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Sérgio Cavalieri, Presidente da ADCE
combustíveis aconteceu a mesma coisa. A gente sempre preferiu enfrentar os concorrentes grandes, mas que atuavam dentro da lei, do que os aventureiros que eram desleais. Acredito na redução significativa da sonegação e de outras irregularidades no setor de combustíveis. Aliás, já melhorou bastante e vai melhorar ainda mais. A sociedade brasileira está cansada da corrupção e batalhando a favor da ética em todos os aspectos da nossa vida social, política e econômica.
C&C: Como o empresário da revenda pode enfrentar as dificuldades do negócio? SC: Não há outra alternativa fora da ética e do cumprimento integral das regras. Quem quiser se arriscar fora desse caminho, vai se dar mal. Tem que trabalhar cada dia melhor, com segurança, eficiência, qualidade, foco nos serviços, na conveniência, na diferenciação, surpreendendo os clientes. Equipe bem treinada, capacitada, engajada, reconhecida, recompensada e feliz. Esse é o caminho.
C&C: Temos visto que algumas empresas pequenas, na ânsia por se manterem abertas, acabam comprando produtos de fornecedores que sonegam impostos, fazendo com que entrem no ciclo de prejudicarem os seus concorrentes, alimentando a competição desleal. Qual a sua visão sobre essa conduta? Os fins justificam os meios? SC: Não. Os fins não justificam os meios de jeito nenhum. Se todos os empresários pensarem e atuarem assim, o Brasil será uma terra sem lei,
um caos e um pesadelo para se trabalhar. Estou seguro de que, depois da Lava Jato, a lei anticorrupção e a própria conscientização do empresariado, a mentalidade e o comportamento mudaram. Ainda temos alguns pontos fora da curva, mas a tendência é diminuir, e não o contrário. Vamos perseverar fazendo a coisa certa, do jeito certo. Este é o caminho para o sucesso e prosperidade.
C&C: Qual é sua opinião sobre a venda de combustível delivery? Quais são os riscos deste serviço para a sociedade e para o meio ambiente? SC: Você conhece aquela expressão: “pode isso, Arnaldo?”. Sou totalmente favorável à criatividade e à inovação, mas o setor de combustíveis é regulado, pois trabalha com produtos perigosos para a vida e para o meio ambiente. A segurança tem que vir em primeiro lugar. A meu ver, essa operação, além de ilegal, é insegura e não é racional do ponto de vista econômico.
C&C: O senhor considera ético uma companhia distribuidora vender para dois postos de sua bandeira, geograficamente próximos, isto é, dentro da mesma área de influência, com grande diferença de preços, determinando, na prática, quem sobrevive ou não no mercado? Ou, ainda, a mesma distribuidora vender combustíveis com preços mais competitivos para postos sem bandeira, enquanto da rede bandeirada são cobrados preços bem mais elevados, considerando a mesma área e região? SC: Acho que temos aqui uma questão mais econômico-financeira do que ética. Nenhuma empresa quer ver seu cliente “morrer”. Toda empresa tem um custo para conquistar um cliente e o fechamento ou perda dele é sempre uma perda também para o fornecedor. A questão de preços entre a distribuidora e a revenda é um tema extremamente sensível na relação. As distribuidoras sabem disso, pois esse aspecto pode representar a perda de um cliente, no curto ou no longo prazo. É difícil opinar sem conhecer a realidade de cada revendedor. O preço geralmente depende do investimento inicial que a distribuidora fez no posto, do prazo de pagamento ou galonagem contratado, se houve mú

tuo acordo, entre outros. Diferença de preço muito grande numa mesma região não é saudável, nem para a revenda nem para a distribuidora. Quanto aos postos bandeira branca numa mesma região de um posto bandeirado, entendo que a distribuidora deveria evitar, pois gera um tremendo conflito. Aí, sim, talvez seja possível até falarmos em postura não ética da distribuidora. É aquela velha história: o revendedor diz “confiei na sua bandeira e você me trai.” A meu ver, é uma má gestão e uma atitude inadequada da distribuidora.
C&C: O senhor acredita que a empresa que coloca como foco do negócio somente o lucro pode desaparecer no longo prazo? Quais são os demais pilares que consolidam uma gestão eficiente, que fazem uma empresa se perpetuar e ser reconhecida perante a sociedade? SC: Num ambiente competitivo, a empresa que visa só o lucro vai desaparecer. É uma questão de tempo. Hoje, a sociedade exige muito mais do setor corporativo. Ela quer que a empresa contribua para melhorar a qualidade de vida das pessoas e do planeta. Ela tem que ser relevante para a sociedade. O dono do negócio ou o gestor tem que ter uma visão mais ampla da nova realidade da economia 5.0. Ele precisa estar atento, pois o seu negócio depende da sociedade. Muitos atores se relacionam direta ou indiretamente com o seu estabelecimento, e esperam daquele empreendimento uma contribuição positiva para o bairro, cidade ou região.
C&C: Com base em sua experiência durante anos na Ale Combustíveis, como o senhor vê a proposta de verticalização feita pela ANP para aumentar a competitividade na ponta final da cadeia de comercialização de combustíveis? Parte do setor afirma que a abertura do mercado, nas condições atuais, aumentaria ainda mais as irregularidades do setor. O senhor concorda?
SC: Liberdade de atuação para os agentes e aumento da competição é sempre positivo para o consumidor, desde que as regras sejam respeitadas. Por outro lado, acho difícil a indústria atuar no varejo. Cada elo da cadeia tem suas particularidades e, como na maioria dos setores, o varejo prevalecerá, não por ter uma proteção de mercado, mas por sua competência e capacidade de fornecer melhores serviços.
C&C: Com as mudanças que estão sendo implementadas pelo governo de Jair Bolsonaro, como a reforma da Previdência e outras medidas de estímulo à economia, podemos esperar um melhor ambiente de negócios para 2020? SC: Na minha opinião, sim. Desde o governo Temer e continuando agora com Bolsonaro, existe um novo modelo econômico e uma orientação da economia que me parecem bem mais adequados para o Brasil. Reformas delicadas e importantes já passaram, como a do Teto de Gastos, Trabalhista, da Previdência, da Liberdade Econômica, do Orçamento Impositivo, programas de privatização de empresas, concessão de serviços de infraestrutura, redução do tamanho do Estado, mais eficiência, menos gastos públicos, o que leva ao equilíbrio fiscal. Com regras claras, a confiança volta, aliada à atração de recursos para o setor produtivo e os investimentos, que, no fim, são os fatores que geram crescimento. O aumento das vendas de diesel já é um excelente sinal. Vamos insistir nesse caminho. O setor privado tem que ajudar, fazendo a sua parte com responsabilidade e compromisso com o Brasil e com as pessoas. n

2020: ano das decisões
2019 ficou marcado como um dos anos mais difíceis da revenda. Os empresários que se mantêm no negócio estão com os nervos à flor da pele, em função da instabilidade das decisões que estão por vir.
Temos visto nossa agência reguladora usar dois pesos e duas medidas para os agentes regulados. As regras para postos de combustíveis são severas e, como vendemos um produto inflamável e contaminante, entendo que tenha que haver este cuidado. Porém, a revenda é um dos negócios mais fiscalizados do país.
O posto, para poder vender combustível, tem que instalar tanques de parede dupla, canaletas, caixa separadora, bombas específicas, atender a uma série de regras de meio ambiente, ter o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros, treinar os funcionários, ter procedimentos para proteger a saúde do trabalhador. Enquanto isso, em outubro, a Refinaria Manguinhos colocou alguns caminhões nas ruas da cidade do Rio de Janeiro para vender combustível delivery, via aplicativo. Esse serviço é proibido por lei e não tinha autorização da ANP. Mesmo com ofícios da Fecombustíveis e dos sindicatos filiados com as denúncias, não houve o recolhimento dos caminhões. A venda delivery foi impedida por intervenção da Justiça, que foi mobilizada pelo Sindcomb.
A ANP mudou a sua conduta, primeiro libera, depois regula. Em nome da modernidade, a agência pretende implementar um projeto-piloto durante um ano, para ver se vai dar certo este modelo de venda em domicílio. Eu questiono: estamos vivendo uma crise de valores? Onde está a responsabilidade da agência reguladora com relação ao consumidor e ao meio ambiente? Vamos esperar acontecer um acidente grave para tomarmos atitude? Como o risco é demasiado, a Fecombustíveis ingressou com recurso judicial e obteve uma liminar, em dezembro, para que se estabeleçam critérios de segurança antes da ANP implementar o projeto-piloto.
Entendemos que tudo está em transformação e as mudanças acontecem com rapidez, mas não podemos perder o bom senso. As novidades devem ser implementadas com cautela, evitando todo e qualquer risco à sociedade.
Temos pela frente muitas transformações em 2020, principalmente no primeiro semestre. A venda das refinarias pela Petrobras vai avançar e há muita preocupação com relação à infraestrutura e logística de combustíveis. Haverá uma nova configuração no refino, descentralizada do sistema Petrobras, e serão necessárias muitas mudanças para garantir o abastecimento do país. Se essa abertura não for bem planejada, correremos o risco de transformar o monopólio nacional do refino, que hoje é público, em monopólios privados regionais.
Este é um dos temas que deveriam estar na mesa da ANP como prioridade máxima. Porém, a preocupação da agência reguladoraé com a concorrência na ponta final da cadeia. Na lista de propostas para ampliar a competitividade, temos a venda direta de etanol das usinas para os postos, a liberação da comercialização de etanol e gasolina pelos Transportadores-Revendedores-Retalhistas (TRRs) para postos e Pontos de Abastecimento (PAs), tutela regulatória de fidelidade à bandeira etc. Outro assunto em discussão é a tutela regulatória de fidelidade à bandeira, que tem a concordância do Conselho da Fecombustíveis para que a ANP fique fora. Teremos, em 2020, as definições por parte da ANP de todos estes assuntos.
A Fecombustíveis está desenvolvendo um estudo para medir os impactos de todas as medidas propostas pela ANP. Os resultados parciais deste levantamento mostram que o Brasil tem uma infraestrutura muito precária, por isso a abertura do setor não pode ser feita na velocidade que a ANP quer, para evitar que tenhamos apagões de combustíveis pelo país. A abertura deveria começar pelo refino, sendo implementada gradativamente. No âmbito da reforma tributária, esperamos um modelo mais justo e simplificado, com a monofasia dos impostos federais e estaduais.
A previsão de crescimento do país é de 2,5%. Queremos que, neste ano, o Brasil cresça, que o setor evolua, mas que haja condições de competitividade iguais para todos, sem privilégios. Para 2020, que se inicia, desejo um ano melhor e mais justo para todos!
Confira as principais ações da Fecombustíveis durante o mês de dezembro de 2019:
03 – Reunião da Fecombustíveis com Rogério Marinho, secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, e sua equipe, para tratar de assuntos de interesse da revenda, em Brasília/DF;
03 – Reunião da Fecombustíveis com José Tostes, secretário especial da Receita Federal, e sua equipe técnica, para tratar de assuntos de interesse da revenda, em Brasília/DF;
18 – A Fecombustíveis protocolou na Justiça Federal de Brasília uma ação anulatória contra as notificações da Receita Federal, enviadas aos postos de todo o país sobre o adicional do SAT, em Brasília/DF;
20 – A Fecombustíveis obteve decisão favorável em liminar na Justiça Federal do Rio de Janeiro, para que a ANP abstenha-se de autorizar o projeto-piloto de delivery de combustíveis.
Quando o remédio mata o doente ao invés de curá-lo
Na última edição da revista Combustíves & Conveniência, neste mesmo espaço, tivemos uma posição pessoal contrária ao fim da tutela regulatória de fidelidade à bandeira, divergindo do posicionamento do Conselho de representantes da Fecombustíveis, que foi favorável ao tema.
Diante disso, os subscritores deste artigo, por entenderem que este espaço não é adequado a críticas internas, tampouco a reações individuais contrárias às decisões tomadas pelo Conselho, resolveram voltar ao assunto, deixando claro o posicionamento oficial da entidade.
Por decisão da maioria, o Conselho da Fecombustíveis, em outubro de 2019, posicionou-se pelo apoio integral à nota técnica nº 25/2019, emitida pelo Ministério da Justiça, que recomenda o fim da tutela regulatória de fidelidade à bandeira pela ANP, no âmbito da revisão do marco regulatório da revenda, tema também tratado pela Resolução 12, do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).
Com base na nota técnica, um dos pontos que nortearam nosso apoio ao fim da tutela foi o crescente e nocivo processo discriminatório de preços que, há anos, assombra a revenda, que tem na regulamentação do setor o cumprimento das cláusulas de exclusividade, um de seus pilares de sustentação, o que traz segregação à revenda em categorias, criando “grupos de postos privilegiados” com preços e condições muito mais vantajosos.
Quem deu às companhias distribuidoras o poder de decidir sobre quem vai sobreviver (ou não) no mercado? Até onde sabemos, em qualquer segmento competitivo, o mercado é soberano, implacável e elimina os competidores incompetentes! Isso é mercado, competição! Porém, pagar bem mais caro para alguns poucos pagarem bem mais barato pelo mesmo produto e dentro da mesma área de atuação, pode ser a distorção que define quem vive e quem morre. Isso não é mercado competitivo, mas, sim, discriminação e manipulação de mercado.
Outra distorção, potencializada pelo expediente da tutela, é a falta de competição entre as três maiores distribuidoras de combustíveis, que, juntas, detêm cerca de 65% do mercado nacional. Essas companhias praticam preços bem uniformes, com poucas diferenças, muito superiores às companhias que atendem aos postos bandeiras brancas, com diferenças que chegam a R$ 0,15, R$ 0,20 ou R$ 0,30 sobre o mesmo produto, conforme pesquisa da ANP.
Além da existência de grande distanciamento das forças de trabalho dessas distribuidoras em relação às demandas de seus contratados, não é missão da ANP fiscalizar quem está descumprindo uma relação contratual entre empresas privadas, e sim o Judiciário. Finalizando, 2020 será repleto de demandas importantes, vitais para nosso setor e vão exigir de todos os dirigentes sindicais do Brasil, independência de atuação e muita união em torno dos assuntos de interesse, cabendo à revenda participar das decisões, cobrando transparência de seus líderes.
Até onde sabemos, em qualquer segmento competitivo, o mercado é soberano, implacável e elimina os competidores incompetentes! Isso é mercado, competição! Porém, pagar bem mais caro para alguns poucos pagarem bem mais barato pelo mesmo produto e dentro da mesma área de atuação, pode ser a distorção que define quem vive e quem morre. Isso não é mercado competitivo, mas, sim, discriminação e manipulação de mercado