ZINT ⋅ Edição #21: Ariana Grande

Page 1

zint edição #21: Ariana Grande

FEV. 2019



e di to ri al

thank u, next! A mais nova Edição da revista traz na Capa o maior e mais relevante nome da música pop da atualidade: Ariana Grande, que neste mês debutou um novo disco. Nas Highlights, trazemos também nossa crítica de Creed II e da terceira temporada de One Day at a Time! Ainda, na publicação, temos outras matérias como os 15 anos de Kanye West, o retorno de Avril Lavigne e a quarta temporada de Outlander! No Guia do Entretenimento, três novas palavras para o mês. No Calendário Cultural, o lembrete de que em março tem a estreia dos muito aguardados Capitã Marvel, Nós e Dumbo, uma nova temporada de Good Girls, a estreia da nova série brasileira da Netflix, Coisa Mais Linda, e o álbum de estreia do britânico Tom Walker. Faça um bom proveito da leitura! <3


O QUê A ZINT TEM?

como uma publicação digital, as possibilidades de interações são promissoras. usando a plataforma ao nosso alcance, a revista sempre vem acompanhada de interatividade. aproveitamos de todos esses recursos e você pode usufruir de tudo sem muito mistério. »


paleta de cores;

para ficar fácil diferenciar as áreas de cobertura, cada uma delas possuem suas próprias cores, que ficam visíveis nas barras laterais da revista

vídeo;

stories;

com uma revista de Cultura & Entretenimento, estamos sempre escrevendo sobre algo que possui um trailer ou um videoclipe, por exemplo. o ícone do Youtube é sempre visível para encontrar esse conteúdo audivisual. ao clicar na imagem, uma janela com o player será aberto e você poderá assistir ao vídeo!

se você está pelo app Issuu, é possível ler as principais matérias da Edição em versão “Stories”. na parte superior direita você pode ver um ícone de barras; basta clicar nele para ser levado para a área onde o conteúdo está em um formato de texto corrido

playlists;

links;

algumas das nossas matérias vem acompanhadas playlists. quando isso acontece, eles são encontradas ao final da respectiva matéria. ainda, nas páginas finais de cada publicação, você pode encontrar todas as listas, com ícones para ouvi-las no Deezer, Spotify e Youtube

além do conteúdo audiovisual principal, as matérias contém outros tipos de links, como para páginas da internet, ou até mesmo outros vídeos e áudios. toda vez que essa identificação visual aparecer saiba que ela corresponde a um link. é só clicar!

rodapé;

o easter-egg da revista. no rodapé de cada página de matéria, no mesmo lugar da paginação, o zint.online sublinhado também é um link. neste caso, ele leva para a versão correspondente da matéria no site, em formato blog


colabs da edição a cada publicação, o nosso time de colaboradores muda um pouco

joão

vics

criador da revista; editor de conteúdo

criador da revista; diretor de arte

9 colaboradores participam dessa edição, com matérias sobre música, filmes e televisão!

clique aqui para ver todos nossos colabs


bruna curi

debora drumond

deborah almeida

giulio bonanno

joĂŁo dicker

juliana almeida

mike faria

vitĂłria silva

yuri soares


agenda cultural as principais datas de estreias e lançamentos de março [veja o calendário completo clicando aqui]

01

01

01

dead or alive 6

wasteland, baby!

the widow

pc, ps4, xbox one

hozier

01

what a time to be alive

estreia da 1ªT

03

tom walker

04

07

the name of the rose

the order

estreia da 1ªT

estreia da 1ªT

good girls estreia da 2ªt

07

07

for the people

capitã marvel

estreia da 2ªT


08

08

10

devil may cry 5

still on my mind

american gods

pc, ps4, xbox one

dido

10

14

now apocalypse

the good fight

estreia da 1ªT

estreia da 3ªT

estreia da 2ªT

20

Pretty Little Liars: The Perfectionists estreia da 1ªT

22

21

coisa mais linda estreia da 1ªt

nós

22

27

the oa

jane the virgin

estreia da 2ªT

21

estreia da 5ªT

28

What We Do in the Shadows

dumbo

estreia da 1ªT

28

29

Suspíria - A Dança do Medo

Santa Clarita Diet estreia da 3ªT

31

Veep

estreia da 7ª e última Temporada


guia do en tre te ni men to

não é todo mundo que está imerso no mundo do entretenimento, podendo ficar sem entender alguns (ou vários) dos termos utilizados na área. por essa e outras, mês a mês, nos prontificamos a trazer três palavras, traduzidas, explicadas e exemplificadas

veja o dicionário completo


charts um chart traduz-se, pros nossos termos, como “parada musical”. sendo assim, de uma forma bem direta, são as listas musicais que fazem o rankeamento de singles e compilados lançados por artistas, em um fluxo semanal. os charts mais famosos e importantes do mundo são feitos pela revista norte-americana Billboard, sendo que a parada geral de singles e de álbuns, reunindo todos os gêneros musicais, é, respectivamente, a Billboard Hot 100 e a Billboard 200 – as mais relevantes da revista.

unaired traduzindo, unaired significa “não exibidos”, em tradução livre. consiste em episódios de séries que não foram ao ar por algum motivo, mesmo tendo sido gravados e editados para a exibição. na maioria das vezes, um unaired é resultado de uma produção cancelada – as vezes, antes mesmo de ser lançada, ou que foi cancelada logo no início.

medley o medley é um termo para a junção de duas músicas em uma só. geralmente consiste em uma música base, que serve para guiar todo o instrumental da faixa, tendo assim uma segunda música inserida apenas pelas letras destas. medleys são mais comuns como um produto feito por fãs, ou por artistas durante apresentações e shows.


CONTEÚDO

música

16

Ariana Grande Mike Faria

p.22

p.36

Giulio Bonanno

Deborah Almeida

p.30

p.38

Bruna Curi

Yuri Soares

Kanye West

Avril Lavigne

Ed Sheeran

The Beatles


NA EDIÇÃO

Filmes

48

Creed II Juliana Almeida

p.52

p.54

p.56

João Dicker

João Dicker

João Dicker

Velvet Buzzsaw

Vice

Guerra Fria

televisão

60

One Day at a Time Vitória Silva

playlists

p.64

p.70

Outlander

Boneca Russa

Bruna Curi

Debora Drumond

p.102

Todas as nossas listas musicais [ +5 ]



[

música

]


ariana e o grande

thank u, next por mike faria diagramação vics

16| zint.online


zint.online | 17


S

e “Grande” já fazia parte do nome e da trajetória musical de ARIANA GRANDE, agora também faz parte do seu trabalho. Com thank u, next, seu quinto e mais recente álbum, após seis meses do último disco Sweetener, a artista comprovou sua grandeza e levou seu pop ao auge com baladas dançantes, letras afiadas e batidas envolventes. Se Sweetener era leve e doce, o atual disco traz uma carga mais pesada, divertida e cheia de confiança. Ariana Grande mostra que sabe o que quer, sem culpa, parece encontrar sua personalidade e usa a voz da melhor maneira, seja para agradecer o ex ou dizer que não vai dar sorrisinho falso para agradar ninguém (“fake smile”). Assim, essa atitude domina o álbum e confirma, com baladas e músicas R&B e um toque de trap, estilo musical do rap, por que a jovem é hoje considerada a “grande estrela pop”, e seu próprio nome não deixa mentir. No novo trabalho, a cantora parece se encontrar, sabe lidar com as contradições e emoções de forma honesta. Independente e sem nenhuma parceria, traz ao público

um conjunto de confissões pessoais e seu lado “malvado” interior que tomou conta dos singles 7 rings, onde Grande afirma que o que ela quer, ela consegue, e o surpreendente e sensacional thank u, next. As faixas, juntas, fizeram história ao consagrar o disco, antes mesmo de sua estreia, como o terceiro da história a estrear duas músicas direto no topo da Billboard Hot 100 – os outros dois foram Scorpion, de Drake, em 2018, e Daydream, de Mariah Carey, em 1995. Segundo anuncia a crítica do jornal The Guardian,

Todo investido no rosa, 7 rings é uma completa ode ao poder e fortuna de Ariana Grande. No clipe da música, a cantora faz uma gigantesca festa para suas amigas em uma mansão, repleta de carros de luxo, diamantes e champagne. Em um dos momentos de maior referência, Grande está deitada no chão, expondo um gigantesco rabo de cavalo (sua marca registrada) de metros, caindo sobre os degraus da escada.

18| zint.online


OUÇA O ÁLBUM

Apple Music

Spotify

Deezer

Youtube

Tidal

“crucialmente, no centro de tudo, talvez pela primeira vez está Ariana. Tal como aconteceu com o ‘ANTI’ da Rihanna, isso parece o trabalho de uma estrela pop anteriormente feliz por servir de canal para outras pessoas, e agora finalmente descobrindo que elas são o que quiserem ser. Aqui, Ariana encontra sua voz”. Ainda, o texto revela a nota para o disco: quatro de cinco estrelas.

Aclamado pela crítica, thank u, next estreou no topo de 13 países, incluindo Estados Unidos, Reino Unido e Austrália. Nos dois últimos Estados, o álbum já possui certificados de Prata (mais 60 mil cópias vendidas) e Ouro (mais de 35 mil), respectivamente.

Cada vez mais segura e forte, Ariana Grande mostra que amadureceu e superou algumas adversidades que marcaram sua vida e até mesmo, seu trabalho nos últimos tempos, tendo em vista os acontecimentos envolvendo a cantora. Ela enfrenta suas dores e se permite ser ela mesma, feliz e despreocupada, em um trabalho preciso e bem construído. Ao ouvir o álbum todo, fica a sensação de que as músicas são parecidas em alguns momentos, seja por causa das batidas ou pelos recursos vocais, mas esse aspecto não compromete o material e revela talvez, até uma intenção da própria cantora e um sentimento que norteia as canções. Algumas músicas são destaque, como NASA, uma faixa sutil e original. Ela investe na batida, com referências antigas mais tranquilas e R&B. A mensagem é da mulher que “precisa

zint.online | 19


O álbum possui quatro créditos de samples. A mais famosa é em 7 rings, com porções de My Favorite Things, música cantanda por Julie Andrews no filme A Noviça Rebelde. Mac Miller, *NSYNC e Wendy Rene são os outros três artistas da lista.

de espaço”, de ficar sozinha e quer que o cara entenda isso. A partir daí, ela entra em uma viagem que faz rir e dançar ao mesmo tempo: “É como se eu fosse a N.A.S.A. e você fosse o espaço”, já pode ser considerado um dos melhores refrões do CD. Em bloodline, primeira música mais dançante do disco, feita com o produtor Max Martin, aparecem o ritmo do reggae e um conjunto de metais. A letra fala de pegação sem compromisso e representa bem a leveza de espírito do álbum. Para fechar o disco, Grande investe em um discurso sugestivo em break up with your girlfriend, i’m bored, uma das faixas que

se apropria bastante do rap, com vocal mais suave. Ela quis terminar o disco do jeito mais leve e bem humorado possível – traduzindo, o título significa “termine com sua namorada, estou entediada“. Depois de tanta coisa pelas quais Ariana passou, ela merece ser um pouco despreocupada. thank u, next rendeu à Ariana Grande 70 milhões de reproduções em suas primeiras 24 horas no Spotify, marcando o álbum como a melhor estreia de um disco feminino na plataforma de streaming. Lan-

O clipe da faixa-título faz quatro grandes referência à cultura pop, relembrando os filmes Meninas Malvadas, Legalmente Loira, As Apimentadas e De Repente 30. A superprodução conta até mesmo com rostos familiares das películas, como os atores Johnathan Bennett (o Aaron Samuels, de Meninas Malvadas) e Jennifer Coolidge (a manicure Paulette, de Legalmente Loira), além do cantor Troye Sivan e da empresária Kris Jenner.

20| zint.online


çado com 12 músicas, a artista apareceu com todas as faixas dentro do Top 15 do Spotify Global, incluindo todas as nove primeiras posições da parada – ao lado de Drake, ela é a única artista a conseguir tal marca na plataforma. O projeto ainda retem alguns outros recordes, como o compilado que chegou mais rápido ao topo do iTunes, levando apenas cinco minutos – igualando-se à Taylor Swift, com o reputation. Nas paradas musicais da Billboard, ela retém alguns títulos, como a primeira artista, desde 1964 com os Beatles, a ocupar simultaneamente o 1º, 2º e 3º lugar da Billboard Hot 100, e ainda é a segunda mulher com mais álbuns #1 nesta década (quatro), empatando novamente com Taylor Swift e perdendo para Lady Gaga (com cinco). Também, em streams, ela é a artista com a maior estreia de um álbum pop e a maior estreia de uma cantora (independente do gênero musical!), com 307 milhões de reproduções em sua primeira semana!

Muito questionado por alguns fãs e admiradores da cantora, o intervalo entre um álbum e outro parece ser o tempo que a artista precisou para saber lidar com a carga emocional representada no quarto álbum, um desabafo e discurso para deixar o momento mais tranquilo e harmônico. Parece ser o que ela precisava dizer, uma carga criativa após o término com o último namorado, Pete Davidson, em um tom humorístico que incorpora todos os aspectos da cantora. Ela parece querer deixar para trás a fase que passou, mostra que não tem medo de inovar e se descobre de uma forma inteligente, evidenciando assim que encarou o passado e claramente, aprendeu com ele. Certamente, com o lançamento Ariana Grande consolidou ainda mais sua influência no cenário musical e nos deixa curiosos para o que ainda pode contribuir nesse meio, sobretudo, na cena pop. Afinal, se a edição desse ano do Grammy não soube valorizar sua presença, então thank u, next! //

PLAYLIST TEMÁTICA

Deezer

Spotify

Youtube 21


por

giulio bonanno

diagramação

vics

15 anos de

Kanye West 22| zint.online


P

egar um álbum e chamar de clássico, hoje em dia, soa banal. Efeito colateral da descentralização que marca a indústria fonográfica desde os tempos em que o Napster bateu a porta. Aqui no Brasil já não temos mais a MTV. No mundo atual, até o Grammy é alvo de chacota e desinteresse. Quem ainda vende um milhão de cópias físicas na primeira semana? Aliás, o que são cópias físicas? Ver seus amigos se aventurando em uma carreira musical já não é tão extraordinário quanto parecia há 10, 15 anos. Não estou falando que isso é ruim. Querendo ou não, estamos cansados de saber que as coisas mudam. É um privilégio acompanhar certas mudanças e acredito que fazer parte delas consiste numa dádiva existencial ainda maior. Persistência, sorte, predestinação ou uma mistura disso tudo fez de KANYE WEST um pivô na linha de frente desse cenário amorfo e tudo isso começou lá atrás. 2004 já me parece bem distante. O mundo político nutria-se do alarmismo belicista característico da era Bush-Cheney. Grandes democracias ainda gozavam de notória estabilidade, enquanto o fluxo de informação permanecia controlável. A internet soava mais como uma ferramenta avulsa que não interferia drasticamente no cotidiano que nem hoje. Os jogos olímpicos modernos comemoravam edição histórica na Grécia, que sequer antecipava os maus lençóis que cobrem sua economia vigente. Se o cenário global (ou local) não era lá tão confortável, forças estabelecedoras faziam parecer sê-lo. Qualquer um com um ímpeto de questionamento sabia que um novo padrão de dinamismo se fazia presente. Prever o quão rápido esse padrão se consolidou e nos consumiu já não me parece tão óbvio assim. Ainda bem que, perante conceitos e contextos emergentes, temos a arte para nos servir de guia.

Em To Pimp a Butterfly, Kendrick Lamar exalta a importância do meio como espaço de aprendizagem e amadurecimento. Em Nothing Was the Same, Drake expõe seu carinho pela fase da adolescência e sua vontade de tomar a frente e o centro de seu destino. Em Oxnard, Anderson .Paak é obrigado a reverter cenários de luto em sensações hedonistas. Muitos outros álbuns de rap da década atual revivem, desconstroem e ressignificam suas expectativas depois de tudo o que aconteceu. Reproduzem sua juventude em beats e letras intimistas, extravagantes, ou algo entre os dois. Seguem os passos de Q-Tip, Busta Rhymes, 2Pac, Nas e vários outros que fizeram de sua voz uma imposição sintomática e cultural. Eis a força do gênero e de toda a esfera pulsante e imediata que caracteriza o hip-hop. A revolução não televisionada que ainda ecoa em almas e corações e impulsionam a inclusão em um mundo fragmentado.

Desde sua estreia, Kanye West é um dos artistas mais aclamados pela crítica, além de um dos mais sucedidos comercialmente, com vendas superiores a 120 milhões de discos comercializados mundialmente. Sua carreira é feita de oito álbuns #1 (ele possui 10 discos lançados) e 21 Grammy Awards.

zint.online | 23


A indústria fonográfica sabe velar esse sonho como ninguém. É como um leviatã microcósmico que se retroalimenta de rótulos e certificados amalgamáticos. Talento é só um detalhe e disso todo mundo sabe e finge que tá tudo bem. Os poderosos chefões não estampam capas de álbuns. Na verdade, ficam ali, bem no final do encarte, desejando o mínimo de exposição possível. Me vêm à cabeça Ahmet Ertegün, Brian Epstein, Berry Gordy, Tommy Mottola, L.A. Reid e mais uns nomes aleatórios aí – Harvey Weinstein… hum, esse não. Enfim, a noção de que a indústria fonográfica sabe(ria) domar seus monstros, sendo ela mesma o maior deles, nunca foi passageira. Não só artistas, como pequenas gravadoras e também movimentos culturais inteiros submetem-se aos seus esquemas, perdendo parte de suas essências em troca de posições mais altas na Billboard ou mais uma vitrolinha dourada na estante. A seleção natural desse meio já varreu uma população de anônimos que garantiriam mais umas 30 temporadas do The Voice.

24| zint.online

Adaptações são necessárias e se infiltrar nesses mecanismos se tornou o objetivo de vida de Shawn Corey Carter, o tal do Jay-Z. Sua habilidade com negócios é perceptível desde os tempos em que precisava vender crack para bancar mãe e irmãos nas habitações Marcy, no coração do Brooklyn. O talento com ritmos e rimas veio de brinde. A capacidade de se locomover de um ponto a outro na cena

Amigos de longa data, Jay-Z e Kanye West lançaram, em 2011, o álbum #1 Watch the Throne, nos quais os dois dividem os vocais e composição de todas as faixas, além da produção de algumas delas.


OUÇA O ÁLBUM

Apple Music

Spotify

Deezer

Youtube

Tidal

local, estabelecendo vínculos com gente importante, o garantiu visibilidade em tempo recorde. Jay era empresário antes mesmo de lançar seu primeiro álbum em 1996, o saudosista Reasonable Doubt. Emplacando sucessivos hits, participações estratégicas na música dos outros e com uma Beyoncé para lhe chamar de Clyde, seu nome se tornou um lugar-comum para a indústria. Na virada do milênio, se identificava tanto como um interlocutor das ruas como uma vitrine de Wall Street. Era o cara certo para fazer contato e alçar para a fama. Se um pequeno produtor chamava a sua atenção, era questão de tempo para que este se tornasse lugar-comum na indústria também. Foi o que aconteceu com Timbaland, Jermaine Dupri e dois sujeitos de Chicago: No I.D. e um tímido Kanye Omari West. Não que seja o foco desse texto, mas, antes de 2004, é necessário voltar para 2001. Além de ter sido o marco zero para políticas armamentistas sem precedentes, foi também o ano em que nasceu The Blueprint. É aqui que a semente para o THE COLLEGE DROPOUT germina. As digitais de Kanye se encontram bastante presentes nas cinco músicas que produziu, como a incisiva Takeover ou a comovente Ain’t No Love

(Heart of the City). Não requer ouvido absoluto para perceber suas assinaturas onipresentes: os samples de soul acelerados, as influências do gospel e um flerte inconsciente pelo rock psicodélico. Enquanto uma década se iniciava de maneira trágica, uma faísca de revolução acendia nos estúdios da Roc-A-Fella. Representantes de diversas companhias estavam relutantes em liberar espaço para Kanye West se lançar como um rapper e gravar seu primeiro álbum. Havia um pressentimento de que sua postura inversa ao perfil gangsta consumista exigido pela indústria o prejudicaria em suas vendas e isso sobraria para as gravadoras. Até mesmo Jay-Z o considerava um produtor nato e não o visualizava plenamente com o microfone na mão. Um co-fundador da Roc-A-Fella, Damon Dash, foi quem deu a cartada final, garantindo o orçamento e a equipe necessária para Kanye elaborar a sua sonhada apresentação para o mundo.

zint.online | 25


Em outubro de 2002, enquanto dirigia de volta após sessões num estúdio da California, Kanye West caiu no sono e se acidentou. O episódio quase fatal teve como resultado uma mandíbula fraturada, uma cirurgia de reconstituição facial e uma nova canção registrada: Through the Wire. Nela, o (agora) rapper relata suas vivências de modo lúcido e literal. Imerso em delírios de grandeza oriundos de uma experiência de quase-morte, West desenhava suas primeiras abordagens não só para um álbum, como para toda uma discografia. Juntando rabiscos da adolescência e refinadas técnicas de produção, Kanye buscou centralizar anseios e devaneios em um trabalho que apresentasse temas tão diversos como fé, família, amizade, materialismo, escapismo e exclusão. São algumas das ideias que perambulavam a sua mente desde que seus pais se divorciaram quando tinha três anos ou enquanto escutava histórias de seu tio como membro dos Panteras Negras. West cresceu em um ambiente de classe média, com mãe acadêmica e principal mentora (até uma trágica morte em 2007). Gostava de pintar, escrever poemas e insistia para ser levado a um estúdio de gravação. Nessas pequenas aventuras artísticas, cruzou caminhos com o já citado No I.D. e o aspirante Common. Aprendeu a arte do sample e suas aplicações nos diferentes estilos de hip hop – do boom bap ao gangsta rap. Incapaz de decodificar seus rótulos, Kanye entrou para alguns cursos superiores de pintura e literatura. Pouco tempo depois, descobriu que seu lugar era mesmo num estúdio de gravação. As faixas de The College Dro-

26| zint.online


pout são temporalmente espaçadas. Rascunhos de meados dos anos 90 ganhavam uma repaginada e se juntavam às canções feitas em 15 minutos numa madrugada produtiva. Percebe-se também algumas músicas “intrusas”, como Never Let Me Down, inicialmente planejada para o The Blueprint de Jay-Z. Trechos de mixtapes pipocam ao longo da tracklist. Mesmo assim, é um álbum consistente devido não só à participação de Kanye como produtor em todas as faixas (consolidando mais ainda sua identidade sonora), como também na imposição de um estilo que abandona paradigmas tóxicos do rap comercial americano. O título, inclusive, não poderia ser mais apropriado ao refletir tanto um período da vida do autor (que literalmente se livrou da faculdade) como também ao evidenciar que instituições engessadas e comportamentos padronizados são insuficientes para entender como funciona o mundo – e como transformá-lo. Embasado em uma narrativa ligeiramente linear, reproduzindo cenários vividos em escolas ao incluir broncas de um diretor (voz de DeRay Davis imitando Bernie Mac), o álbum é surpreendentemente convidativo. Passa anos-luz de ser um Yeezus e encontra mais semelhança com algo da Lauryn Hill – inspiração direta na exuberante All Falls Down, condenando o materialismo no hip hop em pleno auge de Nelly e 50 Cent. O foco é em abordagens mais intimistas. Algumas apostavam no sarcasmo (We Don’t Care, que coloca um coral infantil para cantar sobre expectativa de vida no tráfico) ou no ceticismo absoluto (Spaceship, que reúne os velhos amigos GLC e Consequence numa curiosa batida

zint.online | 27


em ¾). É um fluxo irresistível. Quando chegamos em Jesus Walks, sentimos pouco espaço para a leveza de outrora. Estamos diante de uma das peças mais controversas daquele tempo. Uma música invariavelmente mainstream falando sobre cristianismo e se colocando no lugar de figuras marginais da sociedade pedindo socorros do além. Não seria exagero que, a partir daqui, Kanye começou a expor traços de uma personalidade cada vez mais confusa e desamparada. Os versos são fortes. A entrega é forte. É uma tremenda música para entender como começou o século XXI e como se viveu desde então. Os arrepios são bem-vindos. Ou não. Por pouco que o álbum inteirinho não fica na sombra de Jesus Walks, indicada à Canção do Ano no Grammy – bem mais relevante há 15 anos. O trabalho como um todo foi bastante reconhecido também, chegando a liderar várias listas de fim de ano e cimentando os novos passos que o rapper daria em sua carreira. Rendeu uma trilogia de álbuns com tema acadêmico (preceden28| zint.online

do Late Registration, de 2005, e Graduation, de 2007) ditando toda uma era não só para o autor, como também para os fãs de rap em geral. Percebia-se uma soltura de amarras saudável para o gênero, algo que só acontece quando gente grande surge no pedaço. Outro reflexo das boas energias que cercavam Kanye West naquele momento se traduz na quantidade de nomes convidados de destaque: os iniciantes John Legend, Jamie Foxx, Twista e Freeway, além de cortesias de Ludacris, Mos Def, Talib Kweli, entre outros. É um retrato fiel de um momento incerto para a cultura pop e versos como “Como eu pude deixar suas palavras me afetarem / Eles dizem que o Hip-Hop está morto, eu estou aqui para ressucita-lo” quase que nos deixam reviver esse estranho período. Não consigo escolher um momento favorito em The College Dropout. Adoro o exercício de estilo em Slow Jamz e a dose reforçada de ironia em The New Workout Plan. Ainda que tenha a consistência da produção de Kanye e seus aliados, trata de uma diversidade de assuntos e se apoia em expectativas, frustrações e ressignificações para se manter como uma peça incansável,


progressiva e envolvente. Dependendo da versão que você escutar (a edição em vinil, por exemplo, apresenta boas alterações na tracklist), vai encontrar no final uma quadra poderosa encabeçada por Two Words, Through the Wire, Family Business e Last Call. São obras completas que encontram um fim em si mesmo, porém dentro do contexto se tornam ainda maiores ao querer discutir contornos reais e tangíveis da memória e da personalidade do autor – com as quais nos identificamos facilmente. É o momento certo para se indignar, se culpar, se emocionar ou questionar se já não passou por situações parecidas. O sucesso de Kanye West não deu trégua. Não há hoje uma pessoa antenada na cultura pop que não saiba da existência desse sujeito. Poderíamos discutir aqui suas declarações polêmicas, como o VMA de 2009 ou a inacreditável ponderação da escravidão africana como uma “escolha”. A verdade é que não há muito que falar. Ele pouco se lixa. A verdade é que seus maneirismos, seu ego e sua persona são eclipses de uma sensibilidade artística outrora saudável e proativa. É como se Kanye levasse o conceito de “morte do autor” ao pé da letra. Seus álbuns falam por si… Ano passado, mesmo inundado de controvér-

sias, trabalhou no projeto KIDS SEE GHOSTS (ao lado de seu pupilo Kid Cudi) e conquistou novamente o reconhecimento da crítica, do público e da imprensa – sem indicações ao Grammy desta vez. Sonoramente, tem pouco a ver com The College Dropout, mas é gratificante saber como isso tudo começou e como as narrações de uma mente conturbada ainda constituem sua principal finalidade criativa. Quando estamos sozinhos, nos percebemos vivos. Nos encontramos diante de pensamentos que trafegam nossa rede neural e se dissipam em frações de segundos. Talvez nem a milionésima parte deles alcancem a materialização. Se expressar por meio da arte é uma oportunidade de enclausurá-los e temperá-los com as adversidades do tempo. É bonito apreciar os clássicos que a indústria fonográfica quis que a gente adorasse. Hoje, mais do que nunca, os clássicos são representações de mundos fragmentados. Nada impede que você faça a sua parte também. Escolha suas melhores lembranças, acelere o tom e descubra como samplear. Essa percepção é o que oxigena exposições criativas individuais em 2019. Parece estranho, mas há 15 anos era diferente. Estávamos em uma guerra com nossas próprias percepções daquilo que somos e do queremos ser. Havia, nos subúrbios de Chicago, um soldado lutando por emancipação; pela livre expressão de uma identidade cultural personalizada. Pode ter fugido do colégio, mas seu aprendizado não foi em vão. //

PLAYLIST TEMÁTICA

Deezer

Spotify

Youtube zint.online | 29


30


A volta triunfante de Avril Lavigne Head Above Water marca o retorno de Avril Lavigne após mais de cinco anos sem um disco novo, em uma era marcada pelo sentimento de “nova chance”. po r bruna curi

di ag r a m ação vics

zint.online | 31


T

odo mundo já deve ter ouvido falar de AVRIL LAVIGNE, a famosa cantora canadense que aparenta não envelhecer e é constantemente associada a teorias da conspiração – a mais famosa é de que ela morreu e foi substituída. Depois de alguns anos afastada dos holofotes, no dia 15 de fevereiro a cantora lançou o seu sexto álbum de estúdio: Head Above Water. INÍCIO DA CARREIRA Avril ficou conhecida em 2002, com o lançamento de seu primeiro álbum, Let Go. O disco recebeu avaliações favoráveis por parte da crítica especializada, e, somente naquele ano, vendeu mais de oito milhões de cópias. Além disso, o projeto foi o segundo álbum com o maior número de vendas entre 2002 e 2003, sendo o disco de artista do sexo feminino mais vendido no ano de 2002. O seu primeiro single, Complicated, teve um desempenho impressionante. Após o lançamento, ele se manteve durante cinco semanas em primeiro lugar em número de vendas do Reino Unido, e debutou na segunda posição na parada da Billboard Hot 100, dos Estados Unidos. Foi Let Go que deu à Avril a sua carreira,

32| zint.online

levando ela a concorrer alguns prêmios. Em 2003, a artista foi indicada em cinco categorias do Grammy Awards (Melhor Artista Feminino, Melhor Artista Revelação, Música do Ano, Melhor Performance de Rock Feminino e Melhor Álbum), mas acabou não ganhando nenhum dos prêmios. Mas esse era apenas o início de sua carreira de sucesso. Dois anos depois, em 2004, a artista lançou o o álbum Under My Skin. Diferente do antecessor, a coletanêa apresentava faixas mais pesadas e letras com um ritmo mais sentimental. Apesar disso, não havia uma diferença de estilo muito brusca, levando-o a um grande sucesso. Uma semana após o lançamento, o álbum ganhou o Disco de Platina no Japão, permanecendo por muito tempo em primeiro lugar na UK Albums e Billboard 200, charts dos álbuns mais vendidos do Reino Unido e EUA, respectivamente. COMEÇO DAS MUDANÇAS Ao longo de sua carreira, Lavigne mudou tanto o seu estilo musical quanto o seu vestuário. Em 2007, ela abandonou o lado roqueira


OUÇA O ÁLBUM

e lançou The Best Damn Thing, seu terceiro álbum. O novo disco chega com um estilo pop punk e é diferente de tudo que já tinha feito até aquele momento. O projeto conta com músicas alegres e agitadas, enquanto as letras demonstram um tom de autoconfiança. Na primeira semana de lançamento, o disco vendeu aproximadamente 286 mil cópias, ficando em primeiro lugar de vendas nos Estados Unidos, Inglaterra, Japão, Canadá, Alemanha, Itália e Brasil. Além disso, a cantora ficou conhecida pelo título de Princesa do Punk-Pop. O quarto álbum da cantora, Goodbye Lullaby, lançado em 2011, também foi marcado por uma série de experimentações. Segundo a artista, trata-se de um trabalho mais maduro, com canções mais sentimentais e pessoais, mas sem deixar de lado o seu jeitinho extrovertido. O quarto trabalho foi bem avaliado pela crítica especializada, e ainda chegou ao primeiro lugar simultaneamente em oito países, tendo um destaque especial no Japão, onde vendeu mais de 100 mil cópias. Já na Billboard 200, o disco atingiu a quarta posi-

ção, ficando em segundo na parada do Canadá. Ainda, o álbum rendeu três singles: What the Hell, Smile e Wish You Were Here. O quinto álbum de estúdio da cantora, intitulado Avril Lavigne, foi lançado em 5 de dezembro de 2013. Segundo a artista, o disco era um dos seus trabalhos mais artísticos, se comparado com os anteriores. Enquanto Goodbye Lullaby tinha uma produção mais acústica, a obra homônima se diferenciava por ter canções no estilo pop rock, baladas alegres e o piano incorporado em diversas canções. No geral, o disco obteve uma opinião positiva da crítica especializada, mas, comercialmente, teve um desempenho moderado. Em comparação com seus trabalhos antigos, o quinto álbum de estúdio não fez muito sucesso. HEAD ABOVE WATER Depois do lançamento do seu quinto álbum e da turnê realizada para divulgar o trabalho, a cantora ficou sumida dos palcos, sem produzir nenhum trabalho novo – com exceção de Fly,

Apple Music Deezer

Spotify

Tidal

Youtube

zint.online | 33


uma composição inédita da cantora para as Olimpíadas Especiais que aconteceram em Los Angeles, em 2015. Mais tarde, Lavigne contou sobre o período que passou doente. A artista lutou, por aproximadamente dois anos, contra a Doença de Lyme, contanto sobre um momento em que achou que iria morrer. “Eu aceitei que estava morrendo. Eu me senti naquele momento como se estivesse submersa e me afogando, tentando respirar por um ar. E, literalmente, com a minha respiração, eu fiquei tipo ‘Deus, me ajude a manter minha

34

cabeça acima da água’”, revelou em entrevistas realizadas em 2018. E esse momento específico serviu de inspiração para a composição da música Head Above Water, o carro-chefe de seu novo álbum e lançado em setembro do ano passado. A música, que dá nome ao seu novo álbum, Head Above Water, lançado no dia 15 de fevereiro. Escrita enquanto Avril estava de cama, lutando contra a doença, a faixa tem

Com mais de 40 milhões de álbuns e 50 milhões de singles vendidos, Avril Lavigne é a terceira artista feminina canadense de maior sucesso de todos os tempos. Ela fica atrás da rainha das baladas Celine Dion (mais de 200 milhões de álbuns vendidos) e da rainha do country Shania Twain (mais de 100 milhões).


uma letra bastante dramática e pessoal. A canção fala sobre a sensação de estar se afogando, e sobre a força necessária para lutar por sua vida: “Sim, estou lutando pela minha vida / Não consigo me distanciar do mar, não consigo alcançar o raso / E as vozes se tornam a força dominante / Não vou deixar isso me controlar”. Em seguida, a faixa Birdie fala de uma mulher que teve as asas cortadas, que perdeu sua liberdade. Com um forte vocal e a presença de um piano, a canção retrata um pouco do período complicado pelo qual a cantora passou. As músicas I Fell In Love With the Devil e Tell Me It’s Over falam sobre o amor de maneiras diferentes. A primeira, sobre uma paixão pelo “diabo”; uma relação que parece não estar indo bem. A segunda, sobre o momento de fechar as portas de uma relação. Além disso, em Tell Me It’s Over, é possível identificar um empoderamento mais maduro por parte da cantora. Dumb Blonde, parceria com Nicki Minaj, é uma das canções que

mais destoa do restante do álbum. Apesar do nome “Loira Burra“, em tradução literal, a letra da canção fala totalmente o contrário: “Eu não sou uma loira burra / Eu não sou uma Barbie estúpida / Eu sei jogar / Preste atenção, preste atenção, preste atenção em eu provando seu erro”. Mesmo que com um refrão clichê, a faixa Warrior aborda a força de Avril, colocando a cantora como se fosse uma guerreira, que luta por sua vida. Chad Kroeger, o ex-marido da cantora, assina a coautoria da faixa, em uma parceria de resultado muito bonito e poético. Com um total de 12 músicas, Head Above Water marca a volta triunfante de Avril para os palcos e para os holofotes. Com letras bem pessoais e uma assinatura melódica, Lavigne transita por algumas referências de seu passado, mas também brinca com experimentações, como é possível observar nas canções Crush e Love Me Insane, por exemplo. Com um som autêntico e forte, Head Above Water marca uma nova era na carreira de Avril Lavigne. //

PLAYLIST TEMÁTICA

Deezer

Spotify

Youtube 35


Um ruivo em terras tupiniquins

deborah almeida d i ag ra m aç ão vics por

Quase dois anos depois da sua última visita ao Brasil, o cantor ED SHEERAN voltou mais uma vez para finalizar a turnê mundial de Divide, seu terceiro disco. Em maio de 2017, o britânico veio para promover o mesmo álbum e realizou shows em Curitiba, Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte. Dessa vez, o número de apresentações foi reduzida, sendo dois em na capital paulista e um em Porto Alegre. O primeiro evento aconteceu no dia 13/02 e fez a estadia do cantor no país começar com o pé direito. Na realidade, o encontro foi tido como um “show extra”, uma vez que os ingressos para ver o artista no dia 14 esgotaram rapidamente. Quem abriu o show foi Michael Rosenberg, mais conhecido como Passenger, dono do hit Let Her Go. E, para a surpresa de muitos, Passenger não era uma banda e sim um cantor com um violão. Michael, inclusive, brincou sobre isso durante sua performance, o que arrancou muitas risadas da plateia. Seu show começou pontualmente às 19:45, horário que estava previsto, e

36| zint.online

durou até 20:30. Ainda que seja conhecido apenas por Let Her Go, ele cantou outras canções autorais e apresentou um cover de The Sound of Silence. O artista estava visivelmente ansioso, visto que era sua primeira visita à América Latina. A plateia, apesar de não conhecer as músicas, foi muito receptiva e arriscou-se em cantar os refrões. Depois de um ótimo show de abertura, os equipamentos de Ed foram posicionados e arrumados no palco, com o artista subindo com uma pontualidade britânica impressionante. Como de costume, começou cantando Castle on the Hill, que sempre é a primeira em todos os shows. Em seguida, apresentou Eraser e depois um medley de Don’t com New Man. Em sequência, cantou Dive, emocionando a plateia; Bloodstream com toda a explosão sonora; Happier que vem carregada de sentimentos; e Tenerife Sea, para deixar todo mundo ainda mais apaixonado. Depois, outro medley, dessa vez com All of the Stars, Lego House e Give Me Love.


Posteriormente, cantou Galway Girl, que contagia toda a plateia a cantar bem alto; seguida pelo medley de Feeling Good e I See Fire. Para completar a noite e fazer todo mundo chorar, Sheeran trouxe o trio da sofrência: Thinking Out Loud, Photograph e Perfect. Finalizando essas canções, saiu do palco por alguns minutos e voltou usando uma camisa do Brasil ao som de Sing, que quebrou todo o romantismo anterior. E, claro, não deixou de fora Shape of You, primeira canção a alcançar dois bilhões de reproduções no Spotify em 2018. Para finalizar, You Need Me, I Don’t Need You, antes de uma saída triunfal que deixou todo mundo em êxtase e com gostinho de quero mais. Um dos pontos mais fortes dos shows do britâncio são os telões que combinam perfeitamente com a música que está sendo cantada. Em Bloodstream, por exemplo, as telas são preenchidas por intensos tons de vermelhos. Já em Photograph, podemos apreciar fotos de sua infância. Os telões também fazem ilusões de ótica, dando a impressão que o palco está se movendo, o que torna toda a apresentação bem mais dinâmica e especial.

O maior diferencial dos shows de 2019 foram os equipamentos trazidos pelo cantor. Em seus últimos show na América Latina, ele era acompanhado somente de seus violões e guitarras. Contudo, dessa vez o evento foi completo e com truques sonoros. Esses equipamentos são pedais e microfones, preparados para reproduzir batidas e backing vocals. Dessa forma, as músicas ficam bem mais parecidas às gravações em estúdio. Todavia, o show né majoritariamente parecido com o de 2017. Ainda que algumas músicas tenham sido trocadas, o setlist é semelhante e a única novidade são os efeitos sonoros – o que não é de todo um choque, já que não houve nenhum lançamento desde sua última visita ao Brasil. De forma geral, as produções de Ed Sheeran são excelentes. Mesmo que haja uma enorme equipe por trás do evento, ele é a única figura do palco e faz tudo acontecer sozinho. Tem discursos cativantes e emocionantes, fala sobre suas experiências pessoais e ainda convida todos a se divertirem e cantarem o mais alto que puderem. É um show atraente e fascinante do início ao fim. //

PLAYLIST TEMÁTICA

Deezer

Spotify

Youtube 37


the Beatles

e o show que entrou para a historia por

38| zint.online

yuri soares

diagramação

vics


E

m 2013, o Please Please Me (1963), álbum de estreia dos BEATLES, completou 50 anos. De lá para cá, todo ano um disco da banda volta às páginas dos jornais com matérias que enaltecem suas cinco décadas de aniversário. Assim será até 2020, quando o Let It Be (1970) encerrará o ciclo dos cinquentões. Esse ano, os holofotes estão voltados para o Yellow Submarine e Abbey Road, lançados, respectivamente, em janeiro e outubro de 1969. Mas não para por aí. Outro marco na carreira do quarteto de Liverpool, o Apple Rooftop Concert, também completa seus 50 anos em 2019. No dia 30 de janeiro de 1969, acontecia o icônico show dos Beatles no telhado da Apple Corps, na rua Savile Row, do bairro Mayfair, em Londres.

Oficialmente, não se sabe quem deu a ideia da apresentação. Com base nas declarações da banda e produtores, acredita-se que John, Paul, George e Ringo decidiram juntos, alguns dias antes, que iam cantar e tocar músicas inéditas no telhado da gravadora deles. Tudo sem divulgação prévia. Só amigos e produtores sabiam. Engane-se quem acha que a performance era uma despretensão. Pelo contrário, era parte de um novo trabalho. Na verdade, mais do que isso. O quarteto tinha lançado um álbum duplo homônimo, o The Beatles (1968), popularmente conhecido como The White Album, havia poucos meses. Sucesso de crítica e vendas, sua produção foi o pontapé inicial para as desavenças entre os quatro músicos. Hunter Davies, autor da única biografia autorizada da banda, escreveu que “os Beatles começaram a se separar já em 1966,

zint.online | 39


quando desistiram de fazer shows e pararam de viver uma vida em comum”. Sendo assim, os desentendimentos, mais cedo ou mais tarde, aconteceriam. Fato é que chegada de Yoko Ono na vida de John Lennon deu uma apimentada nas discussões. Ele a levava para o estúdio de gravação, o que irritava os outros três, pois quebrava com a dinâmica que tinham estabelecido desde o primeiro trabalho juntos. As brigas durante as gravações do álbum duplo chegavam a patamares antes inimagináveis, ao ponto que nas músicas Back in the U.S.S.R. e Dear Prudence, quem toca a bateria é Paul McCartney – Ringo tinha abandonado as gravações após discussões entre os quatro. “Ele disse que estava farto de ser o baterista deles. (…) No entanto, ele ficou afastado apenas um dia e foi convencido a voltar”, escreveu Davies sobre o episódio na biografia homônima dos Beatles. Decidido a acalmar os ânimos e a produzir algo novo, que unisse a banda, Paul McCartney idealizou o Get Back, um documentário sobre o processo criativo do quarteto na gravação do seu novo disco. Depois, finalizaram com uma grande apresentação ao vivo. Vários locais estavam na mira para o grand finale, dentre eles o Coliseu, em Roma, e um grande estádio em Los Angeles, nos Estados Unidos. A ideia agradou a todos. As filmagens começaram Twickenham Film Studios, mas logo desagradaram. Por questões sindicais da época, os takes começavam pela manhã, no auge do inverno londrino. Não suficiente, foi a vez de George Harrison abandonar a banda – retornando logo depois, assim aconteceu anteriormente com o colega. As gravações foram, então, transferidas para o recém construído estúdio da Apple Records, o edifício 3 da Savile Row, também endereço da sede da Apple Corps, empresa que pertencia aos Beatles e gerenciava

40| zint.online

todo o império da banda. Era um dos principais motivos de desavenças entre eles. APPLE ROOTFTOP As filmagens seguiram em tom ameno. George Harrison convidou o tecladista Billy Preston, pois imaginou que o artista poderia ajudar a melhorar o clima entre eles. Parece que funcionou. Preston é único músico oficialmente creditado em gravações com os Beatles. Após dias de gravações, o quarteto de Liverpool desistiu do grande show em algum local de suntuosa visibilidade. A apresentação seria no telhado do estúdio, ali mesmo no centro comercial de Londres. Billy Preston, lógico, estava convidado. John Lennon, Paul McCartney, George Harrison, Ringo Starr e Billy Preston começaram a tocar a música Get Back no horário do almoço. As pessoas não conheciam as canções, naquele momento inéditas, mas começaram a aglomerar em frente ao prédio da gravadora, nas ruas próximas e nos telhados. A notícia, em tempos que não existia internet e celulares, espalhou-se rapidamente. Parece que alguns comerciantes ficaram irritados com o barulho, além da comoção que resultou até em problemas no trânsito. A polícia foi acionada e teve de intervir. Policiais tentavam obter a ordem e ameaçavam prender os funcionários da gravadora caso não parassem com o show. O policial de identificação 503 da delegacia de Westminster subiu no telhado e deu ordem para que a apresentação acabasse, mas os músicos continuaram por alguns bons minutos, mesmo com a presença do agente. Entre uma câmera e outra, os Beatles gesticulavam que não ia parar. Paul McCartney até ironizou a situação em um improviso na letra de Get Back: “Você está brincando no telhado de novo,


OUÇA O ÁLBUM

Apple Music Deezer

Spotify

Tidal

Youtube

zint.online | 41


e sabe que sua mãe não gosta, ela vai mandar te prender!”. O show durou 42 minutos e contou com nove tomadas de cinco músicas: Get Back, Don’t Let Me Down, I’ve Got a Feeling, Dig a Pony e One After 909. Além disso, tocaram o hino britânico God Save the Queen e um trecho de I Want You (She’s So Heavy), que mais tarde estreou no álbum Abbey Road. No final da apresentação, John Lennon agradeceu em nome do grupo, complementando com um “Espero que tenhamos passado na audição”. Depois da apresentação, o projeto Get Back ficou esquecido. O quarteto começou a trabalhar em outro disco, o Abbey Road. As filmagens, dirigidas por Michael Lindsay-Hogg, resultaram no filme Let It Be (1970). Lindsay-Hogg utilizou 10 câmeras nas gravações do show, tudo para pegar a maior variedade de ângulos possíveis do evento. Sucesso de bilheteria, o longa ganhou o Oscar de Melhor Trilha Sonora Original. Infelizmente, o filme não pode ser encontrado em DVD ou Blu-ray. Entretanto, existem trechos na internet. Além disso, o vídeo oficial da música Don’t Let Me Down está disponível no canal oficial dos Beatles

42| zint.online

no YouTube. Com o filme veio o álbum de mesmo nome, Let It Be (1970). Desta vez, George Martin, produtor de todos os álbuns anteriores da banda, não organizaria o material. Para esse trabalho, contrataram o engenheiro de som Glyn Johns, que já havia trabalhado com The Rolling Stones, The Who e Led Zeppelin. Os Beatles detestaram o resultado de Johns. Recorreram ao aclamado produtor Phil Spector, que finalizou oficialmente o Let It Be, quase um ano e meio após as gravações. Três das canções do show no telhado estão no disco, sendo elas: I’ve Got a Feeling, Dig a Pony e One After 909. É sabido que Paul McCartney não gostou da montagem realizada por Spector no último álbum da banda, mas mesmo assim o disco foi lançado. Paul não deixou barato. 33 anos depois foi lançado o Let it Be… Naked (2003), uma versão remixada e remasterizada supervisionada pelo próprio McCartney. O álbum é considerado uma versão mais pura das gravações realizadas em 1969, antes dos produtores trabalharem com o material.


REFERÊNCIA Depois do Apple Rooftop Concert, shows em telhados viraram uma espécie de tendência no mundo da música. A banda irlandesa U2 também resolveu fazer seu espetáculo no térreo de um prédio. A apresentação de Bono e companhia foi planejada com referências diretas do show dos Beatles, mas, ao contrário dos britânicos, os irlandeses convidaram os fãs. O show do U2 aconteceu na primavera de 1987, quase 20 após o Apple Rooftop Concert, no telhado de um loja de bebidas, localizada na East 7th Street com Main South Street em Los Angeles. O propósito era gravar o videoclipe da música Where The Streets Have No Name, terceiro single do álbum The Joshua Tree (1987). Assim como aconteceu com o quarteto de Liverpool, a polícia também fez intervenções – entretanto, era um desejo da banda irlandesa, que colaborou para a presença policial no local. Gravado ao vivo, o clipe musical levou o gramofone de Melhor Performance de Videoclipe no Grammy de 1989, contando com imagens do show e áudio sobreposto para a versão da música gravada em estúdio. Depois disso, shows ou gravações de vídeos musicais em telhados tornaram-se ainda mais comuns. A banda norte-americana Red Hot Chilli Peppers é mais um exemplo famoso disso. Em 2011, eles subiram no terraço de um prédio da movimentada Venice Beach, em Los Angeles, para gravar o videoclipe de The Adventures of Rain Dance Maggie, primeiro single do álbum I’m With You (2011).

Na primeira imagem, o show de terraço da banda irlandesa U2, que tomou lugar em 1987. Na segunda imagem, o show da nada de rock Red Hot Chilli Peppers, em 2011. Os dois aconteceram em Los Angeles: o primeiro foi no centro, e o segundo na orla da praia.

No mesmo ano, Marc Klasfeld, diretor do vídeo, disse em uma entrevista para a MTV norte-americana que ele e o vocalista da banda, Anthony Kiedis, estavam assistindo o clipe de Get Back dos Beatles e decidiram que fariam algo parecido. Seria “simples e icônico”, lembrou Klasfeld. Na época, o programa de variedades Fantástico, da TV Globo, também realizou

zint.online | 43


entrevista com o Red Hot e mostrou detalhes da produção do clipe. Infelizmente, o material não está disponível na internet. Outra representação clássica do show dos Beatles no telhado da Apple Records está no filme Across the Universe (2007), dirigido pela mesma cineasta de Frida (2002), Julie Taymor. Pautado em canções dos Beatles e todo o contexto do mundo na década de 1960, o longa tem como um de seus momentos mais empolgantes a cena em que Jude Feeny (Jim Sturgees) e seus amigos cantam All You Need Is Love. Fica a recomendação do filme, que conta com a participação de Bono e Joe Cocker. Bono, aliás, foi um dos produtores. Os shows também migraram para especiais em canais de televisão. O próprio Paul McCartney repetiu o feito em 2009, ao se apresentar de surpresa no telhado do Ed Sullivan Theater, em Manhattan.

44| zint.online

O show era um especial do Late Show, na época ainda apresentado por David Letterman. Também em 2009, o U2 voltou aos telhados. Dessa vez em um edifício da BBC Londres. Em 2017, a banda irlandesa fez um show exclusivo para a TV Globo, no heliponto da emissora em São Paulo. DOCUMENTÁRIO No dia 30 de janeiro, o perfil oficial dos Beatles no Instagram anunciou, na legenda de uma foto do quarteto acompanhado de Yoko Ono em estúdio, que vem material novo por aí. Trata-se de um documentário dirigido por Peter Jackson, diretor da franquia O Senhor dos Anéis. O texto explica que o novo projeto é uma colaboração da banda com o diretor aclamado pela Academy Awards. Para o novo filme, Jackson teve acesso a 55 horas de filmagens do projeto Get


Back, que deu origem ao Let It Be em 1970. As imagens, gravadas entre 2 e 31 de janeiro de 1969, são inéditas e prometem revelar um clima mais amigável entre o quarteto, diferente do que foi visto no filme de 1970 de Michael Lindsay-Hogg. O texto da rede social revela as impressões e expectativas de Jackson após analisar o material. Em publicação, ele afirma: “As 55 horas de imagens inéditas e 140 horas de áudio que nos foram disponibilizadas garantem que este filme será a melhor experiência com a qual os fãs dos Beatles sonham. Fiquei aliviado ao descobrir que a realidade é muito diferente do mito. Depois de rever todas as filmagens e áudio que Michael Lindsay-Hogg gravou, 18 meses antes de se separarem, é simplesmente um incrível tesouro histórico. Claro, há momentos de drama – mas nenhuma da discórdia com a qual, há muito tempo, associam a esse projeto. Assistir John, Paul, George e Ringo trabalharem juntos, criando músicas clássicas do zero, não é apenas fascinante – é engraçado, edificante e surpreendentemente íntimo. Estou muito feliz e honrado por ter recebido esta filmagem notável – fazer o filme será alegria pura”. Segundo informações de portais de notícias, o documentário será uma parceria entre Apple Corps e WingNut Films e contará com o apoio de Paul

McCartney, Ringo Starr, e as viúvas de John Lennon e George Harrison, Yoko Ono e Olivia Harrison, respectivamente. De acordo com essas publicações, as filmagens serão remasterizadas por uma empresa da Nova Zelândia, especializada no assunto e responsável pelo tratamento do material utilizado por Jackson em seu último trabalho, o Eles Não Envelhecerão (2018), um documentário sobre a Primeira Guerra Mundial. O título e a data de lançamento do novo filme dos Beatles não foram divulgados. A expectativa é que chegue aos telões em 2020, ano que o Let It Be completa seu 50º aniversário. YESTERDAY Em junho deste ano, chega aos cinemas norte-americanos o filme Yesterday, do cineasta britânico Danny Boyle, diretor do premiado Quem Quer Ser um Milionário? (2008). Protagonizado por Himesh Patel, o longa contará a história de Jack Malik, um compositor fracassado que, após um acidente, vai parar em uma dimensão onde os Beatles nunca existiram. Malik vê uma oportunidade nisso e começa a faturar com as composições do quarteto britânico. Sem data de estreia no Brasil, o filme da Universal Pictures tem no elenco Lily James, Kate McKinnon, Ana de Armas, Ed Sheeran e James Corden. Na internet, fãs comentam das supostas participações de Paul McCartney e Ringo Starr. //

PLAYLIST TEMÁTICA

Deezer

Spotify

Youtube 45



[

filmes

]


48 | zint.online


por

juliana almeida

OS DRAMAS DE CREED E OS FANTASMAS DO PASSADO diagramação

vics

zint.online | 49


S

e você assistiu à Rocky IV, o roteiro de CREED II não lhe pareceu novidade alguma. O novo longa-metragem aposta na nostalgia daqueles que já acompanhavam a história de Rocky Balboa (Sylvester Stallone) e que continuam voltando ao cinema para rever o personagem. O segundo filme com Adonis Creed (Michael B. Jordan) como protagonista não se distancia do primeiro e muito menos dos clássicos, mas isso não significa que seja ruim. Toda a artimanha para prender a atenção dos espectadores se encontra exatamente na retomada de histórias anteriores e na repetição de erros do passado. Não é à toa que neste filme temos a volta de um dos oponentes mais fortes de Rocky, o russo Ivan Drago (Dolph Lundgren), que sozinho já é o suficiente para deixar a todos angustiados. Isso porque, para aqueles que não

se lembram, ele foi o causador da morte de Apollo Creed, o pai de Adonis. Enquanto o filme de 1985 se apóia no patriotismo a priori pra validar a luta de Apollo com Ivan, Creed II usa a honra como justificativa. Adonis não apenas precisa manter o título de campeão mundial de boxe, como também carrega a necessidade de vingar o pai ao enfrentar Viktor Drago (Florian Munteanu). Neste ponto, o roteiro nos presenteia com uma visão mais ampla do antagonista que, assim como o protagonista, busca trazer a honra outrora tirada da sua família por Rocky. O fato do roteiro se preocupar em mostrar a importância da vitória para os dois lados é o primeiro indicio de uma evolução de algo que parecia ser apenas uma história reutilizada – e isso mais tarde se refletirá como um dos grandes trunfos do enredo. No entanto, o grande embate assume a posição de clímax da narrativa, mas não é o foco do filme. A obra tem como ponto principal a evolução de Adonis como pessoa, a necessi-

MICHAEL B. JORDAN E SYLVESTER STALLONE COMO ADONIS CREED E ROCKY BALBOA.

DOLPH LUNDGREN E FLORIAN MUNTEANU COMO IVAN E VIKTOR DRAGO

50 | zint.online


dade de deixar o fatal orgulho hereditário de lado e aprender a lidar com os problemas menos glamourosos que o cerca fora do ringue. As cenas de luta, na verdade, servem como um reflexo da verdadeira batalha dos personagens: os conflitos familiares. DO RINGUE ÀS TELAS Para conseguir manter uma narrativa de superação já tão conhecida pelos fãs de Rocky, o diretor Steven Caple Jr. teve que apostar em cenas de drama para complementarem os confrontos de Creed II. O resultado é um mix de ansiedade e de torcida, que é ampliada ao sabermos o que está em jogo para Donnie e para Viktor, nos fazendo torcer por Creed, mas ainda assim sentir pena de Drago. A atuação de Michael B. Jordan é a grande catalisadora de todos esses sentimentos, já que o ator entra tão bem no personagem que todas as suas emoções parecem incrivelmente legitimas, gerando uma empatia tão intensa que faz com que soframos cada um dos dramas e problemas de Adonis. Esse é um dos pontos que distanciam o personagem de Apollo, que tinha uma arrogância tão grande que dificilmente despertava compreensão nos espectadores. Da mesma forma, podemos enaltecer Dolph Lundgren, que deixou o personagem robótico, praticamente sem sentimentos e sem expressões nenhuma em Rocky IV, e trouxe para as telas um pai e um treinador orgulhoso, com fortes sentimentos de vingança, preparando seu filho para a honra de trazer o campeonato mundial para a família. No entanto, Florian Munteanu assume todo o personagem robótico estereotípico que torcíamos para ter ficado no roteiro passado, sem expressar sentimentos nenhum, se destacando apenas nas cenas de luta – o que na verdade

não é nada impressionante já que antes de atuar, ele já era conhecido por ser boxeador profissional. Mas o destaque de atuação, mais uma vez, retorna para Sylvester Stallone, que mesmo após anos, interpreta o garanhão italiano de forma perfeita. Mesmo sem participar das famosas cenas de ação por quais o ator ficou conhecido nos cinemas, Stallone dá um show nas sequências dramáticas, cativando-nos com sua doce atitude paternal e nos envolvendo no triste fado do antigo campeão mundial de boxe, que após chegar ao auge de sua carreira, se encontra praticamente sozinho ao lidar com suas próprias tragédias familiares. E quando falamos em tragédias familiares, Creed II é o especialista nisso, às vezes forçando até demais os dramas na vida de Adonis para tentar despertar uma afinidade com a audiência que, para ser sincera, já havia sido criada há muito tempo. Em certo momento do filme, temos que deixar alguns dos desfortúnios de lado para que possamos de fato prestar atenção no enredo do filme. A impressão é que, ao humanizar o adversário de Creed, os produtores tiveram medo de que o protagonista não se manteria pelo próprio carisma, apelando pela piedade do público, o que acaba na verdade, irritando muitas vezes ao longo da projeção. No entanto, o final de Creed II acaba sendo auto-suficiente para emocionar a todos, com sentimentos naturais vindos da boa atuação. O roteiro reciclado acaba se mostrando como uma alegoria para a situação de Adonis Creed, que se encontra exatamente no lugar de seu pai e precisa se mostrar melhor para conquistar o publico. Assim como seu protagonista, o filme cumpre sua tarefa gloriosamente, entregando o que prometeu, sem impressionar muito, mas trazendo muita nostalgia para aqueles que já eram fãs e conquistando alguns novos. //

zint.online | 51


THE USA IS A DICK (CHENEY)

por joão dicker INDEPENDENTE de qualquer crítica ou elogio, é inegável que VICE (2018) é um filme político, politizado e autoral. Escrito e dirigido por Adam McKay, que volta a direção de um longa-metragem depois do premiado A Grande Aposta (2015), a nova película carrega a identidade cômica do diretor em sua essência, mas dessa vez com um discurso político mais articulado e crítico. Se no projeto antecessor McKay propôs uma análise cômica, ácida e didática a respeito da crise econômica de 2008, em Vice ele volta seu olhar para a história de Dick Cheney (Christian Bale), uma das figuras políticas mais marcantes da história recente dos EUA. De cara, o diretor dá o tom do filme ao situar o espectador de que o que estamos assistindo é inspirado por fatos reais, mas que o trabalho de adaptação da vida de Cheney para as telonas to-

52 | zint.online

diagramação vics

mou liberdades criativas graças à forma sorrateira com que o político construiu sua trajetória e atuação política dentro da Casa Branca. Assim, McKay cria um roteiro que apesar de inconsistente e um pouco bagunçado, consegue propor recortes da vida do personagem – e sim, mesmo que se trate de uma cinebiografia, Vice é acima de tudo um estudo de personagem. Dito isso, acompanhamos Cheney desde sua juventude desajustada e um pouco perdida, até seu ingresso na vida política e sua ascensão na máquina pública dos EUA. A cada cena percebemos como aquele homem vai aprendendo a jogar as regras do jogo, muitas vezes as burlando para conquistar seus objetivos e crescer dentro da Casa Branca, ao passo que também acompanhamos um pouco da sua vida pessoal. Diferente do que é feito na maioria das cinebiografias, McKay não tenta humanizar Cheney em momento al-


gum, nem mesmo quando trabalha melhor a imagem de sua esposa (interpretada por uma excelente, carismática e intensa Amy Adams) ou quando problematiza as atitudes tomadas por ele em relação a sexualidade de uma de suas filhas. Todas as decisões do diretor estão de acordo com seu posicionamento ideológico frente ao que o político representa e a toda a máquina conservadora existente nos EUA, formada por uma mídia ideológica e por um assustado Partido Republicano pós 11 de setembro – e neste sentido ele utiliza do atentado terrorista para problematizar diversas das políticas internacionais e protecionistas adotadas pelo país nas últimas duas décadas. Este manifesto político engraçado e didático é a principal virtude do roteiro confuso e repleto de digressões narrativas. É justo dizer que McKay faz o melhor que pode ao tentar contar a história de um homem sorrateiro, cheio de segredos inimagináveis e desconhecidos, mas a forma como ele estrutura a narrativa se baseando em muitas elipses e em acontecimentos em blocos dá uma sensação de que estamos assistindo seguidos esquetes de humor. Talvez seja um resgate de quando trabalhou como roteirista do Saturday Night Live, mas a falta de uma coesão narrativa mais direta tornam os acontecimentos bagunçados. O que não funciona tão bem quanto em A Grande Aposta é o uso do narrador consciente, que apesar de brincar com a impossibilidade de completar certos diálogos e acontecimentos justamente pelo desconhecimento público do que se deu, se torna um artifício narrativo que desgasta o espectador. Compensando a densidade de informações históricas e o roteiro inconsistente, Christian Bale carrega o filme para outro nível. Conhecido por se entregar de corpo e alma aos papéis, o ator desaparece em seu próprio corpo ao engordar e replicar os trejeitos físicos, vocais e comportamentais de Cheney. É mais uma atuação im-

pressionante de Bale, que consegue transmitir a destreza silenciosa com que aquele homem planejou sua ascensão para o posto de Vice Presidente dos EUA, transformando o cargo, assumindo responsabilidades e um poder quase que supremo, capaz de lhe garantir meios e liberdade para cometer atos (no mínimo) questionáveis. O restante do elenco também é muito bom. Amy Adams e Sam Rockwell garantem personalidade a personagens pouco trabalhados pelo roteiro, e no caso do George Bush Jr. vivido por Rockwell, a coragem com que McKay o constrói como um mimado inexperiente é muito interessante. Apesar de carismático e divertido, Steve Carell vive um Donald Rumsfeld caricato e muito parecido com diversos outros papéis que o ator mostrou em sua carreira. Assim, o que fica ao final é que mesmo que com um roteiro bagunçado e inconsistente, Vice é uma cinebiografia muito interessante. Graças a impressionante atuação de Christian Bale e a acidez que Adam McKay apresenta Dick Cheney (e tudo o que ele representa), o filme se sustenta com um divertido, engraçado e forte discurso político contemporâneo. //

OSCAR 2019 8 INDIC AÇ ÕE S 1 VITÓRIA

MELHOR MAQUIAGEM E PENTEADO GREG CANNOM, KATE BISCOE, PATRICIA DEHANEY

zint.online | 53


O mundo da arte como sátira por

joão dicker

Desde que estreou como diretor com o excelente O Abutre (2015), Dan Gilroy deixou uma expectativa quanto ao que sua jovem carreira como cineasta traria ao cinema. Se em seu primeiro filme o diretor propos uma sátira seca e irônica do sensacionalismo jornalístico, em VELVET BUZZSAW, estreia recente da Netflix, Gilroy retoma seu olhar satírico, para falar criticar o afetado o mundo da arte. O roteiro, também assinado por Gilroy, acompanha a história do crítico de arte Morf Vandewalt (Jake Gyllenhaal), que entra em uma espiral de aconte-

54 | zint.online

diagramação

vics

cimentos sobrenaturais após as obras de arte de um desconhecido e falecido artista alcançarem o estrelato no circuito de museus de Los Angeles. Com o reconhecimento dos trabalhos, a fama e o consequente desejo de lucrar com as obras por parte dos galeristas, alastra-se uma maldição sobre todos os principais nomes da elite da arte da cidade. A principal virtude do longa-metragem é, justamente, a forma satírica com que o cineasta constrói sua narrativa. Já nas cenas inicias acompanhamos um evento de abertura de exposição, em que percebemos a competição existente na corrida capitalista de monetização da arte. E quando somos levados a refletir a respeito de


toda a afetação existente no glamour e na suposta erudição existente no segmento, percebemos como há uma hipocrisia latente em cada um dos personagens que trespassam a vida do protagonista – e nele próprio. Assim, Gilroy combina elementos de terror slasher e sobrenatural, a doses de um humor desconjuntado pautado nos excessos das situações apresentadas, seja na afetação, futilidade ou erudição. É um roteiro que acaba entregando um resultado de tom desconjuntado, tornando o filme em uma mistura de gêneros que não se assumem propriamente. A confusão é também sentida na quantidade de personagens que transitam na trama. A superficialidade desta high society de arte é latente a construção de personagens, que são todos interpretados com cargas de excesso e afetação por um ótimo elenco estrelado. Jake Gyllenhaal é quem carrega o filme com uma atuação magnética, vivendo um personagem com falhas morais em sua vida pessoal, deixando que estes erros acabem entrando para

a esfera profissional. A constante variação de um comportamento arrogante para uma atuação que gera empatia transforma o crítico em um interessante peão em jogo de poder. Dos componentes de elenco de apoio quem é mais priorizada pelo roteiro é Zawe Ashton, que apesar dos evidente esforço de criar uma personagem que aprende a crescer com as regras do jogo em que está inserida, não edifica uma transformação crível – tanto nas emoções quanto no seu arco. Toni Collete e Rene Russo garantem prendem os olhos do espectador quando estão em cena, abraçando as afetações e exageros de suas personagens, roubando a tela sempre que aparecem. Já John Malkovich e Daveed Diggs tem pouco o que fazer, participando para dar rosto e corpo à representações batidas do mundo arte: Malkovich é o artista consagrado que vive uma crise de criatividade, enquanto Diggs faz um artista contemporâneo de origens do gueto urbano. Dentro de toda a satírica e engraçada confusão que é a narrativa, fica a sensação de que Gilroy não encontrou o tom que queria. De forma trágica, dá falta de um terror que a todo o momento se enuncia, mas que em momento algum se edifica, e na carência de uma tensão forte para o mistério construído, Velvet Buzzsaw cria para si uma aura diferente das obras assassinas de seu enredo: um constante potencial que é alcançado em discurso, mas não em forma. //

VELVET BUZZSAW DISPONÍVEL PARA STREAMING NA NETFLIX.

2019; 1h53; Drama, Horror, Satírico zint.online | 55


Os Encontros e Desencontros Melancólicos de um Amor por

joão dicker

diagramação

56

vics


Quando a lista dos indicados ao Oscar de 2019 foi revelada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, o nome de Pawel Pawlikowski entre os concorrentes a Melhor Diretor surpreendeu a muitos. Contudo, o trabalho que o polonês faz em GUERRA FRIA é merecedor de todos os elogios e premiações possíveis. Assim, Pawlikowski entrega um filme intimista e sensível sobre os encontros e desencontros de duas vidas que se cruzam devido ao amor. Na trama acompanhamos as idas e vindas da relação de Wiktor (Tomasz Kot) e Zula (Joanna Kulig), um amor que percorre 15 anos. Unidos pela música folclórica polonesa e ligados por uma forte paixão, o casal é a definição de dois opostos que se atraem. Ele é um músico experiente, ela é uma jovem com talento para desenvolver. Ele é o resquício de um mundo em transformação pela guerra, enquanto ela é o fôlego de um novo mundo que chega a todo vapor. Dos desencontros criados pela personalidade de cada um, os breves momentos de carinho e os cometimentos causados por um continente mergulhado em um contexto de tensão, somos convidados a acompanhar o florescer de um amor tão íntimo e intenso, quanto desolado e insólito. Existe uma carga histórica e cultural marcante em Guerra Fria, com as canções folclóricas polonesas possuindo devida importância na trama, na relação

dos protagonistas e no tom lírico do filme, mas a beleza com que Pawlikowski filma os números musicais torna tudo orgânico e agradável. Neste sentido, todo o trabalho estético da direção é magistral, desde a escolha por filmar na tela quadrada 4:3 e por uma fotografia em preto e branco, que tornam o clima do filme mais melancólico. A fotografia explora um jogo de sombras muito bonito, que fica ainda mais estonteante nas cenas noturnas da Paris boemia em que o casal passa boa parte da trama. A forma como Pawlikowski dirige seus atores é impecável e a entrega em que ambos dão aos seus papéis torna tudo ainda mais potente. Os sentimentos de afeto, carinho, ciúmes, raiva, solidão, saudade e desejo existem na relação, mas são demonstrações destinadas a olhares, toques, sorrisos, beijos e lágrimas profundas e intensas. É uma construção de um relacionamento pautado pela sutileza de um amor que passa por longas pausas e separações, mas que em momento algum se permite diminuir. De tanta intensidade e melancolia, brilham as atuações de Tomasz Kot e Joanna Kulig. Ela, principalmente, transita entre a euforia, energia e encanto para a tristeza e desolação com uma facilidade arrebatadora, emanando um magnetismo da tela. Com seu desfecho melancólico e poético, Guerra Fria entrega uma bonita, tocante e dura história de amor. Uma jornada marcada pelos encontros e desencontros de duas pessoas que se entendem, completam e encontram no mundo por meio de um sentimento tão intenso quanto melancólico. //

zint.online | 57



[

televisĂŁo

]


por vitória silva di ag r a m aç ão vics

a quebra da família tradicional norte-americana 60 | zint.online


NOTA DO COLAB: ESTE TEXTO CONTÉM LEVES SPOILERS.

Imagine

um retrato de uma típica família norte-americana. Agora substitua por uma mãe ex-militar divorciada, uma filha lésbica, um filho latino e uma avó imigrante cubana. Essa é a receita perfeita e incomum que deu origem a (nova versão da série) ONE DAY AT A TIME. Produzida pela Netflix e lançada em 2017, a produção é um reboot da sitcom de mesmo nome, originalmente lançada em 1975. Ambientada na cidade de Los Angeles, esta versão retrata o cotidiano da família cubano-americana Alvarez, formada por Penelope (Justina Machado), Elena (Isabella Gómez), Alex (Marcel Ruiz) e Lydia (Rita Moreno). Justina interpreta uma veterana do corpo de enfermagem do exército dos Estados Unidos, com o desafio de criar seus dois filhos após se divorciar do seu marido alcoólatra. A matriarca conta com a ajuda de sua mãe Lydia, uma imigrante que deixou Cuba durante a ditadura de Fidel Castro – em um episódio histórico conhecido como Operação Pedro Pan, um êxodo em massa de mais de 14 mil cubanos menores de idade desacompanhados. A filha mais velha, Elena, é extremamente engajada em causas sociais, diferente de seu irmão, Alex, que ainda tem muito a aprender com os problemas da adolescência e passa grande parte do tempo sendo mimado por sua avó.

Outros personagens acabam integrando o ambiente familiar do apartamento dos Alvarez. Um deles é Schneider (Todd Grinnell), canadense e síndico do prédio, que acaba assumindo uma imagem paternal para Elena e Alex e é um dos maiores alívios cômicos da série. Além dele há o Dr. Leslie Berkowitz (Stephen Tobolowsky), chefe de Penelope, que assume a posição de “fiel escudeiro” de Lydia e acaba por tornar os desastres da sua vida, em especial a difícil relação com sua filha, em algo tragicômico. Na primeira temporada, o grande enfoque é a questão LGBTQI+ por meio do arco de Elena, que se assume lésbica para a família, posteriormente precisando lidar com todo o processo de aceitação por parte de seus parentes (e dela mesma). Já na segunda temporada, assuntos como depressão, xenofobia e a relação dos imigrantes nos EUA são trabalhos na série em grande profundidade, sempre de uma forma leve e educativa.

No site, a ZINT fez uma publicação listando sete motivos para você assistir One Day at a Time. Para ler a postagem, clique aqui!

zint.online | 61


Após ser ameaçada de cancelamento, One Day At A Time conseguiu ser renovada para uma terceira temporada, principalmente graças ao apoio dos fãs nas redes sociais. Com a sequência garantida, o novo ano levantou diversas questões pertinentes na sociedade, como, por exemplo, a ansiedade e o alcoolismo. No entanto, apesar de manter a variação entre o drama e o humor, é notável uma escassez de fôlego em relação ao desenrolar as temáticas, com algumas discussões extremamente rasas e que rodeiam o humor escrachado. A temporada não tem uma linha cronológica bem definida, com episódios que parecem independentes uns dos outros, em que a duração do castigo do Alex e a “bouquet list” de Lydia são alguns dos pequenos detalhes que estabelecem uma conexão e conseguem nos localizar no tempo. Dessa forma, os temas

62 | zint.online

Na primeira imagem abaixo, da esquerda pra direita: Melissa Fumero, Gloria Estefan, Rita Moreno, Justina Machado e Stephanie Beatriz no S03E01.


abordados acabam soando avulsos e pouco desenvolvidos nos 25 minutos de cada episódio. Ainda, o peso dramático dado a cada um destes assuntos não possui um devido balanceamento, tendo questões como o alcoolismo de Schneider sofrendo com a falta de aprofundamento, enquanto simples conflitos entre irmãos são excessivamente dramatizados, beirando a exaustão. Mesmo com decaídas na nova temporada, ainda restam elogios à One Day At A Time, principalmente no quesito atuações. A começar por Justina Machado, que merece grande destaque por ainda conseguir estabelecer a ponte perfeita entre o cômico e o dramático, sem causar um efeito brusco e “novelesco”. Mas a premiada Rita Moreno é quem consegue roubar o foco da série em todos os segundos de aparição na tela. Desde sua primeira entrada teatral em meio às cortinas, a atriz transparece naturalmente à fidelidade cubana de Lydia, especialmente no seu sotaque forte – e ainda há, é claro, as diversas entregas das melhores tiradas da série. Entre os principais destaques da nova tem-

porada estão também às participações especiais, que contam com duas atrizes já bem conhecidas pelo público das sitcoms: Melissa Fumero e Stephanie Beatriz, ambas da série Brooklyn Nine-Nine, além da intérprete da música-tema da série, a veterana cantora cubana Gloria Estefan. Além disso, o roteiro dá mais espaço para a terapia em grupo da qual Penelope participa, tornando este espaço um refúgio da personagem para tratar sobre seus problemas pessoais e questões familiares. One Day At A Time se arrisca – e faz isso muito bem – ao misturar o drama com a comédia, em uma abordagem mais leve e um humor mais fraco que o de temporadas anteriores. Mas é sempre de suma relevância ressaltar a importância da sitcom, que trata de pautas extremamente pertinentes nos dias atuais, estimulando diversas reflexões ao mesmo tempo que entretém. Além disso, a produção consegue se destacar no meio da grande maioria de concorrentes, que repetem a mesma fórmula e muitas vezes não conseguem passar da supercialidade e entreguem (muito) menos do que o planejado. Uma coisa é certa: não há como assistir One Day At A Time sem se identificar com as personagens ou com os próprios conflitos de gerações vividos entre eles. A vida dos Alvarez tem conquistado um público cada vez maior, que se sente extremamente acolhido e representado no cotidiano da família cubana. Que venha uma próxima temporada! //

ASSISTA

ONE DAY AT A TIME NA NETLIX.

zint.online | 63


64


Bem-vindos ao

Novo Mundo por bruna curi diagramação vics

NOTA DO COLAB: ESTE TEXTO CONTÉM LEVES SPOILERS. 65


E

xibida originalmente no canal Starz (e pelo Fox Premium 1, aqui no Brasil), OUTLANDER é uma série que vem conquistando uma legião de fãs. A trama conta uma história de amor através dos séculos entre Claire (Caitriona Balfe) e Jamie Fraser (Sam Heughan). Depois de lutarem para ficar juntos, a série retorna em sua quarta temporada, apresentando novos desafios para o casal. Os acontecimentos da quarta temporada se passam pouco tempo depois do final da terceira. Após o naufrágio do navio em que os Fraser viajavam, indo da Jamaica para a Escócia, Claire, Jamie, Fergus (César Domboy), Marsali (Lauren Lyle) e o Jovem Ian (John Bell) descobrem estar na América do Norte, especificamente no Novo Mundo – que, há alguns anos dalí, passaria por uma Revolução rebatizando-o para Estados Unidos das Américas. A situação pode não ser muito favorável, mas o importante é que eles permanecem juntos e unidos. AMÉRICA, A GRANDE Voltar para a Escócia pode ser um pouco complicado, de forma que eles decidem se estabelecer na colônia americana e tentar a sorte por lá. Em um primeiro momento, o grupo decide morar na propriedade da tia Jocasta (Maria Doyle Kennedy), irmã da mãe de Jamie. A oportunidade de prosperar por lá é muito grande,

66 | zint.online

ainda mais que Jocasta deposita muita confiança nos serviços de Jamie, mas a escravidão presente na propriedade se torna um grande empecilho. Por ter a mentalidade do século XX e ser uma mulher à frente de seu tempo (figuradamente e literalmente), Claire se posiciona constantemente contra a escravidão. Para ela, essa é uma prática desumana e que deveria ser abolida. Dessa forma, o casal começa a procura por uma nova terra onde eles possam se estabelecer e construir uma nova vida. É assim que surge a Fraser’s Rigde. A tarefa de construir uma nova casa pode ser exaustiva, mas não foi um dos maiores desafios enfrentados por Claire e Jamie. Depois de tudo que passaram, a perspectiva de uma nova vida, em uma nova terra, é uma ideia agradável – mesmo que eles saibam que restam poucos anos para a Revolução Americana, e que Jamie, por ter aceitado terras da Sua Majestade, provavelmente será convocado para lutar pela Coroa. Paralelamente, em 1969, o público de Outlander tem a oportunidade de acompanhar a vida de Brianna (Sophie Skelton), filha de Claire e Jamie. A jovem adulta vem fazendo o melhor para seguir com sua vida desde que se separou de sua mãe (quando, na terceira temporada, Claire voltou para o passado, para reencontrar Jamie), mas percebe que o sofrimento é inevitável. Ela


está orfã de seu pai e sem a presença da mãe na mesma época. É nesse momento conturbado que Brianna se aproxima de Roger (Richard Rankin). Enquanto ele está completamente apaixonado por ela, Brianna se sente confusa e tem medo de entregar totalmente à ele, com a relação dos dois logo sendo colocada a prova quando Brianna decide ir, em segredo, para o século XVIII na tentativa de encontrar com seus pais e alertá-los de um incêndio que pode causar suas mortes.

FAMÍLIA REUNIDA, POLÊMICAS A PARTE Por mais que Brianna seja uma jovem destemida, com o espírito de uma verdadeira guerreira das Terras Altas e teimosa como seu pai, Jamie, se aventurar no passado não é uma tarefa nada fácil. Até conseguir se reencontrar com seus pais, Brianna percorre uma longa trajetória (em um arco que traz brevemente personagens antigos) e enfrentar alguns perigos pelo caminho (mostrando a grande ironia sadística do destino).

CAITRIONA BALFE E SAM HEUGHAN ESTRELAM A SÉRIE COMO CLAIRE E JAIME

zint.online | 67


Mas é nessa história que Outlander dá a oportunidade de Brianna ter o primeiro contato com Jamie, em um arco narrativo marcado por grandes altos e baixos e, claro, cheio de expectativas e muito esperado pelos fãs. Mas o que era para ser um encontro emocionante entre pai e filha, acaba ficando algo meio “frio” na concepção de alguns telespectadores, que esperavam um pouco mais de emoção. Porém, a cena chega a ser compreensível quando se leva em conta o contexto de que Brianna e Jamie acreditavam profundamente que só a ideia de se conhecerem seria completamente impossível – ele não tem a capacidade de viajar no tempo, e ela nunca havia planejado passar pelas Pedras que levaram sua mãe para o passado. As polêmicas continuam, se estendendo pelo personagem Roger. Se na terceira temporada de Outlan-

68 | zint.online

EM UM DOS MOMENTOS MAIS ESPERADOS DE OUTLANDER, BRIANNA E JAIME SE CONHECEM PELA PRIMEIRA VEZ, REUNINDO A FAMÍLIA FRASER NO MESMO SÉCULO.

der ele parecia ser um cara fofo, sensato e perfeito para Brianna, a situação se inverte na quarta temporada. Roger não aceita ser contrariado por Brianna levando os dois a constantemente brigarem, eventualmente deixando a jovem em uma posição vulnerável após uma discussão que parece marcar o fim definitivo do casal.


Tanto Roger quanto Jamie têm algumas atitudes machistas (um é fruto da década de 70, enquanto o outro é do século XVIII), como é perceptível em alguns episódios, mas a diferença é como os dois lidam quando suas ideias são confrontadas. Sempre que discutem, Claire e Jamie tentam chegar a um entendimento, com Claire explicando seu ponto de vista e Jamie tentando aprender com o momento. Enquanto isso, Roger dificilmente dá o braço a torcer e aparenta querer apenas o controle de Brianna, exercendo seu papel de “dominador” como o homem da relação. Além disso, muitas pessoas comentaram sobre a forma que a série abordou o episódio de estupro de Brianna. Por mais que a Starz tenha avisado,

SOPHIE SKELTON E RICHARD RANKIN COMO BRIANNA E ROGER através do Twitter e antes do episódio, o gatilho que o episódio continha, a cena não deixou de chocar o público. Muitos espectadores chamaram atenção ao fato de que a cena foi ao ar no mesmo episódio em que a personagem perdeu a virgindade. No livro, os dois acontecimentos são próximos, afim de gerar a dúvida a respeito da paternidade do filho de Brianna. Contudo, colocar essas duas cenas, do sexo consentido e o não consentido, no mesmo episódio, gerou uma relação complicada. Existem diversas ferramentas narrativas que poderiam ter sido usadas para retratar uma cena tão pesada. De todas as temporadas de Outlander, a quarta temporada é a mais instável de todas. Apesar do belo cenário e dos figurinos, Brianna e Roger não são personagens tão carismáticos como Claire e Jamie. Agora, resta torcer para que a série encontre o caminho correto em sua quinta temporada. //

ASSISTA

OUTLANDER NA FOX PLAY.

zint.online | 69


É PRECISO VOLTAR PARA SE CONHECER por

debora drumond

O mês de fevereiro animou os fãs de Orange Is The New Black com a estreia da nova produção original da Netflix, Boneca Russa, protagonizada por Natasha Lyonne – a Nicky Nichols, de OITNB. Além de estrelar, a atriz também assina o roteiro da trama, juntamente com Leslye Headland e Amy Poehler – parabéns à Netflix por produzir mais um projeto feito por mulheres!

70 | zint.online

diagramação

vics

Na série, Natasha interpreta Nadia, uma mulher misteriosa e independente, que carrega muitos traumas consigo mas prefere curtir a vida ao invés de curá-los. Sua trajetória começa em sua festa de aniversário planejada por uma de suas melhores amigas, Maxine (Greta Lee). Ao sair da comemoração, no caminho de volta para casa, ela avista seu gato perdido, Oatmeal, mas ao atravessar a rua ela é atropelada por um táxi e morre. É aí que o inesperado aconte-


ce: ela recupera a consciência na mesma cena em que a série se inicia, no banheiro na casa de Maxine, durante a festa, ao som de Gotta Get Up, de Harry Nilsson. A partir daí, Nadia entre em looping, morrendo e retornando à cena do banheiro. De início, ela pensa que tudo é uma viagem causada pelo baseado, teoria que prova-se errada após uma investigação sobre sua composição. E é durante todo esse processo, após várias tentativas falhas de solucionar essa brecha no tempo-espaço, que Nadia conhece alguém que está passando pela mesma situação que ela: Adam (Charlie Barnett). Coincidentemente, as mortes de Adam também o levam a um banheiro, mas ele revive o pior momento de sua vida: a noite em que sua namorada termina com ele. Ao contrário de Nadia, Adam se deixa afetar profundamente por seus traumas se tornando um adulto depressivo. Juntos, eles tentam descobrir se existe alguma lógica em todo esse caos e porquê eles estão vivendo isso juntos. Durante essa jornada de descobertas, o

título da série, Boneca Russa, começa a fazer sentido. Se antes Nadia era alguém que fugia dos próprios demônios e pensava que intimidade era algo ruim, passa a tentar entender seus conflitos e demonstrar o quanto se importa com aqueles ao seu redor. Assim como uma boneca russa, em que ao abrir cada uma ficamos próximos daquela que é sólida, a cada um dos oito episódios desvendamos novas camadas de Nadia e chegamos mais perto de sua essência. O mesmo acontece com o roteiro da série: de início, parece ser apenas uma comédia mórbida sobre quantas mortes ela terá, ou sobre a expectativa de que ela encontre seu gato – o único vínculo que ela se permite criar. No entanto, passamos a nos questionar sobre como ignoramos nossos traumas ou como nos deixamos afetar por eles. Começamos a notar que devemos prestar mais atenção ao que acontece em torno de nós. Ao final dos episódios, encontramos a verdadeira Nadia e o verdadeiro Adam, mas talvez encontramos um pouco dos verdadeiros nós. Em tempos que depressão e ansiedade, que tem se tornado parte da vida de mais e mais pessoas, é importante que conteúdos como Boneca Russa sejam produzidos. De forma sutil, a série cativa a audiência e a faz refletir sem demonstrar de cara esse objetivo. Contrapondo diálogos inteligentes com momentos cômicos, Boneca Russa traz uma nova forma de refletir, sem ser tão Black Mirror sabe. //

ASSISTA

BONECA RUSSA NA NETLIX.

zint.online | 71



[

PLAYLISTS

]


play lists

a revista possui suas próprias playlists temáticas, fruto das matérias que produzimos. ao todo, são 48 listas, que você pode usufruir e escutá-las pelo Deezer, Spotify e Youtube!


PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!

PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!


PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!

PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!


PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!

PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!


PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!

PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!


PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!

PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!


PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!

PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!


PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!

PARA ACESSAR AS PLAYLISTS, CLIQUE NA IMAGEM CORRESPONDENTE!




« Edição Anterior

Próxima Edição »


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.