Revista EXPE - Edição 13 - 2019/2

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EQUIPE EXPERIMENTUS (EXPE) Revista Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó) Coordenação: Angélica Lüersen Coordenação pro tempore: Alexsandro Stumpf REDAÇÃO E DIAGRAMAÇÃO Alana de Bairros Alexsandra Zanesco Ana Laura Baldo Ana Vertuoso Cristian Alflen Deise Agnoletto Eduarda Boettcher Gabriela Busatta Ícaro Colella Isabel Bevilacqua Isabel Piccoli Jaqueline Biavatti Lucas Liston Jhonatan Beneti Laura Fiori Mirella Schuch Natália Souza Paula Luiza Eloy Tayvon Bet Valeria Cenci

EDITORIAL

Se o objetivo de uma revista laboratório é apresentar a construção coletiva de vários estudantes, não poderia ter melhor maneira de retratar essa integração do que escrever um editorial também de forma conjunta. Eu (Angélica) e eu (Alexsandro), compartilhamos a coordenação do curso de Jornalismo da Unochapecó durante o período de produção da 13ª edição da Revista Experimentus. O motivo? Angélica se tornou mãe da Maria Tereza e Alexsandro assumiu, com carinho, os “filhos” do curso durante sua licença maternidade. Depois de dois anos de pausa nas publicações, a Experimentus, que passa a se chamar EXPE, retoma suas edições com uma nova proposta gráfica e editorial que reflete a reestruturação da matriz curricular do Curso de Jornalismo da Unochapecó. De forma interdisciplinar, busca unir os conhecimentos desenvolvidos pelos estudantes do 6º período nos componentes de Grande Reportagem e Planejamento Gráfico em Jornalismo. A temática desta edição faz link com o futuro, mas sem esquecer das histórias do passado. São reportagens que demonstram a preocupação com o amanhã, com a vida de quem está por vir, na produção de notícias que possam garantir um futuro melhor para a Maria Tereza e para as próximas gerações.

FOTO DA CAPA Isabel Bevilacqua SUPERVISÃO DE TEXTOS Prof. Franscesco Flavio da Silva Componente curricular: Grande Reportagem SUPERVISÃO DE ARTE E DIAGRAMAÇÃO Prof. Alexsandro Stumpf Componente curricular: Planejamento Gráfico em Jornalismo www.unochapeco.edu.br/jornalismo instagram.com/jornalismounochapeco

Prof. Angélica Lüersen e Prof. Alexsandro Stumpf Coordenadora e coordenador pro tempore do Curso de Jornalismo da Unochapecó


SUMÁRIO O Oeste catarinense representado pelo saber colonial Hortas urbanas (Re) significar: a liberdade de uma vida sustentável A voz do campo

A morte delas também é a nossa Juventude: o link da roça com o futuro Responsabilidade social empresarial: além dos produtos e serviços Dona camponesa: a desconstrução e reconstrução do papel da mulher do campo Guardiãs de um legado: a luta das mulheres pela preservação da cultura cabocla Reaproveitamento de carcaças de grande porte

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Foto: Divulgação

O OESTE CATARINENSE REPRESENTADO PELO SABER COLONIAL Escrito por Alana de Bairros e Deise Agnoletto O Oeste catarinense, lugar de gente acolhedora e de bonitas paisagens, já foi território paulista e paranaense, até tornar-se região de Santa Catarina depois da Guerra do Contestado, em 1916. A mesorregião é a maior do estado, composta por 118 municípios e localizada no canto superior do mapa, oposto as ilhas e à capital.

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O local tem sua economia baseada na agropecuária e é conhecido por contemplar os maiores grupos agroindustriais de carnes de aves e suínos do Brasil. De outro lado, a agricultura familiar contribui para dar valor à imagem da região, que não é apenas terra onde se produz alimentos em massa, mas também produtos de qualidade diferenciada. A partir da década de 1990, intensificou-se a produção colonial no local, e os produtos que antes restringiam-se ao consumo familiar, passaram a ter


espaço no mercado regional, mostrando o potencial da agricultura familiar para o desenvolvimento socioeconômico da região. Os produtos coloniais são os alimentos feitos pelos próprios “colonos”, termo que por muito tempo carregou o estigma de “gente de baixa renda e escolaridade”. Era comum ouvir a expressão “seu colono!” usada para ofender alguém. Graças a importantes mudanças no Brasil, desde as leis até o entendimento sobre o campo, a diversidade étnica e cultural começou a ser vista como uma riqueza, e os agricultores passaram a reconhecer e reafirmar sua importância. Em alguns casos, a produção é feita para complementar a renda, mas especialmente para levar sabor e saúde à mesa. O queijo e o salame são os produtos coloniais de maior destaque, mas a diversidade é ampla: chimias, também chamadas de geleias, cana-de-açúcar, torresmo, queijo de porco, codeguim, morcilha, méis, vinhos, cachaça, além da ampla variedade de hortaliças, frutas e verduras em conservas. Os alimentos coloniais carregam, em sua essência, qualidades que atravessam a história. Para alguns, representam os alimentos feitos com carinho. A outros, remetem boas lembranças do interior. Tem aqueles que caracterizam o colonial como saudável, e ainda os que reforçam que é nele que se encontra os sabores e riquezas que vem do campo. Apesar de estar enraizada na tradição do Oeste, a agricultura familiar vive um tempo de evasão, e isso é percebido nas pesquisas do IBGE. Em 1995, os derivados de carne suína eram produzidos em 20.398 estabelecimentos rurais. Os dados apontaram que este percentual reduziu-se para 1.590 em 2006. Referente aos derivados do leite, o índice, que era de 59.741, caiu para 5.838 produtores. Reflexo de saberes ficando para trás e da falta de preservação dos significados e valores sociais que a produção colonial representa.

Os produtos coloniais, em grande parte, são vendidos na informalidade, para familiares, vizinhos e conhecidos. A comercialização formal, feita em mercados, feiras ou diretamente com o consumidor, requer uma série de adequações no processo de produção. A inspeção industrial e sanitária dos alimentos de origem animal, como o queijo, mel, ovos, carnes e seus derivados, compete às secretarias da agricultura, quando o produtor opta pelo comércio apenas dentro do município.

Entre os 601.504 habitantes da região Oeste registrados nos dados do IBGE de 2010, mais de 160 mil moram na zona rural. A Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc) é o órgão que fiscaliza a comercialização entre os municípios e o Serviço de Inspeção Federal (SIF), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, é o responsável por inspecionar os produtos comercializados entre os estados e internacionalmente.

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Duas décadas de sabor e saúde Neri Vaccari, de 56 anos e cabelos levemente grisalhos, nasceu em Águas de Chapecó, onde morou até os 18 anos, quando mudou-se para o Mato Grosso do Sul. Há 25 anos, a decisão de voltar para o Oeste catarinense falou mais alto, e o destino foi Chapecó. Atualmente, mora na linha Simonetto, com sua esposa e um dos filhos. A agricultura já era algo presente nas raízes da família de seu Neri, o que o incentivou a fazer o curso profissionalizante de Técnico Agrícola, onde aprofundou o conhecimento no ramo. Em sua propriedade, a produção está ativa desde 1998 e o investimento inicial foi na área de horticultura. Com o passar do tempo, expandiu para a olericultura e fruticultura. A partir da grande produção, viu a oportunidade de criar uma indústria rural, que estampa seu sobrenome. Passou a produzir compotas de pêssego, pepino e vagem, sucos naturais de laranja e uva, além das geleias de amora, laranja, morango, uva e figo. Pela diversidade de produtos e pela demanda de trabalho, o produtor opta em potencializar a produção de alguns, enquanto outros têm em menor quantidade. “O carro chefe na produção são os sucos”, conta. Seu Neri destaca que a procura e preferência pelos seus produtos coloniais

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Foto: Deise Agnoletto

se dá, principalmente, porque produz de forma orgânica, sem agrotóxicos e conservantes. “Ainda são poucos os produtores que se dedicam nesse campo”, explica. A pureza e naturalidade são os principais diferenciais em seus produtos, coloniais e orgânicos. “O segredo para manter a boa qualidade dos produtos é usar recipientes de vidro, em particular nas conservas e nas geleias”, ressalta. Apesar da rotina intensa, com três pontos de feiras, alguns mercados, além da cooperativa Cooper Familiar, cultivar tomates, amoras, pêssegos, entre outras especiarias da olericultura é o que mais agrada seu Neri. O agricultor, de voz rouca e calmaria na fala, comenta sobre a força que a profissão exige. As mãos calejadas são reflexo da jornada de trabalho, de 15 a 18 horas diárias. A exaustão, exigências, falta de tempo para si e a impossibilidade de folga são apontadas como as principais dificuldades que encontra na atividade. Quando pensa no futuro da atividade, vê queda na produção natural em um futuro não tão distante, porque a agricultura tem ido para o lado do agronegócio. De acordo com ele, “somente grandes produtores e propriedades têm permanecido, e a nova geração não tem interesse nesse campo pois requer mais mão de obra e trabalho duro”. O produtor ainda reforça que o caminho para gerar interesse na população, a fim de que as futuras gerações deem continuidade a essa atividade, é difundir o conhecimento sobre a produção agrícola, em escolas e universidades, para os adolescentes terem contato e entenderem a importância da produção natural. Conforme seu Neri, a maior satisfação de trabalhar com isso é disponibilizar o melhor ao próximo e propiciar a qualidade de vida.

O que eu quero para mim, ofereço ao outro.


Doce companhia Gaúcho, agrônomo e apicultor, Gilson Marcos Bogus, de 48 anos, nasceu em Erechim e passou parte da infância em Três Arroios, no Rio Grande do Sul. Há 41 anos vive em Chapecó, no bairro Industrial, onde mora com sua irmã e seu sobrinho. A paixão pela apicultura veio de família, foi herança de seu pai, e a graduação em Agronomia na Unochapecó potencializou o desejo de trabalhar com isso. Quando aposentou-se, seu pai deu início ao sonho que era de ambos. Depois do falecimento, Gilson deu continuidade ao legado que passou de uma geração para outra. Atualmente, o mel é a principal produção em que se dedica, com média de 3.500kg por temporada, que são duas ao ano. Além disso, também produz própolis, um produto natural que pode auxiliar no combate de vírus, bactérias e fungos. Gilson faz a venda em três lugares diferentes, e quando não está comercializando, está no campo, em seus apiários. A vida gira sempre em torno de sua colmeia e das milhões de abelhas. O apicultor possui 123 caixas, com cerca de 80 a 100 mil operárias cada uma. Para analisar com periodicidade a qualidade do mel, faz parte da Associação de Apicultores e Meliponicultores de Quilombo (AAMQ). O produtor, com a expressão preocupada, atenta para turbulência vivenciada no setor da apicultura. Mesmo com grande mortandade de abelhas nos últimos anos, o valor do mel tem decaído. Em 2019, o mel de Santa Catarina foi eleito pela quinta vez o melhor do mundo, mas esse resultado não tem gerado benefícios e recompensas aos apicultores catarinenses. A alternativa que Gilson adotou para se manter firme e não ser afetado com a desvalorização é a venda direta com o consumidor. O apicultor também ressalta a maior diferenciação entre o mel vendido em mercado e o das feiras: a escolha de floradas. Na região, são duas as floradas predominantes, da uva japão e do eucalipto. Cada florada faz o mel ter sabor, textura e coloração diferentes e na feira, podem ser provados antes da

O preço tem baixado cada vez mais, mas o amor pelo trabalho nunca me deixou pensar em desistir. compra. Além disso, explica que em mercados, normalmente se encontra o mel Blend, que tem diferentes floradas misturadas, para manterem padronização no sabor e na cor. Conforme o apicultor, a comercialização é o maior desafio da atividade. Na profissão, Gilson conta que a técnica tem sido deixada de lado e a forma antiga de apicultura ainda está muito presente, o que não é favorável para os resultados dos apiários. “Para melhor aproveitamento e produção de mel, falta a tecnificação dos companheiros de carreira”, ressalta. Infelizmente, o agrônomo enfatiza a falta de interesse dos jovens em dar seguimento e futuro para a profissão, mesmo com o grande potencial que a região possui. Apesar de todos os percalços e dos criadores de outros animais serem mais valorizados, Gilson afirma, com a simpatia que faz parte de sua personalidade: “sou realizado em trabalhar com as abelhas”.

Foto: Deise Agnoletto

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Três gerações de saber

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local é a criação de perus, mas também há porcos, galinhas e gado de leite e de corte. Para consumo, a família faz questão de escolher os produtos coloniais. “O que é feito em casa é mais bom, porque tu sabe o que tu ponha dentro, sabe que carne que é”, ressalta dona Glória. O porão da casa é espaço onde são feitos os derivados de porco. Para a produção do tradicional salame, quem é experiente no assunto explica: 1kg de sal para cada 35kg de carne, alho e às vezes um pouco de pimenta. Lá, o codeguim também ganha forma, e com a carne da cabeça é feito o queijo de porco. “Vai a cabeça, língua, nariz e orelha. Só tira as vista”, lembra dona Glória. Outro alimento tradicional é o torresmo, feito com a carne e o toucinho. Conforme dona Glória, o segredo é deixar ele bem torradinho, depois prensa e coloca um pouco de sal. Nada se perde ou se desperdiça no processo. A banha do porco é usada para temperar os alimentos no dia a dia e o sebo é destinado para a produção de sabão. Com uma terra farta onde se produz a própria carne, temperos, hortaliças, verduras e frutas, dona Glória destaca o valor que tem o interior e os saberes coloniais.

Foto: Alana de Bairros

Quem ouve um ronco diferente de motor pelas estradas de chão da Linha Roncador, em Coronel Freitas, já sabe: é a dona Glória em seu quadriciclo, indo visitar os vizinhos ou a destino da bodega no centro da comunidade. Aos 78 anos, Glória Zatti Grapiglia conserva o espírito jovem e as raízes italianas. Dona Glória tem orgulho de dizer, que durante toda sua vida, sempre morou no interior. “Aqui é um lugar bom de viver, de noite a gente vai dormir sem escutar barulheira, só os cachorros”, e ainda completa que o agito da cidade não lhe agrada. Natural de terras gaúchas, foi em Constantina onde nasceu, conheceu seu marido, hoje falecido, e teve os três primeiros filhos. Há mais de 54 anos mudaram-se para o interior de um município pequeno e que recentemente havia sido emancipado no Oeste catarinense, Coronel Freitas. Lá, a família cresceu e foram criados os sete filhos: Ivete, Idene, Amauri, Ivania, Adilson, Adailton e André. A produção colonial sempre fez parte da vida de Glória. Desde a infância, aprendeu com os pais a produzir os alimentos que vão à mesa, e conserva esse saber até hoje. Além disso, todos os filhos foram ensinados a fazer e valorizar essa produção. O legado passou de geração para geração e atualmente, o filho Adailton dá continuidade aos saberes e valores aprendidos com os pais. A nora Merediana e os netos Jhonatan e Alana também auxiliam na condução da propriedade de Glória. A atividade principal no

Nunca quis e não quero sair daqui, da minha tranquilidade.


Foto: Alana de Bairros

De volta à tranquilidade Natural de solos paranaenses, Sandra Regina Casanatto Vanzin já rodou bastante pelos interiores e fazendas. Morou em Toledo, no Paraná, Amambaí e Nioaque, no Mato Grosso do Sul, até casar-se e ir para Quilombo, em Santa Catarina, há 20 anos. A produção colonial é um saber que veio de berço, e quando criança já se interessava em aprender.

Sempre vi minha mãe fazer e ela ia ensinando. Hoje, com 41 anos, os produtos coloniais voltaram a ser uma das suas atividades. Mas antes disso, traçou outros rumos, juntamente com seu marido, Roque. Em 2004, mudaram-se para Porto Belo, na região metropolitana catarinense, e experimentaram a vida urbana. No início, trabalharam como empregados por oito meses até conseguirem ter o próprio empreendimento: um restaurante. Depois de 12 anos trabalhando sem horários fixos e finais de semana, a decisão de voltar para Quilombo foi em busca de qualidade de vida e tranquilidade para a família. Além disso, Sandra precisava diminuir o ritmo de trabalho para recuperar-se de um câncer. De volta às terras quilombenses, retornaram com a criação de animais e produção colonial. Hoje, na propriedade Vanzin são criados porcos, galinhas, patos e gado de leite e corte. A rotina de trabalho começa cedo, com o canto das galinhas, e já de manhã Sandra faz o produto colonial que mais gosta: o queijo. “Coloco o leite amornar, adiciono o coalho e deixo descansar por 40 minutos. Depois mexo para dividir a massa do queijo e o soro, e coloco na

forma”. Assim, Sandra faz dois tipos: o queijo apenas com sal ou com orégano. Com o soro que se separa da massa do queijo é feita a puína, chamada também de ricota. “Coloco o soro ferver e quando começa a levantar as bolhas adiciono um copo de água fria com sal”, conta. Para cada quilo de queijo, é preciso 10 litros de leite. Sandra explica que o produto colonial requer mais cuidado na conservação, diferente do que é comercializado segundo as normas da vigilância sanitária, que contém grande quantidade de conservantes. “Geralmente nem as moscas sentam em cima por causa dos industrializados que são colocados no queijo do mercado”, ressalta. A produção é diária, pois além de ser para o consumo da família, também é vendido para vizinhos e conhecidos. “Tem uma dona de laticínio que as vezes vem pegar queijo comigo, pois as pessoas passaram a valorizar mais o colonial”, acrescenta. Os filhos, Daniel, de 17 anos, e Victoria de 6, veem o trabalho duro dos pais todos os dias, mas não têm muito interesse em trabalhar com isso. “Aqui se trabalha muito e ganha pouco, mas esse pouco vale a pena”, destaca Sandra. “Eu acredito que no futuro essa atividade terá mais valor do que hoje, pois as pessoas estão tendo consciência de que quanto mais natural melhor para saúde, então quem ficar nessa área vai ser valorizado”, conclui.

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HORTAS URBANAS Chapecó, a cidade do agronegócio apresenta alternativas para uma alimentação saudável Por Ana Vertuoso e Ícaro Colella

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Com o crescimento populacional e o avanço da industrialização, os seres humanos, ao longo dos anos, começaram a mudar vários hábitos. Uma das primeiras, e mais importantes, trocas se deu na forma de alimentação. A vida cada vez mais corrida e a verticalização das moradias fizeram com que o contato com a terra se perdesse no tempo. São poucas as pessoas que, em meio a grandes centros urbanos, sabem a origem do que consomem e, menos ainda, aquelas que produzem seu próprio alimento.

Foto: Ícaro Colella


Em Santa Catarina não é diferente. O estado, conhecido mundialmente por seu agronegócio, chega a confundir quem vai pesquisar sobre a produção de alimentos. Por um lado, é considerado pelo IBGE como o que mais usa agrotóxicos no Brasil, já que de 70% das propriedades rurais seguem esse estilo. Porém, ele também traz a contrapartida de ser o quarto maior produtor nacional de alimentos agroecológicos, segundo a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri). Florianópolis, por exemplo, foi a primeira cidade do país a banir o uso de agrotóxicos. No entanto, não é apenas a capital que se destaca pelas atitudes agroecológicas. Chapecó, no oeste do Estado, é um bom exemplo. A busca por novas formas de alimentação é uma preocupação para cada vez mais pessoas no município. E, com iniciativas motivadas a conscientizar a população para formas mais saudável de consumo, um tipo específico de produção tem ganhado popularidade em grandes centros. As hortas urbanas, assim como feiras orgânicas, são ideias que dão mais opções a população. Elas são responsáveis por inserir os orgânicos no mercado local, o que possibilita o contato com a produção agroecológica e ressignifica a alimentação, além de ensinar lições de cuidado com o meio ambiente e com a saúde. A grande maioria das hortas espalhadas pelos bairros são pequenas e mantidas no quintal das casas, geral-

mente, para consumo próprio. Porém, outras oferecem opções de consumo para a população.

Hortas em todo lugar Em Chapecó existem algumas iniciativas no mínimo curiosas. Afinal, quem já imaginou uma horta orgânica no telhado de um shopping center? Pois bem, esse projeto existe e já está ativo há um ano. E, ao que tudo indica, têm dado muito certo. A horta instalada em parte da laje superior do Shopping Pátio Chapecó surgiu em 2018, com um projeto da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó), em parceria com a ONG Verde Vida, uma empresa de venda de produtos orgânicos. A ideia nasceu no aniversário de cinco anos do Shopping, e apesar de já ser aplicada em grandes centros, como é o caso de São Paulo, é pioneira em Santa Catarina. Intitulada de “Projeto Pátio Verde”, a iniciativa pretende ir além do shopping, e desafia os grandes empreendedores a aplicarem algum tipo de prática sustentável em seus espaços empresariais. Atualmente, a horta tem espaço de 400 metros quadrados para o plantio e usa os resíduos orgânicos gerados na praça de alimentação para gerar adubo. Segundo o professor de Agronomia da Unochapecó e responsável pelo projeto, Gelso Marchioro, a importância do trabalho é mostrar como é viável cultivar diversos alimentos para fim de consumo em espaços urbanos.

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Foto: Ícaro Colella

Os produtos da horta são consumidos por funcionários do Shopping ou doados á instituições carentes

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“Um deles, é a divulgação de uma ideia muito interessante. Outro, é que essas verduras são colhidas por funcionários das lojas, que normalmente levam para casa e podem consumir os produtos saudáveis. O restante dos produtos são destinados de forma gratuita a instituições carentes, entidades do Programa Mesa Brasil e até mesmo do Sesc”, comenta. Ainda segundo o professor, o apoio da Unochapecó é importante. A Universidade tem o papel de provar que existe viabilidade no cultivo de diversas olerícolas sem o uso de agrotóxicos. No shopping, a horta já iniciou de forma orgânica. Lá, são produzidos alface, temperos, cebolinha, salsa, tuberosas, cebola, cenoura, beterraba, rabanete, couve flor, e outras hortaliças.

Ao ar livre Outro exemplo de horta urbana em Chapecó supera a do Pátio em tamanho e é, sem dúvidas,

bastante peculiar. Localizada na Penitenciária Agrícola da cidade, a maior horta que encontramos dentro da área urbana se estende por 220 mil metros quadrados. Sob responsabilidade de Adelmo Keller, há dois anos, o espaço produz uma grande variedade de grãos, hortaliças, frutas e, até mesmo, flores. A ideia de cultivar alimentos na Penitenciária é antiga, porém nem sempre teve a dimensão atual. Após anos de pouca produção, a horta foi repensada em 2016.

O projeto agrícola foi retomado para que pudéssemos resgatar o nome de Penitenciária Agrícola. Então, recuperamos algumas áreas e já estamos no terceiro ano consecutivo. Dos 22 hectares destinados à área agrícola, uma parte é para a lavoura, uma destina-se a produção de frutas cítricas e outra à hortaliças.

Para cuidar das mudas, o projeto conta principalmente com a participação de um estagiário, contemplado com bolsa de pesquisa da universidade, e do professor Gelso. Alguns voluntários, que normalmente são estudantes de agronomia, também auxiliam na manutenção e irrigação da horta. O espaço ainda recebe diversos visitantes, entre escolas e outras instituições, que pretendem trabalhar e implantar uma horta orgânica, ao montar projeto similares. No shopping é possível apontar que, desde o início do projeto, já é possível ver resultados. “Conseguimos uma redução nos materiais produzidos pelo shopping a partir da conscientização e destino correto do lixo orgânico”, declara Gerso. Além de mostrar para empresas e sociedade em geral que é possível colocar o lixo no lugar certo, de volta a sua origem, com a reciclagem, este trabalho tem outros grandes pontos positivos.


porque, geralmente, quando se fala no trabalho dos presos, todos imaginam um espaço fechado, em indústrias. Então, o trabalho da horta tem refletido positivamente e nós percebemos isso com os comentários das visitas que recebemos a nível de Brasil”. Uma dessas visitas marcantes, aconteceu em junho deste ano, quando o Governador do Estado, Carlos Moisés (PSL), e o Ministro da Justiça, Sérgio Moro, estiveram no complexo. Durante a ocasião, Moisés assinou um convênio com a prefeitura de Chapecó para a aquisição de alimentos. Com isso, até 10% do que é consumido na rede de assistência social e em programas de segurança alimentar do município são produzidos na Penitenciária. “Essa foi uma ideia que surgiu em função da oferta de saladas e

hortaliças que temos, e, também, em função da dificuldade que enfrentamos para comercializar esses produtos. Então, desenvolvemos esse projeto porque 30% dos alimentos consumidos na rede de educação têm que ser oriundos da agricultura familiar, e apesar desse não ser o caso, os produtos também não pertencem a nenhuma agroindústria grande”, explica Adelmo. Atualmente, a horta atende supermercados, o banco de alimentos e os dois restaurantes populares do município, além das cozinhas do Complexo penitenciário e do Centro de Atendimento Socioeducativo Provisório (Casep). Assim, ao mesmo tempo em que produz alimentos de qualidade, a Penitenciária desenvolve um trabalho social junto à comunidade. Acervo Penitenciária

O Gerente de Atividades Laborais da Penitenciária conta ainda que a produção é orgânica. Para isso, a adubação é realizada com cama de aviário, comprada por meio de licitações. E, quando existe a necessidade de suplementação de nutrientes, o processo é feito por meio de fertirrigação, uma técnica e irrigação por gotejamento. Além disso, o controle de pragas utiliza somente métodos naturais. “Nós compramos produtos a base do óleo de neem, ou fazemos um composto natural com álcool, detergente neutro, fumo e água, que atua como controle natural de insetos. Então, posso afirmar sem medo que nossa horta tem alguns dos melhores produtos disponíveis no mercado de Chapecó”, salienta. Em tempos de crise ambiental, técnicas menos prejudiciais ao meio ambiente são fundamentais. Porém, mais importante do que isso, é o papel social da horta. Diariamente, a partir das 6h da manhã, 14 detentos tomam seus cafés da manhã e seguem para os respectivos postos. São eles os responsáveis por realizar o plantio e a colheita dos alimentos em uma iniciativa que trouxe destaque nacional para a Penitenciária. O ambiente de trabalho diferenciado proporciona mais momentos ao ar livre, algo raro no modelo prisional utilizado no Brasil, e, também, auxilia na reinserção dos presos em regime semiaberto. “Quem conhece o espaço fica impressionado com o que fazemos

Ao todo, são 22 hectares destinados à produção de alimentos orgânicos

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Planos para o futuro

As hortas ensinam as pessoas sobre a importância do contato com a terra, a alimentação saudável e o cuidado com o consumo. E, não existe fase melhor na vida para que esse ensinamentos sejam repassados, do que o período escolar. Pode parecer clichê, mas é verdade que as crianças são o futuro e, por isso, precisam de direcionamentos para que criem, desde pequenas, os hábito que irão acompanhar as próximas gerações. Na Escola Municipal Ensino Fundamental Tancredo Neves, localizada no bairro Efapi, já existe um projeto que visa justamente isso. A criação de uma horta orgânica está com o planejamento concluído, e deverá ser implementada no mês de janeiro, de 2020. No entanto, esta não é a primeira iniciativa agroecológica da escola. Eles já possuem um horto, com plantas nativas e medicinais, cultivadas e mantidas pelos professores. As plantas são usadas nas aulas de Ciências da Natureza, onde são passados para os alunos ensinamentos sobre plantas medicinais e como utilizá-las em benefício da saúde. O horto foi pensado com diversas finalidades. A primeira, para gerar envolvimento com a comunidade, resgatar conhecimentos populares e fazer o intercâmbio entre o conhecimento científico e o conhecimento popular. “Os estudantes

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do ensino fundamental e professores estão envolvidos por meio de projetos, e a escola trabalha com a metodologia de projetos. O horto serve como um espaço vivo permanente de aprendizagem, que também é aberto a comunidade”, comenta o professor de física do ensino fundamental e responsável pelo projeto, Itacir Carlos. Além da função educativa, o horto serve para a preservação de plantas, criação de mudas e produção de chás. Segundo o professor, o horto possui um potencial de disseminação muito grande. “O horto serve para

inúmeras atividades. Ele tem ganhado importância e se ampliado cada vez mais, ao passo em que as pessoas o conhecem. Isso não é graças somente a escola, mas também a toda sociedade. Além de ser subsídio para pesquisa, principalmente, para as disciplinas de Ciências, ele tem servido, permanentemente, para a coleta de chás para pessoas da escola e comunidade como um todo”, relata. Depois da experiência positiva que tiveram com o horto, os professores decidiram expandir o experimento. Como a escola possui uma grande área disponí-


Foto: Ícaro Colella

Devido a grande área disponível nos fundos da escola, a comunidade e os professores irão construir, em janeiro, uma horta para ser usada como campo de estudo nas aulas vel, que irá comportar a horta no próximo ano. A comunidade e os professores, principalmente os de Química, viram naquele local uma opção não somente para a produção de hortaliças e verduras, mas também para a criação de um espaço permanente de estudo. A partir do ano que vem, o ensino de processos naturais, físicos, químicos e biológicos das plantas poderá ser feito de forma mais imersiva. A horta será usada como instrumento para as aulas práticas nas disciplinas e os produtos cultivados poderão ser utilizados em outros projetos da escola. A participação da comu-

nidade, assim como já é feito no horto, também irá contribuir no crescimento do conhecimento social dentro e fora da Instituição. Deste modo, assim como acontece no Shopping e na Penitenciária, essa horta não terá apenas uma única função. Além de prover alimentos, ela também terá papel importante na conscientização das futuras geração. As crianças irão aprender, logo cedo, a importância de cuidar da terra e, principalmente, conhecer a origem do próprio alimento. E, essa consciência é talvez o maior benefício desse tipo de iniciativa.

Quem tem acesso a uma horta urbana, tem a possibilidade de se conectar com a terra, a natureza e consigo mesmo. Independente de morar a dezenas de metros do chão e passar grande parte do dia rodeado de carros, qualquer um pode dedicar um pequeno espaço em casa para o cultivo do próprio alimento. É claro que a ideia de plantar todo o necessário para sobreviver não passa de uma ilusão distante para grande parte dos que moram em cidade, mas uma pequena horta urbana em meio ao concreto já é um ótimo começo.

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(RE) significar A liberdade de uma vida sustentável

Escrito por Isabel Piccoli e Paula Luiza Eloy

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Foto: Plantamor

Em algum momento você já ouviu ou leu essas cinco palavras: reduzir, reutilizar, reciclar, recusar e repensar. São os 5 Rs da sustentabilidade. Mas, incluir o termo ressignificar, faz todo o sentido, afinal, não são as grandes atitudes que movem o mundo, e sim, as pequenas transformações no dia a dia que favorecem a geração atual, as futuras gerações e um imenso ecossistema. Chega ser inacreditável, que no Brasil, são produzidos mais de 11 milhões de toneladas de lixo plástico por ano, mais de dois milhões de resíduos são descartados irregularmente, números que colocam o Brasil em 4º no ranking de país que mais gera resíduos no mundo, segundo relatório do WWF (Fundo Mundial para a Natureza). Mudar hábitos simples, da rotina, substituir os produtos por os com menor impacto ambiental, levar um copo junto para os lugares, ou até uma ecobag para colocar as compras, sem pressão, adaptando, dia após dias, porque ressignificar é ter liberdade de fazer as melhores escolhas para o próximo e para você mesmo. E sim, é possível!


“A NATUREZA PODE EXISTIR DENTRO DE VOCÊ!” Ressignificar as plantas e buscar a reconexão com a natureza é o propósito do projeto familiar Plantamor. Unindo a energia humana com a energia da mãe natureza, Adriana Carolina, ou melhor, a Carol, juntamente com seu companheiro Juliano, também conhecido como Ju, e sua mãe, dona Lucia, transformam uma miscelânia de plantas, com a próprias mãos, em produtos fitoterápicos. A Plantamor é jovem, tem apenas dois anos, mas já tem plantado transformação na vida de quem quer mudar os hábitos, para os mais sustentáveis. Desde 2017, quando a Carol estava concluindo a graduação de Farmácia, veio o momento de incertezas, e de uma certeza: que não iria trabalhar nas farmácias comerciais. Foi neste momento que o que era descanso nos finais de semana, se tornou um trabalho muito prazeroso, por sinal. Em uma terra infértil, do município de Ouro/SC, a família de Carol, há quase duas décadas, conseguiu recuperá-la e criar uma espécie de agrofloresta. Aos poucos, as plantas cultivadas que já viravam chás e cosméticos para consumo próprio, se tornaram um projeto comercial, que envolve, especialmente, aromas, sentidos e muito amor. A ideia da Plantamor é iniciar e fechar o ciclo de produção, em que se consiga plantar, colher, produzir e vender. Mas afinal, como produzir em busca de uma vida mais sustentável? “A nossa produção é agroecológica, primeiro, porque a gente não usa agrotóxico, e por repor a natureza que estava perdida antes nesta terra. Nós conseguimos, além de causar o que falam de menor impacto ambiental, nós colocamos um impacto positivo, pois re-plantamos árvores nativas, deixando como se fosse uma floresta. Além disso, tudo que é orgânico dentro do laboratório, volta em forma de compostagem para terra”, explica Carol. Sim, naquele espaço de cultivo das plantas, há também um laboratório, onde depois de colhidas, são retirados os extratos, que servem como matéria-prima central para o desenvolvimento dos produtos. Agora, o que a Carol e o Ju não conseguem produzir, eles compram de terceiros, com certificação e transparência, sempre adquirindo com cuidado, prezando a sustentabilidade. A produção inicia em Ouro e vai parar nas lojas de Chapecó/SC.

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Mas, muito além de desenvolver cosméticos naturais, o principal objetivo é alinhar a energia da natureza, e usufruir as propriedades fitoterápicas das plantas. “Nosso foco é muito na fitoterapia, o uso das plantas medicinais para tratamento e cura do corpo. Os cosméticos, shampoos, condicionadores, sprays, os chás, eles entram como um braço dessa fitoterapia”, conta a farmacêutica. Além disso, toda a parte visual da Plantamor é criada pelo Ju, que trabalhou durante muito tempo com tecnologia da informação. A maioria das embalagens contém imagens únicas, feitas por artistas locais. E os produtos são geralmente embaladas em papel, que demora poucos meses para se decompor. Tudo é pensado com amor, cuidando do meio ambiente e das pessoas. Afinal, a natureza pode existir dentro de você e

Foto: arquivo pessoal

mudar sua rotina, é uma questão de ressignificar. “Nós facilitamos o uso das plantas, por não pensar que precisamos fazer grandes transformações É questão de troca e adaptações. Por exemplo, quan-

do a sua escova de dente estiver velha, pode começar a usar uma de bambu, e já vai ser uma grande mudança, porque essa não ficará por anos na natureza. Sem pressão de ser completamente correto”, finaliza o casal.

“SE EU ME AMO, VOU CUIDAR DESSE INSTRUMENTO MATERIAL QUE É O MEU CORPO” As crianças providas de inocência se estimuladas passam a observar causas globais, foi assim com Daiane Caroline. Desde muito cedo, a influência da escola e dos pais, permitiram com que a pequena compreendesse o que era educação ambiental. Assim, não houve necessariamente uma mudança de hábitos, mas escolhas conscientes, ainda

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adolescente, que visavam o meio ambiente. Aos 12 anos, Daiane decidiu substituiu a carne pela vasta quantidade de grãos, legumes, sementes e frutas. Ela foi se autoconhecendo e se amando a ponto de conhecer os seus limites, e jamais escolher o extremo, contudo, decidiu estudar por conta própria para saber aquilo que de

fato passava a se tornar sua verdadeira rotina. Sair do bombardeio de informações produzidos pela mídia, foi a alternativa para que Daiane abraçasse ainda mais a causa que luta até hoje, a natureza. O processo inicia aos 15 anos, hoje, a estudante tem 20. O segundo passo se deu com planejamento e organização, com base em ma-


neiras mais ecológicas de levar a vida. “Para mudar é preciso fazer um esforço muito grande e se virar com as própria pernas, então eu peguei na minha mão, e falei ‘agora eu sou responsável por mim mesma, e ninguém mais vai mandar em você e obrigar a fazer as coisas’’, conta a estudante de artes visuais. Os hábitos sustentáveis dizem muito sobre quebrar os estereótipos de beleza e de limpeza, e de fato ressignificam a natureza que existe no corpo de cada ser humano, afinal, para Daiane, cada um é natureza, por estar cercado de todos os elementos, e ser formado pelas mesmas moléculas e partículas que os raios do sol. “Uma tecla que eu bato muito é o amor próprio, porque tudo é amor próprio, se eu me amo, eu vou cuidar desse meu instrumento material, que é o meu corpo”, ressalta. Daiane não compra mais roupas, nem em brechós, acredita ter peças básicas e suficientes. Além disso, em um momento, ela começou a usar sabonetes e shampoo, veganos a base de plantas, os do projeto familiar Plantamor. No entanto, a viralização de uma vida mais saudável, fizeram os preços subir, e ela partiu para outras alternativas. Saiu da zona de conforto e passou a estudar a essências das plantas. “Eu comecei a fazer meu shampoo, não tenho os materiais que usam em shampoos, então eu lavo só com chás, eu faço em casa e guardo em uma garrafa de vidro, que dura uma semana. Eu passei por um processo de um ano só usando shampoo veganos comprados em barra, até que meu couro cabeludo se acostumar com a sujeira natural, porque sujeira não é uma coisa ruim, muito pelo contrário a oleosidade é um hidratante muito potente, quando então eu comecei a aplicar os chás. Além disso, eu também não uso sabonetes”, explica. Outras mudanças incluem trocar os absorventes comuns, pelos de pano, substituir carros e lotações pela bicicleta, e preferir alimentos produzidos pelas próprias mãos, que carregam consigo o amor e a energia de quem faz a comida. Mesmo que todas as práticas de Daiane pareçam distantes, isso se trata de um processo, que requereu estudos e tempo, por isso para ela cada um

tem seu momento. A alimentação é a primeira forma de amor que conhecemos. É através dela que laços de afeto se constroem entre dois seres, mãe e filho. Quando so-

“Eu acredito que para

alguém fazer a mudança na rotina dela tem que ser uma vontade que venha dela, e não de outra pessoa. Eu não fico falando para os outros, que eles tem que mudar. Eu faço a minha parte, e quando a pessoa sentir que precisa mudar, ela irá mudar”

“ÓRION, SEMPRE FOI MINHA CONSTELAÇÃO FAVORITA DE OLHARDE OLHAR NO CÉU ABERTO” mos bebês, o leite materno é o que precisamos para sobreviver, portanto, à grosso modo, entendemos num nível inconsciente que, se nossas mães nos alimentam, é porque elas querem que vivamos. Assim, nos sentimos amados, aceitos, bem-vindos. Mas, a alimentação precisa ser feita com amor. E como não falar do amor entre uma mãe, com o nome da maior flor aquática do mundo, e uma criança que carrega o nome do filho da deusa da terra, segundo a lenda. De superstição, somente o nome. Nossos personagens realmente existem, sejam eles uma flor ou um Deus grego, ambos cumprem de forma correta seu papel na terra.

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Vitória Régia Gaté é mãe de Órion. Ela e seu companheiro sempre estiveram envolvidos com causas sustentáveis, preocupados com uma alimentação saudável e com o consumismo desmedido. Desde os 14 anos, Vitória começou a enxergar o mundo e o meio ambiente com um olhar mais defensor e protetor. Ou seja, um olhar de mãe! Desde então, passou a estimular o lado consciente, mudou os hábitos alimentares, e passou a fazer a própria comida, com ingredientes cultivados por ela. Estudou e aprendeu a desenvolver o que necessita, para a higiene pessoal, bem como chás e sucos naturais com efeito medicinal. Vitória Régia abriu mão de roupas caras e da moda. Começou a frequentar brechós, doar e receber doações de roupas e calçados. “Minha intenção foi ir mudando gradativamente os hábitos diários até me tornar uma pessoa quase que 100% sustentável em tudo o que envolva a minha saúde, e a saúde do meio ambiente”, conta. Aos 21 anos, a flor se tornou mãe e precisou adaptar a rotina. Se tornou uma mamãe sustentável. Com o nascimento do pequeno Órion, Vitória destinou mais tempo para seu dia a dia, começou a pensar por dois e sentir a responsabilidade em cuidar de outro ser. Mas, nada disso foi sacrifício. “Na alimentação eu me aprofundei ainda mais, procurei alimentos que substituíssem as proteínas da carne e os derivados de origem animal, mas que ao mesmo tempo garantisse o desenvolvimento saudável do meu filho”, explica Vitória.

Mas como nem tudo são flores, Vitória teve alguns impasses ao sair da sua zona de conforto. Sabe o que é mais curioso? O maior desafio não seria criar um filho, conforme o seu padrão de vida, e sim deixar de seguir o padrão de vida imposto pelas pessoas. “Quando eu decidi mudar meus hábitos, algumas pessoas me questionaram, mas aceitaram numa boa. Já quando o Órion nasceu, eu sofri certo preconceito, principalmente pela minha família, eles não aceitavam que eu usasse pano, ao invés de fralda, que eu o vestisse com roupas usadas, que eu não quis dar a chupeta e que os brinquedos dele eram feitos por mim, com elementos da natureza”, ressalta a mais nova mamãe.

“Para o futuro, eu sei que meu filho vai ter contato com vidas não sustentáveis e ele será livre para escolher o que melhor lhe convém. A minha forma de demonstrar amor é fazê-lo entender desde cedo que precisamos cuidar do próximo, do meio ambiente e das gerações futuras.”

“QUAL O SENTIDO DISSO, CELEBRAR O AMOR SEM DEMONSTRAR O AMOR PELO OUTRO?” Ah, o amor conjugal! Dizem que o homem quando ama, realiza-se plenamente como pessoa. Então, juntar os laços e casar-se é uma das etapas da vida. Porém, já era a época em que as únicas preocupações dos noivos, em relação ao casamento eram a música, as comidas, as bebidas e a decoração. Em tempos onde muito se fala em sustentabilidade,

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poucos casais buscam alternativas ecologicamente corretas para celebrar o grande dia de suas vidas. Agora, Vanusa e seu companheiro, Jankiel, revolucionaram. Vanusa Maggioni Cella, trabalhou por nove anos com o gerenciamento de resíduos, e hoje é coordenadora do Programa Lixo Zero de Chapecó. O olhar


O Programa Lixo Zero é parte do Instituto Lixo Zero Brasil e tem como objetivo o máximo aproveitamento e o correto encaminhamento dos resíduos recicláveis e orgânico, e a redução, ou mesmo o fim, do encaminhamento deste materiais para os aterros sanitários.

Prêmio do Instituto Lixo Zero Brasil / Foto: arquivo pessoal

sustentável, o desejo de cuidar do próximo e também do ecossistema sempre estiveram presentes na rotina, nas escolhas e nas atitudes. O sonho em se casar já era antigo, mas a partir de sua essência superou as expectativas e promoveu um dos eventos mais significativos para o meio ambiente em escala nacional. O próprio casamento foi 100% sustentável e 100% lixo zero. “A minha intenção foi a melhor de todas, uma festa de amor! Não adiantava dar uma festa linda, e no outro dia ter gerado um problema para o meio ambiente e para as pessoas que nem no casamento estavam. Quando decidimos fazer uma festa, assim como quando reformamos uma casa, precisamos prever no orçamento a destinação dos nossos resíduos. É inevitável produzi-lo, então porque não pensarmos nele com o mesmo amor e cuidado que pensamos na festa?”, destaca Vanusa. Falar é fácil, mas a noiva foi lá e tornou realidade! Apesar de parecer distante da habitual, a Vanusa teve o apoio dos fornecedores, que inclusive não prestavam serviços Lixo Zero, porém, que se adap-

taram ao modelo de casamento proposto, através de muito diálogo, pesquisas e principalmente disposição. Afinal, não havia outra opção, a não ser aquilo que era sustentável. E o resultado? Somente 6% do lixo produzido, que corresponde ao do banheiro, foi para aterro sanitário. O restante, desde jardinagem até decoração foram para a compostagem. Da ação o reconhecimento. Vanusa não só realizou o seu casamento 100% sustentável, como também realizou o primeiro casamento Lixo Zero do Brasil. “Eu nem imaginei que ganharia este título, foi uma surpresa linda, eu apenas me dediquei a fazer o bem. A certificação foi um presente que recebi do Rodrigo Sabatini, presidente do Instituto Lixo Zero Brasil, no dia do meu casamento mesmo. Eu tenho muito orgulho dele!”, relembra. Vanusa acredita que pensar em sustentabilidade é olhar economicamente, socialmente e ambientalmente, ou seja, olhar para si mesmo, afinal, “não há maneira melhor de demonstrar amor à alguém, do que cuidar de tudo que as pessoas precisam para viver: o ar, a água e o solo”, finaliza.

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Foto: Divulgação

A VOZ DO CAMPO Produção do autoconsumo na agricultura familiar e suas importâncias Escrito por Jhonatan Beneti e Jaqueline Biavatti

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A vida no campo para alguns é uma questão escolha pela qualidade proporcionada, um ambiente para sossego, descanso e um lugar para apreciar. Já para quem cresceu nesse ambiente é uma questão tradição, herança que carregam a muitas década,s assim construindo suas famílias e fazendo deste ambiente o seu ganha pão, o sustento para quem ali reside com seus familiares.


Mas essa cultura de poder produzir, colher e vender grãos, produção de leite ou em outro segmento, tem se tornado um desafio de se manter e vem declinando com passar dos anos a quem praticamente dedicou uma vida praticamente no campo. Além de necessitar da mão de obra própria ou terceirizada qualificada, muitos necessitam de implementos. Com isso, números altos de despesas assustam, o tempo e a mão de obra escassa é outro fator que tem deixado muito agricultor pensativo, tendo que optar por outros caminhos em alguns casos As famílias que perduram no campo demandam mão de obra qualificada, e isso é outro agravante que tem afastado muitos de suas terras. As que detêm um poder aquisitivo maior acabam adquirindo implementos agrícolas para dar sequência nas safras. Já as com poder aquisitivo menor, ficam refém por ter essa dificuldade de investimentos e acabam alugando ou vendendo para grandes produtores, por não ter poder de investimentos igualitário. Além de ser valores altos de investimentos, outro fator que também preocupa é o clima. O agricultor ou melhor, quem vive do campo fica engessado às condições climáticas, sendo assim, em tempo se torna vilão e em horas e por tempo “amigo”. Dessa forma, fica a incerteza e com isso o medo do endividamento. Tendo como ponto de partida o custo para a sobrevivência no campo, onde o planejado foge do controle por vários fatores, uma opção que vem dando certa tranquilidade para o agricultor é a produção do seu próprio alimento. Isso desde sempre tem sido uma válvula de escape no corte de gastos e importante meio tanto para uma melhor qualidade de vida se tornado um divisor positivo na agricultura. Uma pesquisa realizada pela Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural a (Epagri), trás números importantíssimos quanto a auto produção no campo. Entre os principais itens, alguns citados foram: hortaliças, queijos, carnes e frutas, entre outros. Isso representa uma economia de R$ 1.351,99 por mês, de acordo com a pesquisa. Para obter estes dados, foram visitados 112 municípios do Oeste e Meio-Oeste Catarinense e entrevistadas 381 famílias. Nas propriedades que foram visitadas mais de 90% delas têm menos de 50 hectares, dados que comprovam a importância na produção do autoconsumo, assim diminuindo as despesas no momento em que o mercado está instável.

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Foto: Divulgação

As principais rendas identificadas são a aposentadoria, que representa um percentual de 54%, e a bovinocultura de leite 55%, de renda nas propriedades. Isso são números que comprovam a importância da produção para o autoconsumo nas propriedades rurais. As carnes bovina, suína e de aves, estão presentes e registram percentual entre 80% e 90%. Aproveitando e comparando, o queijo e o salame ultrapassam de 50% das propriedades que produzem e o pão 92%. Outras especialidades que o campo tem como ponto forte são as hortaliças, árvores frutíferas, ovos e o feijão, que também fazem parte deste portfólio determinante para estes números apresentados. E para entender esses números que a Epagri apresentou em Julho passado, fomos a campo para entender como é destinado esse tempo para a produção. Na comunidade de Linha Scussiato, interior de Chapecó, na propriedade da família Grotto. São aproximadamente uma colônia de terra destinada ao ramo leiteiro e plantação de produtos para o autoconsumo. A propriedade conta com a colaboração de seis pessoas nas rotinas diárias, são elas: Romildo Grotto, Adelires Grotto, Rodrigo Grotto, Indianara L. P. Grotto e

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Rosiana Grotto que além de estudar na cidade, no finais de semana ajuda a família nas tarefas. Além da pequena Yasmin Grotto, filha do casal Indianara e Rodrigo. Rodrigo Grotto e filho mais velho, destaca que além do leite a produção de outros produtos é determinante para manter a família longe do endividamento. A plantação de hortaliças, a engorda de animais e outros itens são divididos entre os familiares. “Dividimos assim, enquanto uns cuidam dos piquetes, movimentam os animais e tiram leite, outros focam nos alimentos que produzimos para o nosso consumo. Plantam, colhem enfim. É claro que a tarefa pesada eu e o pai fizemos, mas no mais, todos pegam juntos”, afirma. Grotto ainda destaca que a família para o ano todo os mais variados produtos. “Produzimos mais de 90% dos alimentos que consumimos durante o ano. Além de produzir, o que a gente entende que vai sobrar ou estragar, trocamos com os vizinhos por outros produtos. Para conter gastos se planta o que nos possibilita. Cultivamos pipoca, amendoim, feijão, vários tipos de salada, tem galinha, ovos, porco, gado, cebola, tomate, batata, são poucos produtos que compramos.


Na ponta do lápis

Economia na cidade

Os cálculos são determinantes para esse equilíbrio no campo, como destaca a pesquisa. De certa forma esse contraste faz a diferença quando a safra acaba. Para Rodrigo, essa instabilidade que obriga o colono a buscar outras saídas, e essa tem sido uma boa com o custo praticamente zero e isso tem sido uma válvula de escape. A família Grotto tem um controle de gastos mensais que passam de R$ 3,5 mil mensais envolvendo as duas famílias e destaca. “O que produzimos além de nos dar um fôlego e esse valor nos aplicamos em novas tecnologias para melhorar nosso processo de qualidade”. O secretário da agricultura do município de Chapecó, Valdir Crestani, destaca que o governo municipal busca atender as necessidades do produtor rural. “Estamos sempre em contato com o agricultor, com as famílias rurais buscando as ações e tentando estar próximos nas ações. Buscamos auxiliar quando possível e buscar novos investimentos para nossa região. Nossa região tem potencial e os números retratam a força do campo em nossa região”. Crestani destaca que a economia gira bem se a agricultura está bem, por isso desta aproximação do município com o campo. Ainda pontuando este setor que tem seus altos e baixos, dados do IBGE apontam que nos próximos anos, a região oeste tende a viver um dos seus melhores momentos. Em 2019 o setor leiteiro teve um aumento de 6,6% na produção de Leite e no próximo os índices indicam evolução considerável.

Pensando nisso, Outra pesquisa realizada pela Epagri em parceria com a UFSC e apresentada no seminário é “Governança alimentar e práticas das famílias agrícolas: uma abordagem pelos fluxos de provisão de alimentos e a multilocalização familiar”. Com objetivo de identificar a quantidade de alimentos que as famílias rurais transfere para familiares na área urbana, 49 famílias foram entrevistada na região de Chapecó para saber destes dados. São casos de filhos de agricultores que saem do interior para trabalhar ou estudar na cidade e com isso para não super elevarem seus gastos longe de casa, tem o auxílio de suas famílias do campo. Estes números e valores chegam a R$350,00 mensais. Para Sr. Romildo, está conta de custos com alimentação ultrapassa a casa dos R$500,00 com sua filha que reside na cidade para estudar. “Quando ela vem pra casa nos ajudar a gente manda literalmente um rancho pra ela se manter. Isso nos ajuda a não ter altos custos, pois na cidade tudo é muito caro”, finaliza. Isso mostra a força que vem do interior e também e o quanto somos dependentes desse fortalecimento do campo. Mas o que preocupa e chama a atenção é o volume que o agricultor produzia para os grandes centros. Esse número vem ano a ano decaindo. Altos valores dos insumos, mão de obra praticamente zerada, poucos incentivos dos governos tem desestruturado o campo e se torna um agravante. Já para o “pequeno agricultor”, o fator de poder produzir para si mesmo vem surtindo efeito. Custos menores são importantes no espelho econômico que o país está passando. No mercado onde oscila e que é preciso de ajustes, o agricultor está um passo à frente. É a voz do campo falando alto novamente.

˜O que produzimos além de nos dar um fôlego e esse valor nos aplicamos em novas tecnologias para melhorar nosso processo de qualidade”. Edição 13 . 2019/2

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A MORTE DELAS TAMBÉM É A NOSSA

Foto: Valeria Cenci

Sem a polinização feita pelas abelhas, a produção agrícola poderia ser reduzida em 30% a 40% Escrito por Laura Fiori e Valeria Cenci Você conhece a importância das abelhas para a vida humana? Esses pequenos insetos, em sua busca por alimentação, viabilizam a fertilização de plantas ao visitarem jardins e plantações. O papel das abelhas como polinizadoras é de extrema importância principalmente na agricultura, já que, de acordo com um estudo realizado na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), as abelhas são responsáveis pela fertilização de 33% da produção agrícola mundial.

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Mas, o que se vê atualmente são dados alarmantes que apontam um declínio no número de abelhas no mundo. Dentre os motivos para esta baixa está o uso de agrotóxicos em plantações. De acordo com o engenheiro agrônomo e extensionista rural da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) de Formosa do Sul/SC, Vilmar Franzen, quando se trata dos agrotóxicos que podem afetar abelhas, é necessário primeiramente distinguir as três categorias desses produtos que são utilizadas na agricultura. São elas herbicidas, fungicidas e inseticidas. Segundo ele, são poucos os herbicidas que afetam as abelhas de forma expressiva, sendo rara a morte quando o produto é usado de forma correta. No caso dos fungicidas, eles podem afetar a abelha diretamente, matando-a, ou indiretamente, quando interferem na sobrevivência dos microorganismos na colmeia. Segundo Franzen, quando se trata dos inseticidas, a situação é mais crítica. De acordo com ele, teoricamente os inseticidas de base química podem matar abelhas. Os produtos que se destacam dentro deste grupo são os neonicotinoides, como fipronil, imidaclopride e tiametoxam. Franzen destaca que estes princípios ativos estão presentes na grande maioria dos inseticidas utilizados atualmente na agricultura, sendo colocados tanto nas sementes quanto na pulverização de cultivos. De acordo com Franzen, o inseticida não é o problema em si, mas a forma como ele é utilizado. “Tem que se entender o comportamento da abelha. A abelha não vai passear na lavoura. Ela vai aonde tem flor

que ela possa coletar néctar. Apenas isso, essa é a atividade dela e com isso ela realiza a polinização das plantas. Então onde está o problema? Quando é aplicado inseticida sobre plantas em floração. É importante ressaltar que não existe base legal para se recomendar a aplicação de inseticidas nessa fase do cultivo, de nenhum cultivo. Então quando é feito, foi orientado de forma irregular ou foi aplicado pelo produtor de forma irregular. Não se pode fazer isso” ressalta. Segundo o engenheiro agrônomo da Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) de Rondinha/RS, Leandro Soares, os casos de mortalidade de abelhas nas áreas em que atua - Carazinho, Ronda Alta e Rondinha, no Rio Grande do Sul - não tem como motivo a intoxicação por agrotóxicos. “Chegamos a conclusão de que nenhum desses casos que teve mortalidade foi devido ao uso de agrotóxicos, nem de forma errada do uso do agrotóxico pelo agricultor ou apicultor. [...] Aqui na região,

De acordo com o site RFI, o inseticida fipronil é utilizado na agricultura para o controle de pragas que atacam o milho, o girassol e as maçãs verdes. Ele age nas células nervosas dos insetos, que morrem de hiperexcitação.

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todos os casos que nós fomos visitar, que nós atendemos de mortalidade de abelhas, foi por erro de manejo ou por causas até desconhecidas”, aponta. Segundo uma reportagem publicada na revista Época, testes realizados com recursos do Ministério Público estadual apontam a morte de 50 milhões de abelhas derivadas de agrotóxicos em janeiro de 2019 no estado de Santa Catarina. Segundo a reportagem, o fipronil é a principal causa dessas mortes.

Vida em desequilíbrio “Imagine: você tem uma fábrica onde há uma linha de produção que segue um fluxo, onde entra a matéria prima e sai o produto acabado. Agora, você vai ter cerca de 20% dos empregados que vão trabalhar contra o fluxo, que vão derrubar produto no chão, que vão começar a discutir lá dentro e fazer uma confusão. Ainda com os outros 80% dos funcionários que vão trabalhar normalmente, não vai haver mais a mesma produtividade, o mesmo resultado”. Esta é a realidade de uma colmeia de abelhas após a intoxicação devido ao contato com agrotóxicos. A analogia é citada pelo engenheiro agrônomo e extensionista rural da Epagri de Formosa do Sul/SC, Vilmar Franzen. Ele conta que situações como essa acontecem pois os agrotóxicos atuam nos neurotransmissores cerebrais das abelhas, o que

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afeta toda a colmeia, assim como as abelhas que vão ao campo, já que elas não acham o caminho de volta. Porém, neste caso, a intoxicação por agrotóxico seria crônica. Em situações em que a intoxicação é aguda, a colmeia colapsa, ou seja, morre. Mas, de acordo com o engenheiro agrônomo da Emater de Rondinha/RS, Leandro Soares, não há mudança no comportamento das abelhas no contato com agrotóxicos. “No comportamento em si não tem influência nenhuma, a abelha continua sendo abelha e fazendo o serviço dela com ou sem agrotóxico”, afirma. Ainda de acordo com Soares, a produção só seria prejudicada caso haja a utilização de forma errônea do agrotóxico por parte do apicultor. “Pode causar a mortalidade e reduzir o número de enxames dos apicultores e, obviamente, a produção de mel também acaba caindo. Pode também acontecer de ter uma contaminação pequena do enxame e ele baixar a produção, não chega a morrer o enxame, mas ter uma baixa na produção”, aponta. Os impactos referentes a morte de abelhas podem ser diversos, mas nem sempre calculados. De acordo com o engenheiro agrônomo da Epagri de Formosa do Sul/SC, Vilmar Franzen, é difícil mensurar a perda de espécies na região em que atua. Mas, em locais onde ocorre a aplicação de agrotóxicos aérea e o produto é aplicado na lavoura e em parte das matas adjacentes, é possível identificar a morte das “abelhas de mel”, cujo nome é aphis mellifera, pois elas possuem um dono. Porém, a morte de espécies de abelhas como também de outros tipos de insetos que vivem nas matas, não pode ser contabilizada. “Outros insetos e outras abelhas que estão nas matas, simplesmente não se sabe onde estão e como estão. Eles vão morrer. Nós não vamos ficar sabendo [...] já que é um tanto inviável investigar isso de forma sistemática”, explica. A abelha nativa do Brasil, também a mais popular, é a Jataí. Uma espécie sem ferrão e que pode ser encontrada em todas as regiões do Brasil, inclusive em centros urbanos. O manejo do tipo de abelha tetragonisca angustula pode ser considerado mais


A abelha nativa do Brasil, também a mais popular, é a Jataí. Uma espécie sem ferrão e que pode ser encontrada em todas as regiões do Brasil, inclusive em centros urbanos. O manejo do tipo de abelha tetragonisca angustula pode ser considerado mais fácil em função de ela não possuir ferrão. Costuma estar em troncos de árvores mais velhas e é responsável pela polinização de muitas plantas nativas. As abelhas jataí são conhecidas por sua robustez, assim, vivem no frio do inverno do sul do país e no calor do centro e norte do Brasil.

Foto: Valeria Cenci

fácil em função de ela não possuir ferrão. Costuma estar em troncos de árvores mais velhas e é responsável pela polinização de muitas plantas nativas. As abelhas jataí são conhecidas por sua robustez, assim, vivem no frio do inverno do sul do país e no calor do centro e norte do Brasil. Com relação ao uso de agrotóxicos e as consequências para a produção de mel e outros alimentos, Franzen conta que é uma realidade possível. “Frutas de maneira geral dependem da polinização cruzada que as abelhas acabam promovendo. Já cereais como milho, trigo, soja, não são dependentes de polinização, mas são favorecidos com a polinização cruzada. Porém, o que isso aumenta em termos de produtividade não afetaria a produção de alimentos. Mas frutas sim, nozes, castanhas, enfim. A própria diversidade ambiental das plantas nativas seria afetada”, afirma. Em entrevista concedida para uma reportagem da revista Época, o agrônomo Rubens Onofre Nodari, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), explicou que com a falta da polinização das

abelhas, haveria uma redução de 30% a 40% na produção agrícola. Segundo Nodari, alguns pesquisadores apontam 73%. Ainda de acordo com a reportagem, não existem pesquisas nesse teor referentes ao estado de Santa Catarina. Porém a morte das abelhas ocasionaria a não existência de maçãs, frutas produzidas no Estado.

Luz no fim do túnel? Entre as regiões do mundo em que a problemática das abelhas mais tem tido repercussão é a Europa. Esse movimento tomou força a partir de um estudo divulgado por uma obscura sociedade entomológica alemã, conforme consta em matéria da revista

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Piauí. O estudo aponta que as populações de insetos voadores nas reservas naturais da Alemanha haviam recuado 75% ao longo de 25 anos. A pesquisa de 2017 desencadeou um debate sobre a questão. Atualmente na Alemanha a iniciativa popular “Salvem as abelhas” quer forçar o governo da Baviera a buscar soluções para a diminuição da biodiversidade. A proposta prevê o incentivo à agricultura orgânica, proteção de matas ciliares, a ampliação da ligação de habitats naturais e o banimento de agrotóxicos. E no Brasil, quais as proposta de solução para esse problema? Com a liberação intensiva de agrotóxicos, muitos deles a base de Fipronil, reverter esse cenário

se torna cada vez mais complexo. Para o engenheiro agrônomo da Epagri de Formosa do Sul/SC, Vilmar Franzen, temos que entender que as soluções passam pelo uso adequado de agrotóxicos. Se faz respeitando os prazos para aplicação dos químicos, “as épocas em que são registradas no Ministério da Agricultura, que no Brasil é exigente, como primeira medida. Em segunda medida, o mundo inteiro está investindo e passando a utilizar ferramentas, inseticidas de base biológica, controle biológico, com insetos que destroem pragas, fungos que afetam pragas, vírus, enfim”, explica. Para o agrônomo, os produtos de controle biológicos funcionam de forma efetiva e por esse motivo merecem incentivo. Na quarta-feira, 27 de novembro, o Ministério da Agricultura publicou a autorização do registro de mais dois agrotóxicos inéditos, conforme divulgado pelo site G1. Além deles, foram liberados outros 55 genéricos - variações de produtos que já existem no mercado. Um dos dois novos produtos é um agrotóxico biológico e outro é considerado de baixa toxicidade conforme a nova metodologia de

Foto: Valeria Cenci

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classificação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O defensivo biológico é a vespa Telenomus podisi e poderá ser usado para combater o percevejo marrom. Franzen explica que a morte das abelhas não ocorre exclusivamente pelo uso indevido de agrotóxicos. O manejo dos apiários por parte dos apicultores tem papel decisivo na proteção da vida destes insetos. “Não podemos esquecer que existem outros elementos que causam a morte das abelhas. Entre elas, quando o apicultor não faz aquilo que ele já sabe fazer. Existem três formas de matar qualquer organismo: de fome, por doença ou por envenenamento” comenta. Com a abelha não é diferente, o agrônomo conta que se ela estiver fraca, com fome, afetada por alguma doença em maior ou menor grau, se tomar uma dose de veneno, vai morrer muito antes do que se tivesse um organismo saudável. Na opinião de Franzen, há morte de abelhas na região em função do uso de inseticidas, da mesma forma que existe morte de enxames por fome, por falta de alimento na colmeia. O engenheiro agrônomo que atende a Emater do município de Rondinha, Leandro Soares, traz questões parecidas e é ainda mais incisivo. Para ele, “os produtores não estão conseguindo aumentar os enxames por erro de manejo, e pior, muitas vezes estão colocando a culpa em outro fator e não estão resolvendo o problema. Então esse é um foco que nós temos nos últimos anos, de levar essa orientação para o produtor. O que ele tem que fazer para evitar a mortalidade, conseguir aumentar o número de enxames, conseguir aumentar a produção de mel e, lógico, também estamos levando para o produtor a questão dos agrotóxicos, o uso correto e adequado para evitar problemas”, explica. Para Leandro a solução da mortandade de abelhas pode ser resolvida de forma muito simples. “Se foi mal utilizado o agrotóxico, as abelhas podem ser afetadas, mas isso é muito fácil de se corrigir, muito fácil de se resolver. É apenas conscientização e orientação dos produtores para não utilizar os produtos. São uma quantidade pequena de produtos que causam realmente a mortalidade das abelhas. Se esses

produtos forem bem aplicados, não tem risco nenhum. O segundo fator é que sem o uso de agrotóxicos a gente também não teria comida”, comenta. Porém a solução para esse problema é muito mais complexa do que parece. Com um ambiente tão desfavorável para a vida das abelhas, várias questões devem se adequar. A resolução passa por diversos setores da sociedade, desde órgãos públicos, até apicultores ou mesmo o consumidor de mel. Cada um tem uma fatia de responsabilidade neste problema com proporções tão catastróficas. É necessária acriação de políticas que preservem as espécies de abelhas nativas, de forma especial. Além de um trabalho de conscientização da importância das abelhas, não só como produtoras de mel, com viés econômico, mas em especial como as principais responsáveis pela vida no planeta. Com consciência é possível reduzir o uso de agrotóxicos e, quando usados, serem aplicados de forma adequada. Assim será possível amenizar esse cenário devastador.

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Foto: Isabel Bevilacqua

JUVENTUDE: O LINK DA ROÇA COM O FUTURO Muitas são as peculiaridades vivenciadas em uma realidade tida como rural. O vínculo ao território constitui um dos mais significativos laços entre homem e terra, denotando a substancialidade do modo de vida rural. - Lima e Souza

Escrito por Isabel Bevilacqua e Lucas Liston

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O ano de 2010 trouxe algumas novidades surpreendentes, além dos velhos conhecidos como as tragédias naturais, aquecimento global, tráfico de drogas e violações dos direitos humanos, os holofotes no Brasil, estavam voltados ao fim da “era Lula” e a eleição de Dilma Rousseff. Enquanto tudo isso vinha a tona, em um pedacinho do país chamado Jardinópolis, um jovem ‘do mato’ abria sua atuação na indústria, a única da cidade.


Com 17 anos de idade, o trabalho dado a Joel, era lixar cadeiras, aquelas que certamente seu avô comprou dizendo que essas sim, iam durar por longos anos! O fato é, que o modo como a história foi escrita em 2010, influenciou nos seus próximos nove anos. Joel Pietro Biasi, 26 anos, é atualmente um jovem agricultor que atravessa a sucessão familiar na propriedade rural dos pais, além de eventualmente, trabalhar na fábrica de cadeiras da cidade. Entre os critérios estabelecidos com 17, estava melhorar a vida pobre, na intenção de tirar um dinheiro extra para começar a ter suas próprias coisas. Não deu outra, o rapaz, criado no mato, era bom de serviço! Tanto é que um ano depois conseguiu comprar sua Honda Fan 125 na cor verde. Era seu orgulho ter conquistado a carteira de motorista e a “motinha”, com o suor do seu próprio trabalho na cidade. Em todo o tempo de existência Joel morou no interior com os pais. Por 5 anos, saia de casa de segunda a sexta, e com sua moto ia trabalhar na cidade. Foi quando a mãe Ilse começou a ter sérios problemas de saúde, que o rapaz teve que largar o serviço de fabricante, para ajudar nos afazeres dentro e fora de casa, ali aprendeu a lavar roupa, limpar o chão, organizar a casa, cozinhar, entre outras funções internas. Lá fora era outra história, roçar o potreiro, levar as vacas no pasto, tirar leite, plantar o milho e mais outras diversas atividades que quem morra no interior faz. Um dos momentos mais difíceis da vida dele, foi quando os dois irmãos mais velhos saíram de casa para morar em Blumenau. Joel na época com apenas 7 anos, sofreu dificuldade, pois era muito apegado aos irmãos. “Aí foi bixo feio” contava, “Via eles uma vez por ano, e ainda tinha anos que eles não vinham, por que não se tinha condição. Nós se falava por orelhão, então nós ia até na cidade, comprava aquele cartãozinho e ligava, era só assim pra matar a saudade”, disse Joel. “Laço e laço!” dizia Joel, quando o assunto era momentos mais felizes na propriedade. Para ele não tem preço estar em cima do trator, “peleando”, além de passar momentos com a família e o filho. Assim, conta-nos do seu sonho “Meu sonho, bem dizer, está realizado, continuar vivendo bem com todos ao meu redor, manter a família sempre bem unida e com saúde”, diz o jovem com um sorriso no rosto e com toda a simplicidade do mundo. A decisão de fazer parte dos jovens do campo estava concretizada, “Na verdade, eu sempre gostei de morar na roça, quando ia passear na cidade que ficava um dia, era bom, mas não como estar na liberdade da roça. Aqui eu tenho espaço, tem os bichos, posso pegá o trator a hora que eu quiser, e isso me deixa feliz. Quando precisam de mim na fábrica eu vou, mas aí vou meio dia só, pois tenho que lidar com as coisas aqui em casa também!”. Ser um agricultor para Joel, é uma das coisas na qual não se mede as dificuldades, se mede as dimensões do significado da agricultura, pois é dali que sai o alimento para a nação inteira, “Todo mundo precisa do alimento e alguém tem que produzir”. Ele pensa que quanto mais jovens ficarem na agricultura, melhor será o futuro de todas as pessoas. Mas para isso, são necessários os incentivos.

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Joel conheceu, e casou-se com Laiana, uma moça que morou no interior e na cidade, ela diz com toda a certeza, “Eu prefiro mil vezes o interior, é mais tranquilo, aqui estamos livre”. Juntos tiveram o Arthur, e o desejo deles é que o filho siga os caminhos do campo.

Fotos: Isabel Bevilacqua

Foi possível! Joel, na intenção de morar para sempre no interior, conseguiu apoio de um programa municipal chamado Jovem no Campo. Assim, conseguiu construir sua própria casa na propriedade, continuando perto dos pais.

Visão macro sobre o atual cenário do campo Os debates que vêm se estabelecendo sobre o tema do espaço rural ganham novos desdobramentos a cada instante. É o caso dos últimos dez anos, a história foi se escrevendo e permeando a agricultura familiar no Brasil, que perdeu 2,2 milhões de trabalhadores, uma queda de 16,5% em comparação com o ano de 2006. Os números revelados pelo Censo Agropecuário 2017 do IBGE, apontam, ainda, que o número de estabelecimentos agrícolas familiares caiu em 9,5%. Jovens agropecuários também estão inseridos nas pesquisas, logo, a preocupação em relação ao futuro do campo. Os de idade entre 25 a 35 anos, são 9,48% dos moradores de áreas rurais, bem abaixo dos 13,56% do censo anterior realizado em 2006. Pois bem, Joel cita que todo mundo precisa do alimento e alguém tem que produzir. O fato é que todos precisamos do produtor também. Entre os fatores apontados pelo Mestre em Políticas Sociais e Dinâmicas Regionais, Fabiano Rambo, a diminuição de jovens no êxodo rural pode ser explicada pela falta de oportunidade para o jovem ter uma independência financeira e perspectivas de valorização na tomada de decisão da propriedade rural. Segundo Fabiano, estes são fatores importantes e que desmerecem o jovem, fazendo-o sair do campo, buscando oportunidades no meio urbano. Em relação ao Oeste Catarinense, onde está localizado o município de Jardinópolis, ocorre muito a desistência do campo. Arlene Renk, especialista em problemas regionais e ambientais,

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conta que exceto nas cidades com mais de 10 mil habitantes, há um esvaziamento do campo, e a saída dos jovens é maior entre o público feminino. Por algumas propriedades da região, é possível encontrar apenas o casal de pais, cujos filhos já saíram de casa, e não querem permanecer na agricultura. Conforme Arlene, este fenômeno é conhecido como a falta de sucessores. “Isto significa que, com a morte de um dos proprietários, essa propriedade estará inviabilizada”, indica a especialista. Já os jovens que permanecem no campo, voltam-se à profissionalização do agro, procurando adquirir maquinário e incentivos para facilitar o trabalho. “Hoje, boa parte encontra-se inserida na atividade leiteira. Agora, com um aumento em escala, maior número de vacas, com tecnologias para ordenha, com salas de ordenha, com resfriadores, entregando o leite a grandes laticínios”, diz Arlene, ressaltando que a permanência dos que ficam, se deve a vantagem de receber renda mensalmente. “Por essa razão permanecem no meio rural”, evidencia. Em meio ao desafio de reter jovens em um campo cada vez mais envelhecido, o papel da família no processo de sucessão é determinante na decisão dos filhos, deles deixarem o meio rural ou darem continuidade aos negócios da família. Para Fabiano, um processo de sucessão não é simples, porque envolve mudança de cultura, mas não deve ser de valores. “O filho na certa tentará tomar decisões diferentes do pai, por exemplo. Já o pai relutará o ‘não’ em todos os casos, com uma inovação de processos. Essa concertação é conflituosa se não houver entendimento entre as partes e talvez até uma mediação”, explica. Ainda, Fabiano argumenta que o desafio não é trocar o velho pelo novo. É trazer a experiência de quem sabe e já fez, com o vigor de quem está chegando.

Pilar de uma valia O pai de Ivonir nascia, enquanto na década de 70, o Brasil vivenciava uma acentuação do êxodo rural. No oeste de Santa Catarina não era diferente, as cidades se industrializavam e havia apoio governamental para tanto. A partir do fortalecimento de programas de incentivo, principalmente, para agricultura familiar, aconteceu uma mudança na perspectiva de valorizar o trabalhador na atividade agrícola e agropecuária. Antoninho Bevilacqua, 49 anos, residente no mesmo município que Joel. Aprendeu a valorizar a agricultura familiar desde muito cedo, e com o passar dos anos, percebeu que com o produto vindo da terra era possível um dia, ter um bom retorno. Passou este legado aos três filhos, na qual apenas um optou pela atividade. Hoje, Ivonir, 26 anos, atualmente é Técnico em Agronegócio, Torneiro Mecânico e sucessor na família Bevilacqua. O jovem conta que não gostava de ter que estudar na escola regular, tanto é que se formou na 8ª

série e optou por estudar o que gostava. “Entrei para a Casa Familiar Rural de Quilombo com 15 anos de idade. Lá o estudo era totalmente diferente, por justamente focar na agricultura. Por uma semana estudávamos na teoria e na prática o tema proposto, e quando retornava para casa o dever, em duas semanas, era conseguir aplicar na propriedade”, explica. O estudo na Casa Familiar Rural fez despertar em Ivonir o fascínio pelo modo de vida no campo. E esse interesse pelo aprendizado diferente, partiu do irmão mais velho, Ivan, que já havia estudado na casa familiar e conseguido aplicar muitas coisas na propriedade. Tendo em vista o acompanhamento das coisas que o irmão mais velho conseguiu transformar no espaço familiar, Ivonir optou pela especialização em Técnico Agrícola. Ainda durante os estudos, o jovem viu na propriedade um dilema, pois a família que sempre havia trabalhado com gado de leite e lavoura e tinha alguns dos equipamentos que auxiliavam bastante

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no processo de produção, como ordenhadeira, trator, ceifa, plantadeira, entre outros equipamentos, tinham que se sujeitar a mecânica, quase que mensalmente, para arrumar os equipamentos. Apenas Técnico agrícola não era mais o suficiente! “Eu já me interessava muito pela área de mecânica com implementos agrícolas, então logo após finalizar o curso na casa familiar, comecei um curso técnico de torneiro mecânico em Chapecó.

Ivonir descobriu o amor por duas profissões, entre elas a mecânica agrícola.

Foto: Isabel Bevilacqua

Queria colocar uma mecânica em casa mesmo para arrumar as máquinas, além de fazer serviços para vizinhos e não precisar gastar com trabalho terceirizado. Mas a prioridade, eram as máquinas”, contou Ivonir. No decorrer da experiência como torneiro, em estágios e trabalhos técnicos da profissionalização, ele optou por abrir uma mecânica na cidade de Jardinópolis. Ivonir e sua esposa Kelly, mantém a mecânica há 8 anos, na intenção de obter mais retorno financeiro. O jovem mudou-se para a cidade e junto com Kelly construiu uma família. Mas diariamente é rendido pelas façanhas do interior, e a vontade de estar trabalhando com o pai Antoninho e a mãe Genilei, na lavoura. A família se desfez da atividade leiteira, porque exigia de muito trabalho. Hoje se mantem somente com o sustento do cultivo de grãos, na qual Ivonir, ajuda do plantio à colheita, além de arrumar o

maquinário que estraga na propriedade sem cobrar nada. Para ele, muitos jovens saem do interior, pela falta da oportunidade de um estudo, e pela atividade não obter o lucro esperado. “Todas as atividades ligadas ao campo merecem um estudo melhor para você conseguir aumentar a produção com melhor qualidade. Muitos saem do campo, porque vê que a atividade não está obtendo lucro para se manter, o preço dos insumos aumentam a cada dia, então no interior tudo é investimento elevado, ainda mais se não se tem auxílio”, diz Ivonir. Cita o que fez o irmão Ivan e a irmã Isabel, saírem de casa, foi a necessidade de fazer o que gosta, pois para ele, cada um tem que seguir o caminho que acha melhor. “O meu caminho é este, gosto de ser agricultor, e gosto de ser mecânico nas horas vagas. Eles tem o caminho deles, e se um dia voltarem para casa, nós agradecemos muito, pois assim, além de ter a família unida teremos mais mão de obra”, destacou. “Para o meu filho Luiz, espero o mesmo que meus pais me ensinaram até hoje. Que ele estude, seja uma pessoa boa e siga com os princípios e valores pelos caminhos certos da vida” finalizou o jovem, dizendo que sempre o ajudará em tudo, como seu pai fez.

Foto: Isabel Bevilacqua

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É necessário uma formação para trabalhar no campo? O especialista Fabiano, nos apresenta que a qualificação no campo é fundamental, e que não basta conhecer apenas parte dos processos, para tomar uma decisão mais assertiva. Pois para ele, fazer agricultura familiar é também dominar aspectos de gestão e de conhecimentos específicos inerentes aos setores agrícola e agropecuário. “Agricultura familiar não é sinônimo de pouca tecnificação ou despreparo. Muito pelo contrário, é um modelo de produção e reprodução social dentro de um ambiente de concorrência, integrando cadeias produtivas longas e curtas, onde estar qualificado é pressuposto básico para exercer a atividade”, diz o especialista. Como disse a pesquisadora Arlene, o jovem rural tem muitas oportunidades de aperfeiçoar-se e de empoderar-se. Hoje as informações chegam até ele a qualquer momento, pois o acesso à internet está à disposição e é uma ferramenta que facilita uma tomada de decisão, o que não ocorria há algumas décadas. Como vimos no capítulo anterior, para o jovem Ivonir, é tendo conhecimento que você consegue transformar as coisas ao seu redor. Por tanto, além do conhecimento que parte de dentro da propriedade, devemos considerar que hoje há muitas oportunidades. São universidades, faculdades, Casas Familiares Rurais, Sistema S, cooperativas, entre outras tantos centros que contribuem importantemente para capacitar com diversos tipos de conhecimento os produtores rurais.

Políticas Públicas e incentivos A reportagem conversou com Clovis Dorigon, que é pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI), e especialista nos temas: mercados de produtos alimentares de qualidade diferenciada, agroindústria familiar rural, desenvolvimento rural, desenvolvimento regional e sucessão hereditária. A entidade que Clóvis trabalha é pública e está vinculada ao Governo do Estado de Santa Catarina, por meio da Secretaria de Estado da Agricultura e da Pesca. Ir mais afundo e entender como atua uma das entidades que diz ser proporcionadora de apoio ao jovem no campo, é fundamental para ampliar a visão sobre alguns dos incentivos e políticas públicas, para o jovem no campo. A Epagri está organizada em nove programas, sendo eles: Aquicultura e Pesca, Fruticultura, Gestão

e Mercados, Grãos, Olericultura, Pecuária, Gestão e Desenvolvimento Institucional, Desenvolvimento e Sustentabilidade Ambiental e Capital Humano e Social. No escopo do programa Capital Humano e Social há uma linha específica de trabalho com “Gênero e Geração”, a qual está vinculado o trabalho com os jovens rurais e marítimos. Devido à alta migração dos jovens do meio rural para o meio urbano e o crescente número de propriedades rurais sem sucessores, a Epagri, desde 2012, atua no estado com capacitações específicas para jovens entre 18 a 29 anos de idade. De 2012 a 2016 estas capacitações receberam apoio financeiro do programa SC Rural para atender demandas específicas dos jovens que compõem espaço rural e marinho. E a partir de 2017

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Foto: Aliança pela Infância

para a continuidade desta ação, a empresa vem buscando parcerias e/ou com recursos próprios. Conforme Clóvis, existe um curso que é realizado em todos os centros de treinamento da Epagri no estado, com a proposta de trabalho em forma de alternância, para ele, se entende como uma das experiências mais exitosas de educação no campo. Este curso aborda quatro especificidades: Eixo Humano, Eixo Gerencial, Eixo tecnológico e Eixo ambiental. Desde 2012 a Epagri capacitou mais de 2 mil jovens em todo o estado de Santa Catarina. Na região Oeste, 191 jovens rurais já se formaram através da Epagri, sendo de municípios próximos e que fazem parte da Unidade de Gestão Técnica da Epagri do Oeste. Além do curso, existe um projeto que visa desenvolver o protagonismo do jovem para melhorar alguma atividade existente na propriedade, ou mes-

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mo para iniciar uma nova. “Durante a capacitação os jovens, e acompanhamento dos extensionistas municipais da Epagri, elaboram o Plano de Desenvolvimento da propriedade (PDP), e um projeto de vida”, indica. “As ações com os jovens não se limitam somente aos cursos nos Centros de treinamento. Nos municípios de origem, estes jovens são incluídos em outras atividades que os técnicos municipais realizam, conforme planejamento, bem como ao acesso a outras políticas públicas disponíveis a agricultura familiar”, salienta Clóvis. Ainda para o especialista, com as ações de extensão rural é possível oportunizar aos agricultores, na qualidade de vida no campo, agregando valor aos produtos que são produzidos nas propriedades e contribuindo para que os jovens permaneçam nesse espaço, seguindo a profissão de seus pais.


O futuro do campo Empiricamente em nossa mesorregião catarinense se percebe um movimento de retorno de jovens ao meio rural. O caso de Joel e Ivonir, não são tão raros, ou seja, homens e mulheres que buscaram oportunidade nas cidades, fora da casa dos pais, hoje retornam para dar sequência a uma atividade agrícola e agropecuária iniciada, muitas vezes, pelos avós. Esse movimento, está caracterizado de certa forma às mudanças na perspectiva de qualidade de vida destas populações. Felizmente, na microrregião, campo não é sinônimo de pobreza e subsistência, não generalizando. Vendo a tecnificação cada vez mais constante, até mesmo pela necessidade da falta de mão de obra, traz outros anseios para os jovens no

meio rural, como momentos de descanso, conforto e bem-estar. A permanência do jovem no campo é um tema de fundamental importância no contexto atual e dentro da perspectiva econômica, de inserção da agricultura familiar. Há um movimento bastante intenso dentro da academia e do setor cooperativo, em especial, para tentar elucidar a questão dos fatores que influenciam a permanência do jovem no campo. O jovem que for incentivado à sucessão, gruda-se a sua raiz. Este, buscará por qualificações e, ousaria dizer, muito bem relacionado aos sistemas econômicos atuais, terá acesso a fazer investimentos dentro da sua atividade escolhida.

“Não podem fazer ideia da vida que eles levam ali. Uma vida rural simples e dura. Que levantam cedo porque têm muito que fazer e deitam cedo porque têm muito pouco que pensar.” Oscar Wilde

Foto: Isabel Bevilacqua

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Foto: Mirella Schuch

RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL: ALÉM DOS PRODUTOS E SERVIÇOS Empresas de Chapecó (SC) contribuem para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável Escrito por Mirella Schuch e Natália Souza

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“Por mais de 30 anos, a ciência tem sido muito clara. Como vocês se atrevem a continuar ignorando isto?”. Este foi o questionamento da ativista sueca Greta Thunberg, na abertura do Encontro de Cúpula sobre Ação Climática, em 23 de setembro de 2019. No discurso, a jovem de 16 anos questionou os líderes interna-


cionais sobre as atitudes tomadas até o momento para conter as mudanças climáticas e terminou com um aviso aos Chefes de Estado presentes: “E a mudança está chegando, quer vocês queiram ou não”. O encontro, promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU), discutiu ações sustentáveis que contribuam para o cumprimento da “Agenda 2030”. O documento, assinado por 193 países em 2015, estabeleceu os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). São 17 objetivos e 169 metas a serem atingidos até 2030 em diferentes áreas, como a social, a ambiental, a econômica e a institucional. Os ODS se baseiam nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e buscam trazer uma abordagem mais sustentável às primeiras metas, cuja validade expirou em 2015. Os 17 objetivos são, em resumo: erradicação da pobreza; fome zero e agricultura sustentável; saúde e bem-estar; educação de qualidade; igualdade de gênero; água potável e saneamento; energia limpa e acessível; trabalho decente e crescimento econômico; indústria, inovação e infraestrutura; redução das desigualdades; cidades e comunidades sustentáveis; consumo e produção responsáveis; ação contra a mudança global do clima; vida na água; vida terrestre; paz, justiça e instituições eficazes; parcerias e meios de implementação. A adoção dos ODS pelos países-membros da ONU revela a aceitação de um caminho comum para o desenvolvimento do planeta. No entanto, este novo modelo de progresso não impacta somente os governos, mas também as empresas. O setor privado passou a ser cobrado por uma postura mais sustentável, aliada a uma atuação responsável. Neste cenário, não basta que o empresário tenha consciência dos problemas ambientais, ele também precisa pensar nas boas práticas sociais e na valorização do capital humano, indo além do fornecimento de produtos e serviços. O econômico, o social e o ambiental, juntos, formam o chamado “tripé de sustentabilidade”. O termo foi cunhado por John Elkington, cofundador

da organização não governamental internacional SustainAbility, em 1994. A relação entre estes três aspectos, bem como sua existência em si, criam um contexto de sustentabilidade no ambiente em que é aplicado, seja ele um país ou uma casa. No caso de aplicação em uma empresa, este equilíbrio está intimamente ligado a uma gestão ética e transparente.

O que as empresas têm a ver com isso? A responsabilidade social empresarial (RSE) trata-se do compromisso da organização com a comunidade na qual a empresa está inserida. Segundo a especialista em responsabilidade social empresarial, Isabel Machado, as empresas precisam ser transparentes e éticas e implementar ações na comunidade onde estão inseridas, pensando na construção de uma sociedade mais justa e igualitária. “Acredito muito que de nada adianta uma empresa saudável em uma sociedade doente. Essa é a fala do Peter Drucker, um grande estudioso, que em suas obras traz esse pensamento que as organizações devem ter”, destaca. A RSE envolve a sociedade e tem relação com os ODS, que visam melhorar a qualidade de vida de toda a sociedade, em especial a das pessoas mais carentes economicamente. Isabel diz que mui-

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tas vezes pensa-se que é preciso realizar ações grandiosas, mas que não é necessário. “Pequenas atitudes do dia a dia na organização, com olhar mais inclusivo, contribuem. Não precisamos salvar o planeta, mas fazer ações locais para melhorar o mundo que nos cerca”, destaca. O questionamento crucial é: como contribuir para um planeta mais sustentável? A especialista em responsabilidade social empresarial explica que, primeiramente, as organizações precisam conhecer os ODS, os três principais pilares da sustentabilidade e compreendê-los. Então, devem avaliar o impacto que têm nas comunidades onde estão inseridas para, assim, estabelecer metas a serem alcançadas, através de indicadores de sustentabilidade. Alguns exemplos simples de como pôr em prática os pilares da sustentabilidade, de acordo com a especialista, são: sensibilizar a equipe em relação ao cuidado do meio ambiente e incentivar a economia de energia e água; o plantio de árvores; a alimentação saudável; a separação dos resíduos e o destino correto dos resíduos; a redução do uso de materiais que geram muito lixo; a participação em movimentos relacionados à questões ambientais e a implementação de energia renovável. Isabel ressalta que as práticas devem ser adotadas tanto dentro da organização, como no ambiente familiar de cada colaborador. Outras maneiras de concretizar ideias sustentáveis são fazer campanhas, como doação de sangue, voluntariado e coleta de material para doações.

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Participar de ações da comunidade e fazer palestras em escolas e instituições são outras possibilidades. É importante acompanhar mês a mês o desenvolvimento da organização em relação à sustentabilidade, pois assim é possível identificar riscos, mensurar resultados e pensar novas estratégias para que a empresa impacte seu entorno cada vez mais de forma positiva. Isabel afirma que empresas que trabalham a responsabilidade social empresarial na sua organização, terão resultados a longo e não a curto prazo, pois é preciso sensibilizar as equipes em relação à este tema. Para ela, quando a empresa trabalha a cultura da responsabilidade social empresarial na comunidade, ganha vantagem competitiva e gera imagem positiva da organização perante a sociedade. “Os clientes começam a olhar a empresa com outros olhos. Os colaboradores sentem-se mais satisfeitos, valorizados e motivados, pois estão participando e a comunidade em torno se envolve com a empresa”, explica. A especialista pontua, ainda, que tudo o que a empresa realiza em termos de responsabilidade social empresarial, auxilia a organização a administrar e gerenciar as crises. “Se ela é ética com a sociedade, na possibilidade de surgir alguma crise, a própria comunidade vai defender a organização, pois confia e acredita no que a empresa sempre foi e mostrou que é: transparente”, expõe.

GISTotal: uma estratégia inovadora no Oeste Catarinense A principal forma de apresentar os resultados das ações sociais, econômicas e ambientais de uma empresa é através de um relatório de sustentabilidade. É uma prestação de contas à sociedade e às partes interessadas sobre suas ações e práticas sustentáveis. É por meio deste documento que a empresa divulga os impactos socioambientais causados pelas suas atividades cotidianas. Entre estas atividades,


está a geração de resíduos e a destinação dada à eles pela organização, bem como as práticas para diminuir a geração de detritos. Atualmente, existem diversos modelos de relatórios à disposição das empresas. O mais popular entre elas é o disponibilizado pela Global Reporting Initiative (GRI), uma organização internacional que auxilia empresas, governos e outras instituições a relatarem e comunicarem os impactos socioambientais que as suas atividades causam. O modelo GRI possui diretrizes que podem ser aplicadas a empresas de todos os tamanhos, tipos e setores do mercado. Elas identificam as informações a ser divulgadas, que são relevantes e essenciais para a maioria das organizações. Também estão alinhadas com a Declaração Internacional dos Direitos Humanos, ao Pacto Global, aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, aos padrões ISO e a códigos de conduta e de ética. No Brasil, o GRI está ligado ao Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da Bovespa, os Indicadores de Auto-avaliação do Instituto Ethos e as melhores práticas propostas pelo Instituto Brasileiros de Governança Corporativa (IBGC). Foi com a finalidade de facilitar o desenvolvimento do relatório que nasceu o “Protótipo de um gerador de relatório de sustentabilidade conforme diretrizes GRI”, trabalho de conclusão do curso (TCC) da Bacharel em Sistemas de Informação e Especialista GRI Standards, Sílvia Vaccari. Ela escolheu o padrão GRI para desenvolver o protótipo, pois é o modelo mais utilizado e reconhecido mundialmente e recomendado pela ONU. “Conheci as dificuldades das organizações no processo de relatório e isso me motivou bastante, para que na área da tecnologia conseguisse fazer algo por essas empresas. Queria que meu TCC fosse útil e pudesse servir de estudo depois de finalizar o curso”. A analista de sistemas estudou desde 2015, durante a graduação, a metodologia do GRI, que encontra-se na língua inglesa, para que, no final do ano de 2018, concluísse o processo do trabalho final. “Na graduação temos que desenvolver algo relacionado

à tecnologia, mas eu precisava entender o tema para conseguir desenvolver o que eu queria. O protótipo é um conceito do que consegui assimilar nos estudos. Depois que terminei, consegui fazer outras certificações”, explica. Sílvia é companheira de Rodrigo Holl, o também Bacharel em SIstemas de Informação e diretor executivo da DotSE Software Engineering, empresa de desenvolvimento de softwares, localizada na cidade de Chapecó (SC). Rodrigo teve o conhecimento da existência de relatórios de sustentabilidade a partir de Sílvia. Por conta do relacionamento, ele acompanhou o trabalho dela e ambos tinham a pretensão de desenvolver um software. Em reunião na empresa, Sílvia apresentou o conceito do protótipo e como precisaria ser desenvolvido o software. A equipe acreditou na ideia e assim surgiu o sistema de gerenciamento de indicadores de sustentabilidade, o GISTotal, que tem em sua sigla a palavra “total” por ser possível cadastrar além da metodologia do GRI, outros modelos de indicadores. O GISTotal auxilia no processo de elaboração do relatório de sustentabilidade e serve para acompanhar, medir e fazer a gestão dos indicadores de sustentabilidade da organização. Os relatórios emitidos pela ferramenta permitem que o gestor da empresa visualize o panorama como um todo da organização e tome decisões estratégicas para melhorar o desempenho da organização.

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Silvia afirma que não encontrou software semelhante ao GISTotal no mercado brasileiro, mas que tem conhecimento de sistemas estrangeiros homologados pelo GRI. “Eles não têm a mesma pegada do GIS, que foi concebido para ser fácil de usar, mas para usá-lo é necessário ter conhecimento sobre indicadores de sustentabilidade”, explica. O primeiro relatório de sustentabilidade emitido pelo sistema foi o da empresa DotSE, em 2019, referente às ações da organização do ano anterior. Rodrigo afirma que através do estudo de Sílvia percebeu a importância e necessidade de acompanhar e mostrar para a sociedade os impactos positivos e negati-

vos da empresa no ambiente em que está inserida. “Emitir o relatório é uma questão de consciência, que é necessária, independente do setor empresarial, governamental ou da sociedade em geral. Se não atendermos os ODS, a tendência é que tenhamos problemas bem crônicos e isso afeta não somente a nossa geração, mas também as novas que vêm surgindo”, salienta. Sílvia e Rodrigo esperam que muitos relatórios sejam emitidos pelo GISTotal e que o sistema venha a se tornar referência mundial. “Queremos trazer isso no Brasil, em Chapecó, e fazer com tecnologia e pessoas daqui, para que as empresas façam uma mudança disruptiva do conceito de sustentabilidade”, expressa. Uma empresa interessada em emitir um Relatório de Sustentabilidade com base em GRI é a Estilo Verde. A proprietária Marina Petzen afirma que faz relatórios anuais das atividades do estabeleci-

O Relatório de Sustentabilidade da DotSE é o primeiro emitido pela ferramenta GISTotal e possibilita a visualização dos impactos da organização no meio ambiente, na economia e na sociedade (divulgação/DotSE)

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O Dia de Compartilhar incentiva os clientes a trocar peças de roupa, acessórios e outros objetos, de forma a dar uma nova utilizade a eles.(divulgação/ Estilo Verde)

mento, apesar de ser uma empresa pequena. “Eu não emito exatamente um Relatório de Sustentabilidade, pois os processos são um pouco atrapalhados e muitos dos resultados estão somente comigo. Porém, desejo muito ter um. É uma forma de participar deste processo importante, mesmo sendo uma microempresa”, afirma. Com foco em moda e acessórios sustentáveis, o empreendimento é comprometido com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável desde 2018. “Somos signatários do movimento do Comitê local pelos ODS e do movimento nacional há dois anos. Eu sempre tive contato com o movimento, desde que eram ODMs. Depois que eu fundei a Estilo Verde, decidi colocar a empresa nesta linha”, comenta a empresária. Sobre a Responsabilidade Social Empresarial, Petzen entende que ela deve existir para fazer bem à sociedade. A Estilo Verde tem várias iniciativas que buscam tornar a sua atuação mais sustentável. Um exemplo é o Dia de Compartilhar, que busca conscientizar sobre o consumo responsável. “As empresas são um reflexo. Elas têm papel bem importante de formadora de opinião e devem ser responsáveis,

ao meu ver. No entanto, eu vejo que a Responsabilidade Social Empresarial é pouco praticada e, infelizmente, vista como obrigação”, completa Marina. A especialista em responsabilidade social empresarial, Isabel Machado afirma que as empresas que trabalham a responsabilidade social empresarial e temáticas voltadas à sustentabilidade dentro das organizações, estarão atendendo globalmente a comunidade e colaborando para atingir os ODS. “A Agenda 2030 com certeza é um caminho bastante extenso para se percorrer e se atingir todos os objetivos dentro dos percentuais estabelecidos pela ONU, mas se cada organização e cada pessoa fizer a sua parte, vamos conseguir alcançar os objetivos na sua totalidade e contribuir para uma sociedade melhor, mais justa e igualitária”, finaliza.

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DONA CAMPONESA A desconstrução e reconstrução do papel da mulher do campo Escrito por: Eduarda Boettcher e Tayvon Bet Corpo, cada corpo conta com suas marcas, às suas histórias de prazeres e desprazeres tórridos. Estudando comunicação aprendemos que tudo o que usamos é uma forma de comunicar, nossas roupas, adornos e porque não, nossos trejeitos corporais. De forma que marcas roxas comunicam uma possível agressão e um sorriso uma possível felicidade, os ombros caídos e os braços grossos comunicam que esse corpo, é um corpo de mulher camponesa, marcado pelos anos que correm nos rostos e na mente.

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Às mulheres camponesas, assim como tantas outras mulheres, para não dizer todas, estão inseridas dentro de uma construção patriarcal machista, marcada também pela presença da igreja. Os ensinamentos dessas mulheres são passado de mãe para filha, geralmente, sem tempo para ensinar minuciosamente, esses saberes são adquiridos pelo olhar atento e pela necessidade de aprender para poder ajudar, e porque em geral, servirão de lastro junto aos saberes "masculinos" do marido, assim que casar-se. Podemos perceber que às mulheres que nascem e são criadas no campo, compartilham de uma visão essencialista, o que gera o pensamento crente de que seus deveres são com os papéis imutáveis de mãe, cuidadora da casa, e em muitos casos, instituídos por Deus pai. Frente à isso, podemos dizer que o corpo da mulher camponesa nasce grudado, quase como gêmeas siamesas, às suas obrigações e deveres de mulher, construídos com o passar dos anos. Às mulheres camponesas vivem sobre um função utilitarista, isto é, estão sempre em função de serem úteis, raramente encontraremos elas com tempo ocioso. Estão sempre em movimento, cuidando do quintal de casa, participando de reuniões da comunidade, fazendo guloseimas ou até os trabalhos da roça. A noite, é um dos poucos momentos nos quais há um espaço para lazer. Mas nem sempre para todas, existe mulheres que mesmo após o entardecer, seguem trabalhando, geralmente limpando a casa, pois dedicaram o dia aos fazeres externos. Um mito sobre as camponesas, é que suas funções se limitam à casa. Há toda uma jornada tripla de trabalho, além da casa e dos filhos, o trabalho na roça junto ao marido é parte da rotina rural. Plantar fumo, tirar leite, regar a terra, passar veneno, fazer queijos e outros produtos coloniais para a alimentação da família, são alguns dos muitos trabalhos que essas mulheres realizam.

Outro ponto importante, quando discutimos sobre a vida das mulheres camponesas, são suas construções com relação ao sexo e sexualidade. As informações sobre relações sexuais, são passadas de mãe a filha de maneira tímida e pouco explicada. O corpo e o sexo para a mulher ganha um tom perigoso de pecado, fruto da presença histórica da igreja dentro das comunidades. Assim, se institui um sentimento de vergonha e medo sobre seus próprios corpos e também com relação aos homens, que poderiam roubar a “pureza” que guardão. Para entender melhor isso é preciso voltar no tempo, quando o clero da Igreja Católica formado por sacerdotes, reconhece o poder da sexualidade das mulheres sobre os homens, então, com tentativas falhas de exorcizar a sexualidade delas, expulsão todas às mulheres dos momentos de liturgia e do Ministérios dos Sacramentos. Com isso, transformam a sexualidade feminina em um peso de vergonha, resultando no pouco conhecimento e timidez enraizadas nas famílias camponesas e outras tantas cristãs. É necessário olhar para a mulher camponesa como um símbolo de resistência e como olhos críticos a criação instituída a elas. Com o passar do tempo é comum que por necessidade, a sociedade mude em processo de evolução, as discussões sobre feminismo e machismo estão fomentando mudanças e as mulheres do campo, diferente do que muitos pensam não ficam para trás. O pensamento crítico sobre suas realidades está constituindo novos horizontes, por mais que suas criações enraizadas pelo utilitarismo tomem boa parte do seu tempo. Hoje, a criticidade brota firme e forte para efetuar transformações. Com isso em mente fomos até a comunidade São Pedro e São Paulo, no distrito de Alto da Serra, cidade de Chapecó. Nós Eduarda Boettcher e Tayvon Bet, repórteres entrevistadores, fomos acompanhados por Sirlei Bet, mulher camponesa, de 53 anos, amiga das entrevistadas, mãe de Tayvon, nossa motorista quase particular e nesse dia entrevistadora também.

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DONA ZENILDE Era um domingo de sol quente, com cheiro das flores desabrochadas por consequência da primavera. Chegamos na casa de Dona Zenilde Mendes Cinelli de 70 anos, por volta de meio dia e quarenta, um pouco inconveniente de nossa parte chegar tão cedo após o almoço. Encontramos uma senhora de cabelo loiro, voz doce e calma, cheia de simpatia e sorrisos, sentada em uma cadeira na sua varanda conversando com uma de suas três filhas, a mais jovem, Adriana. Logo o companheiro Elias Cinelli chega e junta-se a nós. Dona Zenilde conta que nasceu na comunidade Colônia Bacia, Chapecó. É a irmã mais velha de quatro filhos. Aos oito anos seus pais se divorciam e sua mãe se muda para Porto Alegre, Zenilde e os irmãos ficam com o pai no campo. É nesse momento que ela assume, ainda que tão jovem, as obrigações e responsabilidades com a casa, o pai trabalhava na roça o dia todo, enquanto ela cuidava dos irmãos mais novos. Zenilde diz que chegou a passar fome por não saber cozinhar e que aprendeu a fazer pão e outras comidas observando o pai. E em alguns outros momentos, quando sobrava tempo, seu pai ensinava algo novo para ser feito em casa, diferente da história de muitas jovens e fugindo da condicionalidade do campo, onde a maioria das mulheres aprendem a cuidar da casa com a mãe, já que por construção social seria responsabilidade das mulheres transferir esses ensinamentos. O tempo não para, continua correndo. A menina de oito anos cresce, mas não muito. Com 12 anos Zenilde começa a trabalhar como doméstica, para ajudar na renda da família. Com o proceder do tempo, fica um pouco mais velha e se muda para Chapecó, onde continua trabalhando como doméstica. Aos 19, em um baile, conhece seu atual companheiro o já citado Elias. “Nos conhecemos porque era para ser, um mês e pouco depois de conhecê-lo,

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meu pai acabou morrendo”. Conta ela, enquanto troca um olhar doce com o companheiro. Após o casamento Zenilde e Elias voltam a morar no campo, dessa vez, na Linha São Pedro e São Paulo no interior de Chapecó. No início Zenilde não gostava da vida que levava na roça, sentia falta da convivência com os vizinhos e amigos que tinha na cidade, já que no campo, não havia alguém próximo. Zenilde sentia-se sozinha em muitos momentos, ela comenta que chegou a chorar escondida. Mesmo contrariada, continuou a viver no campo, trabalhando ao lado de seu marido nas atividades rurais e também cuidando da casa. A solidão pode ser uma consequência da vida no campo para muitas mulheres, isso pode tornar as coisas ainda mais difíceis, pois além do trabalho braçal e dos muitos afazeres que elas realizam durante o dia, estar só, sem ninguém para conversar quando necessário, é amedrontador. O marido nem sempre é um apoio para esses tipos de conversar, afinal, homens são ensinados a não conversarem sobre sentimentos e aflições, o que geralmente não compactua com a criação das mulheres. Perguntamos à Dona Zenilde sobre às mudanças positivas na vida da mulher do campo, a resposta, veio cheia de percepções otimistas e antenadas. “A mulher possui mais liberdade hoje, antigamente isso não existia no campo. São mais livres dos maridos também, agora elas podem fazer o que querem, como o marido sempre fez. Porque o homem sempre foi livre.” Zenilde ainda recorda de outro ponto positivo, “Antigamente, os filhos não poderiam ficar juntos com os pais nas rodas de conversa, hoje a família conversa junto.” Sirlei também complementa que hoje em dias as mulheres do campo também dirigem, e mesmo dentro das cidades isso é visto como uma conquista feminina. Em seguida, perguntamos sobre educação sexual e Zenilde não exitou em responder. “Naquele


tempo não falávamos muito, tínhamos vergonha. Eu sentia vergonha de explicar algumas coisas para minhas filhas, porque também não fui ensinada. Hoje isso mudou, minhas amigas comentam que conversaram com seus filhos e filhas sobre. Melhor saber antes do que depois, agora eu vejo a importância desse saber” afirma. Por fim, perguntamos o que ela mais gosta na vida do campo, a resposta veio assim que a pergunta foi feita, estava na ponta da língua. “A liberdade. Na cidade não tenho a liberdade que tenho aqui, posar lá, só quando é necessário.” Zenilde diz que, hoje, gosta muito da vida calma que leva no campo e que não pensa em mudar-se. Para ela, o campo se tornou algo doce e agradável, após anos de muito trabalho duro.

“Hoje as terras que eram usadas para o plantiu sao arrendadas.” Zenilde Mendes Cinelli

Foto: Tayvon Bet

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DONA CEMA Após terminar e entrevista com Dona Zenilde, entramos no carro e fomos até a próxima morada, desta vez para conversar com a Dona Iracema Bolsonni. Ao chegar comentamos “Desculpa vir incomodar a senhora”. Dona Cema carrega um tom de humor natural, sem intenção de causar risos, então responde “Incômodo é doença”. Em seguida, colocamos nossos celulares para carregar, estavam quase sem bateria devido à entrevista feita minutos antes com dona Zenilde. Sentamos para conversarmos um pouco, Sirlei toma a frente na conversa e a gente o roteiro de pergunta para serem feito. Passado alguns minutos, interrompemos a conversa das duas, que estava muito boa por sinal. Começamos a explicar (desta vez pessoalmente) para dona Cema o porquê de nossa visita e conversar sobre seu dia à dia, tudo em off. Cema, logo começa a contar coisas extremamente relevantes para a realização desta matéria, pedimos para que pare e aguarde até que nossos celulares estejam em mãos. Cema nos conta que nasceu em Linha Feliz, em Caxambu do Sul e que morava com sua família. Hoje é mãe de quatro filhos, que pariu em em casa com auxílio da sua mãe que era parteira. Os filhos são carinhosamente chamados por apelidos, Nenê, Nego, Neninho e Andrea, única filha mulher e única sem um apelido fofo. Em seguida perguntamos sobre como conheceu seu companheiro, “Um dia a mãe disse para mim ir limpar a calçada de casa, quando sai para fora vi que tinha um homem parado perto de um caminhão que carregava porcos, ele ficava me encarando”, comentá. “Voltei para dentro de casa e disse para minha mãe que me sentia incomodada de limpar a calçada, enquanto aquele estranho me observava.” O estranho que Cema conta, era João Carlos seu futuro marido,

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que estava trabalhando na propriedade do pai de Cema. Alguns meses depois a família de Cema se muda para a vila do Alto da Serra, fugindo da roça propriamente dita. Lá a família se torna vizinha de Carlos. Alguns dias de depois, o namoro se inicia, com um pedido de namoro feito ao pai de Cema, sem consultá-la. “O pai chegou e disse para mim fazer um chimarrão que Carlos está vindo para namorar contigo. Nem sabia fazer chimarrão”, relembra ela, ao contar a história. O namoro era permitido até às 20 horas de noite, depois Carlos ia para casa.

“Benzo de bixas, minguas, tormenta.” Iracema Bolsonni


Com algum tempo de namoro, Carlos busca Cema na casa de seus pai e os dois fogem para morar juntos no campo. “Ele diz que a gente não fugiu, mas se ele não tivesse me pego em casa, não teria vindo”, ri ao pontuar a frase. 16 dias depois da fuga, o pai de Dona Cema fez o casal firmar o relacionamento perante a igreja. Cema se casa com 13 anos, enquanto Carlos possuía 26. Agora casada, os dois começam a construir suas vidas juntos. São anos de trabalho duro, dedicado a roça. Dona Cema diz que seu marido nunca pediu para que ela trabalhasse na roça e deixa bem claro quando diz em tom de voz firme “Eu trabalhei por que eu quis”. Ela ainda relatou algumas histó-

rias que passou com o trabalho pesado, como por exemplo, quando ainda não sabia que estava grávida de seu último filho e teve que passar veneno na lavoura de milho, em baixo de um sol muito forte, com mais de dez litros de água nas costas, durante horas, e quando chegou em casa ao anoitecer, ao invés de descansar foi fazer o serviço da casa. Uma mulher forte, que suportou muitas dificuldades físicas, hoje tem um problema ainda maior, além de lidar com dores corporais, ela também sofre de um cansaço psicológico, pois a vida no campo exige muito esforço e dedicação. Cema diz estar exausta do trabalho na roça, afinal, ao 61 anos continua plantando fumo. Para Cema a vida no campo continua árdua e difícil.

DONA DE SI A luta pelo empoderamento feminino envolve e muito a visibilidade de diferentes tipos de mulheres, em distintos contextos. A mulher do campo está inserida em um local periférico, já que a colônia está muito afastada dos grande centros urbanos. Conversando com as ilustres Dona Zenilde e Dona Cema, percebemos a real importância e dimensão da realidade das mulheres camponesas. Já no meio urbano, há toda uma romantização sobre a colônia, e aos mesmo tempo, uma desvalorização. Muitos comentam que a vida no campo, é a melhor vida que alguém poderia levar, ignorando todo o esforço e desgaste físico que a lida na roça exige, principalmente, por parte das mulheres camponesas. A desvalorização vem dessa mesma ignorância, não se compreende que os alimentos comprados no mercado vem do trabalho puxado dos camponeses. Os homens e mulheres do campo, além de produzir seus próprios alimentos, alimentam todas as cidades do país e mundo. Por outro lado, é nítida a evolução dos conceitos e responsabilidades de homens e mulheres nes-

se meio, principalmente das mulheres. A conquista pelo plena liberdade segue firme e demandando energia, a percepção sobre suas realidades está cada vez mais nítida, como uma foto que vai se revelando ao poucos. As mulheres camponesas estão mais antenadas nas discussões sobre feminismo, e cada vez mais empoderadas. Mesmo estando longe de uma harmonia perfeita e utópica entre gêneros, essas mulheres, continuam firmes na discussão sobre e fomentação destas mudanças. A mulher camponesa, carrega em sua mente e mãos, um conhecimento interminável sobre plantas, chás, rezas e benzimentos, culinária, plantio e mitologia. Em seu sangue, corre uma força inquestionável, coragem de sobra e marcas históricas de lutas e conquistas. Ser uma mulher camponesa é antes de tudo, ser um corpo político, cheio de lembranças para contar. Entre flores e espinhos que essa vida camponesa traz, há ainda muita vida de luta e de mudanças para serem enfrentadas. Valorizemos e admiramos mais, estas mulheres de luta.

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Foto: Ana Laura Baldo

GUARDIÃS DE UM LEGADO A luta das mulheres pela preservação da cultura cabocla Escrito por Alexsandra Zanesco e Ana Laura Baldo

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Do trabalho árduo e diário, da simplicidade e da luta incansável pela preservação do meio ambiente, os caboclos construíram uma sociedade simples, que visa o amor pela terra e pela vida. No Oeste catarinense, eles chegaram de todos os lugares do Brasil, a procura de um lugar onde pudessem trabalhar e viver em paz. Como explica a doutora e mestre em antropologia, Arlene Renk, “A cultura cabocla é complexa, e é definida de forma abstrata. Diria que tem como marco histórico a colonização, momento em


que ‘sentiu na carne’ a diferença em relação ao colonizador, instante em que houve a expropriação das terras e do modo de vida para ceder espaço aos ‘novos moradores’”. Os caboclos, trabalhavam preocupados com a sua subsistência, nunca em busca de acúmulo de riquezas, apenas desejavam uma vida saudável. A professora Arlene relata seus estudos sobre o modo de vida deste povo, “De modo geral, não partilhavam dos valores e perspectivas econômicas do colonos e colonizadores. Seguiam a lógica de fazer para viver. O importante não era acumular”. Assim, os caboclos, como retrata a história, produziam seus próprios alimentos, em suas terras, dentre eles o arroz, feijão, milho e erva-mate, além disso mantinham alguns animais para uso de seus derivados e sua carne. Eles levavam a sério a partilha da amizade, se preocupavam com a “mão amiga”, já que a solidariedade sempre foi uma das principais qualidades do povo caboclo. As ações dos caboclos tiveram um contato especial e direto com a natureza, o comportamento do povo, explica como a sua cultura é essencial e fundamental para a preservação do meio ambiente. As casas dos caboclos eram construídas em morros e encostas de rios, o espaço podia ser utilizado para sua subsistência. Originado da língua tupi, o termo caboclo, é usado para designar a descendência da miscigenação dos indígenas, de origem distintas (Kaingang ou Guarani), escravos, e egressos das fazendas de Palmas, Lages e Rio Grande do Sul, com os europeus brancos. O termo caboclo, é usado com frequência para falar sobre o modo de vida, por alguns momentos, a questão racial é deixada em segundo plano. A vida e o trabalho, que nunca foram fáceis, eram de suma importância para os caboclos, eles eram responsáveis por plantar, cuidar dos animais, realizar a extração da madeira e da erva-mate. Foi difícil conseguir um pedaço de terra onde o povo pudessem se instalar e viver em comunidade. As tradições que são passadas de gerações a gerações, são uma das características mais marcantes dos caboclos. Os ensinamento desenvolvidos no trabalho, no modo de vida e na religião, são levados a sério por aqueles que cultivam os frutos desta cultura. “Nas últimas décadas, houve uma faccionalidade em relação à religião. Parte dos caboclos converteram-se ao pentecostalismo e desprezam as narrativas e crenças de outras religiões, inclusive, o popular catolicismo”, como explica Arlene. No Oeste de Santa Catarina, a valorização da cultura é marcada pelos museus que contemplam as obras que relembram à cultura cabocla. Como o Museu Histórico de Pinhalzinho e o Centro de Memórias do Oeste de Santa Catarina (Ceom), que por diversas vezes abre seu espaço para exposições, que retratam esta cultura.

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Arlene Renk reforça a importância da valorização deste conhecimento deixado na região, “Creio que nas universidades e casas de memória, a cultura cabocla passou a receber um tratamento respeitoso. O Ceom publicou o ‘Inventário da Cultura Imaterial Cabocla’. Além disso, Pinhalzinho tem uma casa da memória, que fez um belo trabalho”. Outros espaços têm se mostrado disponíveis para a cultura cabocla, como explica Arlene, “Nas universidades, tem sido escritas dissertações de mestrado muito interessantes sobre os caboclos. No ambiente acadêmico há relativa visibilidade”. Ela reforça que é preciso conquistar mais visibilidade “Fora desta atmosfera acadêmica, há um silêncio. Caberia investigar a mídia local para saber qual o tempo dedicado aos cabloco, e comparar com a área concedida à cultura gaúcha”.

Preservar a cultura cabocla e os alimentos que vem dessa cultura significa, resistência. Foto: Ana Laura Baldo

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Sementes da solidariedade Originárias e produzidas com o cuidado, e dedicação da agricultura familiar, assentados da reforma agrária, quilombolas ou indígenas, as sementes crioulas, tradicionais, da paixão ou da solidariedade, são variedades desenvolvidas por comunidades agrícolas, com características bem determinadas e reconhecidas pelos respectivos produtores. Segundo o Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural (Nead), estas sementes, são passadas de geração em geração, e são preservadas em bancos de sementes que espalhados por todo o Brasil. Em meio a problemas, que podem ocorrer, os bancos de sementes trabalham como forma de garantia para os produtores rurais, pois até mesmo os melhores exemplares sofrem com problemas climáticos e epidemias agrícolas. Na possibilidade de uma safra ser prejudicada, os agricultores contam com as sementes estocadas para recuperar a sua produção. Com pensamento para o futuro, o Governo Federal compreende a importância de apoiar e fortalecer o armazenamento das sementes tradicionais. As mesmas são uma forma de auxiliar a ampliação das bases genéticas disponíveis para os agricultores. Apesar da disseminação das sementes híbridas e transgênicas, milhares de famílias do campo resistem e espalham as sementes crioulas por todos os cantos do país, com o intuito de conservar a agrobiodiversidade. Juntas, essas famílias e comunidades compartilham conhecimentos, práticas e crenças. A população do campo passou a se organizar em associações e estabeleceu redes e parceiros, como forma de solucionar suas próprias demandas. As sementes da paixão podem ser encontradas em bancos de sementes individuais, coletivos ou institucionais, que visam preservar e disseminar essas produções agrícolas, de forma adequada. Elas estão disponíveis ainda, em feiras ou eventos de troca de sementes, organizados por movimentos sociais, cooperativas da agricultura familiar e sindicatos rurais. A internet também é uma forma de adquirir essas iguarias, que estão disponíveis em sites de doação, troca ou compra de sementes.


Da colheita ao armazenamento: um ato de amor O preparo da terra é primeiro passo para produção das sementes crioulas, já que as mesmas não recebem nenhum tipo de adubo químico. O espaço precisa ser afastado da poluição e dos agrotóxicos. O melhor adubo para o solo, é o verde, como feijão de porco, amendoim forrageiro, feijão guandu e fava. Essas plantas são responsáveis por fixarem o nitrogênio na propriedade, além de cobrirem o espaço, de forma a evitar a erosão e a perda da água. A adubação pode ser complementada com resíduos de alimentos, estercos de animais e rochas moídas, como, calcário e fosfato natural. A etapa seguinte é separar as sementes boas para o plantio, dessa maneira diversos problemas no desenvolvimento da planta, são evitados. É preciso ainda, realizar o teste de germinação antes da semeadura. O teste consiste em semear diversas plantas pelo campo. Após alguns dias, contar as que germinaram de maneira normal, em seguida, dividir por quatro, para encontrar o percentual de sucesso do cultivo no solo desejado. Em meio ao desenvolvimento das plantas, é preciso evitar as pragas e doenças, sem o uso de agrotóxicos. A urina de vaca e os biofertilizantes são alternativas para os agricultores, além de mais baratos, não fazem mal para a saúde dos produtores e consumidores. A colheita, deve ser realizada assim que as plantas atingem a maturação ou o ponto de colheita. Dessa maneira, é possível encontrar as sementes sem ataque de insetos e sem danos causados pelo clima. É preciso realizar a secagem das sementes, para que possam ser armazenadas de forma correta, já que a colheita não será consumida de forma integral. O processo consiste em espalhar uma camada fina de sementes sobre uma lona ou algum plástico, que permita a circulação do ar. Elas devem ficar expostas ao calor, evitando o período de sol mais quente e o sereno, pois pode diminuir a germinação. Para evitar o superaquecimento, é necessário realizar a movimentação periódica das sementes.

Na resistência de preservar a cultura cabocla, muitas das semenstes cultivadas são doadas para a população. Foto: Ana Laura Baldo

Após limpas, as sementes podem ser guardadas em vasilhames, tambores ou sacos plásticos bem fechados. Os recipientes devem ser armazenados em um local coberto e fresco. As plantas que foram colhidas para o próximo plantio devem ser armazenadas em frascos separados. As embalagens devem ser identificados com a data de colheita e o nome da planta. Para conservar as sementes por mais tempo, não é necessário o uso de produtos químicos, pois a própria natureza fornece esses conservantes. O cal, a cera de abelha, as cinzas de madeira, a casca de laranja seca e moída, os dentes de alho, as folhas de eucalipto ou de louro, são alguns exemplos de produtos naturais, que prolongam a duração das sementes, previnem pragas e doenças, tudo isso, sem causar danos à saúde e ao meio ambiente.

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Cores, aromas e sabores que preservam Dona Rosalina Nogueira da Silva, carinhosamente chamada de Rosa, herdou de sua avó, sua mãe e suas tias, a árdua missão de resgatar e preservar o cultivo e a disseminação das sementes crioulas, além de conceder espaço a cultura cabocla pelo Oeste de Santa Catarina. Ela sempre soube que sua tarefa não seria fácil, por isso reuniu um grupo de mulheres da sua comunidade, a Linha Faxinal dos Rosa, que compartilhavam sua preocupação. São 43 anos de luta pela preservação da história das sementes crioulas, em meio a essa batalha, surgiu a Associação Pitanga Rosa. O trabalho do grupo é reconhecido legalmente a quatro anos, quando conquistou o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ). Fundada em 1976, a Associação Pitanga Rosa é resultado da preocupação de dona Rosa e algumas mulheres da comunidade, com a preservação, o cultivo e a conscientização das sementes crioulas. O nome foi definido junto de todas as participantes do coletivo, e é uma referência a pitanga, planta nativa da região, que é usada para fins alimentícios e medicinais. A pitanga é conectada há uma homenagem da comunidade para a dona Rosa, idealizadora da ideia.

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A iniciativa é constituída por 40 mulheres e suas famílias, com base em um trabalho voluntário e coletivo. A contrapartida, além do amplo conhecimento, consiste em receber de forma gratuita cursos, palestras, remédios fitoterápicos, mudas e sementes. Essas atividades transformaram a região Oeste em um importante campo de estudo da cultura cabocla. Os encontros ocorrem duas vezes na semana, às segundas e quintas-feira, e são destinados ao trabalho coletivo das mulheres, que envolvem o plantio, cultivo, colheita, secagem, processamento e armazenagem de sementes e plantas medicinais crioulas. O trabalho desenvolvido pela Associação Pitanga Rosa já têm frutos por todos os cantos. Todo mês, cerca de 980 pessoas visitam a Linha Faxinal dos Rosas, para conhecer e aprender junto do trabalho desenvolvido pelo coletivo, que hoje beneficia centenas de pessoas através de suas ações. Além de fazer um bem incalculável para o meio ambiente. Os encontros do coletivo acontecem em um espaço localizado na parte mais afastada da Linha Faxinal dos Rosas, longe do acúmulo da poluição e dos agrotóxicos. No local, as mulheres e suas famílias se reúnem para realizar o processamento, preparo e conservação das plantas e sementes, além de executar capacitações e formações. Para a pesquisado Arlene Renk, produzir e cultivar as sementes crioulas é um ato de resistência. “A partir da perda das sementes nativas, faz-se todo o esforço em recuperar elas, isso é um ato político merecedor de atenção”. Os produtos desenvolvido pela Pitanga Rosa são distribuídos para as voluntárias, o excedente da produção é partilhado ou comercializado, por um valor simbólico, na sede do grupo, nos encontros do Movimento das Mulheres Camponesas e em eventos culturais e comunitários. Além das sementes em natura, o grupo produz remédios homeopáticos, essências, compostos, xaropes e cápsulas fitoterápicas. Para colaborar, é preciso participar das formações oferecidas pelo grupo, adquirir os produtos desenvolvidos pelo coletivo, visitar e divulgar o trabalho desenvolvido pela Pitanga Rosa.


Sem medo de ser mulher: um movimento de resistência Dentre as organizações responsáveis pela preservação e discriminação das sementes tradicionais, o Movimento de Mulheres Camponesas se destaca. O coletivo surgiu na década de 80 no Oeste de Santa Catarina. Na resistência, às integrantes lutam pela construção de uma sociedade com equidade de direitos e pelo fim do modelo capitalista e patriarcal impostos ao longo dos séculos. Elas são responsáveis pela preservação e conservação da agrobiodiversidade por todos os cantos do país. O nome do coletivo, Movimento de Mulheres Camponesas, visa incluir as agricultoras, pescadoras, extrativistas, quilombolas, indígenas, sertanejas e caboclas. A organização é essencial para a construção de uma sociedade livre de opressão, na qual a luta pela preservação do meio ambiente é excepcional. O movimento se faz presente em lutas que visam a emancipação da mulher. Elas constituíram a organização, motivadas pela bandeira do reconhecimento e valorização das trabalhadoras rurais. Suas lutas, sempre foram voltadas pela libertação da mulher, sindicalização, documentação, direitos previdenciários (salário maternidade, aposentadoria), participação política, na busca sempre incansável pela libertação, como afirmam em seu site. Desse modo, o coletivo moldou-se e inclui outros movimentos sociais. Em 1995, foi criada a Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais, que uniu as mulheres de vários movimentos sociais, dentre eles, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Pastoral da Juventude Rural (PJR), o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), o Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STR) e o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Como diz no site do MMC, “Lutamos por uma sociedade baseada em novas relações sociais entre os seres humanos e deles com a natureza”.

O MMC se caracteriza por ser um coletivo de cunho social, feminista, democrático, que visa a liberdade da mulher de todas as formas de opressão. A luta pela vida e autonomia feminina, pela preservação do meio ambiente e também pela preservação da cultura, fazem o Movimento de Mulheres Camponesas, junto com outros coletivos feministas e ambientais, fontes de força e resistência. Como diz a frase que ganhou as redes sociais, em meio aos momentos difíceis, “Ninguém solta a mão de ninguém”.

Rapadura de farinha tiririca Ingredientes - 1 kilo de açúcar mascavo - 3 ovos - Meia colher de banha - Farinha de mandioca Modo de fazer Quebre os ovos em uma tigela, coloque o açúcar. Faz-se uma gemada, derreta a banha na panela e coloque no fogo para cozinhar a gemada, mexendo sem parar. Quando estiver fervendo coloque a farinha até dar o ponto. Despejar em uma forma. Quando estiver frio corte e sirva.

Foto: Divulgação

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REAPROVEITAMENTO DE CARCAÇAS DE GRANDE PORTE

Foto: Cristian Alflen

Impactos positivos e negativos de ter ou não tal prática Escrito por Cristian Alflen e Gabriela Busatta Desde sua colonização, o Oeste Catarinense vem crescendo nos setores da agricultura familiar até as agroindústrias. Não é surpresa para muitos que a produção que inicia nesta região tem um impacto significativo na economia do Estado e, por conseguinte, do país. Hoje, o agronegócio no Brasil é responsável por cerca de 23% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional, segundo dados disponibilizados em 2018 pela CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil). Tais números apresentam uma percepção de que a produção de suínos, bovinos e aves aumenta a cada dia em determinadas regiões. Felizmente, esse também é o cenário do Oeste de Santa Catarina.

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Mas em contrapartida, esses mesmos dados levam a indagar em cima de duas questões: toda essa produção é aproveitada? E se não é, para onde vai? Apesar de não ser do interesse de múltiplas pessoas, essas questões envolvem também o crescimento econômico do país e, principalmente, do meio ambiente. Portanto, esse trabalho foi desenvolvido no intuito de esclarecer dúvidas ligadas aos impactos positivos do reaproveitamento de carcaças de animais de grande porte e também os impactos negativos do descarte incorreto e o que isso pode afetar ao nosso derredor.

Métodos comuns de descarte das carcaças Por muitos anos os métodos mais comuns para “se livrar” de uma animal que acabou morrendo inesperadamente ou dos restos de animais depois de matá-lo para consumo é enterrar a carcaça, queimar, ou jogar no meio do mato para que os urubus e outros animais devorassem. Essa era e é a forma que vários agricultores ainda fazem por não ter um destino adequado. Na Linha São Francisco-Itá, um produtor que não quis se identificar comentou que quando morre algum animal em sua propriedade, independente do tamanho, a carcaça é jogada numa “pirambeira” perto de um de seus aviários. Já na Linha Rosina Nardi-Seara, o produtor Rodrigo Zanluchi afirma que nunca houve despejo ou enterramento de animais mortos em suas terras, pois sempre tiveram composteira. “Como nossa propriedade não é grande comparada a outras, não temos muito problema com isso”, ressalta Zanluchi. Ele salientou que não se importaria se tivesse que pagar uma pequena taxa para alguma empresa efetuar o recolhimento, pois se torna vantajoso para a empresa e para o produtor rural. Em Linha Encruzilhada Santa Cruz-Seara, na propriedade de Gilson Bordignon, a compostagem foi “inaugurada” há alguns anos. Antes disso, costumavam enterrar as carcaças ou jogá-las num barranco íngreme para que outros animais as comessem. Embora atualmente a composteira só aguente animais de porte pequeno ou médio, já amenizou bastante o problema. “Há algum tempo enterramos uma vaca grande, pois a composteira não dava conta”, lembrou Bordignon. Questionado se havia utilizado outro método, disse que não, pois embora o dano ambiental que a carcaça causa embaixo da terra, a queima ou outra forma poderia ser pior. “Esquartejar ou talhar o animal já morto e depois jogá-lo na composteira seria uma cena nada agradável”, disse Gilson em tom mais sério.

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Nas duas propriedades, o sistema de compostagem é o mesmo. Uma casinha com dois “cômodos” para as carcaças e um terceiro para depósito de serragem. Basicamente, o animal é jogado num desses cômodos com serragem a pouco mais de 30 cm de altura, a carcaça no meio e mais serragem por cima. Independentemente se estiver com fraturas expostas ou com placenta por conta de eventuais partos. A serragem decompõe a carcaça de forma a não deixar nem mesmo a ossada. Quanto ao tempo de decomposição, depende de dois fatores principais. Um deles é o tamanho do animal e o outro é a situação em que a carcaça se encontra. “Já tive que revirar, remexer e jogar ainda mais serragem quando via que o animal não decompunha”, destacou Gilson. Não chega a causar cheiro. A composteira preferencialmente fica a uma distância considerável da residência e do chiqueiro ou aviário, ou ambos.

Quem regulariza o descarte? Até o momento não existe nenhuma Lei que atende, fiscaliza ou dispõe regras aos produtores rurais em torno dos aspectos sanitários, ambientais e eco-

nômicos do destino correto das carcaças no Brasil. (sugestão de olho) O que existe em volta disso em Santa Catarina é o projeto de lei 5851/2016, de autoria do deputado federal Valdir Colatto (PMDB-SC), que fala do aproveitamento de carcaças de animais de produção e seus resíduos para transformar em produtos não comestíveis. Segundo Valdir Collato, esse projeto tem regras para o recolhimento, transporte, estocagem e processamento de animais mortos (exceto por doenças que comprometam o processamento). A intenção, conforme o deputado, é garantir a destinação correta, saneamento ambiental e saúde ao restante dos animais. Quem realmente pode se beneficiar desse projeto são os agricultores que não possuem uma forma segura de destinar as carcaças. Com esse sistema, é possível transformar as carcaças em novos produtos, como: adubos, biodiesel, produtos de higiene e limpeza. Conforme Collato, somente em Santa Catarina é estimado anualmente 300 mil toneladas de aves, suínos, equinos e bovinos mortos no meio rural, portanto, “o projeto dará mais segurança sanitária, além de amenizar os impactos ambientais e econômicos”, afirma o deputado. Composteira da propriedade de Gilson Bordignon. Foto: Cristian Alflen.

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Projeto Recolhe Segundo o projeto, eram recolhidos em torno de 170 toneladas de carcaças por semana, equivalente em média de 800 suínos e 70 bovinos.. Pode-se projetar uma média de 1 a 2 animais mortos por dia em todas as propriedades rurais. Quando iniciou o recolhimento, os produtores rurais encontraram ali a solução para a questão. Todos os produtores rurais e autoridades são unânimes quando se questiona da importância do recolhimento para a sanidade rural.

Fechamento do projeto Infelizmente, desde o início de 2019 a empresa Cbrasa de Seara que realizava esse trabalho teve que fechar as portas por prejuízos colossais causados por não ter o que fazer com o que era originado das carcaças desde que o Projeto Recolhe havia começado. A princípio, não há qualquer possibilidade da Cbrasa retornar às atividades. O assunto é de suma importância para a cadeia produtiva catarinense, pois a região e o Estado são impulsionados pela agricultura e pecuária. O presidente da Cbrasa, Leonardo Biazus, não se manifestou até o momento quanto à parte administrativa e de funcionamento da empresa, visto que os funcionários receberam férias coletivas. Houve reuniões para discutir o tema com todos os envolvidos, desde autoridades até produtores rurais. O Deputado Estadual Mauro de Nadal (MDB), autor do Projeto Recolhe ainda em 2015, é uma das lideranças que ajudaram para conseguir a instrução normativa do Ministério da Agricultura. Na última reunião, de Nadal explicou que uma empresa do Oeste do Estado se propôs a montar a estrutura necessária, mas apenas uma agroindústria teria aderido ao projeto, o que torna a atividade muito cara de ser executada. “Fizemos uma projeção para atender todo o Estado, mas falta matéria prima”, salientou o Deputado do MDB. Ele argumenta que poderá sair uma posição final de todas as agroindústrias para que os trabalhos retornem o mais rápido possível. Um novo encontro deverá ocorrer nos próximos dias para novas diretrizes e para resolver pendências para o reinício dos exercícios.

Localizada entre Seara e Itá, empresa ainda nao retornou as atividades. Foto: Jornal FolhaSete.

De acordo com o diretor da empresa responsável pelo Projeto Recolhe, Edson Argenton, sem o apoio das agroindústrias em 2018, o prejuízo girou em torno de 3 milhões de reais. “Nós precisamos de viabilidade para a operação, pois o custo do projeto é alto”, ressaltou Argenton. Ele argumentou que a participação de todos é essencial para que a atividade volte a acontecer. Já o Deputado Fabiano da Luz, do PT, enfatizou que nas reuniões foi definido que o produtor rural não irá arcar com quaisquer prejuízos da atividade, uma vez que as agroindústrias e a empresa assumiriam as despesas. O presidente da ACCS, Losivanio de Lorenzi, demonstrou grande preocupação com o fato de o recolhimento não ter retornado aos trabalhos. Um dos pontos principais citados por de Lorenzi, é de que as composteiras, onde são jogadas as carcaças na propriedade, não dão conta de aguentar tanto animal morto. Também falou sobre a questão ambiental, pois enterrar é extremamente prejudicial ao meio ambiente. Outro fator importante lembrado pelo Presidente da ACCS foi o fato de que se antes não tinha a regulamentação do Ministério da Agricultura e Pecuária e tinha a empresa, hoje é o inverso. “A não ser que uma outra empresa inicie o recolhimento, estaremos em compasso de espera”, salientou de Lorenzi. Questionado sobre novos impostos, taxas ou outras questões governamentais após a normativa, disse que nada mudará sobre a questão. O governo só receberá o imposto das exportações. “Se tivessem liberado antes, o lucro seria interessante, pois temos vários países interessados no produto oriundo das carcaças”, finaliza Losivanio.

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O Prefeito de Seara, Edemilson Canale, foi incisivo em vários pontos do tema. Comentou que os municípios ajudaram com mais de 1 milhão para a atividade. Frisou que caso a região perca esse recolhimento, é possível que ocorra uma peste suína igual ocorre na China. Salientou também que em todas as reuniões o objetivo principal era defender o produtor e a sanidade rural, visto que enterrar os animais é crime, mas não havia o que fazer. Destacou que se a atividade não retornar, é possível que haja quebra dos produtores e agroindústrias, pois o prejuízo está a nível nacional e afeta toda a cadeia produtiva. Disse também que os técnicos da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina, Cidasc, afirmaram que a farinha tem segurança sanitária e por isso não há risco e que o produto pode ser vendido sem problema algum. “Não é porque a empresa se localiza em Seara que estamos tão preocupados, mas sim com toda uma questão financeira, de sanidade e outros fatores que envolvem esse trabalho”, finaliza Canale. O produtor que não quis se identificar explicou que se o Projeto Recolhe voltasse às suas atividades não precisaria jogar os restos do animal em qualquer lugar. Já Gilson Bordignon assim como os demais produtores rurais, espera que retorne, pois quando acontece uma ou mais mortes, é melhor que alguém venha buscar as carcaças.

Riscos ambientais e sanitários do descarte incorreto Por não contar com uma legislação específica para o destino correto das carcaças, essa prática hoje no Brasil é um desafio em diversos setores da agropecuária. Infelizmente, o descarte incorreto de qualquer resíduo orgânico pode trazer danos irreparáveis, tanto do ponto de vista da saúde pública como também ambiental. Como estamos falando de resíduos orgânicos altamente putrescíveis, que emitem odores que podem incomodar as comunidades próximas, o pes-

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quisador da área de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Suínos e Aves (SC), zootecnista e agrônomo, Everton Krabbe, explicou que devemos adaptar outro método para destinar carcaças de animais de grande porte além daquilo que geralmente é o mais usado, a compostagem. Na sua visão, da mesma forma que as demandas desse setor aumentaram, é necessário requerer métodos que trabalham junto com a tecnologia com procedimentos mais eficientes e menos trabalhosos.

Everton explicou que um dos problemas de realizar o descarte de um animal de grande porte ou suas carcaças em um lugar aberto, além de afetar o solo e as águas, acaba atraindo agentes transmissores de doenças, como moscas, urubus, ratos e baratas. Tal ação além de gerar incômodo nos moradores e vizinhos, gera sérios riscos à saúde humana e também dos demais rebanhos. Além disso, esses restos se tornam uma grande fonte de contaminação para o solo, seus mananciais de água (seja de superfície ou subterrâneo) e no ar, conforme divulgação do Ministério da Agricultura e Pecuária.

Em Santa Catarina, uma boa saída para prevenir e evitar esses problemas é o Projeto Recolhe, pois além de realizar a destinação correta das carcaças, demonstrava comprometimento com o meio ambiente, pela diminuição da insalubridade e o aumento da segurança dos trabalhadores e produtores rurais e também pela prezava pela sanidade rural. Até o momento, não há possibilidade da empresa Cbrasa retornar aos trabalhos e as carcaças voltaram a ter o mesmo destino de quando ainda não vigorava o Projeto Recolhe.


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