4 minute read
O País precisa da Tap Sim ou Não? | António Manuel Cunha Lopes
O País precisa da TAP Sim ou Não?
Comandante da TAP Aposentado Muitas histórias para contar
ANTÓNIO MANUEL CUNHA LOPES
Não há reunião social ou debate televisivo em que a emergência do assunto TAP não provoque, de forma apaixonada, acesa controvérsia. É raro, porém, ouvir uma abordagem desinteressada, racional, sustentada, sem preconceitos ideológicos.
Também, por isso, não posso deixar de fazer uma declaração de interesses: sou piloto de linha aérea, trabalhei na TAP cerca de 40 anos e sou reformado da TAP.
Mas isso não me impede, julgo eu, de analisar de modo isento a questão que puxei para título desta intervenção.
Começo por abandonar todos os argumentos que vejo formulados e que rotulo de românticos: o papel da TAP no regresso dos retornados, a presença dos símbolos nacionais nos aeroportos internacionais, a alegria dos nossos emigrantes ao sentir-se em casa quando entram nos aviões da nossa companhia, e tantos outros que no fundo apontam para a natureza pública da empresa. E faço-o porque não me parece que o esforço dos contribuintes deva ser justificado por considerações desta natureza. Até porque, por razões meramente economicistas a TAP há muitos anos “abandonou”, ou não serviu de modo apropriado e equitativo, todas as regiões do País. E por este motivo vem criando uma legião de críticos que, com razão, mostram a sua hostilidade ao suporte orçamental das opções da empresa.
Mas se a razão é essa, parece simples a solução: a definição de obrigações de serviço público asseguradas por um plano estratégico e operacional que as contemple. E não se diga que a dimensão do esforço não é equilibrada com o interesse protegido, porquanto os
4 mil milhões de euros necessários têm muito mais a ver com as consequências económicas decorrentes das restrições impostas pela proteção da saúde pública num quadro de pandemia, do que da ineficiente gestão da empresa. Recordese a inexistência de qualquer outra ajuda do Estado desde o fim do século 20, Há cerca de 25 anos que a TAP não beneficia de qualquer outra ajuda pública para além da que está agora em discussão e que relançou o debate. 25 Anos, durante os quais, as contribuições da TAP para a economia nacional e para o Orçamento de Estado excederam, largamente, a ajuda que a sobrevivência da empresa parece exigir.
Estas ajudas de Estado ocorreram em muitos outros países europeus e apenas os concorrentes privados, em especial um, contestou a sua razão de ser. Porquê então o ruido que a própria União Europeia tem criado em torno do caso português? Mais uma vez a TAP foi vítima da guerra partidária e dos preconceitos ideológicos que levaram a enfatizar a situação financeira pré-pandemia provocada pela privatização. No entanto, ignoraram-se as razões próximas do desequilíbrio financeiro, gerado essencialmente pelas transformações a que se assistiram no plano estratégico, as dores de crescimento causadas pela introdução de novas rotas com aeronaves desajustadas ou até obsoletas e cuja substituição estava programada para assegurar a rentabilidade dessas rotas. Acresce que a saturação do Aeroporto de Lisboa condicionou o crescimento da empresa, constituindo uma fonte de irregularidades cujos prejuízos causados não terão andado longe, só em 2019, de cerca de 100 milhões de euros. Claro que tudo isto não importa quando o objetivo é utilizar a situação da empresa como arma de arremesso ideológico fragilizando-se a apresentação em Bruxelas do caso português empolando os efeitos da privatização em vez dos danos gerados pela pandemia. Quando se ganhou consciência do erro, era tarde de mais, tendo como consequência a dramática redução de dimensão que não podia deixar de ter custos sociais enormes e a perda da oportunidade de garantir o sucesso do eixo América do Norte - África, tal como o eixo Europa – Brasil representara o maior fator de sucesso nos primeiros vinte anos deste século.
E é esta questão que nos transporta para aquilo que, quanto a nós, é a chave da resposta à questão formulada.
É comum ouvir-se que o encerramento da TAP seria irrelevante porque outras operadoras responderiam às necessidades do mercado. Tal é verdade para o mercado português, mas sem uma companhia ”hub” desaparecia cerca de 20% dos passageiros que passam pelos aeroportos portugueses, nomeadamente Lisboa e Porto e que não se destinam ao território português. Perguntar-se-á qual é o interesse de passageiros que apenas passam pelos nossos aeroportos? Sem eles muitas das rotas diretas de que hoje Portugal beneficia deixariam de ser viáveis economicamente e seriam encerradas, limitando a qualidade das nossas acessibilidades e deixando de constituir o fator essencial de suporte ao crescimento do nosso Turismo, em especial o segmento dos “short breaks” inviável sem rotas diretas. Não parece ser necessário salientar a importância do Turismo e da sua recente contribuição para o crescimento do PIB nacional e absorção do desemprego gerado pela crise financeira subsequente à queda do Lehman Brothers.
Este setor será o grande prejudicado pelo desaparecimento da TAP, mas também todos os portugueses que perderão a disponibilidade de muitas rotas diretas com as consequências em termos de tempo gasto e comodidade das suas deslocações.