foi por intermédio da poesia que falaram, ouviram e aprenderam a lição maior: estudar. Hoje, quando os fundadores da Cooperifa vão às escolas da quebrada, os alunos os conhecem. Os professores levam os alunos ao Sarau da Cooperifa, não em parques de diversão. Eles se mobilizam por um evento feito pela própria periferia. Além do sarau existem outras frentes de atuação por parte de Sergio. Ele tem o projeto contra a violência. Há oito anos e visita uma escola por semana. Provoca os alunos a lerem, escreverem e escutarem poesia. Ele diz que se sente um missionário ou psicopata da poesia. Eles escrevem para a periferia, e se eles não forem ler, não faz o menor sentido. Desde 2007, tem também a Mostra Cultural, que está na décima terceira edição e dura oito dias. É feita em parceria com as escolas e com grupos de teatro, dança, musica palestrantes, professores e também poetas.

Algumas novidades também aparecem por aí, como a Inauguração de um clube de leitura mensal, aos sábados, das 10h às 16h, que termina com show e feijoada literária. Os participantes passam o dia falando de livros e autores porque estão faltando ideias. Tudo na Laje do Batidão. E tem o Cine na Laje, que é gratuito, com conversas sobre os filmes na sequência.

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DROGAS

enfermeiro do rolê

Jan Philipzen

Uno Vulpo, autor do perfil @sentomesmo no Instagram, fala a real sobre drogas, suas misturas e a importância da redução de danos para o rolê e para a vida dos jovens


James Marcus Haney

por mais antiga que seja aquela famosa – e, na minha opinião, icônica – propaganda da Eliana nos anos 90 falando “Não use drogas”, até parece que estamos parados no tempo, já que continuamos a repetir o tal mantra como se ele, magicamente, fosse em algum momento funcionar. O nosso governo de hoje, em comparação com outros países, está retrocedendo cada vez mais na política de drogas (que foi reformada e assinada pelo presidente Bolsonaro em 2019), diminuindo os investimentos em redução de danos e lidando com os entorpecentes como se o seu único problema fosse a dependência química e a solução fossem as organizações religiosas que implementam terapias de reabilitação extremamente duvidosas. Ao meu ver, a redução de danos dá para quem faz uso de drogas o poder de entender o que pode ou não acontecer com seu corpo e sua mente, mudando o vínculo com o uso delas e conscientizando sobre os riscos. Ela discute drogas dentro

A mistura de substâncias psicoativas é muito comum entre nós, jovens, principalmente durante festas, como o carnaval, mas sem orientação, pode levar a prejuízos muito sérios

do contexto onde elas estão, diferente das estratégias de abstinência, por exemplo, que consideram que o único caminho para todos é, simplesmente, parar com o uso. Em exemplos práticos, reduzir danos é chegar em uma turma de alunos do Ensino Médio e explicar sobre os riscos de exagerar na bebedeira, orientar as pessoas sobre os riscos de dirigir alcoolizado ou contar para um amigo sobre os riscos de comprar pó (cocaína) de origem duvidosa. Por meio de tais estratégias, lidamos com as drogas sem hipocrisia, já que o tema é tratado a partir da realidade, vontade e possibilidades de cada um. E quanto aos resultados, no mínimo, evita-se uma bad trip chata e no máximo mais uma morte por desinformação. E para isso, aqui vão algumas dicas úteis e bem importantes que acumulei em alguns anos de guerra.

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James Marcus Haney

DROGAS

A tabela de misturas é uma ferramenta muito importante para que o jovem fique mais ciente do que está ingerindo, reduzindo os danos à saúde, mas sem deixar de aproveitar muito o rolê

Em festas

Chemsex Para dar uma quebrada no gelo ou animar um pouco mais a noite, está ficando cada vez mais comum usar alguns tóxicos debaixo dos edredons, no chamado Chemsex. A dica de ouro nesses casos é que, mesmo que você acredite e ame muito aquele boy, nunca use nada que você não tem certeza do que é. Se o crush te oferecer comprimidos ou um pozinho meio duvidoso, diz que você está tomando antibiótico e não pode usar nada ou já inventa um motivo para voltar para casa.

Debutantes Se for sua possível primeira viagem, sugiro que você vá com calma e comece num ambiente tranquilo e acompanhado. Procure alguém de sua confiança e que vai cuidar de você caso algo dê errado. Ao iniciar experimente aos poucos, observando como seu corpo reage. E, por favor, compre produtos com uma procedência que seja pelo menos minimamente confiável.

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Não use o que você não sabe o que é! E se você entrar em alguma bad trip ou começar a passar mal, chame um colega, vá para um local mais isolado e tome bastante água. E se estiver em grandes grupos, é importante que alguém esteja num estado sóbrio durante todo o evento para que, se algo der errado você possa ter ajuda.

Acabou no hospital? Por todo o amor que você tem a si mesmo: não esconda das médicas(os) que você está lá por conta de drogas. A mentira pode levar a uma confusão no tratamento que você precisa receber, e isso pode ser fatal.

E claro, a famosa tabelinha Garanto que é um ótimo salva-vidas para quando bater aquela dúvida no próximo, e tão esperado, carnaval. OBS: Na minha opinião, as pessoas têm de ser monogâmicas com as drogas, mas se você não estiver a fim, guarde ela no coracão.


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MODA

recicla o kit Visões inovadoras para brechós de quebrada como possíveis complementos de renda e conscientização sobre a sustentabilidade

Amanda Montalto

Fotos TIAGO BORGES, DO PERIFERIA EM MOVIMENTO


dona lurdes mantém um brechó há mais de 10 no Jardim Rosana, Capão Redondo, zona Sul de São Paulo. E há 5 anos, Vinicius Faustino, que tem 22, frequenta e consome as roupas que ela vende por lá. “A gente recicla roupa na periferia”, diz o fotógrafo Thiago Borges, que escolheu justamente estabelecimento comercial próximo ao ponto final do busão como tema de uma das fotos vencedoras do Concurso Cultural Pense Grande Sua Quebrada, com o desafio de fotografar iniciativas transformadoras nos bairros mais periféricos de São Paulo. “Comprar roupa em brechó de periferia também é uma expressão política”, ressalta Tiago. Para o educador popular em economia solidária Alex Barcellos, integrante da Agência Solano Trindade, por um lado os brechós são alternativa de renda para muitos trabalhadores e trabalhadoras da quebrada. E, por outro lado, dão acesso a quem não tem possibilidade de comprar em grandes magazines, por exemplo. Se surgem pela necessidades, em bazares de igreja ou associações de bairro, hoje os brechós nas quebradas também são uma oportunidade de discutir as relações de consumo, sociedade e ambiente.

A consciência que tenho hoje é por conta dos mais jovens começarem a falar no Instagram que brechó muito legal”

Apenas no Brasil, onde a indústria da moda tem mais de 20 mil fábricas e emprega mais de 1 milhão de pessoas. Foram produzidas mais de 5,9 bilhões de peças no ano passado segundo o Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEME). Em todo o mundo, o consumo de peças aumentou em 60% nos últimos 15 anos. Isso tem um impacto gigantesco. A indústria da moda é responsável por mais de 10% de emissão dos gases causadores do efeito estufa, mais do que aviação e transporte marítimo juntos. Libera 500 mil toneladas em microfibras por ano nos oceanos, e, de acordo com a ONU Meio Ambiente, todo ano mais de 180 mil toneladas de roupas vão pro lixo só no Brasil. “Eu e a minha mãe comprávamos no brechó por ser mais barato. A consciência que tenho hoje é por conta dos mais jovens começarem a falar dos brechós do Instagram, de que brechó é legal pra caramba”, conta a estudante Dani Vieira, que mora no Parque Alto, Extremo Sul de São Paulo. Dani faz parte do Coletivo Chita, criado por ela, Jessica Paixão, Day e José Ricardo, para discutir moda nas periferias, com oficinas sobre história, costura, customização, entre outros temas.

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MODA

Tem gente com vários preconceitos com brechó porque dizem que tem ‘roupa de morto’, mas isso é tudo falta de informação

“Que auxílio podemos dar pra pessoas que estão começando um brechó? A gente quer construir isso”, explica a produtora Jéssica, que reside no Grajaú, e desde criança customiza as próprias roupas. “Ainda tem gente com preconceito com brechó porque diz que é ‘roupa de morto’, mas isso é falta de informação. Brechós estão crescendo porque tem uma onda de consciência. Temos que parar de produzir material e consumir o que já existe. Mercado de troca daqui uns anos vai ser maior que essas marcas”, completa. Se os brechós atendem a um anseio mais imediato das pessoas, as grifes e marcas que surgem nas quebradas partem de um entendimento individual e do território. Nos anos 1990, o importante era colar com Nike, Adidas e outros logotipos internacionais. Mas a busca por uma própria identidade fez brotar iniciativas locais. Da Lab Fantasma criada pelo rapper Emicida da Zona Norte, à icônica 1 da Sul (com a qual o escritor Ferréz disseminou o nome do Capão em camisetas e bonés cidade afora), o que estampa tem a ver com construção histórica de uma quebrada. “A importância das grifes é se ver, ter uma marca que te represente”, observa

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Barbara Terra, articuladora da rede de empreendedorismo Nois por Nois, que atua a partir do Extremo Sul da cidade de São Paulo. “Quando eu era mais nova, tinha que comprar determinadas roupas pra me encaixar em determinados grupos e ser validada. A presença dessas marcas mostra muito a pluralidade do território”. Gabi Bazílio se inspira na cultura afrobrasileira para criar as peças da Mocamba Ateliê. Sem pretensão de viver da moda, quando criança ela fazia roupas de boneca, cortava camiseta da escola e agora revive as práticas das avós materna e paterna, com quem costurou desde sempre. Tudo começou em 2016, na festa de Halloween da empresa de telemarketing em que ela trabalhava. Gabi decidiu que criaria a própria fantasia. Numa visita à loja, conheceu uma vendedora que falou a ela do curso “Despertando o Empreendedor”, da escola Empreende Aí. Durante a formação, Gabi se deparou com os tecidos africanos vendidos por imigrantes no Centro de São Paulo e se apaixonou. Recentemente, ela começou a customizar em cima de peças de brechó ou de peças trazidas pelos clientes que já cursaram ou compraram em outros lugares.


Amanda Montalto

Gabi Bazílio (acima)faz as peças para a marca Mocamba Ateliê, todas com tecidos africanos e peças inspiradas na rica cultura afrobrasileira. Milena Lima (abaixo) é a criadora da marca Mile Lab que nasceu em 2017, e se inspira em si própria. Tudo foi possível graças ao Projeto Possibilidades e muito trabalho duro e esforço

Na mesma região, Milena Lima dá vida à Mile Lab, uma marca inspirada nela própria e no território em que mora. Depois de fazer um curso de corte e costura, ela começou a desenvolver alguns produtos até que foi chamada para um evento de moda promovido pelo Projeto Possibilidades. “Era muito novinha, não entendia muito de como desenvolver e não demorou muito pra eu quebrar, apesar da visibilidade, de estar sempre em festas”, diz ela, que atualmente tem 21 anos. Foram uns 2 anos com a marca parada. Neste período, Milena trampou da ponte

pra lá e teve um contato mais próximo com os processos da indústria da moda. “Lá fora, você vai atrás do conceito, estrutura métodos para entender, enquanto aqui é muito orgânico”, conta. Em julho deste ano, a Mile Lab renasceu. Milena apresenta a coleção Marginal. Com moletons, camisetas, camisas, ela destaca a paleta de cores que enxerga todos os dias no Grajaú: laranja dos tijolos de casas inacabadas, o verde da vegetação e da represa Billings, o marrom da terra. “Pra marca Mile se manter em questão de identidade, ela busca compreender questão sociocultural do espaço”, explica Milena. O público da Mile Lab hoje é formado por poetas, músicos e artistas. Milena consegue viver com o trabalho na moda, mas acumula todas as funções – da criação e confecção até a compra de materiais, venda e entrega dos produtos. Além de ter mais gente trampando com ela, para o futuro cursos e oficinas sobre o assunto e, a longo prazo, quem sabe criar uma escola . “A ideia é trazer formação profissional na área por meio de perspectiva periférica, ter esse potencial de profissionalizar na moda a partir da periferia”, conclui.

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MODA

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ALIMENTAÇÃO

movimento PANC Eva Brito

Cinco coisas que você precisa saber sobre plantas alimentícias não convencionais e como elas podem melhorar sua alimentação


se você se interessa por culinária, gastro-

nomia em geral, está sempre em busca de um novo ingrediente/receita/restaurante e, somado a tudo isso, também se preocupa com os impactos da sua alimentação na sociedade, provavelmente já ouviu falar das PANCs. A sigla para plantas alimentícias não convencionais foi criada por dois pesquisadores botânicos que lançaram um livro de mais de dez anos de trabalho. Mas, pensando um pouco sobre esse nome, será que plantas que encontramos em qualquer supermercado, feira livre e hortifruti deveria ser considerada convencional quando, na verdade, tê-la o ano inteiro significa abusar do uso de agrotóxicos em seu cultivo? Batemos um papo com Neide Rigo, nutricionista expert no assunto–ela comanda uma caminhada pela horta comunitária CityLapa para (re)conhecer PANCs, inclusive, que infelizmente está suspensa por conta da pandemia para entender algumas definições, descobrir curiosidades e destrinchar um pouquinho desse movimento PANC. Existem muitas PANCs. Muitas mesmo. “É impossível saber o número exato. Estima-se que sejam aproximadamente 30 mil, mas esse número pode variar para mais ou para menos. O que temos como referência é o que está no livro do Kinupp, são 12 mil espécies catalogadas lá”.

[…]para isso precisa de demanda. E, para ter demanda, as pessoas precisam conhecer isso

Consumir PANCs não é realmente inovador “Se você pensar que muitas plantas foram negligenciadas, abandonadas, pode-se dizer, sim, que existe uma tendência a voltar a prestar atenção nelas. Ninguém está inventando de comer, todas essas plantas hoje classificadas como PANCs têm registro de consumo. A não convencionalidade fala sobre mercado, não sobre a incidência delas no nosso território. Olhe o macarrão, por exemplo: nunca foi brasileiro, veio com os europeus, mas está nas mesas de norte a sul. Por exemplo, o macarrão é mais convencional do que a ora-pro-nobis, se você for pensar, e essa PANC tem até uma festa típica em Sabará, Minas Gerais. Acho que todo o movimento PANC tem como objetivo que elas, um dia, não sejam PANCs. Que os pratos fiquem mais biodiversos, que as pessoas ganhem mais autonomia na hora de comer, que mais coisas sejam convencionais. Todo país tem suas próprias PANCs “Existe um movimento no mundo todo, com diferentes nomes – plantas silvestres comestíveis, por exemplo. Estava vendo no outro dia uma salada com flores de flamboyant, que no Vietnā as pessoas fazem essa salada com flores de flamboyant

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Catarina Bessell

ALIMENTAÇÃO

e frango, e isso é não convencional para muita gente lá. Muita gente comia lá quando era criança, mas perdeu-se esse costume. Agora, parece que alguém colocou lá no Instagram e rolou um boom. Tem vários hábitos culturais que são de outros países e que vieram para cá por motivos diversos, às vezes nem para fins alimentícios, como a Manga-verde, por exemplo, não é convencional – quando eu cato manga verde na rua, muita gente vem me perguntar o motivo. Na Índia, na Tailândia, é super comum suco de manga verde, conserva de manga verde, mas que a gente recebeu aqui da Ásia e chegou para consumir madura, assim como a jaca. Jaca verde é consumida como aqui fazemos com palmito em muito país asiático.” PANCs são punks. “Incluir PANCs na alimentação pode ser considerado gesto político. Qualquer escolha que você consiga fazer com independência é um gesto político. A partir do momento em que você identifica algo comestível e coloca no seu prato, é um gesto político e é uma das formas mais presentes de resistência.” PANCs possibilitam a transformação da alimentação fora dos grandes centros “Na periferia, o grande desafio é encontrar

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espaços para esse tipo de cultivo. São necessárias políticas públicas para esse incentivo. De forma alguma podemos elitizar as PANCs. Estamos falando também de partes não convencionais, fazer uma feira e utilizar todas as partes do vegetal. Nas feiras nas periferias, você poderia ter a introdução delas, mas para isso precisa de demanda. E, para ter demanda, as pessoas precisam conhecer. É necessário que haja um esforço coletivo para que as pessoas dependam menos de produtos industrializados, que possam fazer escolhas saudáveis e que saibam que essas escolhas podem ser grátis. Na periferia, as escolas concentram espaços que poderiam ser hortas e já ajudar na merenda escolar. Mas você vê escolas com grandes terrenos tomados por grama, espaços fechados, normalmente nem são espaços utilizados pelos alunos. Tudo isso poderia ser horta com uma grande diversidade de espécies, para que logo se conheça e depois busque por todos esses alimentos.


DEIXE AQUI A SUA DOAÇÃO. Ajudar ao próximo também é uma forma de salvar vidas.


INTERNET

algoritmo é padrão Após ter sua conta banida repetidamente, Polly Oliveira começou #OExperimento no Instagram e concluiu queestar fora do padrão não é bem visto pela rede social Fotos INSTAGRAM @POLLYOLIVEIRAREAL


Publicação feita por Polly em seu instagram pessoal em que mostra a beleza de seu corpo real e livre

muito se especula sobre os algoritmos do Instagram – melhores horários para postar, quais conteúdos bombam mais em quantos minutos é preciso curtir uma foto para que ela seja entregue para os todos seus seguidores, como aumentar o alcance dos stories e como o engajamento funciona. Fato é, no entanto, que pouco se sabe sobre a tecnologia que controla a ordem dos posts e quais os critérios que definem para quem eles são mais ou menos entregues desde que a rede social deixou de mostrar um feed cronológico. Polly Oliveira já trabalha como criadora de conteúdo há seis anos e, de dois anos pra cá, reparou que seus posts eram repetidamente tirados do ar, com a desculpa de que eram sexualizados demais para as diretrizes da rede. No entanto, suas postagens sempre foram sobre autoestima, corpo livre e liberdade feminina, em conversas com mulheres sobre padrões, machismo e a sociedade patriarcal que tanto insiste em controlar nossos corpos.

criou #OExperimento para provar que corpos que não são padrão têm suas postagens boicotadas pelas plataformas

“Sempre que eu expunha meu corpo, postava vídeos dançando de biquíni ou lingerie, que é algo que sempre fez parte do meu conteúdo, recebia muitas notificações de que perderia minha conta, que eu estava ferindo as diretrizes”, conta Polly. No dia 31 de dezembro de 2020, o Instagram derrubou sua conta – sem chance de retorno – por conta de um vídeo seu dublando um vídeo de Mayra Cardi. O vídeo original da “líder em emagrecimento natural” curiosamente continua no ar. Depois de ter seu perfil devolvido por pressão das denúncias feitas por veículos, sua história. Polly criou #OExperimento na tentativa de provar que os corpos fora do padrão não têm suas postagens entregues e são boicotadas pela plataforma. Começou a estudar o comportamento e quais eram as publicidades feitas pelas maiores influenciadoras do ramo – todas brancas, magras e, em sua maioria, loiras –, que anunciavam toda sorte de produtos de chás emagrecedores a géis redutores de medida com supostos resultados milagrosos. Avisou suas seguidoras sobre qual seria seu conteúdo daqui pra frente, para que elas soubessem o que estava por vir e deu início a sua experiência inédita.

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INTERNET

Oliveira é uma influenciadora que incentiva amor ao próprio corpo e liberdade feminina. À esquerda a foto tratada para parecer mais magra e à direita a foto original

Nas semanas seguintes, Polly começou a postar sobre produtos milagrosos, usando os mesmos jargões que já conhecemos, escovou seu cabelo cacheado, falou que havia feito cirurgias plásticas e publicou fotos com bastante Photoshop.Como resultado sua conta foi tirada do Shadow Ban (uma prática do Instagram que consiste em deixar a conta ‘invisível’. Funciona assim: além de não conseguir encontrar o perfil pela busca clássica, o conteúdo não aparece para quase ninguém, a não ser que você digite exatamente o arroba da pessoa e entre no perfil) e suas postagens começaram a serem entregues para todos os seus 358 mil seguidores. Polly descobriu também, que o Instagram ainda associa um corpo fora do padrão a fast-foods, dada a mudança de anúncios que ela recebia antes de começar #OExperimento – onde se viam hambúrgueres e propagandas de aplicativo de delivery, agora Polly recebe ads de cirurgias plásticas e produtos fit. Além disso, percebeu

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que, ao postar um conteúdo que era sexualizado, suas fotos eram entregues à milhares de homens, financiando uma cultura de objetificação do corpo da mulher. A verdade é que talvez isso não seja novidade para quem trabalha com redes sociais, mas #OExperimento provou por a+b que o algoritmo privilegia um tipo de corpo, de cor de pele e de conteúdo específicos: os do grupo dominante. Isso é algo que deve ser combatido para quem acredita no fim desses padrões que matam e aprisionam e para quem vive de Instagram e pode ver seu “reinado” desmoronar. “O algoritmo muda constantemente e, cada vez mais, a cara que eles querem os representando é o jovem, branco, magro, dentro do padrão. É absurdo que essas mulheres que ainda lucram com isso hoje não percebam que nosso tempo está contado. Ou nós mudamos isso ou a gente só vai continuar empurrando merda ladeira abaixo”, concluiu a influêncer Polly.



PEGA A VISÃO

Aquário

Para essa galera, vai rolar um processinho de amadurecimento: dar mais importância para o que é sólido. Aliás, a palavra estabilidade vai marcar os aquarianos

Gêmeos

Se prepara, junho é o seu mês de dar aquela causada. Aproveita para criar! Escreva, leia muito, faça contatos, estude, e aproveite muito

Libra

Junho vai trazer uma energia enorme pra você. Sabe aquelas matérias que você achava muito difícil? Pois é, vai tirar de letra, fica tranquilo!

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Câncer

Marte, para a querida astrologia, representa a agressividade. Mas isso não significa coisa boa ou ruim, afinal, tudo depende do jeito que você vai usar a sua influência, atenção!

Peixes

Junho chegou trazendo muitas oportunidades. Portanto, nesse período, você pode começar um curso novo, que va ajudar na carreira que você quer seguir, por exemplo

Escorpião

Escorpiano, seu rolê de junho é em casa. Mais legal do que fazer um retiro, é conseguir curtir a sua própria casa. Organiza seu quarto e vai viver esse momento com o que você tem


Áries

Touro

Leão

Virgem

Sagitário

Capricórnio

O mês de junho podem rolar uns conflitos em casa Pra evitar BO, não esquece que pessoas pensam de maneiras diferentes, até as com o mesmo sangue, ok?

Pode rolar um conflito sobre o que fazer da vida, mas não é nada que não dê para contornar, ta? Aproveita pra trocar ideia com quem você confia sobre todos os assuntos

Chegou a hora de deixar a paquera no turbo! O flerte vai dar certo graças a Mercúrio. Você vai estar indo tão bem que até as DRs vão ser moles pra você!

Em junho você pode reavaliar o jeito com que fazia as coisas e, quem sabe, abrir os olhos para o novo. Por outro lado, pode rolar BO entre você e alguém bem próximo

Em junho se acontecer uma autoavaliação, é muito provável que você veja que isso é desnecessario. E pode ter brigas com amigos mas lembra que pessoas pensam diferente.

Em junho pode rolar BO com crush ou com a sua galera. Mas, antes que você fique toda culpada, em relação aos contatinhos, o estresse é normal em toda relação

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VOA

#MeNotaLynne MC Lynne lança projeto de livre inscrição para auxiliar cantores iniciantes a ingressarem no ramo da música

atenção cantores e cantoras iniciantes,

carreira, então decidi abrir essa oportuniessa é para vocês! A MC Lynne acaba de dade e poder compartilhar o que aprendi anunciar em seu perfil do Instagram o pro- nesses anos como cantora com pessoas jeto #MeNotaLynne. A principal intenção que também tenham esse sonho”. é ajudar e incentivar os artistas iniciantes Lynne ainda ressalta o que pensa soque querem ingressar no ramo da música. bre a importância desse projeto: “Decidi A seleção será feita da seguinte forma: compartilhar meu aprendizado e expeOs que desejam participar devem fazer um riência musical. Para mim nem tudo é vídeo cantando uma música cover ou auto- sobre concorrência, tem espaço para todo ral; Depois publicar no Instagram usando mundo! Ajudar o próximo não diminui suas a tag #MeNotaLynne; No fim, marca a MC chances de crescer”, conclui a cantora. Lynne na descrição do vídeo e na publicaLynne faz parte do “Hervolution”, projeto ção. E pronto já está participando! da KondZilla que dá visibilidade pras minas, Toda quinta-feira Lynne irá escolher um manas e monas na música em suas quecantor ou cantora, para aconselhar de bradas. Recentemente lançou a canção forma individual e exclusiva. Além disso, a “Assédio no Vagão”, junto com Pécora. O MC irá divulgar a pessoa escolhida no seu som se tornou um grito de protesto contra perfil do Instagram, para proporcionar uma o assédio, após uma situação que a MC maior visibilidade ao iniciante. Se liga só: passou a caminho do estúdio de gravação. Em um papo com o portal KondZilla em parceria com a Fervo, Lynne explicou o porque de iniciar esse projeto: “Muitas pessoas me pedem essa ajuda com divulgação e com dicas de como começar a

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_bora programar!^ Instituto PROA abre 150 vagas para terceira edição do curso de capacitação profissional em programação Java em SP

o instituto proa traz novidades para aquela

galera que gosta de tecnologia e sonha em aprender a programar (processo de escrita, teste e manutenção de um programa de computador). Quer saber sobre como se inscrever para não ficar de fora dessa oportunidade maravilhosa? Para concorrer a uma das 150 vagas é bem simples, o candidato deve ter entre 17 a 22 anos e estar cursando ou já ter concluído o 3º ano do Ensino Médio na rede pública de ensino. Quanto às inscrições, elas estarão abertas até o dia 14 de maio, então não vacile para não esquecer e corra agora mesmo para o site do Instituto Proa e se cadastre, essa é uma grande chance. O curso tem previsão para início em agosto de 2021, tem duração de seis meses e pode ser realizado no período da manhã, das 9h às 13h, ou tarde, das 14h às 18h, de forma 100% online. Mas fica atento, caso as coisas melhorem quanto ao coronavírus, as aulas podem se tornar presenciais caso seja permitida a abertura.

Mas o que eu vou aprender neste curso de programação? A aprendizagem está dividida em: núcleo técnico em desenvolvimento full stack (248 horas) em programação Java; núcleo comportamental, projeto de vida e comunicação (118 horas) e núcleo cultural e vivências (74 horas). Acha que acabou? Você pode ainda concorrer a uma vaga nas empresas parceiras do Instituto Proa, afinal ao término do curso os formados no projeto serão encaminhados para entrevistas e serão acompanhados pela organização por pelo menos três anos. A intenção do instituto PROA é capacitar a quebrada para que ela possa encarar o mercado de trabalho e os processos de recrutamento e seleção que são cada vez mais disputados de igual forma. Por isso, se você quer se inserir no mercado de trabalho não pode perder essa chance. Não tem perreco, vamos pra cima que foguete não tem ré e a favela é mídia. As inscrições estão abertas no site: https://www.proa.org.br/

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