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OS CAÇULAS DO E-COMMERCE: COMO CONQUISTAR A GERAÇÃO Z

Sim, a geração Z está chegando aos poucos à maioridade, e muitos desses jovens adultos já trabalham e gastam o próprio dinheiro no comércio eletrônico, mesmo que de forma mais exigente

Por Giuliano Gonçalves e Júlia Rondinelli, da Redação do E-Commerce Brasil

Toda geração mais velha vai ter o que falar das mais novas. Muito do que se pode falar sobre a geração Z - que, sim, já trabalha, gasta e consome - foi dito sobre as gerações anteriores quando elas entraram no mercado de trabalho. Mas pera lá! Existem, sim, diferenças sensíveis que destacam os caçulas do consumo moderno.

Para começar, a idade: a geração Y (conhecidos como millennials, nativos digitais e geração do milênio), que tanto sacudiu os padrões de consumo com suas visões de exclusividade, autenticidade e personalização, é composta por indivíduos nascidos entre 1976 e 1995. A geração Z (conhecida como centennials ou ainda pós-millennials), que também compartilha desses e de outros valores, começou a povoar esta terra a partir de

1996. Se a geração Y era tida como opinativa e imersa no universo digital, a Z já nasceu com muito mais acesso e familiaridade com essas tecnologias.

O que difere: a opinião dos jovens consumidores é bombardeada sobretudo pelas mídias digitais, que ditam não só comportamentos como formas de se relacionar. Se há 15 anos era preciso chegar em casa para acessar o MSN e o Orkut, hoje carrega-se o Instagram, o BeReal e o TikTok no bolso o tempo todo. Já há algum tempo a geração Y é tida como “acostumada” com a tecnologia por ter tido um computador de tubo na sala de casa, enquanto que a geração Z é acostumada diretamente com os smartphones em tempo integral na palma da mão desde a adolescência ou a infância. A diferença não é, então, o acesso ao mundo digital, mas o nível de maturidade dessa tecnologia enquanto essas gerações tão próximas (e tão diferentes) cresciam.

O que elas têm a ver com o e-commerce?

De maneira resumida: tudo. Dados do Futuro Commerce mostram que os integrantes da geração Z têm um papel fundamental na manutenção de novos entrantes no e-commerce nos próximos anos. Ou seja, se o comércio eletrônico quiser continuar crescendo, vai ter que atender a essa parcela da população. Na parcela dessa geração que já é maior de idade (entre 18 e 25 anos), 32% afirmaram que pretendem gastar mais em datas sazonais em 2023 do que no ano anterior.

Uma pesquisa da Adobe vai ainda mais longe ao propor que a geração Z é a mais propensa de todas a comprar produtos online em detrimento das lojas físicas. Nesse caso, 67% dos entrevistados compram online semanalmente, em comparação com 55% dos millennials.

“A geração Z chega à idade adulta com alto grau de pragmatismo, em especial se comparada à geração Y, quando tinham a mesma idade. Os millennials chegaram à maioridade em época muito positiva do mundo em geral, em que quase tudo ‘funcionava’, seja a geopolítica (sem guerras), a economia (globalização, capitalismo, boom das startups) e até mesmo os valores de vida ocidentais mais avançados”, lembra Felipe Mendes, diretor geral da GfK na América Latina.

Um dado interessante, segundo Mendes, é que os jovens Z chegam ao mundo adulto após enfrentarem a pandemia da Covid-19, na qual a ausência de lideranças ficou evidente. “Eles ainda surgem em meio à falta de produtos, à volta da inflação, à invasão da Ucrânia, a demissões das Big Techs e a outros eventos que acabaram com o ‘Magical Thinking’ que definia os Y”.

O Magical Thinking descrito pelo executivo pode ser entendido com um otimismo e até uma crendice da geração Y em imaginar um futuro bastante promissor na fase adulta, já bastante questionado pela geração Z. Mesmo assim, os valores que essas duas gerações compactuam são semelhantes: “Houve um achatamento geracional importante a nível global, mais marcado no Brasil e na América Latina”, completa.

As redes sociais são protagonistas nas dinâmicas da geração Z

Ana Paula Passarelli, COO da Brunch (agência focada em influência de verdade e criação de uma economia criativa), é especialista em marketing de influência e acredita que as redes sociais têm um papel fundamental nos novos comportamentos da geração Z, inclusive com relação ao consumo.

“As redes sociais colocaram uma nova lente sobre a maneira como performamos na sociedade. Antes delas, nosso comportamento estava muito atrelado à maneira como nos vestíamos e aos lugares frequentados. Com as redes sociais, temos novos códigos de identidade, como o número de seguidores e a quantidade de likes. Para essa geração mais jovem, que está no ambiente digital desde cedo, há uma comparação excessiva uns com os outros, o que impacta o consumo do conteúdo e os códigos de identidade, seja com o uso de uma roupa, de um sapato ou até dos cosméticos”, ela explica.

A especialista não para por aí, pois entende que o comportamento presente nas redes sociais é uma extensão dos valores difundidos por essa faixa etária. “A maneira como a geração Z consome está em simbiose com o ambiente digital, o que aumenta o nível de possibilidades de personalização, amplificada pelo e-commerce”, argumenta.

Ela explica ainda que o modelo industrial limitava as variações de produtos disponíveis para as gerações tidas como mais tradicionais, ou seja, que vieram antes dos millennials e da geração Z. No entanto, as vendas online possibilitam novas formas de compra, interação e personalização, inclusive com pré-vendas já focadas em detalhes e em diferenciais escolhidos pelos consumidores. Passarelli entende ainda que a personalização é uma exigência para a criação de uma identidade.

“Apesar de ter sido forjada no ambiente digital, essa geração também está em busca de conexões pessoais e reais”. De acordo com a executiva, pelas redes sociais, é possível perceber que a nova geração prefere fotos mais realistas, menos posadas e produzidas e que sejam reflexos do dia a dia - o que é um grande diferencial com relação aos millennials, tidos como cringe por diversos comportamentos menos naturais ao interagirem com as redes.

Assim, os e-commerces que querem se conectar com esses consumidores precisam aparentar realidade, autenticidade e novas dinâmicas estratégicas de posicionamento. “Autenticidade é a palavra da gen Z”, finaliza Passarelli.

Uma pesquisa da Capterra corrobora a visão da especialista e acrescenta um dado importante em relação à forma como essa geração compra e consome: 37% dos indivíduos da geração Z adotaram as redes sociais como motor de busca em detrimento de outros formatos de pesquisa no ambiente digital. Embora esse dado possa ser aplicado a outras gerações, ele é significativamente predominante sobre os caçulas do consumo. As gerações “veteranas”, como os baby boomers (nascidos de 1946 a 1964) e a geração X (de 1965 a 1977), já estão bastante inseridas no ambiente digital e nas interações estabelecidas pelas redes sociais, mas ainda preferem motores de busca tradicionais (como buscadores).

Para Mendes, o comportamento de pesquisa nas redes sociais tem reflexos imediatos no consumo: “Instagram e TikTok são vistos não apenas como diversão, mas como fonte de conhecimento e de exploração de novos produtos ou serviços. Isso impactou inclusive o perfil de influenciadores, que começam a ser cada vez mais ‘experts’ do que simplesmente celebridades. A geração Z valoriza muito a sua liberdade e a autenticidade, em função de todos os questionamentos e contradições que enxergam hoje na sociedade”.

Um estudo da Morning Consult descobriu que 72% dos consumidores da geração Z já compraram um produto por conta de um influenciador online. Já um outro levantamento, desta vez da Pew Research, mostra que 89% dos adultos da geração Z usam as redes sociais, e 45% deles dizem que estão constantemente conectados à internet. O próprio Google admite que 40% do público consumidor da geração Z trocam a gigante das buscas por redes sociais, como TikTok e Instagram, na hora de fazer pesquisas.

O vídeo também é um grande diferencial para essa faixa etária, uma vez que sintetiza boa parte das informações de maneira mais palpável e, novamente, com mais autenticidade. O estudo cita também a experiência da pesquisa como parte considerável para a escolha do motor de busca (redes sociais), formato de conteúdo (vídeos) e dispositivo preferido (smartphones).

Ao observar outros dados do cotidiano, o estudo Future Commerce deste ano mostra que 55% dos integrantes da geração Z usam o celular por pelo menos cinco horas por dia. Para 26%, esse número passa para dez horas diárias. Embora seja uma quantidade alarmante, vale reconhecer que o uso dos smartphones hoje vai além do entretenimento e funciona como parte da rotina de estudo e trabalho de muitas pessoas, substituindo outras ferramentas. 40% desses jovens afirmaram que preferem perder suas carteiras aos seus smartphones.

Conselhos para o e-commerce: experiência e valores

Tanto Passarelli quanto Mendes concordam que experiência e valores são dois quesitos de destaque para engajar a gen Z. A geração das compras online passa a ver a loja física como uma fonte de experiências (não exatamente de compra) e escolhe suas preferidas com base no que a marca expressa e defende.

“As lojas físicas já não são um destino de compra, e sim uma experiência de marca, sugere que as empresas que oferecem experiências exclusivas e personalizadas terão mais chances de atrair consumidores dessa geração. Ainda assim, tanto millennials como geração Z estão preocupados com questões sociais e ambientais, da mesma forma que valorizam a inclusão e a diversidade. No entanto, a geração Z é ainda mais consciente desses assuntos e está mais disposta a falar sobre e se envolver ativamente em causas sociais e políticas.

Para Mendes, a geração Z ressalta três valores mais importantes: “ela enaltece a ‘proteção à família’, ‘honestidade’ e ‘trabalhar com afinco’, sendo que os três estão acima da média da população. Já o valor ‘curtir a vida’ é menos importante para os Z do que para outras gerações. Fica claro, então, que trata-se de uma geração menos hedonista, o que se traduzirá em seus comportamentos de compra, mais planejados e contidosum desafio para o e-commerce”. A Cone Communications, por exemplo, descobriu que 94% dos entrevistados da geração Z nas quais o cliente pode experimentar a vivência proposta, não só se o modelo serve”, diz Passarelli. De acordo com um estudo da Accenture, 68% dos consumidores da geração Z disseram preferir gastar mais dinheiro em experiências do que em produtos. Isso acreditam que as empresas devem ajudar a resolver problemas sociais e ambientais. Nesse contexto, inclusive, 87% disseram que comprariam um produto de uma empresa que apoia uma causa social em que eles acreditam.

“A geração Z é mais conectada digitalmente, mais consciente sobre questões sociais e ambientais, e mais exigente em relação aos produtos e serviços que consome. A reciclagem é importante, mas poder entregar produtos usados e receber descontos por isso, ou ainda comprar itens de segunda mão em lojas em que podem confiar, tem muito mais apelo para essa geração de jovens adultos”, aponta o executivo. Uma pesquisa recente da Nielsen endossa o ponto de vista de Mendes: 75% dos entrevistados (todos da geração Z) afirmam que estão dispostos a pagar mais por produtos sustentáveis.

No ano passado, a Edelman divulgou um estudo mostrando como a nova geração de consumidores tem influenciado o posicionamento das empresas. Em determinado momento, o levantamento mostrou que mudanças climáticas, pobreza, racismo, qualidade da informação e desigualdade de gênero são pautas que 72% das pessoas entre 14 e 26 anos julgam importantes ser de interesse das marcas. Ou seja, há uma exigência primordial a esse apoio de forma exposta para que haja uma identificação e preferência na hora da compra.

O que vem depois?

Embora muitos integrantes da geração Z ainda não tenham um papel ativo nas compras online por não fazerem parte do mercado de trabalho (pela idade, principalmente), seus hábitos são refletidos nas compras dos responsáveis da casa, por exemplo. Além disso, depois da Z, outra geração ocupará o pódio de caçula do e-commerce, a Alfa, daqueles nascidos entre 2010 e 2024 (ou seja, alguns deles nem nasceram ainda). Até 2024, estima-se que eles somem 2,2 bilhões de pessoas. Até 2030, eles serão responsáveis por 11% da força de trabalho do mundo, de acordo com a Future Commerce.

É possível antecipar que se os millennials já estão acostumados há algum tempo com a tecnologia, os alfas já nascem com celulares na palma da mão e serão ainda mais relevantes para o e-commerce do que as gerações discutidas até aqui. Mas isso é assunto para outra matéria de capa, daqui a alguns anos.

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