APENAS SER Preview
título: Apenas Ser
autor: Osvaldo Énio
edição: Edições Vírgula® (Chancela Sítio do Livro)
fotografia de capa: Chistian Manjecen
arranjo de capa: Ângela Espinha
paginação: Paulo Resende
1.ª edição
Lisboa, maio 2023
isbn: 978‑989 8986 71 9
depósito legal: 514201/23
© OsvaldO ÉniO
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APENAS SER
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A poesia pode ser também o grito de uma alma sofrida
Parati,Quiquinha SÃO
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BRINCADEIRA DA MENTE
Acalmei as minhas emoções, Parcelei o meu pensamento, Decidi partir em busca de nada.
Entendi que deveria tocar no nada, Quando me interrogam enfaticamente, Não queres nada?
Então, o nada é tudo para ele. Sim, se o tudo existe, O nada que é nada, Será a ausência de tudo.
É nada, e presumidamente irreal, Será sempre aquilo que desejares, Pois é um oposto ao ser e igualmente Ao tudo que possas imaginar.
O Universo veio do nada, Evoluiu a partir do vazio, Estado a que posso chamar nada.
Afirmam os sábios e os filósofos, Gente de competência e saberes.
Teria sido o nada a sua origem?
Posso representar mentalmente o nada. Poderei até dar-lhe formas.
Assim ao afirmar que o espaço
Não tem nada, eu estou a imputar
Existência ao nada,
Por inferência imediata ao vazio.
Por tal presságio, Sinto-me vazio de nada!
QUANDO O SOL IA DORMIR
Quando o céu começava a pintar-se de vermelho e amarelo,
As várias brincadeiras chegavam ao fim.
Era a altura de ir ter com a Cilinha, Sentar no capim do jardim à frente de casa, E com ar já sereno, recuperado das brincadeiras, Conversarmos sobre o que se havia passado No dia, ou no círculo que mais nos interessava.
Logo que as estrelas pintassem o céu, De sentados passávamos a deitados, E iniciávamos o nosso jogo “interestrelar”
Observando com atenção o firmamento, Espetacular, esmagador, imponente.
E começavam a surgir os desenhos
Que cada um de nós conseguia formar.
E então descobríamos com a nossa inocência e imaginação, além das constelações conhecidas como a Orion,
Três Marias, Cão Maior, Cão Menor
E a Sirius, e desenhávamos um cão, um carro, uma serra, uma montanha.
Por vezes, a nossa fértil imaginação, Levava-nos a passear com os dedos
Por entre as estrelas, felizes, burilando
O futuro que em nosso entendimento, Seria sempre belo, sereno, acolhedor, vitorioso, esplendoroso,
Tal como as estrelas que nos espreitavam
E parecia querer falar connosco.
Começara o nosso futuro, sem o sabermos.
Décadas depois, chegámos a essa conclusão que bailara no pensamento.
E tudo aconteceu como tínhamos presumido.
E somos felizes.
Temos os nossos filhos e uma família unida, amiga, fraterna.
A caminhada é longa e com obstáculos.
O firmamento, e seu idêntico, sempre nos acompanhou!
Foram as estrelas, nossa luz brilhante, Que silenciosamente nos iluminaram!
Numa outra dimensão, seremos avisados, Se fomos realmente merecedores De termos vivido a vida!
DIA DOS NAMORADOS
É dia dos namorados Sempre bem recebido, Por marotos, Apaixonados, Mas por outros, Esquecido.
O mais jovem Comprou a prenda, Que por ora tem, Como lhe lembrava, A agenda, Que guardava.
O outro mais adulto, Com pouca experiência, Portou-se como estulto.
Esqueceu
A prudência,
E lá ficou a lembrança, No prato da balança.
Aquele de meia idade
Já treinado
Para o tal efeito, Chegou com à vontade, Com discurso bem feito.
E com gesto a primor,
Ofereceu-lhe linda flor. O mais senil porém Para não ficar
A perder, Sério como ninguém, Trouxe a recordação, Do primeiro beijo a dar, Ardente de paixão, Os corações a bater, E juras de amor, Para nenhum esquecer!
O INÍCIO
O tempo marcava o dia 7 de Maio de 1953.
Ao findar do dia, e quando a luz solar se enfraquecia, e em simultâneo se coloria garridamente, tudo banhando, mais uma vez estávamos juntos a conversar.
Todos no bairro já diziam que namorávamos.
Nós, rindo, dizíamos que sim… talvez…
Por qualquer razão ou causa que desconhecemos, entendemos tomar a decisão.
Fizemos então a primeira jura de amor.
A madrugada começa a iluminar a terra, e eu procurava encontrar a melhor palavra para dizer o que a minha alma, plena de satisfação, me tornava feliz.
Tinha 17 anos. Após escrever estes versos que queria oferecer à Cilinha no dia seguinte, consegui adormecer.
Por ditame do Universo, a partir de 09 de Março de 2019 cessa parte da matéria e apenas o espiritual nos junta.
E juntos prosseguimos!
Foi no dia sete amor, À sombra de um luar intenso.
Que expandi a minha dor, E tive tanto contentamento!
Sofria silente a meditar, Crendo não gostares de mim.
Quem havia de pensar, Que nesse dia dirias… Sim!
Duas almas se juntaram. Num amplexo imortal!
E nossos seres vibraram.
Numa glória triunfal!
“És minha e eu sou teu”, E a lua por nós sorriu!
Foi uma benção do céu Que eu pedi, e Deus ouviu!
E juntos estamos na vida, Assim quis a nossa sorte:
Imagem de amor reflectida, Em nós dois, até à morte!
O FUTURO
Fujo nem sei para onde, Apenas sou arrastado Por algo ignorado, Buscando uma qualquer fonte.
Olho receoso, aflito, Ao chegar o fim do dia, Sem saber o que perdia, Em minha defesa, grito.
Chega a luz pouco intensa Que me vem tornar mais só, Apenas um grão de pó, Nesta vastidão imensa.
Quero socorro, não posso, Perdi o vigor, a voz, Vai arder um sofrer atroz, O mundo, já não é nosso.
A Natureza não é igual, A Terra perde energia, O sol consome o dia, Eis chegado o degrau final!
ROSA DE PORCELANA
Tenho uma flor linda no meu jardim, A quem dedico esmero e carinho. É um bálsamo feito para mim, Quando saio e parto ao caminho.
Ao chegar vou lesto falar com ela, Ver como a intempérie a tratou. Bailando como a chama duma vela, Que a tempestade nunca apagou.
És um mimo que pinta a minha vida, És o ardor, a flamejante chama, Que faz esta passagem mais amiga.
Suave flor e minha companheira, Chamaram-te rosa de porcelana, Meu querer é ver-te a vida inteira!
UM NÃO
Queres aceites ou não, Eu gosto de dizer não. Para mim, o não encerra Mais robustez que o sim, Traz consequências díspares
E revela menos fragilidade que o sim ou o talvez. O talvez acarreta a dúvida, O receio, a inquietação. Por isso ao talvez não dou Espaço, atenção.
Respondo não, com a força Que enforma a razão. Dizer não, é um desafio, É uma afronta, um conflito. Porém se queres ser o melhor, Se pretendes vencer em calmaria, Com sonante apoio em teu redor, Mesmo que a mente diga não, Encerra os olhos e assim, Afasta as vespas, dizendo um sim!
A MULHER
Sabes cantar e bailar por vezes, Mesmo quando o tempo surgiu ingrato. No trabalho viveste revezes, Tudo arrancaste, nada foi dado.
A meninice não andou grada, Cresceste espreitando em redor, Triste, por todos sempre enganada, Sem alegrias, apenas temor.
A vitória chegou por coragem, O tempo passou e não te venceu, Foi sempre tua essa vantagem.
Hoje és exemplo, mulher e mãe, O bruto explorador tudo perdeu, Agora já liberta, não és refém!
A NOITE ESCURA
Reconheço quem tenha medo da noite! Na minha África, é o tempo que os espíritos Vêm falar com os familiares e amigos.
Quando a escuridão invade a floresta, Cobre os rios e esconde os montes, Eles deslocam-se pelas picadas, Sentam-se no terreiro da sanzala
E aí aguardam quem os quer ver.
Conversar e saber se os deuses
Vão mandar as ombelas1 , as doenças, E se o milho vai crescer bem.
Falam da família e dos amigos que partiram, E querem saber se o sol volta todos os dias. Quando a luz da lua é forte, Quando as folhas das árvores brilham, Os rios são caminhos luminosos, O feiticeiro vai esperar os espíritos
À frente da sua cubata, Onde os vivos não podem pisar.
Apenas o feiticeiro ouve a sua voz, E transmite depois o que lhe foi dito.
Falam dos mortos, o que fizeram, Os bois que deixaram, e da sua família.
Pedem aos deuses conselhos, E confessam quando não houve respeito
Por aqueles que já foram levados, Devendo o soba2 decidir o castigo a cumprir.
Este, que já pensou qual a pena, Após falar com os deuses decide de imediato, E a condenação é pronunciada. É a justiça imediata para ter valor. A verdade é sagrada e é a força Que a todos une e faz a paz na sanzala.
A solidariedade vem logo a seguir Na escala de valores.
A repartição de bens é feita na oportunidade Para que todos possam gozar o seu valor. Os bens da sanzala são utilizados por todos.
Qualquer trabalho é comunitário. Assim, nos locais mais recônditos Da imensa Angola, onde a chamada
“Civilização” das leis escritas não chega, Encontramos em cada sanzala3 , Uma sociedade perfeita,
Onde os seus elementos constituintes Gozam igualmente os direitos e deveres baseados nos sadios princípios
Que a tradição a todos agrega.
2) autoridade local
3) conjunto de cubatas (aldeia)
A PASSEAR
Embora digas ser meu amigo Não quero que me conheças. A amizade são atos, vivências, Atitudes, comportamentos, E não sentimentos.
O sentimento pode ser contrário
Ao procedimento tomado. Continuamos a conversar
E a minuciar os bens da vida, Falamos da situação mundial, Cada momento mais impercetível.
Povos que foram amigos
E hoje são inimigos, E inimigos sempre o serão, Se o ódio for eternizado
Na essência de cada um! Por isso, sem alteridade, Decidi apartar, Não ser amigo de alguém!
Será uma cobardia?
Não sei classificar, Pois não tenho saberes, Nem para me condenar.
É sempre mais fácil julgar os outros!
A TERRA
No princípio eras uma bola incandescente, Resfriando ao longo de milhares de anos, Que te foram solidificando, Formando a sua crosta, o manto e o núcleo, Criando um planeta de composição rochosa, Um planeta telúrico e não gasoso, Como alguns mais.
O mesmo não é rigorosamente esférico, Mas achatado nos pólos, sendo assim
O seu formato geóide. Comporta as camadas seguintes: Litosfera, hidrosfera, atmosfera e a biosfera, Onde vivemos todos os seres vivos.
Pela tua composição gasosa, Chamam-te o planeta azul Que a insanidade dos humanos, Com os seus comportamentos abjetos, Degradantes e lesivos, Estão a fazer menos azul.
O planeta vem dando avisos constantes.
O chão esventra-se e as torrentes
Tudo derrubam e arrastam;
Os ciclones anulam o trabalho dos homens;
As lavas reduzem a cinzas o caminho;
Os mares e os oceanos tornam-se
Em armadilhas para todos, Quer sejam seus habitantes ou não.
Os incêndios apoderam-se das florestas
E tornam o verde em negro escuro, Duro, seco, triste, repulsivo. As populações extinguem-se aos milhares.
Confiemos num novo ser.
Apoiemos numa nova geração, Que vem sido municiada nas escolas, Para que possamos sobreviver, Continuar a gozar e a contemplar Este maravilhoso Planeta Azul, Que o descaso dos seus habitantes, O tem arrastado para um final exterminador!
A TUA MÃO
Olha como a estrada é longa, E os trilhos indefinidos, Tapados pela bruma!
Avancemos juntos, Dá-me a tua mão, Meu Amigo e Companheiro!
Procuremos algum sinal, Mesmo que nada exista, Alcançaremos uma cruz.
O fim, ignoramos onde está!
Juntemos a nossa vontade, Andemos no mesmo passo, Com um só objetivo.
Somemos a nossa verdade, E sejamos gémeos, Duma mesma esperança!
A VISÃO
Foste a presa fácil de paixões, Que feriam grave por instantes, Não separando as divagações, Que te levavam a fins lesantes.
A angústia, medo, ilusão, Tua companhia permanente, Que procuravas vencer em vão, Mas iam consumindo a mente.
O sofrimento atroz que bramias, Plasmado em pungentes palavras, Não emocionou quem tu amavas.
Esperavas alguém, não a visão; Apenas o complacente perdão, Do amado que tanto querias!
ABANDONADO
Continuas a dormir Por entre o cartão
E os papéis, Marcado pela reação E malevolência, Dos cruéis, Dos arrogantes, Dos falsários, Que nada sabem Sentir.
Tens fome, tens frio, Pelas vielas esconsas, Passas abandonado, Sofrido, Olhado com desdém. Ignorado, Por quem Goza de sorte, Tantas vezes, Imerecida.
São pérfidos, Não têm afeição
Que importe, Nem um momento De maldade esquecida.
São lobos famintos, Que passam como cordeiros, Olvidando que o amanhã,