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FRANÇA: PESQUISA DOUTORADO. TOUR SOZINHA PELA EUROPA
"Longa é a viagem rumo a si próprio; inesperada é sua descoberta".
Thomas Mann
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Mais uma vez no MD 11 da VASP rumo a Bruxelas (a 3ª viagem ao exterior em 1997). Chamei-a de “viagem em direção a mim mesma”, pois o casamento havia acabado e eu estava no meio do meu doutorado. Não tive tempo de purgar nenhum sofrimento: dizia para mim que o casamento tinha acabado, mas o doutorado era um compromisso pessoal. Casamento depende de dois... Na estação de trem Bruxelas-MIDI peguei o TGV para a bela estação Montpellier, em Paris, onde daria prosseguimento às pesquisas e à compra dos livros que não tinha no Brasil. Fui para o Hotel Chaligny, onde já havia ficado, para aguardar o estúdio que ia alugar. Nesta temporada, o que mais fiz foi andar a pé pela cidade, percorrendo os conhecidos lugares turísticos, bem como descobrindo lugares aprazíveis para flanar mais tranquilamente, como o Parc de LaVillete, Jardin des Plantes,Parc Monceau, Parc Montsouris, Parc Buttes-Chaumont. A Estátua de Balzac – esculpida por Rodin -, no 8º. Arrondissement, é um monumento grandioso, na Praça Georges Guillaumin, na Avenue Friedland. Lady Di havia falecido,na Ponte d’Alma, no meu primeiro final de semana e eu fui ver as homenagens que lhe rendiam. Marília e Tomás Domingos, seu namorado hoje marido, foram os “anjinhos” que me deram toda assistência na cidade e conseguiram o aluguel do estúdio na Rue Dr. Touffier 4, 13éme. (US$600/mês=R$600).
No dia do meu aniversário, dei-me de presente ver ‘As Bodas de Fígaro’, de Mozart, na Ópera da Bastille. Os/as artistas estavam em greve, não havia cenário nem vestuários, mas havia a orquestra e todos/as encenaram a ópera nos seus trajes normais, em respeito ao público. Mais chic impossível! Belíssimo espetáculo! Desta vez, consegui conhecer os túmulos de Simone de Beauvoir e Sartre, no cemitério de Montparnasse, onde também estão Baudelaire, Olga e Serge Ginsburg. No cemitério de Montmartre, meio sombrio e sujo, vi os túmulos de Berlioz, Stendhal, Fragonard e meu darling Emile Zola, que, agora, está no Pantheon.
Consegui ver a Casa de Balzac, amado escritor da adolescência até hoje, onde fiquei muito emocionada ao ver seus manuscritos e as suas dedicatórias, a árvore genealógica dos personagens da “Comédia Humana”. A casa é simples, pequena, bege de janelas verde-água, e fica embaixo da Rue Rayonard 47. Voltei à Av. Parmentier, onde Gustavo morou, para comer spagethi na cantina “Napoles” (que não existe mais). As francesas, mesmo as jovens, só usavam cabelos curtos. Carros Mercedes e BMWs ficavam estacionados nas ruas com quilos de poeira em cima. Árabes, indianas e africanas transitavam com suas habituais roupas típicas. Gatos e cães eram mais importantes que gente: nos supermercados, havia mais gôndolas para pets do que para kids! E fora de algumas lojas ou mercados, havia ‘estacionamento’ para cães...Os caminhões de mudança também me impressionaram bastante pelo sua forma peculiar de pegar os objetos dos apartamentos. Os caminhões-limpadores-de-rua eram outra novidade para mim bem prática: havia vários pela cidade toda.
Casa de Balzac
Nos fins de semana, comecei a visitar lugares ao redor. No trem Paris-Rouen, desci em Vernon para conhecer a Fundação Claude Monet, em Giverny. Nos bancos do jardim em frente à entrada da casa do pintor impressionista, fiz as primeiras cartas para as amigas de Itajubá, e tomei meu lanche. E tirei fotos das famosas e belas ninféias, que me encheram de muita alegria.
No primeiro mês, resolvi fazer um tour pela Europa, sozinha. Marília e Tomás me levaram à estação Gare de L’est, ainda com guardas armados por conta dos atentados de 1996. Iniciei por Luxemburgo – um pequeno país fronteiriço. Tomei um sorvete na Pizza Hut chamado Coupe Brésilienne – glace vanille, nappage caramel brésilienne (?) e chantilly. Delícia! Hospedei-me no Hotel Washeim, em frente à estação de trem (não existe mais). Cidade linda, pequena, acolhedora, parecia de brinquedo. Havia muitos portugueses ali (1/5 da população). O dono do hotel era um, vindo de Braga. Passeei pelos lugares famosos da cidade: a ponte Adolfo; avenue de La Liberté; o belíssimo Monumento da Memória, com a GelleFra – ‘a mulher dourada’, do escultor Claus Cito, símbolo da independência e liberdade do país; Place d’Armes, onde havia um karaokê no seu coreto; Palais Ducal; Catedral de Notre Dame; a Biblioteca Nacional; o Arquivo Nacional; e as impressionantes casamatas de Bock, com 23km de túneis – abrigo dos/as cidadãos/ãs durante as duas grandes guerras, nas quais não entrei por claustrofobia...Chamada a “Gibraltar do Norte”, a cidade é Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, desde 1994. Segui para Bonn, passando por algumas pitorescas e bem-cuidadas cidades alemães, como Karthaus, Triers e Koblenz, rodeadas de florestas e do rio Mosel, e com muitas áreas de camping. As estradas de carro geralmente margeavam as de trem. Impressionava-me muito era a quantidade de flores nas cidades, nos balcões das casas, jardineiras nas lojas. Na maioria dos trens, na cabine, os bancos eram de frente um para o outro e havia uma mesa no meio, onde eu escrevia os diários, os cartões, com aquele janelão todo para as paisagens. Em todos, havia sacos de lixo nos bancos – para mim, o mais top da civilização! Eu gosto muito da languidez dos trens, mesmo os mais rápidos, porque eles deslizam, têm ritmo, como se dançassem nas curvas, como se a música da natureza os deixasse ser conduzidos pelos trilhos...São muito elegantes, precisos: não tem aquela coisa de freadas bruscas, sinais de trânsito etc..É o meu transporte favorito, apesar de gostar muito de viajar de carro,pois as estradas também dão
a sensação de liberdade, de melhores escolhas...Passei por uma linda cidade, Remagen, que quase desci para conhecer. Devia tê-lo feito... Não gostei do ambiente da estação ferroviária de Bonn e segui para Hamburgo, passando por Colônia e revendo a linda catedral gótica, Dusseldorf, Dortmund, Münster, Osnabrück -bem simpática-, e Bremen, paisagem começando a ficar inóspita e a entrar em uma região industrial, pois havia muitas fábricas.Chamou-me atenção os casais nos trens: conversavam o tempo todo, mesmo aqueles mais velhos. Coisa que não ocorria aqui no Brasil, onde casais costumam estar mudos ou só a mulher falando...Cheguei em noite chuvosa em Hamburgo e fiquei em um hotel em frente à bonita estação de trem, em um quarto enorme. Muitos jovens skin-heads pela rua, cheios de piercings no rosto, roupas extravagantes. A maioria dos homens que passavam por mim cheirava a álcool.
Dia seguinte, subi em um trem de novo para Kopenhagen. O trem se chamava EC 182 Thomas Mann – não é o máximo? O autor-darling de uma das minhas frases de cabeceira: “É curioso como tenho sobrevivido a mim mesmo”. E eu indo rumo à realização de mais sonhos: conhecer o Castelo de Hamlet e a casa de Karen Blixen. A caminho de Puttgarden, vendo o mar Báltico. Surpresa enorme quando vi o trem entrando no ferry boat para fazer a travessia! Um marítimo me viu na cabine e pediu que eu fosse para o salão porque não era bom ficar ali só. No bar, encontrei três americanas muito simpáticas que elogiaram meu inglês! Aportamos em Nykobing – uma pequena cidade supersimpática. Passamos ainda por graciosas cidades do percurso até à capital dinamarquesa – Naestved, Hoje Taastrup, Kobe e Nhavn. Fiquei no Hotel Absalom, em Kopenhagen, bem confortável e um ótimo café da manhã. Andei pelos lugares típicos: Tivoli, Christiansborg, Ópera, Magazin Du Nord – não entrei -, e tirei foto da estátua equestre de Frederick V, toda em obras, na praça de Amalienborg, porque ela é considerada a maior peça de escultura da Dinamarca – uma obra-prima do escultor francês Jacques Saly, de estilo rococó. Nunca vi tanta gente bonita no mesmo lugar! E muito simpáticos/as. O número de ciclovias e a quantidade de bikes pelas ruas me impressionou também, tanto quanto ver mulheres arrumadas e de salto alto em cima das “magrelas”. Como a maioria dos europeus, eles/as fumam demais e também cheiram a álcool. Há vários músicos pelas ruas. Parei para ouvir um rapaz tocando um sax divinamente. É um dos meus instrumentos favoritos. Dias nublados e de muito vento. Da estação de trem fui para Elsingor, ao norte da cidade, em 40’, para ver o Castelo de Kronborg - o do Hamlet, com vista para o mar Báltico. Um dos porteiros, quando eu disse que era do Brasil, me deu “bom dia!” em português, que amável! E ele me deu todas as explicações sobre o castelo, as três torres, o salão de baile que, em 1582, era o maior do norte europeu, falou de Shakespeare...A emoção foi inenarrável! Manhã seguinte peguei o trem para Rosilke – 1ª capital da Dinamarca, fundada por Absalom. Andei bastante até chegar à casa de Karen Blixen, ou Isak Dinesen,
minha escritora estrangeira preferida, autora de “A fazenda africana”, “Festa de Babete” e “Sombras na Relva”. A casa é simples e elegante como ela era. Tem um jardim atrás muito charmoso, onde ela está enterrada à sombra de uma bela árvore; à frente da casa, há uma baía cheia de iates e barcos. Seu escritório via-se através de um vidro e não se podia tirar fotos. Comprei os cartões. Chorei muito, completamente tomada por todo aquele ambiente sereno e delicado, mas impregnado do espírito generoso, altivo e lutador da escritora. O trem da volta se chamava Karen Blixen! Muita emoção! De Hamburgo a Berlim, o trem passou por pitorescas cidades: Wittenberg, Breddin, Falkense e Spandau –já distrito da capital alemã, onde ficaram os criminosos de guerra nazistas.
Em Berlim, fiquei na Pensão Kassandra, semelhante ao hostal de Madri: um andar inteiro de um prédio para hospedagem. Muito bom. Andei no ônibus de dois andares (bus 100), que me deixou na Porta de Bradenburger – um dos ícones da capital alemã, onde só me lembrei dos anjos de Wim Wenders, em “Asas do Desejo” e o “Fim do Mundo”, com olhares e pensamentos sobre uma Berlim que não existe mais. Em um muro, visto do ônibus, estava escrito “The reality crashes my mind”. Fui para a Alexanderplatz – centro da Berlim Oriental, com sua exdrúxula torre de TV; a igreja Marienkirche -, mais ao Sul; a famosa estátua de Marx e Engels, com alguns retratos da luta comunista. Bem interessante e bonito. Vi também a escultura de Netuno
em um jardim mal-cuidado. A parte oriental tinha muitas obras. Havia vários conjuntos de prédios iguais, de cores pálidas. Visitei a Staatsbibliothek – a biblioteca estatal, uma das maiores da Europa, em um belo prédio com heras pelas paredes e um chafariz no meio do pátio. Ela tem a coleção autógrafa de Goethe e uma Bíblia de Gutenberg. No Museu Histórico Nacional vi toda a história da Alemanha. Na parte de Hitler, havia um jovem professor dando aula, bastante entusiasmado, para um grupo de alunos/as ao seu redor. Eu não entendia uma só palavra, mas fiquei fascinada pelo jeito veemente da exposição. Comprei um cartão para Luiz Otávio do dia em que caiu o muro. Muito bonito. A maioria dos taxis era Mercedes ou BMWs. E lindos Porsches ficavam estacionados nas ruas com pó em cima. É duro ser rico em país rico! A quantidade de pets e seus privilégios – como em Paris -, é muito grande. Entram nos ônibus, nos trens, nos restaurantes. O Reichstag estava todo coberto por vigas de alumínio, em obras. À beira do lago do Castelo Charlottenburg- palácio real prussiano -, escrevi alguns cartões postais. Havia um cisne branco e vários patinhos no lago. Paisagem bem bucólica. Havia muitas ciclovias pela cidade e as mulheres, como as francesas, também de cabelos bem curtos e pedalando de saltos. E foi onde vi a maior concentração de homens bonitos da minha vida por metro quadrado! Uma beleza máscula-chic: elegantes, naturais e educados – e a maioria de cabelos pretos. Conheci a Universidade Humboldt, a mais antiga de Berlim; a Berliner Rathaus (prefeitura); o Memorial das Guerras, onde vi a estátua da mãe e o filho, o soldado morto, escultura de KätheKollwitz, uma pietá-símbolo de todas as mães que perderam seus filhos para as guerras, tiranias etc.. É de uma tristeza profunda. “E quanto à mãe que embala ao colo um filho morto —Todos nós embalamos ao colo um filho morto. Chove, chove.” (Fernando Pessoa). A sobrevivente igreja da Segunda Guerra Mundial – a Igreja da Memória - é um símbolo da destruição que restou daquela bela cidade. Ela foi construída em 1895 e bombardeada em 1943. Uma nova igreja foi construída ao lado, mas sua torre está ali para lembrar um passado que ninguém quer repetir.
Em Dresden, cidade-sobrevivente às margens do Rio Elba, foi só passagem para ver a “Florença do Norte”, com o Zwinger Palace, o Versailles alemão; a Ópera Semper; e a Augustusbrücke, a majestosa ponte histórica. Fui e voltei a pé da/para a estação ferroviária. De onde segui para Praga – terra dos meus darlings Kafka, Rilke e Milan Kundera. O trem tinha uma cabine só para bicicletas. A paisagem era bem romântica, cheia de chalés, muitas árvores, morros de pedras: algo assim contos de Grimm. Em Praga, fiquei na casa de um casal idoso, que me ofereceu a estada por US$19 na estação de trem e me levou com eles. E eu fui sem medo nenhum! Peguei um ônibus na Rua Prikope no. 23, centro, para a Premiant City Tour para fazer um tour de três horas pela bela cidade (US$16);e depois fiz o passeio de barco de duas horas, pelo Rio Moldava, o Vltava (US$11). Conheci o Castelo de Praga – que levou quase 600 anos para ser totalmente construído!-, é a atual residência presidencial, com a Catedral gótica de S. Vito, com suas enormes torres e o belo túmulo de São João Nepomuceno, todo
em prata –; o Convento de S. Jorge – onde fica o túmulo da 1ª. mártir da Boêmia, Santa Ludmila -; e o Palácio de Rodolfo II – o que foi retratado por Arcimboldo, no fantástico-natural quadro ‘Vertummus’. Estava lotado: a Europa resolveu passar o fim de semana ali, pois tinha gente de todos os idiomas. Foi dito que ele é o maior castelo do mundo (70 mil m2 de área), e é Patrimônio Mundial da UNESCO, mas não achei essas coisas, não...Em verdade, parece mais uma cidade medieval, com vários castelos, ruas pequenas, jardins, mas sem muros,é tudo aberto. Ali estava a casa-prisão de Kafka, toda azul, na linda Rua do Ouro, no. 22 (hoje é uma livraria). Ali ele escreveu “O Processo” e, provavelmente, foi a inspiração para escrever “O Castelo”. Foi o que realmente me emocionou e fez valer as quatro horas que passamos ali para ver as principais atrações de Praga, que achei uma das cidades mais lindas que já conheci: clássica, altiva, requintada e bem-cuidada – a “cidade dos cem pináculos”. No centro da cidade, vi o quarteirão judeu, onde se encontra uma escultura de Kafka, marcando a casa onde nasceu e que foi destruída; também vi o teatro onde só se apresentam obras de Mozart e palco da primeira apresentação de “Don Giovanni” – antigo Teatro de Praga, hoje Teatro dos Nobres.
O passeio no Rio Moldava passou por todos os pontos principais da cidade: a ponte Carlos IV, o Teatro Nacional, a Universidade. A guia era uma senhora bem idosa que ficou me contando sobre o período da “cortina de ferro”, quando as igrejas não foram fechadas, mas os cultos foram proibidos e as pessoas rezavam em casa; os estudos eram todos voltados para o ateísmo e as novas gerações são atéias; mas ela também não estava satisfeita com o capitalismo, defendia sistemas espiritualistas que elevassem os homens para fazê-los viver bem consigo mesmos. Fui embora em uma manhã de sol, indo a pé para a estação. Gosto do deserto das ruas pela manhã.
Em Viena, fiquei no Hotel Admiral, na Rua Karl-Schweighofer-Gasse 7, bem confortável, em um ponto muito bom. Continuei minhas excursões a pé. Vi a Maria-Thereza Platz, com a estátua da própria cercada por dois museus; a estátua do Goethe; o palácio de Hofburg – local de nascimento de Maria Antonieta e da nossa Imperatriz Leopoldina, e onde viveu Sissi, a bela imperatriz da Áustria - hoje é a residência
do presidente do país; a Catedral Stephansdon; a Ópera de Viena; o Burgtheater (1741) – é o teatro nacional austríaco-; a Karlplatz – onde me sentei em frente à magnífica igreja barroca Karlskirche para escrever cartões para Denise, Eduardo e Gustavo-; a estátua de Strauss no Stadtpark – onde me sentei para apreciar o relógio de flores e sentir o calor do sol . Pelas ruas, só me lembrava do filme ‘Antes do Amanhecer’, com Ethan Hawke e Julie Delpy. Tanto Praga quanto Viena têm construções muito semelhantes às de Paris. O povo também andava muito de bicicleta, com ciclovias por toda a cidade. O Banco do Brasil dali igualmente ficava em um prédio muito chic, como os de Paris, Lisboa e New York. A velha mania de comer feijão e arrotar caviar...Mas hoje quase todas essas agências estão fechadas...
Assisti a um concerto de cello e violão, na Sala Terrena, onde Mozart tocava, com peças dele, Haydin, Beethoven e Schubert – que fazia 200 anos. O lugar era exageradamente belo: bem pequeno, com paredes pintadas em afrescos barrocos, com motivos religiosos (anjos, demônios, animais, flores). Fiquei bastante comovida, mas quase que não chego a tempo, pois fui passear no ônibus D pela cidade e me perdi. Tive que tomar carona de um rapaz, felizmente muito gentil, para não perder o show que fazia parte dos meus sonhos. Em uma noite, fui ao Johann Strauss Concerts – o Kursalon Vienna-, em um lindo prédio do Stadtpark – um dos parques mais antigos da cidade. Ali Strauss se apresentava e há uma linda estátua dele no jardim. Na sala art déco com imensos lustres de cristal, os bailarinos se apresentaram e um deles veio no mesmo metrô que eu! A maioria do público era de estrangeiros idosos. A noite acabou com a clássica “Danúbio Azul”. A cidade é muito musical e vi várias pessoas se apresentando nas ruas. Assisti a uma orquestra com os músicos uniformizados, em um praça. Vi dois rapazes, um tocando sax e o outro, teclado, tocando “Garota de Ipanema”. Para o Palácio Schonbrunn – a Versailles austríaca -, fui de metrô,apreciar os estupendos jardins floridos de diversas colorações. A maior roda-gigante do mundo – com 60 metros de altura-, àquela época, ficava no Park Prater, que é o parque de diversões mais antigo do planeta. Do alto da cabine de madeira, dava para ver boa parte da cidade. Para o Palácio Belvedere, fui no ônibus 71. Mais bonito que o Schonbrunn, o Belvedere guarda o maior acervo de arte austríaca e tem na sua coleção um dos quadros mais lindos da pintura universal: ‘O Beijo’, de Klimt. Também havia quadros de Degas, Renoir, Van Gogh, Münch. No Museu do Barroco, logo abaixo, há duas brancas esfinges nos recepcionando, que são belas e estão sorrindo. Ali eu tive a feliz e emocionante surpresa de ver o retrato mais lindo de Napoleão, pintado por David, em 1801. Bem jovem, ele está em um cavalo branco, empinado em uma pedra, com o braço direito apontando uma direção. Sentei-me em um banquinho vermelho diante dele e fiquei ali, admirando-o. O banheiro ficava no belíssimo ‘golden room’ e a sua porta era toda dourada com afrescos. Um luxo só!
Em Budapeste, às margens do famoso Rio Danúbio, fui apenas para passar o dia, em um tour guiado. Foi muito emocionante cruzar o Rio Danúbio de trem, que ia apitando pelo caminho de paisagem um pouco árida. O país tem a maior população judia do leste europeu e tem a segunda maior sinagoga do mundo, a Grande Sinagoga (só perde para a de Jerusalém). 10% dos judeus mortos na 2ª. GM eram húngaros. Eleito o café mais bonito do mundo (2011), o ‘New York Café’ foi inaugurado em 1894, e tem colunas banhadas a ouro. A avenida Rakóczi era uma via muito movimentada, que atravessava a cidade na direção leste-oeste, com restaurantes e estações de metrô. O Városliget foi o primeiro parque público do mundo. A Andrassy Ut é a ‘champs elysees’ húngara, com prédios históricos, a ópera nacional, restaurantes e lojas. Também tem algumas embaixadas. O músico Bela Bartok morreu nessa avenida. HosokTere é a Praça dos Heróis, ladeada pelo Museu de Belas Artes e o Memorial do Milênio. MórJokay foi o mais famoso escritor da Hungria e sua portentosa escultura está localizada na Jokay St.. No bairro do Castelo de Buda está a gótica Igreja São Matias, que foi fundada há mais de 700 anos, mas destruída algumas vezes. A estrutura atual é do século XIX. Ali chorei ao ouvir um coro cantando música sacra com uma singeleza ímpar. Em torno da igreja, está o Bastião dos Pescadores, cujas sete torres homenageiam as sete tribos que fundaram a Hungria em 896. Subi para ver toda a linda cidade. O Palácio Real também estava do lado de Buda, juntamente com o Parlamento, construído à semelhança do de Londres. Em Buda, havia também os famosos banhos turcos – povo que ficou no país durante séculos. Eles têm uma arquitetura própria muito harmoniosa, como a estação de trem Keleti. A imperatriz Sissi era muito querida em Budapeste porque falava fluentemente o húngaro. Tem muitas coisas com seu nome, Margareth, pela cidade. Tomei um sorvete maravilhoso na Galeteria Italiana, em frente à estação Rennweg. De lá, peguei o ônibus 0 e fui para a estação Messe-Prater para comprar biscoitos no supermercado Billa. Na volta a Viena, desci na ponte do Danúbio e fui andando pela beira do rio, até a Kohlmarkt e a Stephansplatz – onde fica a imponente catedral de Santo Estevão.
No trem para Zurich, um desfile de cidades lindas: Linz, Salzburg, Innsbruck, Murg, Wädenswil. Casas com sacadas de madeira cheias de flores, jardins muito floridos, telhados pretos com sótãos. Paisagem de contos de fadas, bem bucólicas, como o lago Walen e as montanhas de pedras. Neste dia, dois cavaleiros do apocalipse, fardados, entraram na minha cabine e abriram minha mala e minha bolsa, depois de ver meu passaporte e dizer ‘Brasil’. Os outros passageiros não foram revistados e ficaram impressionados com a atitude e comentaram comigo que estavam surpresos. E ficaram conversando comigo o resto da viagem, falando sobre os lugares que passávamos, dando sugestões de visitas etc.. Muito gentis. Na estação já encontrei novo anjinho da guarda, uma linda moça lourinha, que me deu 10 cents para pegar o ônibus porque eu não havia trocado o dinheiro...E ainda me deu tchau do tram – o elétrico-, que pegou. Conheci Zurich toda a pé, pois a cidade é bem pequena. Fui para a cidade antiga, flanei pela beira do rio Limmat, pela famosa e sedutora Rua Bahnhofstrasse, a igreja Grossmünster, a Casa de Ópera, achei lindas as diversas fontes pela cidade. Só não vi a Casa de Corbusier...
Em Basel – capital cultura da Suíça-, também andei a pé a cidade toda, vendo os lugares mais importantes: como o bem-cuidado centro antigo, de casas parecendo feitas à mão, a Marktplatz, a Rathaus – o magnífico edifício vermelho art noveau, sede do governo. Sentei-me num banco à beira do Rio Reno para escrever cartões postais. Parecia que eu estava dentro de um...
A viagem sozinha acabava aqui. As informações eram de leituras sobre viagens; eu chegava nos lugares e já via os horários de saída dos trens; costumava chegar em horários bons para conseguir os hotéis, que geralmente ficavam perto das estações. Na Europa, a vida cotidiana é quase toda concentrada nos centros das cidades. Minhas anotações: “foram quinze dias ótimos, onde vivi emoções inenarráveis e fui feliz ao meu modo: vendo o que eu queria, andando kms e kms, buscando as coisas que gostava, comendo a hora que escolhia. Enfim, foi a primeira experiência totalmente sozinha no exterior e eu gostei muito. Para dividir de novo, só com alguém muito semelhante a mim porque realmente ainda sou a minha melhor companhia”.
FRANÇA: PESQUISA DOUTORADO COM MARISA "Onde quer que nos encontremos, são os nossos amigos que constituem o nosso mundo".
William James
Enquanto Marisa Boccalato não chegava para dividir o estúdio comigo, eu aproveitava para ficar só em casa ou desbravar o 13ème, que era um arrondissement bem interessante e diversificado: a efervescente Place de Italie, com o MacDô e o KFC; a avenida de Gobelins, onde tem o famoso museu de tapeçarias; Parc de Choisy; Lycée Claude Monet; as Salles de Cinéma, que eu costumava ir a pé – como a Gaumont, da Avenue des Gobelins ; e o supermercado Franprix, onde fazia minhas compras básicas de alimentação. Além disso, ainda andava muito pela cidade: atravessava os Boulevards St. Martin, Montmartre, Saint Germain, Saint Michel; passava pelas ruas dos meus darlings: Rue Edouard Manet, Rue Van Gogh, Rue Victor Hugo; ou pelo Lycée Gaston Bachelard ali no bairro; pelas estátuas de Balzac, Joana D’Arc, Luis de Camões, Beethoven, Churchill, Montaigne, Rimbaud, Alexandre Dumas, Molière, Luis XIV – coisa que mais tem pelas ruas são estátuas! As livrarias FNAC do Forum des Halles – linda!-, e Monalisait, no Chatelet; Bairro Belleville – de restaurantes baratos -, com chineses e africanos transitando e fazendo comércio, além de frutos do mar, peixes e camarões frescos na Rue de Belleville. Andava muito de ônibus também para ver a cidade toda: 20, 22,27,32, 38,39, 42, 62, 63, 83 - comprei o livrinho dos ônibus com horários e trajetos – eram tours pelos lugares turísticos, eram passeios de descobertas: eu, que adoro andar de ônibus, ficava sempre encantada. Numa tarde, entrei numa fila com 20 pessoas para comprar uma baguete recém-saída do forno. A minha foi a última! Um dia a poluição chegou a altos níveis e os transportes e os estacionamentos das portas da cidade foram gratuitos. Saindo do metrô St. Mandé Tourelle, uma tarde, um cara tocava no sax “Que será, que será”, do Chico Buarque!
Às vezes, pegava o trem e ia conhecer cidades do interior, em um bate-volta no mesmo dia, como Dijon, região da Borgonha – um mimo de lugar, com oito cinemas e dois teatros, com cerca de 2500 estudantes que se via em grupos pelas praças, parques e ruas. É a cidade das rotas do vinho, mas não fiz nenhuma, preferi andar pelas ruas para apreciar o estilo gótico e art déco (meu favorito) das lindas construções do centro histórico; o arco do triunfo; a Catedral de Notre Dame – mais antiga que a xará parisiense -; o Marchés des Halles. Comprei um potinho das tradicionais mostardas de Dijon, pois adoro a especiaria. Fui a Lille – a “Londres da França”, também uma cidade universitária, com oito cinemas, um teatro e uma ópera imponente. E também a editora Press Universitaire de Lille. Andei pelas lindas ruazinhas de estilo flamenco; pela Grand Place, com arquitetura do século XVII; pelo mercado Wazemmes, com bares e restaurantes à volta; aqui também há uma Catedral de Notre Dame; e o Palais de Beaux Arts – o 2º. maior museu da França depois do Louvre, em um prédio majestoso, mas não entrei. Fui em um TGV de dois andares (consegui ir no 2º) para Lyon –com dois mil anos de história, mas fiquei impressionada com seu desenvolvimento e modernidade. Cidade onde viveram os irmãos Lumière e onde estava o Instituto e museu Lumière, que não visitei - um "mico" para quem é amante de cinema. Entrei na igreja São Boaventura, onde um homem tocava um órgão divinamente. Fiquei lá, ouvindo um bom tempo. Meu roteiro a pé me levou ao Palácio do Comércio, Liceu Ampere, à grandiosa Ópera de Lyon, e ao Parc Tete d'Or - de beleza indescritível. Vi amor pelas coisas públicas, pois tudo era muito limpo, bem-cuidado, com indicações precisas, jardins, praças e monumentos muito bem-conservados. Lyon também é chamada de ‘capital gastronômica da França’, então, fui ver a famosa Brasserie Georges (1836) – em um lindo prédio, cuja entrada há o retrato de Gambrinus, o rei da cerveja, pois a casa fabrica a sua própria. De volta a Paris, tomei o ônibus 63, na Gare de Lyon, para ir até Alma-Marceau – roteiro urbano ótimo,passando pelos Invalides, Champs Elysées, Rue des Écoles, Carrefour Ódeon, Assembléia e vi a Tour Eifel ao longe toda iluminada
às 21h30. No dia seguinte, fui andar de ônibus novamente. Peguei o 27 na Place d’Italie até St. Lazare,passando pelo Luxemburgo, St. Michel, Ponte Neuf, Notre Dame, St. Chapelle, Louvre, Opera. Depois peguei o 52 na Rue Victor Hugo, que percorria todo o 16ème – o bairro mais chic de Paris, passando pelas ruas Paul Valéry, George Sand, Rodin,La Fontaine, Poussin, Mozart e Michel Ange.
Em outro final de semana, fui para Lourdes, Tolouse, Avignon e Aix-em-Provence. Em Lourdes, acompanhei a procissão das 21h. Foi um espetáculo comovente demais, chorei muito. Fui na gruta milagrosa e assisti a uma missa ao ar livre. Na Basílica, assisti ao final de outra missa. Toulouse – capital da Ocitánia, onde nasceu Carlos Gardel – era uma cidade insegura e esquisita, só fiquei andando no centro para admirar seus belos prédios de tijolos rosas e a majestosa Basílica de Saint Sernin, a maior construção românica da Europa. Em Avignon – cidade dos papas, com seu enorme Palácio Papal medieval, cercado de muralhas -, passeei ainda para ver a medieval Ponte d’Avignon (St. Bénézet) – patrimônio cultural da humanidade pela UNESCO -, e o Jardim de Dom, de estilo inglês. Pequena, bela e charmosa cidade. Fui a Marselha só para pegar o trem para Aix-en-Provence. No caminho, vi o morro Saint Victoire, que Cèzanne pintou 41 vezes, em busca da luz perfeita. Fiquei deveras emocionada com a visão, pois ele é o meu pintor favorito. Muita coisa na charmosa cidade tem o seu nome. Contudo, a frustração foi grande quando a sua casa-atelier estava fechada, pois só abria às 5ªs feiras. E nunca mais ali voltei... Em casa, não havia TV, só um rádio, onde eu ouvia a France Culture e ia apurando o ouvido; mas, em verdade, eu somente lia bem a língua francesa, pois me comunicava com todos/as em inglês. Continuava dando meus passeios de ônibus.
Quando Marisa chegou, fui buscá-la no aeroporto Charles de Gaulle e, de lá, já fomos para St. Germain de Près para tomar um vinho acompanhado de uma tábua de queijos no Deux Magots – freqüentado pelo darling Hemingway. Logo no primeiro fim de semana, fomos para Bologna no TVG Paris-Milão. Havia um Seminário do Umberto Eco na Universidade de Bologna – a mais antiga do mundo (1088), olha só que emoção! Lá encontramos meu orientador, Eric Landowski. Andamos a cidade toda para ver seus lugares principais, como a Piazza Maggiore, as Torres de Bologna, os famosos e inúmeros pórticos, o Museu Medieval. Almoçamos na Osteria Dell’Orsa, uma espécie de restaurante universitário, na Via Mentana, quase ao lado da Via Zamboni, onde fica a universidade. Ali, Marisa perdeu alguns retratos de família e lembranças. Na volta, paramos em Rimini – onde nasceu e está enterrado o cineasta Fellini-, que é praticamente uma vila. Sentamos na praça central para um café, na cafeteria Forum Imperiale, e ver o modesto movimento local. Depois seguimos para San Marino, uma república independente, a mais antiga do mundo, cercada de muralhas e com ruas de paralelepípedo em um sobe e desce sem fim. Ruas estreitas, cheias de lojinhas de quinquilharias, bem cafonas. A Basílica é imensa e linda (fechada); a Piazza de la Libertá tem a brilhante estátua da liberdade em mármore carrara; e as altas e antiquíssimas torres que despontam no céu de qualquer lugar que estejamos.
Os trens italianos eram os piores da Europa: barulhentos, velhos e os/as passageiros/as não paravam de falar alto, de gesticularem com tudo, apesar de serem bem receptivos/as. Ficamos no Albergo Firenze, em Florença, bem charmosinho. Terra de Dante, o “sumo poeta” italiano, que desprezou o latim e escreveu sua obra em italiano, que era a língua do povo. Tomar café nas praças era de praxe. Ficamos algumas horas em um café na Piazza della Republica vendo o grande movimento de turistas. Andamos pela cidade para ver tudo de fora, como a Ponte Vecchio e suas relojoarias; a praça do Gran Hotel Minerva, tendo ao lado a maior igreja franciscana do mundo, a Basílica de Santa Croce, com os túmulos de Micheangelo, Maquiavel e Galileu – há um mausoléu vazio para Dante,pois ele está enterrado em Ravenna, mas há ainda sua estátua em frente à igreja; e a suntuosa Basilica gótica Santa Maria Del Fiore, a Duomo.
Em Nápoles, ficamos no Hotel México, perto da praça Bellini, cheia de bares e estudantes. Fomos para lá para que Marisa conhecesse a terra dos seus avós paternos, além de querermos visitar a ilha de Capri e Pompéia. Pegamos um aerobarco para Capri, Mar Mediterrâneo sereno, dia de sol refletido na água como purpurina. A célebre Gruta Azul, onde Tibério tomava banhos, foi decepcionante para mim porque sou claustrofóbica e fiquei bem agoniada ali dentro,tanto quanto no pequeno barco, mesmo com a beleza da cor da água. Ainda bem que ficamos uns 5’ apenas por conta da maré e do fluxo turístico. O barqueiro era um estúpido e nos enrolou em 5 mil liras. Discutimos, mas não adiantou... Almoçamos à beira-mar. No continente, alugamos um taxi. Enzo era um motorista atencioso e simpático, cheio de histórias. Fomos até Sorrento, início da Costa Amalfitana, cheia de falésias e cafés na Praça Tasso. Vimos a Basílica de Sto. Antonino – padroeiro da cidade-, e a bela igreja barroca de Santa Maria Del Carmine.
SORRENTO POMPÉIA
Dia seguinte, de trem, fomos a Pompéia, cidade do 8º. Século A.C., que, em 24 de agosto de 79 D.C. foi coberta, por sete metros, pelas lavas do vulcão Vesúvio, que nos acompanhou no caminho paisagístico desta região. Em 1600, encontraram a cidade submersa e, em 1748, iniciaram as escavações arqueológicas. Havia vários/as arqueólogos/ as, de vários países, ainda trabalhando. As imagens das pessoas petrificadas foi bastante chocante e comovente: vimos aquelas treze pesso-
as petrificadas juntas. Andamos pelo calçamento original e irregular da cidade que estava bem vazia, mas quando passávamos pelo antigo bordel da cidade – Lupanare-, um guia italiano explicava aos turistas que ali era o lugar que pessoas iguais aos “brasiliani” de Roma ficavam. Morremos de vergonha e de indignação! A cidade era de uma grandeza ímpar, com belo Forum, a enorme Casa do Fauno, o Anfiteatro, as termas, o Templo de Apolo e o triste Jardim dos Mortos.
POMPÉIA
LUPANARE, POMPÉIA
POMPÉIA
POMPÉIA OBRAS DE POMPÉIA
Seguimos para Roma, e ficamos no Hotel Amália, a duas quadras do Vaticano. Muito bom, mas com o inconveniente de o banheiro ser no corredor. Mas como Marisa tinha que fazer suas pesquisas na Biblioteca do Vaticano, este era o mais acessível e barato. Para entrar na Biblioteca, tive que mostrar o passaporte e a carta de apresentação do prof. Landowski. Recebi uma carteirinha para a semana toda. Lá dentro, ficamos boquiabertas com a beleza das pinturas nos tetos. Deu vontade de deitar no chão e ficar admirando aquilo por horas... A biblioteca encerrava às 13h30 e a gente saía para passear pelo Vaticano e por Roma. Na Basílica de S. Pedro, a emoção foi grande novamente ao rever a Pietá, o túmulo de Pedro, o equilíbrio entre o Barroco e a Renascença, os enormes mosaicos, as pinturas dos tetos; também fomos no Castelo Sto. Angelo e na Praça Adriana. Em Roma, andávamos pela sofisticada Via Venetto – onde jantamos em um restaurante envidraçado no meio da calçada-; e pela Via Del Corso, Via Apia Nova, Forum Romano, Forum de Augusto, Coliseu. A igreja onde ficava o Moises de Michelangelo e a Vila Borghese estavam em obras. Saí sozinha um dia em que Marisa foi para a Biblioteca. Andei a pé para o ‘Bolo de Noiva’ (monumento a Vitor Emanuel II), termas de Troiano, Praça Veneza e Praça de Espanha, onde peguei o metrô até Termini,e ali o ônibus 38
para Corso-Trevi, para encontrar Marisa que me esperava na Livraria Viela – só de literatura medieval, e que não existe mais. Voltei para a praça Veneza e fui assistir à missa das 18h na linda igreja Madona Milagrosa. Dali fui para Praça de Espanha para entrar na igreja Trinitá Del Monti – que estava fechada mais cedo -,para ver os afrescos dos séculos XVI,XVII e XVIII. Roma é uma cidade muito elegante, mas barulhenta e trânsito confuso. Fui abordada por alguns ‘lambreteros’, mas não tive coragem de realizar o sonho de dar umas voltas pela cidade em uma lambreta como nos filmes “Candelabro Italiano” ou “A princesa e o plebeu”. A 1ª. visita não-realizada às catacumbas foi cheia de imprevistos: o ônibus 81 fechou as portas na hora em que eu ia entrar e Marisa seguiu só. Peguei o seguinte, mas ela não estava no ponto. Esperei-a aparecer por ½ hora e voltei pelo ônibus 714 e passei pelas Termas de Caracalas e pelo Teatro S. Marcello.
CATACUMBAS ROMA ROMA
No hotel, encontrei Marisa e saímos para o Congresso de Filologia Romana. De lá, seguimos a pé para o Domus Aurea - residência de Nero-, e para a Fontana de Trevi, onde tomamos um delicioso sorvete de pistache, sentadas na lateral direita da bela fonte, de guarda-chuvas abertos porque choveu um pouco e parou. Dali fomos sentar nas escadarias da Praça de Espanha para conversar mais e ver o abundante movimento dos/as passantes. Finalmente conseguimos ir à Catacumba de S. Calixto e seguimos um grupo de espanhóis. Fiquei agoniada, mas fui. A gente anda apenas pelo 2º. andar, com temperatura de 15º,onde há uma bela escultura de Sta. Cecília – mártir convertida. Ali viveram 500 mil cristãos e o lugar é cuidado pelo Vaticano. Saímos dali para o Museu Capitolino que estava com exposição de Matisse. Enquanto Marisa voltava todo dia para as pesquisas na Biblioteca, eu flanava por Roma, à beira do Rio Tibre, para atravessar suas pontes, de onde também se via alguns monumentos: Ponte Inglesa, a antiqüíssima Ponte Fabricio (ou ponte dos judeus), Ponte Sisto, Ponte Sant’Angelo - com o castelo do mesmo nome ao fundo. No último fim de semana na Itália fomos para Pisa – que só tem de especial o complexo arquitetônico que engloba a famosa Torre Inclinada (em obras), o Duomo e a muralha da cidade-, e Turim – a capital do Piemonte, sofisticada, foi a primeira capital da Itália, e é sede da FIAT -, onde fomos apenas na bela Piazza Castelo. Da Estação Porta Susa de Turim, voltamos para Paris.
VATICANO CASTELO SANT'ANGELO
CASA DE KEATS & SHELLEY PISA
TORRE DE PISA
A defesa de Mestrado de Tomás seria naquela semana, na Sorbonne Paris Nord, em St. Dennis – onde passamos rapidamente pela Basílica – o primeiro templo em estilo gótico da cidade-, para ver os túmulos dos reis da França, Luis VIII, Felipe IV, Carlos V e Maria Antonieta. O orientador não apareceu e a data foi transferida para dois dias depois, quando voltamos e Tomás foi aprovado e a comemoração foi no convento dos padres com os quais Tomás trabalhava, tudo sóbrio e distinto. Algumas semanas depois, oferecemos um jantar para Marilia, Tomás e Nilo, um amigo baiano fazendo doutorado na Sorbonne, no “castelo” – como chamávamos nosso estúdio. Marisa fez o strogonoff de ‘dinde’, que comemos com muito vinho nacional!
Eu e Marisa começamos nossas pesquisas na grandiosa Biblioteca Nacional François Mitterrand, a 15’ a pé do nosso estúdio, onde a gente ficava até ela fechar, às 22h, no primeiro mês. Costumávamos comer nos restaurantes do caminho da Biblioteca, mas também comíamos em casa: eu, pratos prontos do Franprix; Marisa gostava de cozinhar e comprava frutos do mar ou scargots frescos nos mercados da Rue de Tolbiac. Nas semanas posteriores, estudávamos até 16h e saíamos para andar pela cidade a pé ou de ônibus e metrô. E ainda íamos descobrindo pontos de vendas de bolsas e malas (metrô Anvers); produtos dietéticos (Bd. Raspail); sex shops (Pigalle); pontas de estoque (Rue St. Placide); a deliciosa Sorveterie Le Flore (atrás da Igreja Notre Dame); o barato bistrô Romain, na Galerie 26 (Champs Elysées com
"O CASTELO"
ST. DENIS, PARIS
Rue Du Colisée); o chocolate da Angelina (Rue de Rivoli, 226); a melhor baguete de Paris, no Lanche du Paul (Rue Auber, perto da Galerie Primtemps); a casa de chá Galerie Vivienne (Rue de La Banque, 5); os imperdíveis sorvetes Berthillon (Rue St. Louis, 31) – quando descobrimos a casa de Camille Claudel ali na Île de St. Louis-; a elegante Floricultura Patrick Allain (Rue St. Louis, 51); as fofíssimas Rue des Canettes (do século XIII), Rue de Guisarde e Rue Princesse (6éme); a sempre imperdível Shakespeare &Co (Rue de La Bucherie, 37), que fica às margens do Rio Sena, com vista para a Igreja de Notre Dame, e é uma espécie de templo da história literária da França; La Hune, uma livraria dos intelectuais franceses, que não existe mais (Bd. St. Germain, 170); o Café des Phares, onde tinha os papos ‘filôs’ dos domingos – ali sentamos na noite de Halloween, para ver o povo passar vestido de “noite do terror”-;a Galeria Véro-Dodat, charmosa, centenária (1ème, Rue de Boulois); tomar sorvete no Minimi’s (que não existe mais), ao lado do Maxim’s, na Rue Royale; andar nos Bateaux Parisiens, à noite, com os monumentos iluminados, foi espetacular – vimos o hotel onde Chopin e George Sand viveram, na Île de St. Louis; comemorar o início da temporada do vinho Beaujolais Noveau, com Nilo, na terceira quinta-feira de novembro (20/11/1997), em um bar na Bastille. Eu ainda tinha as pesquisas no CNRS e Marisa, na Biblioteca de Sainte-Geneviève, quando nos separávamos por uma manhã ou uma tarde.
BIBLIOTECA NACIONAL DA FRANÇA
CABARET EM MONTMARTRE
METRÔ ART NOVEAU
Nos fins de semana, fazíamos tours pelo interior francês juntas. O primeiro foi para o Vale do Loire – de trem, parando na linda Blois- cujo Chateau de Blois foi a residência principal dos reis até 1598. Toda sua mobília é autêntica. Ali pegamos uma excursão local para outros castelos, começando pelo Castelo de Amboise, às margens do Rio Loire - do século XI, onde nasceu e faleceu Carlos VIII, o castelo foi a última fortaleza medieval da França. Seu interior é rústico, sóbrio e sem exageros. Leonardo da Vinci foi hóspede do castelo e ele está enterrado na capela de St. Hubert, anexa ao castelo. O castelo de Cheverny - com o famoso balão colorido no seu jardim belo e bem-cuidado, tem arquitetura menos rebuscada. Ali chegamos na hora da alimentação dos inúmeros cães de caça da raça anglo-francesa Hound (a temporada de caça é de novembro a abril) – o canil foi criado em 1850. O interior do castelo é um tanto kitch, com excesso de dourado, muita tapeçaria nas paredes, mas tem o relógio do avô de Louis XV e uma cômoda de Louis XIV, o Rei Sol –um darling real, que inaugurou a cultura da espetacularização política (A ‘Fabricação do Rei’, de Peter Burke). A família Hurault ocupa as dependências do castelo e mantém a tradição familiar de 600 anos.
CASTELO DE AMBIOSE
CASTELO DE CHEVERNY
CHAMBORD
TOURS
Marisa quase perdeu o tour, pois se atrasou bastante e os/as turistas queriam deixá-la. E o motorista até saiu atrás dela, quando ela apareceu! Seguimos para o Castelo de Chambord – estilo renascentista-, a maior residência do Vale do Loire. Obra de François I, que também teve Leonardo da Vinci como hóspede. A escadaria aberta em dupla-hélice é a obra principal do palácio. Em forma de espiral, as hélices sobem aos três pisos sem nunca se encontrarem. O castelo tem ainda 426 quartos, 282 lareiras e 18874m² de gramados. Tudo lá é gigantesco! Achei-o meio assustador, exagerado e muito frio. O Rio Cosson foi canalizado para passar diante do Castelo. Louis XIV concluiu as obras de Chambord, em 1685. Ali Molière estreou as comédias Monsieur de Pourceaugnac e Le Bourgeois Gentilhomme; e o governo francês escondeu, na 2ª. GM, mais de cinco mil caixas com obras de artes dos museus de Paris. O Castelo de Chaumont-sur-Loire, de estilo
medieval, quando comprado por Catarina de Médici, teve como hóspede Nostradamus. Muitos donos depois, o Castelo foi adquirido pela escritora Madame de Staël e, em seguida, pela família Broglie, que o vendeu ao Estado, em 1938. É majestoso e tem de especial a porta da ponte levadiça e as luxuosas cavalariças construídas pelos Broglies.
Dormimos em Tours e fizemos nosso próprio roteiro para conhecer a cidade-jardim da França, terra de Balzac. Foi capital da França no tempo de Louis XII. Com Henri IV é que Paris se tornou a capital do país. Andamos pelo centro medieval e vimos a Catedral de St. Gatien – nome do primeiro bispo da cidade, iniciada no século XIII e concluída no século XVI. Os vitrôs e as rosáceas são espetaculares! É uma das igrejas góticas mais antigas do país. Ao lado fica o Museu de Artes, mas não entramos. Andamos pela Rue Colbert, cheia de construções medievais, restaurantes charmosos da culinária internacional (italiano, árabe, chinês, espanhol) e muita gente transitando. Na Place Plumereau, o ‘point’ da cidade, com bares e restaurantes com mesinhas na rua e seus prédios de madeira e pedra (estilo ‘enxaimel’), paramos para almoçar e ver a cidade passar pela gente. Fomos até a Torre do Relógio e à Torre Românica Carlos Magno, na Rue des Halles, onde restam partes da antiga Basílica de St. Martin, que foi totalmente destruída no decorrer dos séculos por guerras e invasões. A nova Basílica foi construída em parte do local original. Passamos, só por fora,
pelo deslumbrante Grande Teatro-Ópera de Tours, e atravessamos a medieval Ponte Wilson, que liga as duas margens do Rio Loire. Fazia muito frio. Dia seguinte, contratamos um taxi para irmos a Chinon, para conhecer a famosa fortaleza, onde Joana d’Arc reconheceu o Delfim da França, o futuro rei Carlos VII, mesmo disfarçado. Ele, então, confiou-lhe um exército para expulsar os ingleses do país. Foi ali que Henri II, marido de Eleonora, morreu. Andamos pela Rue Voltaire, bem medieval, com casas do século XV e XVI, ladeadas pelas muralhas da fortaleza, cuja casa de número 44 é o local onde Ricardo Coração de Leão faleceu, em 1199. É também a terra de Rabelais, e havia muitas coisas em sua homenagem: restaurantes, cafés, o hospital. O livro “Pantagruel e Gargantua” é ambientado em Chinon. Esta cidade faz parte do roteiro enólogo do país dos vinhos; então, almoçamos em um restaurante charmoso de um hotel uma carne de corça com talharim e legumes com vinho tinto local. Convidamos o gentil taxista para compartilhar nossa mesa e treinamos nosso parco francês com ele.
ABADIA DE FONTEVRAUD ABADIA DE FONTEVRAUD
Fomos para a Abbaye de Fontevraud, em Anjou, a maior e mais notável abadia medieval intacta da França. Sua imensa nave tem quatro domos e é o melhor exemplo de nave com cúpula em todo o país. Foi fundada no começo do século XII por Robert d’Arbrisse – pregador beneditino, que arrebanhou muitas mulheres da nobreza e colocou-as para serem as abadessas-chefes. A primeira foi Petronille e a segunda,
Mathilde, que ficou viúva aos 12 anos do marido de 14! Eleonora de Aquitânia, depois de ser rainha e mãe de reis, entrou para a abadia, onde está enterrada junto ao marido Henri II, ao filho Ricardo Coração de Leão e à nora Isabele de Angoulême – que assassinou seu outro filho João Sem Terra. Eleonora era mulher de espírito independente e aprendeu a ler, o que não ocorria com as mulheres do século X: o seu túmulo destaca sua escultura em tamanho natural, com um livro às mãos. Nos jardins da Abadia, há o cemitério onde estão enterradas as monjas que o gramado cobre, somente uma placa aponta para o local. Deitamos ali para sentir a energia daquele lugar mágico. Foi uma das maiores emoções da minha vida. Uma sofisticação-singela própria dos beneditinos, cultores da beleza e da elegância com simplicidade. Grande, mas bem arejado, bem clássico.
Às vezes, eu viajava sozinha para novas descobertas no interior da França, durante o dia, ou atravessava o túnel Paris-Londres para passar o dia na capital inglesa. Estive em Lisieux, por ser a cidade de Santa Terezinha, da qual minha mãe é devota. A Basílica se avista do trem, é belíssima. Fiquei uma manhã na igreja e só entrou uma senhora; me ajoelhei em cada capela oferecida por um país com seus santos padroeiros. Na do Brasil, não havia nada. Na cripta da Basílica havia um perfume maravilhoso no ar. Fui ao Carmel, convento das carmelitas, para ver o túmulo de Terése. Andei pela linda cidade medieval até as ruínas galo-romanas do século II, e fui à casa de Pére Zacharie, escritor satírico do século XIII.
LONDRES THE GLOBE
THE GLOBE
Em Paris, eu e Marisa alternávamos as pesquisas com os passeios pela cidade. Íamos muito à FNAC, PUF e La Procure (da Rue de Mézières) – livraria religiosa, onde Marisa descobria a literatura da sua tese. E pegávamos o ônibus 83 para os Champs Elysées; o 42 para a Ópera, Bd de Capuccines e Tulherias, e para saltar na Av. Rapp e ver os prédios Art Nouveau; ônibus 72 para Port de St. Cloud, passando por Cours Albert – rua da Embaixada do Brasil-, Estátua da Liberdade, Maison Radio France, Trocadero; o 47 para a Gare Du Nord; o 46 para
passar pela Av. Parmentier; o 84 para Place de la Concorde. O metrô Porte-Dauphine também era uma linda obra Art Nouveau. E íamos a museus: o Carnavalet, que conta a história da França até a Revolução; o de Picasso, que abriga os quadros que foram passados ao governo francês como pagamento dos impostos atrasados – um acervo enorme de pinturas, esculturas, gravuras, fotos, com alguns quadros dos meus períodos preferidos do pintor, o azul e o rosa; o Museu Gustave Moureau –um simbolista exagerado que pintava basicamente mulheres, a sua casa parecia com suas pinturas: cheia de quinquilharias, escura e poluída visualmente; o Museu de Art Naif, em Montmartre, onde havia exposições interessantes, como do artista Tawaian, com quadros bem coloridos, alegres, semelhantes aos do nordestino Chico da Silva; ao Museu Cluny, da Idade Média,onde tem a famosa “Dama do Unicórnio” – a majestosa tapeçaria que retrata os cinco sentidos; o de L’Orangerie – pequeno e chic -, onde estão as Ninféias de Monet - último ciclo, 30 anos depois da primeira -, as que ele doou ao governo francês depois da 1ª. GM e pediu que só fossem expostas depois da sua morte, que foi em 1927. São 100 metros lineares, oito quadros pintados na própria parede, em duas salas, e não há obra de igual quilate no mundo. E íamos a igrejas: a neoclássica Madeleine,com a Coroação de Napoleão (que a construiu) pintada em sua cúpula; a barroca St. Augustin, muito escura; a barroca St. Roch, mais bela por dentro que por fora, onde se vê ainda algumas marcas das agressões sofridas na Revolução Francesa, ela também abriga os túmulos de Diderot, Corneille e Fragonard, e foi palco do casamento do Marquês de Sade; a Igreja St. Pierre de Montmartre – construída sobre a 1ª igreja merovíngia em ruínas, do século XII, e onde Loyola fundou a Companhia de Jesus; a Igreja St. Etienne, onde estão enterrados Pascal e Racine, tem o órgão mais antigo de Paris, que é um primor do século XVII; a célebre Igreja de Notre Dame estava em processo de limpeza; a medieval Igreja St. Severin, onde havia o ensaio de um coral maravilhoso, acompanhado de órgão, harpa, cello, flauta, regido por um maestro grisalho, que fiquei assistindo até o final – saí dali em total estado de graça!; a be-
líssima Igreja St. Trinité – de fachada renascentista, palco do funeral de Berlioz. E flanávamos à procura dos darlings da literatura, pintura, música, filosofia, como no Quai d’Anjou, onde moraram Baudelaire, Rilke e Wagner; Rue Cortot 12, onde morou Renoir; Rue de Bruxelles, 21, onde morreu Zola; Place des Vosgues, onde viveu Victor Hugo; Bd. Du Montparnasse, 103, onde nasceu e viveu a infância Simone de Beauvoir (em cima do Café La Rotonde); Rue Crespin-du-Gast, 5, onde viveu Edith Piaf (nunca entrei no museu que está ali); Rue du Cardinal Lemoine, 74, onde morou Hemingway; Rue de Fleurus, 27, onde viveu Gertrude Stein. Pegávamos o destino metrô Jasmin para caminhar pelas elegantes ruas do 16éme: Av. Mozart, Av. Gautier, Av. Rodin, Av. Gui de Maupassant. E também ver o complexo de tênis de Roland Garros – meu esporte favorito-; o esmerado Hotel Mezzara, com os requintes da Art Nouveau; e uma cópia da estátua A idade do Bronze,a mais antiga figura em tamanho natural feita por Rodin, no meio da Place Rodin, em um cruzamento de carros. Duas vezes por mês, sentávamos no Café de Flore diante de duas taças de vinho tinto e uma tábua pequena de queijos, e ficávamos lembrando Simone de Beauvoir e Sartre, seus freqüentadores mais famosos. Saíamos andando a pé pelo Bd St. Germain, à época, quase sem pedestres,quando víamos o carro da Mairie, com assistentes sociais muito cuidadosas, tentando convencer os moradores de rua a ir para os abrigos naquelas noites de frio. Só iam os que realmente queriam.
MUSÉE L'ORANGE
IG. ST. ROCHE
E voltei ao Père Lachaise, como sempre faço, com o mapa na mão, para ver os darlings Alan Kardec, Balzac, Moliere, Oscar Wilde, Proust, Chopin, Jim Morrison; no Columbarium, estão as urnas de Isadora Duncan e Maria Callas. O grandioso cemitério estava cheio de árvores floridas pelo outono – minha estação favorita -, que colore toda a natureza de tons marrom, vermelho ocre, amarelo queimado. Eu havia ido lá nas estações do inverno e do verão. E sempre ia colhendo ‘pérolas’ pelo caminho: Hotel Elysées Ceramic, na Av. de Wagram – um prédio art nouveau lindo; a placa em memória ao homem desconhecido morto pela França no lindo Hotel Lutetia – um símbolo da resistência na 2ª. GM, em estilo art déco, onde James Joyce escreveu “Ulisses”; o histórico Hotel des St. Péres, em St. Germain dês Près– hotel do arquiteto de Luís XIV.
HOTEL ELYSEÉS CERAMIC
A primeira vez que fui a Londres, atravessando pelo novo túnel, foi com Marisa em um tour Cityrama. Tomamos o Eurostar para atravessar o túnel Paris-Londres, um sonho que Napoleão já tinha no século XVIII. São 20’ de travessia no eurotunnel – a sensação era sempre um pouco bizarra, além da minha aflitiva claustrofobia. Descemos na Estação Waterloo e pegamos o ônibus de turismo e vimos a cidade toda sob um trânsito horrível, parando nos monumentos mais famosos para as ocasionais fotos: London Tower, alguns palácios, o Parlamento, o Big Ben, a Tower Bridge – tudo que eu já conhecia. O guia sempre falava da princesa Diana, do seu carisma, que sempre estará no coração do povo etc.. Achei interessante: ela não conquistou o coração do marido, mas conquistou o povo que ele iria governar. Cerca de duas vezes mais, eu saía bem cedo para pegar o primeiro Eurostar para atravessar o túnel Paris-Londres e flanar pela cidade. Uma delas fui apenas para conhecer o The New Globe Theater, de Shakespeare, inaugurado com a peça ‘Henry V’, em 29/6/1997, a mesma data do incêndio que destruiu o prédio em 29/6/1613. A rainha e seu esposo, o Duque de
Edimburgo, estavam na noite de estreia. O duque é um dos membros do teatro. O senhor John Shepard foi o guia: é uma reprodução que tentou reconstruir o teatro tal qual era, como as madeiras encaixadas, sem necessidade de pregos ou colas; o teto é de um material parecido com bambu, que tem um efeito maravilhoso; o portão que dá para o cais é todo trabalhado de ferro com as figuras das obras do autor, como a coruja que remete a Hamlet; a bandeira no topo do mastro era para anunciar ao povo inculto que havia peça; o palco tem três níveis, conforme a distribuição do próprio Shakespeare – céu, terra e inferno. Era um teatro-inteligente: no incêndio, não houve mortos, todos/as se salvaram pelas duas portas de saída; hoje, há quatro e em três evacuam todos/as. Gostava de andar pela beira-rio do Tâmisa – e ver o lendário Iate Britannia, da realeza, ancorado debaixo da Tower Bridge, e ainda o Golden Hinde II, no qual Francis Drake circunavegou a Terra entre 1577-80, navio-museu, hoje; pelo mercado de Borought – o mais antigo de Londres, onde almoçava o menu “fish and chips” que adoro! Não sou uma pessoa-gourmet. Nesses passeios, eu me atinha a flanar pela cidade, não entrando mais em museus, ou galerias, ou igrejas.
Em outro fim de semana, eu e Marisa pegamos uma excursão Cityrama para ir a Chartres, ver a importante Catedral gótica, que achei feia, pesada,fiquei sufocada lá dentro...Só valeu pelos esplêndidos vitrôs, divididos em mais de 150 janelas! – são 2600 m² de vitrôs dos séculos XII e XIII. Ela é mais formosa por fora. A cidade é char-
mosa, bonita, pequena, animada e tem muitos jovens e um comércio buliçoso, além de teatro e cinemas para 40 mil habitantes. Vimos também o monumento a Jean Moulin - herói da resistência contra ocupação alemã na 2ª GM. Marisa continuava com seus descuidos: deixou o chapéu no banco do ônibus, mas não viu; e, por sorte, pegou o mesmo ônibus depois, na volta, e sentou no banco onde o chapéu ficara!
Curiosidades: havia uma L’école du chat na rua ao lado da Dr. Touffier, que preparava os gatos para serem adotados; alguns motoristas de taxi andavam com cães no banco da frente; a maioria dos filmes americanos (e estrangeiros) era dublada; em todos os cinemas, a venda de balas e afins era na plateia por moças ou rapazes com aquelas caixas penduradas, passando pelos corredores; alguns homens mijavam nas ruas, livremente; os motoristas dos ônibus usavam terno e gravata e eram muito educados; os ônibus tinham ar condicionado no verão ou quente no inverno; a maioria das pessoas lia muito nos metrôs, nos ônibus, nos trens; toda 4ª. feira, ao meio dia, tocavam sirenes por toda a cidade para lembrar o toque de recolher dos bombardeios da 2ª. GM; também nas 4as feiras, a entrada no Museu do Louvre era gratuita. A temporada parisiense acabou com a cidade entrando no inverno, as árvores já carequinhas, um vento constante pelas ruas...Do avião tirei a prova de que Paris é realmente a ‘cidade-luz’ do mundo (literal, não filosoficamente!), pois ela brilhava. E quando o avião passou por Madri, eu me certifiquei disso. Que grande diferença...