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Jorge Kanehide Ijuim
Faculdade de Artes e Comunicações da Fundação Educacional (FAAC) de Bauru, mestre em Ciência da Comunicação pela Faculdade Cásper Líbero (FCL) e doutor pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, também leciona na Universidade Federal de Santa Catarina.
Foto: Arquivo Pessoal Ao receber o convite para esta entrevista, Ijuim foi muito receptivo. Sua resposta foi tão diferente e emocionante, que se tornou o motivo para ser mantida em seu formato original.
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Minhas vivências na UFMS
“Chegada Desembarquei em Campo Grande em fevereiro de 1994. Fui recebido pela professora Lúcia Mont’Serrat então chefe do Departamento de Comunicações e Artes (DAC), e pelo coordenador do curso na época professor Edson Silva. Iniciava-se um desafio em terras estranhas após ter passado por quase treze anos na Unesp de Bauru. A adaptação foi mais rápida e tranquila do que eu imaginava. Assumi disciplinas e tarefas que estava bem à vontade para cumprir. Tive apoio e estímulo para desenvolver as atividades, o que ajudou a estabelecer uma atmosfera favorável para minha integração ao curso e à Universidade. Estávamos nos fins do governo Itamar Franco e início da gestão de Fernando Henrique. Nesse meio de caminho houve alguns percalços.
Meio do caminho
O governo FHC foi marcado por restrições econômicas drásticas. O recente implantado Plano Real trazia como “júbilo” o controle inflacionário, mas carregava no seu bojo uma onda de cortes que atingia aspectos essenciais para a consecução das atividades fins da Universidade, como em pessoal e infraestrutura.
Pessoal e infraestrutura
Em meados da década de 1990, o quadro de professores do curso era razoável, mas sobre ausências inesperadas como duas aposentadorias (uma delas por invalidez), colegas que se afastaram para qualificação ou por cedência ao Governo do Estado. A política econômica federal congelou contratações de qualquer tipo de servidor. O time da casa tinha que dar conta de todo o trabalho. Certa vez, o colega Edson Silva se deu conta de que contávamos com apenas cinco professores efetivos (e outros cinco substitutos) e lamentou que ‘nosso curso cabia em um fusca’. Se não bastasse, os investimentos em equipamentos para o ensino caíram a zero. Uma sala informatizada – a nossa Redação – instalada no início dos anos 1990 sobreviveu quase 20 anos sem renovação significativa; teve apenas alguns upgrades paliativos. Na área de TV, não fossem iniciativas individuais de alguns colegas, estariam ainda na era Betacam. A produção laboratorial, por isso, era desenvolvida muito mais pela criatividade e esforço de professores e estudantes do que pela retaguarda disponível. A equipe de técnicos – sempre minguada – foi reforçada temporariamente por profissionais terceirizados, contratados via projeto junto a uma fundação. Mas essa prática foi logo interrompida por questionamentos à sua legalidade. Sobre salas de aula, a grande maioria delas, eram mal mobiliadas, as aulas tinham que acontecer na base de quadro e giz. Os velhos retroprojetores viviam com as lâmpadas queimadas. O primeiro Datashow disponível era “disputado a tapas”. A falta de espaço físico fez com que partíssemos para o improviso, fechando corredores para ganhar mais duas salas de aula. Esse espaço criado “na marra” foi apelidado carinhosamente (ou ironicamente) de “favelinha”. Eu me orgulho de ter ministrado muitas aulas nessa favelinha.
Equipe de fôlego – conquistas
O bom da história é que sempre contamos com uma equipe de fôlego. Se as condições de trabalho não eram as melhores, a disposição, o empenho e o desprendimento de pessoas valorosas mantiveram o curso em pé. Vieram os anos 2000 e tivemos um momento, para mim, especial. Eu e Marcelo Cancio formamos uma dupla para enfrentar o desafio de comandar o curso. O Marcelo como chefe de departamento e eu na coordenação do curso. Batemos de porta e porta em todos os setores da Universidade – das pró-reitorias ao GRM. Naquele momento, também conseguimos estreitar as relações com a TV e Rádio Educativa, do Estado. Na falta de um estúdio de rádio suficiente, o sempre disposto professor Robson Ramos levava os alunos à Rádio Educativa para a produção de programas ao vivo. Se os resultados eram tímidos (ou só paliativos), o clima de boa vontade e desejo
de superação foram extraordinários – e contagiantes. Essa atmosfera, no meu entender, refletiu na qualidade do ensino. Por exemplo, os projetos experimentais – o momento alto do curso – eram vigorosos e de alta relevância social. Outro episódio que nos orgulhou muito foi o fato de, pela primeira vez, em 2003 (ou 2004?) o curso de Jornalismo teve “A” no Provão, o Exame Nacional de Desempenho do Inep. Conquistas como estas só foram possíveis pelos esforços individuais e coletivos, em outros termos, pelo privilégio ao relacionamento humano.
Penso, logo existo
Se a infraestrutura, as tecnologias atualizadas ou as condições de trabalho nunca foram os pontos fortes do nosso curso, o grande empenho pela conjugação entre “ação e reflexão” sempre foi sua marca. O esforço contínuo e persistente pela qualificação dos professores, a atenção à pesquisa e à extensão repercutiram de força consistente no maior interessado – o estudante. Enquanto outros cursos do Estado estavam muito bem estruturados, equipados com tecnologias de última geração, nosso curso se destacava pela dedicação ao pensar. Ainda assim, o Projétil nunca deixou de circular, vários alunos venceram concursos de reportagens – no Estado e também nacionais. No encontro do Intercom Centro-Oeste, sediado na UFMS em 2006, nosso curso foi o que apresentou o maior número de trabalhos – professores e acadêmicos.
Saída
Algumas realizações que considero muito importantes foram minha participação em algumas ações fundamentais para os passos futuros do curso. O primeiro que gostaria de destacar foi liderar um grupo de pesquisa sobre Narrativas (cadastrado no CNPq) durante dois anos. Seus membros eram todos alunos e ex-alunos do curso e hoje vários deles já defenderam o mestrado e/ou o doutorado e são professores em várias instituições pelo país.
Outro momento relevante foi a reestruturação do projeto pedagógico do curso, em 2006-2007, quando tive atuação intensa especialmente na fundamentação do novo projeto. Um terceiro foi tomar parte em uma comissão que deu os primeiros passos para a implantação de um mestrado em Jornalismo, entre 2005 e 2006. Este não pode se concretizar naquela época, mas ajudou a criar um espírito de corpo que tornou possível esta conquista mais tarde.
privilégio de liderar, no sentido de constituir o Núcleo de Jornalismo Científico. Este começou com um seminário sobre o tema e a edição de uma revista, em 2006. Em seguida, elaboramos um projeto e o apresentamos ao Ministério de Ciência e Tecnologia. Aprovado, iniciamos sua implantação, mas não houve tempo para que eu visse pessoalmente este sonho se concretizar. Em fevereiro de 2008, me transferi para a UFSC. Após quase oito anos em Florianópolis, quando me perguntam se sinto falta de Campo Grande e da UFMS, eu respondo que sim e que não. Por quê? Porque não me apego a lugares, me apego a pessoas. Não sinto falta dos prédios ou da instituição UFMS, nem das casas e avenidas de Campo Grande. Sinto falta das pessoas da UFMS e de Campo Grande. Sinto falta de pessoas valorosas com Maria Francisca Marcello e Mario Marques Ramires, que infelizmente não estão mais entre nós, de técnicos administrativos como Telma D. Vera. Alunos... são tantos que não convém mencionar para não cometer injustiças. Sobre esses 14 anos de UFMS não tenho necessariamente um mar de lamentações, mas a consciência de muitos desafios extraordinários, e muito para agradecer.