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(Re) significar: a liberdade de uma vida sustentável
(RE) significar
A liberdade de uma vida sustentável
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Escrito por Isabel Piccoli e Paula Luiza Eloy
Em algum momento você já ouviu ou leu essas cinco palavras: reduzir, reutilizar, reciclar, recusar e repensar. São os 5 Rs da sustentabilidade. Mas, incluir o termo ressignificar, faz todo o sentido, afinal, não são as grandes atitudes que movem o mundo, e sim, as pequenas transformações no dia a dia que favorecem a geração atual, as futuras gerações e um imenso ecossistema.
Chega ser inacreditável, que no Brasil, são produzidos mais de 11 milhões de toneladas de lixo plástico por ano, mais de dois milhões de resíduos são descartados irregularmente, números que colocam o Brasil em 4º no ranking de país que mais gera resíduos no mundo, segundo relatório do WWF (Fundo Mundial para a Natureza).
Mudar hábitos simples, da rotina, substituir os produtos por os com menor impacto ambiental, levar um copo junto para os lugares, ou até uma ecobag para colocar as compras, sem pressão, adaptando, dia após dias, porque ressignificar é ter liberdade de fazer as melhores escolhas para o próximo e para você mesmo. E sim, é possível!
Ressignificar as plantas e buscar a reconexão com a natureza é o propósito do projeto familiar Plantamor. Unindo a energia humana com a energia da mãe natureza, Adriana Carolina, ou melhor, a Carol, juntamente com seu companheiro Juliano, também conhecido como Ju, e sua mãe, dona Lucia, transformam uma miscelânia de plantas, com a próprias mãos, em produtos fitoterápicos.
A Plantamor é jovem, tem apenas dois anos, mas já tem plantado transformação na vida de quem quer mudar os hábitos, para os mais sustentáveis. Desde 2017, quando a Carol estava concluindo a graduação de Farmácia, veio o momento de incertezas, e de uma certeza: que não iria trabalhar nas farmácias comerciais. Foi neste momento que o que era descanso nos finais de semana, se tornou um trabalho muito prazeroso, por sinal.
Em uma terra infértil, do município de Ouro/SC, a família de Carol, há quase duas décadas, conseguiu recuperá-la e criar uma espécie de agrofloresta. Aos poucos, as plantas cultivadas que já viravam chás e cosméticos para consumo próprio, se tornaram um projeto comercial, que envolve, especialmente, aromas, sentidos e muito amor.
A ideia da Plantamor é iniciar e fechar o ciclo de produção, em que se consiga plantar, colher, produzir e vender. Mas afinal, como produzir em busca de uma vida mais sustentável? “A nossa produção é agroecológica, primeiro, porque a gente não usa agrotóxico, e por repor a natureza que estava perdida antes nesta terra. Nós conseguimos, além de causar o que falam de menor impacto ambiental, nós colocamos um impacto positivo, pois re-plantamos árvores nativas, deixando como se fosse uma floresta. Além disso, tudo que é orgânico dentro do laboratório, volta em forma de compostagem para terra”, explica Carol.
Sim, naquele espaço de cultivo das plantas, há também um laboratório, onde depois de colhidas, são retirados os extratos, que servem como matéria-prima central para o desenvolvimento dos produtos. Agora, o que a Carol e o Ju não conseguem produzir, eles compram de terceiros, com certificação e transparência, sempre adquirindo com cuidado, prezando a sustentabilidade. A produção inicia em Ouro e vai parar nas lojas de Chapecó/SC.
Mas, muito além de desenvolver cosméticos naturais, o principal objetivo é alinhar a energia da natureza, e usufruir as propriedades fitoterápicas das plantas. “Nosso foco é muito na fitoterapia, o uso das plantas medicinais para tratamento e cura do corpo. Os cosméticos, shampoos, condicionadores, sprays, os chás, eles entram como um braço dessa fitoterapia”, conta a farmacêutica.
Além disso, toda a parte visual da Plantamor é criada pelo Ju, que trabalhou durante muito tempo com tecnologia da informação. A maioria das embalagens contém imagens únicas, feitas por artistas locais. E os produtos são geralmente embaladas em papel, que demora poucos meses para se decompor. Tudo é pensado com amor, cuidando do meio ambiente e das pessoas. Afinal, a natureza pode existir dentro de você e
Foto: arquivo pessoal
mudar sua rotina, é uma questão de ressignificar.
“Nós facilitamos o uso das plantas, por não pensar que precisamos fazer grandes transformações É questão de troca e adaptações. Por exemplo, quan
As crianças providas de inocência se estimuladas passam a observar causas globais, foi assim com Daiane Caroline. Desde muito cedo, a influência da escola e dos pais, permitiram com que a pequena compreendesse o que era educação ambiental. Assim, não houve necessariamente uma mudança de hábitos, mas escolhas conscientes, ainda adolescente, que visavam o meio ambiente.
Aos 12 anos, Daiane decidiu substituiu a carne pela vasta quantidade de grãos, legumes, sementes e frutas. Ela foi se autoconhecendo e se amando a ponto de conhecer os seus limites, e jamais escolher o extremo, contudo, decidiu estudar por conta própria para saber aquilo que de fato passava a se tornar sua verdadeira rotina.
do a sua escova de dente estiver velha, pode começar a usar uma de bambu, e já vai ser uma grande mudança, porque essa não ficará por anos na natureza. Sem pressão de ser completamente correto”, finaliza o casal.
Sair do bombardeio de informações produzidos pela mídia, foi a alternativa para que Daiane abraçasse ainda mais a causa que luta até hoje, a natureza. O processo inicia aos 15 anos, hoje, a estudante tem 20. O segundo passo se deu com planejamento e organização, com base em ma-
neiras mais ecológicas de levar a vida. “Para mudar é preciso fazer um esforço muito grande e se virar com as própria pernas, então eu peguei na minha mão, e falei ‘agora eu sou responsável por mim mesma, e ninguém mais vai mandar em você e obrigar a fazer as coisas’’, conta a estudante de artes visuais.
Os hábitos sustentáveis dizem muito sobre quebrar os estereótipos de beleza e de limpeza, e de fato ressignificam a natureza que existe no corpo de cada ser humano, afinal, para Daiane, cada um é natureza, por estar cercado de todos os elementos, e ser formado pelas mesmas moléculas e partículas que os raios do sol. “Uma tecla que eu bato muito é o amor próprio, porque tudo é amor próprio, se eu me amo, eu vou cuidar desse meu instrumento material, que é o meu corpo”, ressalta.
Daiane não compra mais roupas, nem em brechós, acredita ter peças básicas e suficientes. Além disso, em um momento, ela começou a usar sabonetes e shampoo, veganos a base de plantas, os do projeto familiar Plantamor. No entanto, a viralização de uma vida mais saudável, fizeram os preços subir, e ela partiu para outras alternativas. Saiu da zona de conforto e passou a estudar a essências das plantas. “Eu comecei a fazer meu shampoo, não tenho os materiais que usam em shampoos, então eu lavo só com chás, eu faço em casa e guardo em uma garrafa de vidro, que dura uma semana. Eu passei por um processo de um ano só usando shampoo veganos comprados em barra, até que meu couro cabeludo se acostumar com a sujeira natural, porque sujeira não é uma coisa ruim, muito pelo contrário a oleosidade é um hidratante muito potente, quando então eu comecei a aplicar os chás. Além disso, eu também não uso sabonetes”, explica.
Outras mudanças incluem trocar os absorventes comuns, pelos de pano, substituir carros e lotações pela bicicleta, e preferir alimentos produzidos pelas próprias mãos, que carregam consigo o amor e a energia de quem faz a comida.
Mesmo que todas as práticas de Daiane pareçam distantes, isso se trata de um processo, que requereu estudos e tempo, por isso para ela cada um tem seu momento.
A alimentação é a primeira forma de amor que conhecemos. É através dela que laços de afeto se constroem entre dois seres, mãe e filho. Quando so-
mos bebês, o leite materno é o que precisamos para sobreviver, portanto, à grosso modo, entendemos num nível inconsciente que, se nossas mães nos alimentam, é porque elas querem que vivamos.
Assim, nos sentimos amados, aceitos, bem-vindos. Mas, a alimentação precisa ser feita com amor. E como não falar do amor entre uma mãe, com o nome da maior flor aquática do mundo, e uma criança que carrega o nome do filho da deusa da terra, segundo a lenda. De superstição, somente o nome. Nossos personagens realmente existem, sejam eles uma flor ou um Deus grego, ambos cumprem de forma correta seu papel na terra.
Vitória Régia Gaté é mãe de Órion. Ela e seu companheiro sempre estiveram envolvidos com causas sustentáveis, preocupados com uma alimentação saudável e com o consumismo desmedido. Desde os 14 anos, Vitória começou a enxergar o mundo e o meio ambiente com um olhar mais defensor e protetor. Ou seja, um olhar de mãe! Desde então, passou a estimular o lado consciente, mudou os hábitos alimentares, e passou a fazer a própria comida, com ingredientes cultivados por ela. Estudou e aprendeu a desenvolver o que necessita, para a higiene pessoal, bem como chás e sucos naturais com efeito medicinal.
Vitória Régia abriu mão de roupas caras e da moda. Começou a frequentar brechós, doar e receber doações de roupas e calçados. “Minha intenção foi ir mudando gradativamente os hábitos diários até me tornar uma pessoa quase que 100% sustentável em tudo o que envolva a minha saúde, e a saúde do meio ambiente”, conta.
Aos 21 anos, a flor se tornou mãe e precisou adaptar a rotina. Se tornou uma mamãe sustentável. Com o nascimento do pequeno Órion, Vitória destinou mais tempo para seu dia a dia, começou a pensar por dois e sentir a responsabilidade em cuidar de outro ser. Mas, nada disso foi sacrifício. “Na alimentação eu me aprofundei ainda mais, procurei alimentos que substituíssem as proteínas da carne e os derivados de origem animal, mas que ao mesmo tempo garantisse o desenvolvimento saudável do meu filho”, explica Vitória.
Ah, o amor conjugal! Dizem que o homem quando ama, realiza-se plenamente como pessoa. Então, juntar os laços e casar-se é uma das etapas da vida. Porém, já era a época em que as únicas preocupações dos noivos, em relação ao casamento eram a música, as comidas, as bebidas e a decoração. Em tempos onde muito se fala em sustentabilidade, poucos casais buscam alternativas ecologicamente corretas para celebrar o grande dia de suas vidas. Agora, Vanusa e seu companheiro, Jankiel, revolucionaram.
Mas como nem tudo são flores, Vitória teve alguns impasses ao sair da sua zona de conforto. Sabe o que é mais curioso? O maior desafio não seria criar um filho, conforme o seu padrão de vida, e sim deixar de seguir o padrão de vida imposto pelas pessoas. “Quando eu decidi mudar meus hábitos, algumas pessoas me questionaram, mas aceitaram numa boa. Já quando o Órion nasceu, eu sofri certo preconceito, principalmente pela minha família, eles não aceitavam que eu usasse pano, ao invés de fralda, que eu o vestisse com roupas usadas, que eu não quis dar a chupeta e que os brinquedos dele eram feitos por mim, com elementos da natureza”, ressalta a mais nova mamãe.
Vanusa Maggioni Cella, trabalhou por nove anos com o gerenciamento de resíduos, e hoje é coordenadora do Programa Lixo Zero de Chapecó. O olhar
O Programa Lixo Zero é parte do Instituto Lixo Zero Brasil e tem como objetivo o máximo aproveitamento e o correto encaminhamento dos resíduos recicláveis e orgânico, e a redução, ou mesmo o fim, do encaminhamento deste materiais para os aterros sanitários.
Prêmio do Instituto Lixo Zero Brasil / Foto: arquivo pessoal
sustentável, o desejo de cuidar do próximo e também do ecossistema sempre estiveram presentes na rotina, nas escolhas e nas atitudes. O sonho em se casar já era antigo, mas a partir de sua essência superou as expectativas e promoveu um dos eventos mais significativos para o meio ambiente em escala nacional. O próprio casamento foi 100% sustentável e 100% lixo zero.
“A minha intenção foi a melhor de todas, uma festa de amor! Não adiantava dar uma festa linda, e no outro dia ter gerado um problema para o meio ambiente e para as pessoas que nem no casamento estavam. Quando decidimos fazer uma festa, assim como quando reformamos uma casa, precisamos prever no orçamento a destinação dos nossos resíduos. É inevitável produzi-lo, então porque não pensarmos nele com o mesmo amor e cuidado que pensamos na festa?”, destaca Vanusa.
Falar é fácil, mas a noiva foi lá e tornou realidade! Apesar de parecer distante da habitual, a Vanusa teve o apoio dos fornecedores, que inclusive não prestavam serviços Lixo Zero, porém, que se adaptaram ao modelo de casamento proposto, através de muito diálogo, pesquisas e principalmente disposição. Afinal, não havia outra opção, a não ser aquilo que era sustentável. E o resultado? Somente 6% do lixo produzido, que corresponde ao do banheiro, foi para aterro sanitário. O restante, desde jardinagem até decoração foram para a compostagem.
Da ação o reconhecimento. Vanusa não só realizou o seu casamento 100% sustentável, como também realizou o primeiro casamento Lixo Zero do Brasil. “Eu nem imaginei que ganharia este título, foi uma surpresa linda, eu apenas me dediquei a fazer o bem. A certificação foi um presente que recebi do Rodrigo Sabatini, presidente do Instituto Lixo Zero Brasil, no dia do meu casamento mesmo. Eu tenho muito orgulho dele!”, relembra.
Vanusa acredita que pensar em sustentabilidade é olhar economicamente, socialmente e ambientalmente, ou seja, olhar para si mesmo, afinal, “não há maneira melhor de demonstrar amor à alguém, do que cuidar de tudo que as pessoas precisam para viver: o ar, a água e o solo”, finaliza.