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Segundo o Sebrae, no primeiro semestre de 2021 foram abertas 2.104 novas empresas nesse mercado; para 2022 é esperado um aumento de 30%
Bruna Maleh Clara GiamellaroOsbrechós tiveram grande ascensão durante a pan demia da Covid-19. Em um cenário de crise econômica, marcado pelo desemprego e pela queda de renda, comprar produ tos de segunda mão, com preços mais acessíveis, e empreender nesse mercado tornou-se uma al ternativa bastante considerada. Além disso, cada vez mais pessoas buscam essa forma única e susten tável de se vestir. Trata-se de uma maneira de se engajar no mundo da moda, desfrutando de estilos que lembram os anos 2000 e épo casDadosanteriores.doSebrae (Serviço Brasi leiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) apontam que no primei ro semestre de 2021 foram abertas 2.104 novas empresas na área de brechós, sendo 1.875 MEIs (mi croempreendedores individuais).
Luana Maira de Almeida Lima é uma das empreendedoras da área. Dona de um brechó online, o Afro dite, ela administra seu negócio so zinha há um ano. A ideia de come çar um brechó surgiu quando fazia um curso de corte e costura no Se nac (Serviço Nacional de Aprendiza gem Comercial). “Naquela época eu era ajudante em desfiles e também trabalhava no brechó de uma ami ga. Com a pandemia, resolvi me ar riscar na área, para ter uma fonte de renda”, conta.
Ela utiliza um cômodo vazio na casa de sua mãe como área de es toque e faz suas fotos para o Ins tagram e outras mídias digitais na garagem de casa. A mãe de Luana é dona de uma lanchonete. Luana usa um banheiro nos fundos do es tabelecimento para lavar as roupas do brechó. A microempreendedora oferece algumas dicas para quem quer iniciar um negócio nesse ramo.
Página no Instagram do brechó online Afrodite, de Luana Maira de Almeida Lima.
“É preciso observar muito e gostar do mercado de moda. Também é necessário persistir.”
Luana aponta como principal desafio o cuidado que é preciso ter com o armazenamento das peças. “A falta de espaço é complicada. Te nho mais de 400 peças em estoque.”
Também é preciso ter muito jogo de cintura e disposição para o trabalho. “Faço tudo sozinha, desde a compra das peças, lavagem, até a divulgação nas redes sociais e vendas.”Tudo faz parte de um processo cíclico. Luana compra as roupas em bazares e brechós menores como os de igrejas, hospitais e instituições que, por sua vez, rece bem as peças de doações. Depois de vendidas em brechós como o de Luana, as mesmas roupas aca bam voltando para bazares de en tidades assistenciais, via doação.
Um levantamento do Institu to de Economia Gastão Vidigal
da Associação Comercial de São Paulo (IEGV/ACSP) apontou que os brechós devem crescer quase 30% em 2022.
Universidade Presbiteriana Mackenzie Centro de Comunicação e Letras
Diretor do CCL: Rafael Fonseca Santos
Coordenador do Curso de Jornalismo: Hugo PatríciaEditora:HarrisPaixão
Fotos da capa: Giovana Santoro (terapia), Fer nanda Falcon (aporofobia), João Pedro Sampaio A. Mascari Bonilha (acessibilidade) e Fernando Bertrand (Etecs).
Impressão: Gráfica Mackenzie
Jornal-Laboratórioexemplares.dosalunos do 2o semestre do curso de Jornalismo do Centro de Comunicação e Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie. As reportagens não representam a opinião do Instituto Presbiteriano Mackenzie, mas dos autores e entrevistados.
Tiragem: 100
Boom ocorrido especialmente após o primeiro trimestre de 2020, com a pandemia, expõe crise econômica
Umapesquisa divulgada em julho de 2022, feita pelo Ibre -FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) a partir dos dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Do micílios) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), mostrou que o Brasil ganhou 1,42 milhão de traba lhadores informais entre o primeiro tri mestre de 2020, início da pandemia, e os três primeiros meses deste ano.
Cristiano dos Santos, 20, é um dos brasileiros que engrossa essa estatísti ca. Ele era um estudante do ensino mé dio quando no início da pandemia em 2020 tomou a decisão de se tornar um entregador do “iFood” (aplicativo de delivery de alimentos e compras), para conseguir uma renda. Desde então se gue na atividade com sua bicicleta mo torizada, mas admite que seu sonho é ter um trabalho formal. De acordo com a Associação Comercial de São Paulo (ACSP), o iFood chegou a ter mais de 39 milhões de pedidos por mês no ano de 2020. Juntando todas as empresas nesse ramo, esse mercado cresceu cerca de 250% na pandemia. O ifood
hoje tem mais de 200.000 restaurantes cadastrados e mais de 40.000 trabalha dores.Cristiano destaca diversas desvan tagens a que está submetido por não ter carteira assinada. “A gente fica sem benefícios como VR [Vale Refeição], VT [Vale Transporte], INSS [contagem para a aposentadoria]... Isso sem falar que nossa experiencia fica sem ser registra da, não temos como comprová-la.”
Além disso, os trabalhadores in formais não têm férias remuneradas, ficam sem o depósito no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), sem 13ª salário, têm uma renda que pode ser variada e, caso sofram algum acidente, ficam sem assistência.
Paralelamente ao crescimento da informalidade, o país tem observado o aumento do número de MEIs (Mi croempreendedores individuais). A Lei Complementar n.º 128, de 19 de dezembro de 2008, criou a figura do microempreendedor individual com o intuito de tirar milhões de brasileiros da informalidade, transformando o tra balhador informal em empreendedor individual. De acordo com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), para poder se tornar um MEI o trabalhador precisa atender algumas condições: deve ter
faturamento anual de no máximo R$ 81 mil (até R$ 6.750 por mês), ter no máximo um funcionário e não ter par ticipação em outra empresa.
As microempresas vêm aumentan do em especial entre os mais jovens. Segundo relatório do relatório da Da taHub, divulgado em janeiro de 2022, de janeiro a setembro de 2021 a quan tidade de MEIs cresceu 204% entre pessoas de 18 a 24 anos em relação ao mesmo período de 2019.
Jeferson Ferreira, 29, que antes de se tornar um entregador de aplicativo atuava no mercado formal nas áreas de telemarketing e fazendo trabalhos de escritório, resolveu se tornar MEI, para sair da informalidade. Ele também vi rou trabalhador informal no início da pandemia e chegou a sofrer alguns aci dentes atuando sem carteira assinada.
Para o economista da iDados, Bru no Ottoni, em entrevista para o jornal Valor Econômico, publicada em 10 de novembro de 2021, o crescimento da informalidade reflete o cenário de crise econômica do país. “Com a pandemia, muita gente saiu do mercado de traba lho, que está se recuperando, mas não apresenta ainda crescimento suficien temente grande para absorver todos que saíram dele, no que diz respeito a empregos de qualidade.”
Os trabalhadores informais não têm férias remuneradas, ficam sem o depósito FGTS, sem 13ª salário, dentre outras desvantagens. Arthur Hofmann Trindade Luis Felipe Medeiros Reis ReisMedeirosFelipeLuisPreocupação com o custeio de um sepultamento digno faz com que o momento da perda de um familiar se torne ainda mais doloroso
Aoescrever “vaquinha para fune ral”, na barra de pesquisa do seu navegador, imediatamente você irá se deparar com diversas histórias de pessoas que, devido ao elevado custo do sepultamento no Brasil, estão à pro cura de ajuda para poder proporcionar um enterro digno ao seu ente querido.
Segundo dados de 2021 do site da Prabem, organização especializada em assistência funeral, o preço de um caixão simples com translado até o cemitério gira em torno de R$ 900, isso sem contar gastos com preparo e liberação do corpo (que variam de R$ 800,00 a R$ 1.500,00), sepultamento (pelo menos R$ 400,00) e decoração (uma coroa de flores sai por pelo menos R$ 150,00).
No ano passado, o rendimento mé dio mensal domiciliar por pessoa caiu 6,9%, passando de R$ 1.454 em 2020 para R$ 1.353. Foi o menor valor registra do pela série histórica da Pesquisa Nacio nal por Amostra de Domicílios (PNAD), desde 2012. Nesse cenário, para muitas famílias o enterro do ente querido fica ainda mais complicado de ser custeado.
A psicóloga Maria Helena Pereira, coordenadora do Laboratório de Luto (Lelu) da Pontifícia Universidade Católi
ca de São Paulo (PUC-SP), em entrevista ao canal Universa, do portal jornalístico UOL (publicada em 2 de dezembro de 2018), destaca que é essencial viver o luto: “o luto é uma experiência dolorosa, mas que possibilita uma construção de identidade e de significados importan tes”.A questão é que essa vivência aca ba sendo deixada em segundo plano no momento em que os gastos com a partida do falecido se tornam a principal preocupação.“Émuito difícil ter que deixar as emoções de lado para lidar com a forma de pagamento do velório”, relata a em preendedora Carla Vasconcellos, que ar cou com os custos do funeral do marido de suaCarlairmã.perdeu o cunhado em circuns tâncias bastante traumáticas. Ele se suici dou. Ela queria ter oferecido maior apoio emocional à sua irmã e ter vivido melhor o luto do familiar, mas não foi possível. “Eu queria sentir a perda dele e, naque le momento, quase não consegui parar para abraçar minha família, por conta da preocupação com o lado financeiro.”
De acordo com a Lei 11.083, de 6 de setembro de 1991, a prefeitura é obriga da a conceder gratuidade do sepulta mento e dos meios e procedimentos a ele necessários aos munícipes que
não possuem condições de arcar com as despesas de funeral. Segundo o Ser viço Funerário do Município de São Paulo (SFMSP), a gratuidade é válida para os inscritos em programas sociais do governo pelo Cadúnico (Cadastro Único que visa identificar famílias que estão em um estado de vulnerabilida de social). Dentre esses programas está o Sisrua (Sistema de Atendimento do Cidadão em Situação de Rua). Nesse caso o sepultamento ocorre em dois cemitérios públicos da cidade: o da Vila Formosa, situado na zona leste e que é o maior da América Latina, e o Dom Bosco, conhecido como “Cemitério de Perus”, localizado na zona norte.
No entanto, algumas pessoas que tiveram acesso ao benefício reclamam da baixa qualidade do caixão, da falta de decoração e da parca identificação do túmulo no cemitério público. Em uma página nas redes sociais uma mu lher reclama que assim que os coveiros jogaram algumas pás de terra sobre o túmulo de seu amigo o caixão, por ser muito fraco, partiu-se. Ela diz que nun ca se esquecerá desse triste aconteci mento.Por isso, muitos acabam buscando ajuda extra para enterrar o familiar de forma digna e ficam ainda mais angus tiados, em um momento marcado pela extrema dor.
Aos que não estão cadastrados nos programas sociais do governo, ou seja, aqueles que não têm direito à gratuida de do funeral, o Serviço Funerário do Município de São Paulo informa que o valor mínimo para sepultamento é R$ 800,00. Se a pessoa quiser um pacote funerário com melhor caixão e decora ção esse valor aumenta. O SFMP facili ta as condições de pagamento em até três vezes no boleto bancário. O SFMSP administra 22 cemitérios municipais e a disponibilidade dos terrenos varia de acordo com a região da contrata ção dos serviços. Além dos sepultamos feitos em quadra geral, é possível fazer o enterro em áreas de concessão já ad quiridas pelos familiares.
Homem acende velas para um ente querido no cemitério da Vila Formosa, na zona leste, um dos espaços destinados aos sepultamentos realizados de forma gratuita. Bruna OtávioRibeiroSantosMais de 70% dos brasileiros dependem do SUS ou de programas sociais para lidar com a saúde mental
Giovana Santoro Luca Ferrari53% dos brasileiros a saúde mental piorou na pandemia, de acordo com pesquisa do Instituto Ipsos, encomendada pelo Fórum Econô mico Mundial e divulgada em abril de 2021.Além
daqueles que tiveram o psi cológico afetado pelo contexto pandê mico, há muitos brasileiros que sofrem com doenças mentais importantes. A depressão é tida como o grande mal do século XXI. É considerada pela Organi zação Mundial de Saúde (OMS) como a doença mais incapacitante do mundo. De acordo com a Pesquisa Vigitel 2021, divulgada em abril de 2022, 11,3% dos brasileiros relatam ter recebido um diag nóstico médico da doença. A frequência é maior entre as mulheres (14,7%) em comparação com os homens (7,3%). Os transtornos de ansiedade também têm atingido muitas pessoas na contem poraneidade e o Brasil possui o maior número de pessoas com ansiedade no mundo, segundo a OMS.
A psicoterapia é de extrema impor tância em todos esses casos, pois é um trabalho de autoconhecimento, em que a pessoa toma ciência das próprias emoções e aprende a lidar com elas. O indivíduo consegue enfrentar melhor os problemas da vida e balancear seus desejos, ambições, ideias e sentimen tos. No entanto, devido aos graves pro blemas socioeconômicos do país, os brasileiros sofrem com o difícil acesso à terapia. O cuidado com a saúde mental acaba ficando em segundo plano, dian te de necessidades mais urgentes, como alimentar a família. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), inquérito de base domiciliar realizado em 2020 pelo Ministério da Saúde em parceria com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), menos de 30% da população possui planos de saúde e mais de 70% depende do SUS (Sistema Único de Saú de) ou de programas sociais para lidar com a saúde mental.
Priscila Marcondes, 30, recepcionista
da academia Velocity, relata sua insatis fação em não conseguir continuar o seu tratamento psicoterápico. “Eu acho pés simo, porque me faz muito bem, é uma coisa muito importante e eu não posso parar.” Ela explica que o tratamento psi quiátrico a que foi submetida incluí me dicação acompanhada de psicoterapia. “Então eu preciso fazer os dois juntos, faz parte do tratamento. Se eu não faço, meu tratamento fica incompleto.”
Programas sociais, psicólogos volun tários e clínicas que oferecem atendi mento gratuito ou com redução de cus to, além do próprio SUS, são possíveis soluções para pessoas de baixa renda.
A psicóloga Diana Zanatta, de Ma ringá (PR), participou como parceira de um desses programas, promovido por uma igreja. Os fiéis que necessitavam de auxílio psicoterápico davam os nomes na secretaria da instituição e uma lista de espera era organizada. Os pacientes eram atendidos por Diana, conforme a disponibilidade da psicóloga.
A terapeuta também realiza consul tas em um valor social de R$ 60,00, além de atender por convênio na plataforma digital Telavita. Diana nota grande con traste entre as realidades de pacientes socialmente vulneráveis e os atendidos por plano de saúde. “Enquanto na pla taforma Telavita você encontra pessoas que fizeram uma cirurgia bariátrica e
querem fazer terapia por conta da ques tão da autoestima ou que receberam uma promoção pra trabalhar fora do país e isso acabou afetando sua ansieda de, no grupo dos que não possuem pla no [de saúde] você vai ver que a neces sidade por terapia ocorre pela falta de emprego, pela dificuldade de fazer uma compra no mercado, por problemas com bebida, envolvendo alguém da fa mília. São situações muito diferentes.”
Viviane Pessoa, psicóloga de Feira de Santana (BA), trabalhou no Centro de Re ferência de Assistência Social (CRAS). Lá, viu uma alta demanda por atendimen tos psicológicos de baixo custo. Ela ex plica que o papel da psicóloga do CRAS, quando chega uma pessoa que está com depressão ou crise de ansiedade, por exemplo, é encaminhar esse pacien te para o Centro de Atenção Psicossocial [CAPS], já que o CRAS não oferece aten dimento psicológico. “Porém, no CAPS a demanda é muito alta. Então muitas ve zes eu fazia o atendimento não somente pelo CRAS, mas de forma voluntária.”
O tratamento para transtornos men tais deveria ser prioridade na vida de todas as pessoas. Estima-se que apenas 10% dos que possuem depressão pro curam ajuda, segundo a OMS, e também que o risco de desenvolver depressão é maior em situações de pobreza.
Aumento da miséria e do número de pessoas em situação de rua são acompanhados de atitudes preconceituosas e construções hostis
Nogrego, á-poros significa “po bres” e “fobos” quer dizer “fobia”, “medo”. Nos anos 90, Adela Cortina, professora de Ética e Filosofia Política da Universidade de Valência, na Espanha, usou o termo “aporofobia” para se referir ao medo e/ou rejeição aos pobres, fenômeno que vinha sendo observado com o aumento da miséria. Em função do agravamento da pobreza em nosso país nos últimos anos (segun do o Censo da População em Situação de Rua, divulgado em 2021, desde 2019 o número de pessoas nessas condições em São Paulo teve um aumento de 31%), o termo voltou ao debate nacio nal. Especialmente após denúncias fei tas pelo padre Júlio Lancelotti, da Pas toral do Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo. Em fevereiro de 2021, o padre quebrou a marretadas blocos de paralelepípedos que foram instalados pela gestão do prefeito Bruno Covas (PSDB) na parte inferior de viadutos na zona leste da capital paulista para impe dir a presença de pessoas em situação de rua no local.
Além do pároco, ativistas de direitos humanos de diferentes organizações têm denunciado a aporofobia. “É puro preconceito com o pessoal das ruas”, afirma Valéria Jurado, que trabalha dire tamente com a população em situação de rua e tem a luta contra a aporofobia
como um de seus nortes. “A gente pre cisa olhar mais em nossa volta. É neces sário resgatar a humanidade de todos nós”, argumenta Valéria.
Ela destaca que não só os cidadãos podem ter atitudes de aporofobia. A arquitetura da cidade, dependendo de como for projetada pelo poder público, pode consolidar a aporofobia. Alguns monumentos e estruturas são construí dos de forma a impedir o convívio das pessoas em situação de rua. “Trata-se de uma arquitetura hostil. Podemos citar grades com lanças e pedras pontudas como exemplos. Os próprios bancos das praças têm umas divisões nas ripas, que impedem que as pessoas durmam neles.”Tarcísio Gontijo Cunha, doutorando em Arquitetura pela Universidade Fede ral de Minas Gerais (UFMG) e autor do artigo “O espaço urbano, da aporofobia às fissuras”, ressalta que é preciso cuida
do com a expressão “arquitetura hostil”. “O correto é designarmos essas constru ções como “intervenções hostis”, uma vez que, nas palavras de Nádia Somekh [presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo], a essência da arquitetura é o acolhimento, e não essa desurbani dade.”Para
ele, o Estado deixa de exercer seu papel em favor de todos os cida dãos, ao permitir instalações como es tas.Giovana de Souza Nascimento, da ONG Servidores do Bem, lamenta o fato de a sociedade não desenvolver a empatia e o altruísmo para com os mais vulneráveis. “Precisamos quebrar a visão estereotipada e desenvolver um olhar social como participação cidadã”, defende.Valéria
Jurado cita um caso que a marcou bastante e que reflete o pre conceito que as pessoas em situação de rua vivenciam no dia a dia. “Uma vez eu levei dois amigos da rua num shopping ali no centro [Shopping Light] para to mar café comigo. Eles não estavam mal trapilhos, mas acho que os seguranças desses lugares têm um olhar diferente para essas pessoas, parece que eles sa bem, fazem muita distinção. Quando entramos, o segurança já veio pra cima, como quem diz: ‘pera aí! Vocês não’.”
Valéria comenta esse tipo de atitude com indignação: “Vivemos em um país livre, a gente anda aonde quer, a gente vive numa democracia. As pessoas têm que parar com isso”.
FalconFernanda Pessoas em situação de rua na av. Atlântica com a João de Barros, em Socorro, zona sul. Intervenção arquitetônica hostil, situada na rua Augusta, na região central de São Paulo. MartinsLuizaAnaPcDs relatam cotidiano marcado por diversos desafios; somente 11,7% dos municípios brasileiros com serviços de ônibus intramunicipal possuem frotas completamente adaptadas
João Pedro Sampaio A. MascariPaiva, deficiente visual, caiu nos trilhos da estação Tria non-Masp do Metrô, na Linha Verde, no dia 1º de setembro deste ano. O caso foi amplamente noticiado na grande imprensa. Segundo testemunhas que esta vam no local, a queda de Magda aconteceu quando ela tentava desembarcar do trem, sem ajuda. O Sindicato dos Metroviários apontou que a falta de funcionários no Me trô para assistir pessoas com deficiência e com problemas de mobilidade exige uma solução rápida do governo estadual. Mag na teve que ser internada no Hospital das Clínicas, pois ficou com dores decorrentes da queda. Ela sobreviveu graças às pessoas que ali estavam e gritaram para que abai xasse no vão dos trilhos do trem, pois uma locomotiva estava vindo e chegou a passar acima dela.
O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) afirmou em 2017 que dos 1679 municípios que têm transporte coletivo por ônibus intramunicipal, apenas 11,7%, ou seja, 197 tinham acessibilidade completa da frota. O número de parcialmente adap tados era de 820 (48,8%) e o número de não adaptados era de 662 (39,4%).
Diogo Costa é estudante de jornalismo e deficiente visual. Ele vem de São Caetano do Sul (município da região do Grande ABC paulista) a São Paulo, para assistir às aulas da faculdade, a Universidade Presbiteriana Mackenzie, campus Higienópolis. Diogo utiliza trem, metrô e ônibus. Os funcioná rios o ajudam a embarcar e desembarcar do trem e do metrô. Ele aponta que as estações menores não contam com muitos funcioná rios e nas maiores eles estão muitas vezes ocupados. “Algumas estações são comple tamente inacessíveis, como a de São Caeta no que não tem piso tátil, escadas rolantes nem elevadores”, completa Diogo.
Daniela Aparecida é economista e defi ciente visual. Ela conta que, em vez de pro curar a ajuda de funcionários no Metrô ou no ônibus, prefere caminhar sozinha com seu cão-guia, porque tem mais autonomia. “No entanto, existe um desrespeito por
O deficiente visual Diogo Costa, na Linha Amarela do Metrô de São Paulo. “Algumas estações são completamente inacessíveis”, destaca.
parte dos condutores e/ou cidadãos que recusam ou dificultam a entrada do meu cachorro no transporte”, lamenta. Mesmo existindo uma legislação que regulariza essa entrada (Lei 11.126, de 27 de junho de 2005), ainda há condutores que atrapalham esse processo e criam conflitos.
Daniela também aponta como desafios em seu cotidiano nos transportes da cidade de São Paulo a falta de alinhamento entre a calçada e o ônibus, a plataforma elevatória que muitas vezes se encontra quebrada e pessoas que não são prioritárias e se sen tam nos bancos preferenciais. “É preciso melhorar nos transportes públicos a in fraestrutura e o design, para atender a pes soa com deficiência. Também é necessário um melhor treinamento dos funcionários, a fiscalização mais efetiva dos motoristas e uma maior empatia das pessoas.”
Para a especialista em acessibilidade e mobilidade, Sandra Ramalhoso, a situação melhorou muito em relação ao passado. “Hoje é bem mais fácil para um deficiente entrar num ônibus.”
Mesmo assim ela ressalta que há diver sos pontos a serem aperfeiçoados. “Precisa mos que os veículos sejam totalmente aces síveis, garantindo autonomia das pessoas, para que elas dependam o mínimo possível da ação do condutor e do cobrador”, expli ca.
A especialista ainda aponta outras ne cessidades. “Para quem tem deficiência vi sual, por exemplo, tem que ter aplicativos em braile; para quem tem nanismo é preci so oferecer assentos adaptados e platafor ma elevatória; para os que têm deficiência auditiva, seria importante os cobradores e condutores aprenderem Libras”, conclui.
BonilhaMascariA.SampaioPedroJoãoAlves, 27 anos, faz par te do grupo de milhares de brasileiros que acessaram e concluíram o ensino superior graças ao Prouni (Programa Universidade para Todos). Ela conseguiu concluir os seus estudos em 2018, no curso de Direito da Universidade São Judas Ta deu, a partir da bolsa parcial de 50% ofertada pelo programa e do finan ciamento dos outros 50% do valor da mensalidade, por intermédio do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil). Atualmente, trabalha como analista de contratos no UOL e almeja fazer uma pós-graduação. “A ideia de ser a primeira pessoa a completar o ensino superior em casa não seria possível sem a existência de políticas públicas como o Prouni”, destaca.
Criado em 2004, o Prouni nasceu com a vocação de atender estudan tes de baixa renda. Para obter bolsa parcial ou integral, além de conseguir uma nota maior que 450 na parte ob jetiva da prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e não zerar na redação, o aluno precisava ter cursa do todo o ensino médio em institui ções públicas de ensino básico ou ter sido bolsista integral (pelo menos durante algum tempo) em colégios particulares.Masessa
natureza social foi recen temente alterada. Em 26 de maio de 2022 o presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou sem vetos a Lei 14.350 que amplia o acesso ao programa para es tudantes que fizeram o ensino médio em escolas privadas, sem nenhum tipo de bolsa.
Em entrevista para uma reporta gem do Guia do Estudante, publicada em 27 de maio, um dia após a sanção presidencial, a diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Cláudia Costin, criticou a mudança. “Ela trouxe uma facilitação para o público que de alguma manei
ra já teria acesso ao ensino superior”, diz Claudia, argumentando que não faz sentido que quem já conseguia ar car com uma mensalidade no ensino privado seja beneficiado com bolsa.
Além do desvirtuamento do pro grama, houve uma diminuição de 1/3 do número de bolsas ofertadas de 2020 para 2021 – menor oferta de bolsas desde 2013, segundo dados di vulgados no ano passado pela Frente Parlamentar da Educação. Essa redu ção somada à abertura do programa para estudantes do ensino privado faz com que as poucas bolsas fiquem ain da mais Outrodisputadas.pontoa ser considerado, quando se faz um balanço dos 18 anos do Prouni, é a burocracia que os alunos enfrentam, que desconsi dera, por exemplo, pontos relevantes para distinção de renda. Nathalia Mo raes Desani, estudante de Engenha ria Ambiental na Unesp, em São José dos Campos (interior de São Paulo), comenta que seu pai é trabalhador de usina, e a porcentagem que rece be depende da safra produzida no período trabalhado. Não há espaço no Prouni para que seja feita uma distinção da renda e dos gastos, pre judicando o processo de inscrição da estudante, que não conseguiria bolsa integral pela má interpretação dos da
dos financeiros de sua família.
Para o pesquisador e mestre em Educação, Phelipe Rodrigues de Oli veira Pinto, da Universidade Federal de Viçosa (MG), a criação e manuten ção de políticas públicas na área de educação, com programas como o Prouni, é essencial para a garantia de que os alunos tenham acesso ao estu do contínuo. “As transformações e ini ciativas no sentido de democratização que foram desenvolvidas no contexto brasileiro nos últimos anos trouxeram novas dinâmicas nas relações dos es tudantes com o processo seletivo para o ingresso no ensino superior”, explica Phelipe.“OProuni coloca pessoas na uni versidade. Pra quem pode pagar não faz diferença, mas pra gente que a fa mília tá ali contando os centavos pra dar conta da mensalidade é muito im portante”, diz Leticia de Alencar Bar boza que, desde 2019, vem tentando conseguir uma bolsa pelo Prouni para cursar Medicina. Ela destaca que sem pre soube que sua família não teria condições financeiras para bancar os seus estudos, mas manteve o sonho sustentado pela possibilidade da bol sa. Depois de anos tentando Medici na, Letícia diz que agora está disposta a ingressar em outro curso, porém na mesma área.
SigoloGiovana Estudantes que almejam entrar no programa também sofrem com burocracia. Estudantes e especialistas em educação comentam alterações na natureza do programa que foi criado em 2004, com a vocação de atender estudantes de baixa rendaEntre os 81 mil técnicos que se formam anualmente nas 223 Etecs do estado de São Paulo, 70% conseguem emprego em menos de um ano
Fernando Bertrand Mauro SigristAsEtecs (Escolas Técnicas Es taduais) têm se tornado cada dia mais procuradas. Num cenário de crise econômica, com fa mílias sem condições de pagar uma mensalidade em uma faculdade, o ensino técnico acaba sendo uma im portante oportunidade para que jo vens possam ingressar no mercado de trabalho. Entre os 81 mil técnicos que se formam anualmente nas 223 Etecs do estado de São Paulo, 70% conseguem emprego em menos de um ano, de acordo com pesquisa Da tafolha (instituto do jornal Folha de S.Paulo), publicada em abril de 2020.
Ainda segundo a mesma pesqui sa, o público que estuda nas Etecs é formado por jovens entre 14 e 18 anos, a maioria (80%) vinda de famí lias com renda de até cinco salários mínimos.Beatriz
Montechiesi é ex-aluna da Etec Getúlio Vargas, localizada no Ipiranga, na zona sul de São Paulo. Ela diz que durante os três anos do curso de Nutrição e Dietética teve a oportunidade de aprender de forma significativa sobre como atuar nesse mercado. Pôde ficar por dentro de questões salariais, entendeu como funciona o esquema de férias, como se comportar em entrevistas de em prego, além de aprender algumas leis trabalhistas. “A Etec nos oferece um ambiente estudantil totalmente diferente de escolas convencionais do ensino médio. Eu acredito que os alunos acabam amadurecendo mais, principalmente porque no ensino técnico temos contato com o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)”, explica. A jovem destaca que o ensino da Etec foi essencial para ela conseguir um emprego na área. “Posso garantir que o aluno que es tuda em uma Etec sai bem mais pre parado.”Antes de cursar Eletrotécnica na
Alunos da Etec Basilides de Godoy, na Vila Leopoldina, zona oeste de São Paulo.
Etec Jaraguá, no bairro de mesmo nome, na zona norte, Guilherme de Oliveira estudou em uma escola pública convencional. “Quando vim para o ensino técnico pude compa rar as experiências e foi aí que eu vi a importância e o diferencial da Etec”, ressalta. Vindo de uma família de baixa renda, ele considera que estudar em uma escola técnica é uma excelente maneira de melhorar o ensino recebido na escola pública tradicional. “No início, fiquei assusta do com a mudança. Os professores cobram mais. Mas tem uma coisa legal: notávamos que eles queriam estar lá para nos ajudar e para me lhorar a nossa experiência”, conta. Para Guilherme, a Etec lhe ofereceu as ferramentas necessárias para in gressar no mercado de Eletrotéc nica. Ele só sentiu falta de algumas disciplinas mais generalistas, que lhe permitissem conhecer aspectos importantes de outras áreas. “Os cursos da Etec possuem uma maté
ria em comum que é chamada ‘Se gurança no Trabalho’. Essa matéria trata sobre os riscos no ambiente de trabalho. Geralmente o profes sor foca nos riscos voltados ao seu curso. Acredito que deveriam existir mais matérias comuns entre os cur sos, como Finanças. Essas disciplinas podem fazer grande diferença no desenvolvimento do aluno, e po dem ser lecionadas pelos professo res que já estão na escola”, opina.
Bryan Henrique, do curso de De senvolvimento de Jogos da Etec Ba silides de Godoy, na Vila Leopoldina, zona oeste, diz ter recorrido ao ensi no técnico justamente para ganhar mais preparo para ingressar na área que deseja trabalhar. “Ao pensar em atuar com desenvolvimento de jo gos fico um pouco receoso, tendo em vista o profissionalismo que é exigido nesse mercado, por isso re corri à Etec e espero ter um bom re torno no futuro.”
BertrandFernandoEstudo de pesquisador da UFRJ mostra que a probabilidade de um jovem vir a se tornar um jogador profissional é de cerca de 1,5%.
Enrico Fini Murilo Nuinde se tornar um jogador de futebol bem-sucedido habita a mente de milhares de crianças e adolescentes bra sileiros. Além disso, para muitas famílias que não possuem uma boa condição financeira, apostar no futuro do filho como jogador passa a ser a grande esperança para uma mudança de vida. Ali ne Barros, que trabalha como empregada doméstica em São Paulo, faz parte do grupo de pais que fazem de tudo para o filho se profissionalizar nos gra mados. Mãe de Gabriel, jovem
de 15 anos, ela acredita que o desejo do filho pode se tornar realidade. “Ele sempre disse que vai virar jogador. A gente torce e faz de tudo, porque é o sonho dele”,Masdestaca.ocaminho até a profis sionalização é duro e muitas vezes desonesto ou desigual. Segundo dados do artigo “Jo gadores de futebol no Brasil: mercado, formação de atletas e escola”, do pesquisador Antonio Jorge Gonçalves Soares, doutor em Educação Física pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a probabilidade de um jovem vir a se tornar um jogador profissional é de cerca de 1,5%, uma porcentagem extrema
mente
Umabaixa.dasetapas mais impor tantes do processo de profissio nalização é a “peneira”, seletiva na qual é feita a avaliação de jovens para terem a chance de entrar nos clubes. É um proces so extremamente concorrido, como explica Vitor Alcantara Carnovalle, preparador físico de atletas amadores e ex-funcio nário do Núcleo de Formação e Captação Meninos da Vila (do Santos Futebol Clube). “Para ser aprovado, o jovem precisa des toar dos demais, tanto de fora da base, quanto dos garotos que já estão na categoria do clube.”
A disputa para de se tornar jogador também escancara a
CorrêaPeçanhaCristianodesigualdade social presente no país, como salienta Marcelo Cardoso, professor de Jornalis mo Esportivo da Universidade Anhembi Morumbi e que pes quisa o esporte em suas múlti plas interfaces. “Quanto melhor o nível socioeconômico do jo vem, maior a chance dele seguir na carreira. No futebol, os me ninos que são matriculados em escolinhas que têm convênio com grades equipes possuem a chance de, pelo menos, serem observados nas peneiras que estes times realizam.”
O preparador físico Vitor Al cantara aponta outros elemen tos que influenciam no proces so de escolha de um jovem para profissionalização no futebol: “os critérios de avaliação variam de clube para clube em suas categorias de base. O jogador tem de se apresentar de manei ra completa nos fundamentos principais no futebol. A idade também pode ser um fator para aprovação e reprovação”.
No Brasil há um descompas so entre a realidade das condi ções da maioria dos jogadores de futebol e o imaginário popu lar, que costuma ver o futebol como um meio marcado apenas pelo luxo e a ostentação. Segun do a CBF (Confederação Brasilei ra de Futebol), cerca de 88% dos jogadores de futebol no Brasil recebem menos de R$ 5 mil por mês, sendo que apenas 3% rece bem quantias superiores a R$ 50 mil mensais. Dos 360.291 atle tas registrados na CBF, 75% são considerados amadores e não contam com o esporte como sua principal fonte de Independentementerenda.de to das as dificuldades, Aline con tinua apostando no futuro do filho em grandes estádios e competições. “Ele sempre diz que quer dar o melhor pra gen te e acha que o futebol é o meio de fazer isso. Eu acredito nele. A gente vê na TV esses jogadores famosos, como o Neymar, o Ga briel Jesus. Eles estão ganhando
um monte de dinheiro e reali zando o sonho da família. Espe ro que tudo dê certo com o Biel [Gabriel].”Sobreas “peneiras”, ela des taca que se coloca ao lado do filho em cada seletiva. “Sempre fui aos testes com Biel, acho im portante esse apoio.” Aline re conhece que o processo é bas tante competitivo e, por vezes, injusto. “São muitos meninos tentando com ele sempre. Sei que é muito difícil, nunca pas sam muitos e às vezes não pas sa nenhum. Acho que os times não pensam muito na gente, só pensam em quanto de dinheiro o menino vai poder dar a eles. O Gabriel já passou algumas fases, mas em alguns times já pediram até dinheiro para ele continuar jogando. Mas não tinha como. Não temos como pagar.”
Para a empregada doméstica, o mais importante é ver a alegria de Gabriel. “Se meu filho estiver feliz, eu também estou. Isso é o que interessa.”
CherriOliveiradeRicardoAndré“Quanto Cardoso.
Criada no Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, torcida conta com milhares de seguidores no Instagram e apoio do goleiro Cássio Guilherme Célio Guilherme Ramos Matias
do esporte a comu nidade autista tem, muitas vezes, dificuldade de ser in cluída e respeitada. Porém, alguns corinthianos se uniram com o intuito de trazer para os estádios essa parce la de torcedores, que muitas vezes é deixada de lado.
Os Autistas Alvinegros, como é chamada a torcida organizada de corinthianos autistas, começou em 2 de abril de 2022, justamente no Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo. Rafael Souza Lopes, 35, foi o idealizador do projeto.
“O início se deu pelo meu amor pelo Corinthians e também por eu me descobrir autista aos 33 anos”, explica. Rafael teve o diagnóstico tardio. Ele torcia pelo clube bem an tes de saber que era autista.
O projeto cresceu e hoje tem mais de 6 mil seguidores no Instagram. “Nós, que fazemos parte da organi zação, somos em sete pessoas. Além do Instagram, temos dois grupos de WhatsApp com cerca de 300 mem bros, no total”, conta Rafael.
Porém, nem tudo são flores. Os autistas ainda têm dificuldade de aceitação e convivência na socie dade, tanto no esporte quanto nas outras áreas de suas vidas. “É neces sário ir mais a fundo, pois se trata de um transtorno muito mais complexo do que se imagina. Nós que estamos no espectro autista temos duras ba talhas diárias. Lutamos para nos re lacionarmos, nos comunicarmos, e também para entender as pessoas. É preciso um bom convívio para que possamos evoluir.”
Rafael salienta que nenhum au tista é igual ao outro e que isso pre cisa ser considerado. “Cada um tem suaApesarparticularidade.”dasdificuldades, os Autis tas Alvinegros contam com o apoio de muitas pessoas. “Tem muita gen
te que abraça a causa conosco: pais de autistas, autistas jovens e adultos, profissionais da saúde que lidam com o autismo e simpatizantes que querem aprender sobre o assunto.”
Em 4 de setembro de 2022, o go leiro do Corinthians, Cássio Ramos, declarou, na zona mista, o seu apoio à torcida, usando uma camisa em favor da causa. Na ocasião, ele fez a seguinte declaração: “Eu conheci o pessoal [da torcida], eles estiveram no CT [Centro de Treinamento]. Vi que são pessoas sérias e boas. Acho que nem todo mundo sabe, mas te nho uma filha autista, a Maria Luiza, de 4 anos. Comecei a pesquisar e ler mais sobre o assunto. É bem legal. Sigo também outras páginas de au tismo e, como pai, quanto mais eu puder saber sobre autismo, para me integrar, quanto mais eu puder saber pra dar suporte para a minha esposa, para a minha filha, para que ela pos sa evoluir, melhor”.
No ambiente do estádio, os or ganizadores da torcida têm um dia bem corrido, mas sempre buscam atender os torcedores. “Nos dias de jogos ficamos muito ansiosos para que tudo ocorra como o esperado.
Temos toda uma logística com rela ção aos materiais [bandeiras e faixa]. E também na recepção das pessoas que estão chegando para o movi mento.”Segundo Rafael, o Corinthians trata os Autistas Alvinegros como uma torcida comum, oferecendo os benefícios padrões de uma or ganizada. Mas por se tratar de uma torcida focada em pessoas com defi ciência, algumas regras se destacam. “Pessoas com deficiência não pagam e têm direito a três acompanhantes. No caso de pessoas do espectro au tista, a Neoquimica arena dispõe de um espaço exclusivo que dá direito à entrada gratuita e também direito a mais um acompanhante que paga meia entrada, no caso no setor oeste superior.”Deacordo com Rafael, o único objetivo da torcida Autistas Alvine gros é lutar pelo respeito e inclusão social. “Infelizmente, somos todos os dias taxados e rotulados. Nossa bus ca será contínua pra que possamos conquistar nosso espaço e mostrar que o autista tem voz e essa voz vai ecoar por todos os cantos.”
MottaGustavo A iniciativa de criação da torcida organizada veio do torcedor Rafael Souza Lopes.