Fotografia contemporânea amazônica: memória dos seminários 3x3 : Belém - Boa Vista - Manaus

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Memória dos Seminários 3x3 • Boa Vista • Belém • Manaus

Sávio Stoco

Orlando Maneschy

Anderson Paiva

FOTOGRAFIA CONTEMPORANEA AMAZÔNICA

Ricardo Agum

organizadores

--

Copyright © dos autores, 2016

editor • Isaac Maciel

coordenação editorial • Tenório Telles • Neiza Teixeira

direção de arte • Rômulo Nascimento

imagem da capa • bandeja para revelação fotográfica de Silvino Santos (coleção Silvino Santos, Museu Amazônico, Manaus, am)

normalização • Ycaro Verçosa

S864f Stoco, Sávio

Fotografia Contemporânea Amazônica: memória dos seminários 3x3, Boa Vista, Belém, Manaus. Organizado por Sávio Stoco; Orlando Maneschy; Anderson Paiva; Ricardo Agum Ribeiro. Manaus: Editora Valer, 2016.

128 p. isbn 978-85-7512-811-4

1. Fotografia – Amazônia I. Maneschy, Orlando (Org.)

II. Paiva, Anderson (Org.) III. Ribeiro, Ricardo Agum (Org.) IV. Título

cdd

770.09811

2. ed.

editora valer

Av. Rio Mar, 63. Nossa Senhora das Graças

Conjunto Vieiralves. 69053-180, Manaus/Amazonas.

Fone: (92) 3622 6141

AGRADECIMENTOS

Na Fundação Nacional de Arte – à comissão avaliadora do Programa Rede Nacional Funarte de Artes Visuais –11.° edição, ao acompanhamento de Izabel Costa e demais funcionários envolvidos.

No Banco da Amazônia – à comissão avaliadora do Edital de Patrocínios 2015, ao acompanhamento de Máurea Nazaré Almeida de Souza e demais funcionários envolvidos.

Em Boa Vista – à Secretaria Estadual de Cultura de Roraima, ao secretário Marcos Jorge Lima, no Palácio da Cultura Nenê Macaggi, ao assessor Manoel Vilas Boas e a todos os funcionários que nos recepcionaram e ajudaram. Aos apoios e participações do Coletivo Canoa Cultural e aos acolhedores integrantes do Fotoclube Roraima.

Em Belém – à Universidade Federal do Pará, ao Museu da ufpa, à diretora Jussara Derenji, à coordenadora Nilma Brasil e a todos os funcionários que nos recepcionaram e ajudaram. Ao apoio de Alberto Bitar, Miguel Chikaoka e da FotoAtiva.

Em Manaus – à Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Eventos (Manauscult), ao presidente Bernardo Monteiro de Paula, ao diretor Márcio Braz e a Viviane Tavares; no Museu Paço da Liberdade, ao curador Óscar Ramos, a Leonardo Novellino e Themis Cordeiro. A Cristovão Coutinho, Priscila Pinto, Raphael Alves e Sully Sampaio que gentilmente atenderam ao chamado para a Leitura

de Portifólios. Ao apoio do Núcleo de Antropologia Visual da Ufam e do Coletivo Difusão; à Selda Vale da Costa e à Michelle Andrews, respectivamente.

Ao longo do projeto agradeço aos artistas e pesquisadores que estiveram conosco nesta prazerosa e rica jornada: Alex Pazuello, Alexandre Sequeira, Anderson Paiva, Cristovão Coutinho, Luciana Magno, Mariano Klautau Filho, Orlando Maneschy, Raphael Alves, Ricardo Agum e Rodrigo Braga.

Para a publicação deste livro – ao artista gráfico Rômulo Nascimento, aos editores Neiza Teixeira, Tenório Telles e Isaac Maciel pela acolhida na Editora Valer.

A todos que colaboram com a divulgação e compareceram aos encontros. E a todos os que ainda irão se interessar por este livro.

apoio:

NAVEGAÇÃO

Ensaio fotográfico 1

Prefácio 25

/ BOA VISTA

A reconstrução da memória na vila de Lapinha da Serra

Alexandre Sequeira 30

FotoAtiva: reinventado o mundo através da fotografia

Luciana Magno 38

Um relato de como passar a pertencer a um lugar ao qual não se pertence

RodrigoBraga 48

/ BELÉM

Espaço ilhático: memória.imagens – galeria caua. Ufam. 2003/2011/2014

Cristovão Coutinho 60

Moda, publicidade e fotojornalismo

Alex Pazuello 66

Do informativo ao subjetivo

Raphael Alves 70

Da Estética do Lavrado e suas imagens in progress

Anderson Paiva 76

/ MANAUS

Processos de construção da pesquisa na Amazônia, ou breves notas sobre uma experiência compartilhada

Orlando Masnesky 84

Arte e fotografia em Belém: relato sobre o Diário Contemporâneo de Fotografia –2010/2015

Mariano Klautau Filho 94

Coleção Patrimônio imaterial: fotografia, cartão-postal e a renovação do olhar

amazonense

Sávio Stoco 108

Créditos do ensaio fotográfico 121

Dos autores 123

PREFÁCIO

A noção de fotografia contemporânea amazônica – sem a pretensão de determinarmos o momento do seu nascimento e a delimitarmos rigorosamente – de certo tem como uma de suas experiências mais estruturantes as atividades e referências geradas pelo grupo FotoAtiva, criado em Belém em 1983/84.

Foi com uma palestra sobre este tema que iniciamos o projeto Seminários 3x3: Fotografia Contemporânea Amazônica no Palácio da Cultura Nenê Macaggi em Boa Vista (rr). E este livro tem como propósito ser a memória escrita e visual do evento, realizado entre setembro/ outubro de 2015, apresentando uma parcela deste repertório integrante da fotografia brasileira atual, intercambiando saberes, por meio de artistas e pesquisadores, entre os estados de Roraima, Pará e Amazonas. Buscamos também ofertar aos públicos de cada uma das três capitais o ineditismo na escolha dos palestrantes ou nos conteúdos.

A apresentação sobre a FotoAtiva foi conduzida por Luciana Magno, baseada em sua dissertação de mestrado desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Artes da Universidade Federal do Pará. Poderíamos também observar esta palestra – e a própria realização destes seminários como um todo – pelo viés do momento em que o Norte brasileiro começa a colher frutos consistentes dos primeiros programas de pós-graduação voltados às Artes Visuais em universidades públicas –

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além, é claro, da implementação de graduações recentes, como em Roraima e Rondônia.

Complementando a programação em Boa Vista, participaram dois dos mais destacados nomes da arte contemporânea brasileira e que de maneiras distintas abordam a região e/ou nela vivem: Alexandre Sequeira e Rodrigo Braga.

A partir dai, mais experiências fotográficas puderam ser conferidas nos ciclos de palestras realizados em Belém (pa), no Museu da ufpa, e em Manaus (am), no Museu Paço da Liberdade.

Em Manaus, podemos considerar o contexto da criação fotográfica apurada. O que não faz com que o cenário deixe de se ressentir por um debate crítico mais intensificado. Assim, a programação foi acrescida de uma rica Leitura de Portifólios, aberta à comunidade, com apreciação dos curadores belenenses Mariano Klautau Filho (Unama) e Orlando Maneschy (ufpa). No momento de apresentarem suas palestras, ambos dedicaram-se à dividir suas trajetórias à frente das importantes iniciativas do Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia e da Coleção Amazoniana de Arte da ufpa, respectivamente.

Puderam ser expostas em Belém algumas das mais significativas expressões do repertório amazonense e boavistense. Um encontro aguardado por ambas as partes; público e expositores, dada a novidade destas falas naquele contexto. Estas foram proporcionadas pela ótica dos próprios fotógrafos convidados (Raphael Alves, Alex Pazuello), pelo também curador Cristovão Coutinho que marcou época à frente da Galeria da Ufam, e pela mediação de pesquisadores que buscaram em suas análises traçar um panorama ou se aprofundar em algum caso (Anderson Paiva, Sávio Stoco).

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Cientes de que as escolhas da comissão acadêmica responsável pelos seminários – formada por Orlando Maneschy, Anderson Paiva (ufrr), Ricardo Agum (Fiocruz – am) e por mim – não pretendeu ser totalitária ou unicamente valorativa, buscamos também interagir de uma forma dinâmica e instigante, embaralhando inclusive qualquer ideia unívoca de contemporaneidade. Este tipo de noção, muitas das vezes, aplicada rapidamente a partir de outros contextos, seja estrangeiro ou nacional, corre o risco de deixar de lado particularidades tão significativas que dizem respeito à visualidade de cada localidade, como pudemos ouvir e debater e poderemos agora ver e ler aqui nestas páginas.

Sávio Stoco, proponente

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www.editora valer.com 28
[]
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BV OI AS T A

A reconstrução da memória na vila de Lapinha da Serra

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Alexandre Sequeira II

Gostaria de, através de minha fala, dirigir atenções à relação cada vez mais estreita que estabelecemos com a fotografia em nossos dias. Independente do domínio em procedimentos técnicos específicos, todos nutrimos certo fascínio por imagens fotográficas. Grande parte de nosso entendimento de mundo advém dessa relação. Mas o que efetivamente buscamos nelas? Que questões se evidenciam a partir desse contato? Certamente poderíamos analisar tais questões por infinitos pontos de vista; são muitas as questões que emergem dessa relação. Gostaria de estimular em cada um dos presentes esses questionamentos tomando como referência o encontro entre três pessoas, tendo a fotografia como vetor de aproximação e o interesse particular que cada uma nutria por ela. O local do encontro é o pequeno vilarejo de Lapinha da Serra, localizado na Serra do Cipó, estado de Minas Gerais.

O encontro se deu ao longo dos anos de 2009 e 2010 e os três personagens são Rafael Oliveira de Jesus – um adolescente franzino de 13 anos de idade nativo de Lapinha da Serra; Seu José Cancio de Oliveira, com 84 anos – mais conhecido na vila como Seu Juquinha e avô de Rafael; e eu, Alexandre Sequeira, na época, aluno do curso de Mestrado de Arte e Tecnologia da ufmg. Movido pela possibilidade de conhecer novos lugares no interior do estado e, quem sabe encontrar algo que me estimulasse a desenvolver um novo trabalho artístico, percorri pequenas estradas poeirentas que serpenteiam a Serra do Cipó até alcançar a pequena vila e lá encontrar meus 2 companheiros, com quem estabeleceria uma estreita relação ao longo desses dois anos.

Em nossa primeira manhã juntos, sou surpreendido por Rafael ao manter-se por alguns minutos sobre uma pedra no topo da montanha, com o olhar perdido no ho-

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rizonte. Salto no tempo e me reencontro com o errante personagem do quadro de Caspar David Friedrich, que tantas vezes encarnei em minha infância ao folhear os livros de arte, e de quem, certamente, Rafael jamais ouvira falar. Curiosa sensação de bem-estar e conforto ao reconhecer, não na fisionomia, mas numa atitude, meu vulto interposto no gesto de alguém. Como um vertedouro que se abre repentinamente e nos surpreende, ao estender para além de nós sentimentos quase secretos, situações que, até então, acreditávamos ser somente de nosso domínio.

Movido pela satisfação daquela breve presença que se desfaz, mas que inscreve um importante dado nas páginas que registram nosso primeiro encontro, firmo com Rafael, naquele instante, silenciosamente, um pacto de companheirismo, escolhendo-o como meu novo parceiro de devaneios.

Ao se referir à sua vida no vilarejo na livre flutuação de um pensamento repleto de encantarias do imaginário infantil, meu pequeno parceiro conduz meus olhos e pensamento por dobras do real, que escondem na concretude do lugar um campo poético repleto de metáforas. Um convite a desvelar o mundo a partir de uma miríade de imagens, que se tornam tanto mais numerosas e instigantes quanto mais convivemos com elas, a ponto de ganharem uma existência própria. E assim vacilamos perdidos por tempos diferentes: o tempo real, objetivo, de quando fotografamos; e o tempo vivido, a duração subjetiva que vivemos ao fotografar. Tempo plural que reveste as coisas do mundo de uma camada de imprecisão, convertendo-as em sonhos criadores. ....

Meus momentos de prosa com Seu Juquinha eram pautados por memórias de um homem de 84 anos, privilé-

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gio ou consolo de quem se esgueira de alguma maneira para um desvão do tempo e procura amparo junto aos resíduos do passado em imagens que, de outra forma, perderiam o viço e desapareceriam gradualmente. Mas tal esforço não tinha a menor pretensão de se constituir um relato fidedigno de algo que aconteceu; antes, parte de uma permanente revisão da lembrança, presentificando o passado por caminhos tortuosos. Seu Juquinha seguia seu relato sempre devagar, cautelosamente, pela estrada da memória de um homem em busca de sua identidade. Mas nada era preciso; as referências repetiam-se, confundiam-se. Um olhar lançado na direção do tempo, em permanente deslocamento, do presente para o passado, da fugacidade do evento para sua cristalização na memória. Algo como um empenho deliberado no sentido de descansar a memória, recriando suas redes significantes. Muitas das ações (revestidas de inabaláveis valores éticos) que animavam o dia desse homem eram também pautadas pelos mesmos princípios de rememoração e ressignificação. Nosso encontro determinava um curioso ponto de cruzamento entre interesses distintos em relação à imagem: eu via em Seu Juquinha a possibilidade de aprender a agregar às minhas imagens fotográficas um valor que derivava mais da inexatidão, da interpretação, em fluxos que não seguem a trajetória da luz, mas dirigem-se a sentidos múltiplos; Seu Juquinha, por outro lado, movido pelo temor de que tempo lhe furtasse a memória de seus antepassados, via em mim e em minha prática fotográfica a possibilidade de obter o simulacro, a “cópia material fiel”. Um buscava seus objetivos pela perspectiva bergsoniana2 de uma imagem contaminada de lembranças, enquanto o outro buscava os seus na exatidão do referente que aderia à imagem pela câmara lúcida de Roland Barthes.3 ....

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Certamente, foi a curiosidade por conhecer um novo lugar, seus moradores, hábitos e costumes o que inicialmente fez com que me lançasse por caminhos desconhecidos com tão somente algumas indicações e um ponto demarcado em um mapa. Mas foi com o passar do tempo, a partir de minha permanência e dos contatos que estabeleci, que meu papel pôde ganhar contornos mais definidos.

Precisei de um tempo de convívio para perceber que as escolhas e ações de Seu Juquinha e do pequeno Rafael – ambos integrantes de uma mesma família – refletiam, em sua essência, o dilema que a vila de Lapinha da Serra ao enfrentar valores de um futuro que cada vez mais se fazia presente. Um buscava o conforto nos valores do passado, enquanto o outro, com a curiosidade de quem se lança a desvendar o mundo, dirigia suas atenções para as novidades que o futuro anunciava. O temor por um ataque alienígena, insistentemente alardeado por Rafael certamente representava uma projeção infantil das mesmas ameaças vislumbradas por Seu Juquinha com a chegada do progresso. Do mesmo modo, o respeito e importância atribuídos por Rafael às figuras do imaginário coletivo da vila, como a lendária “Mulher do pé de manga”, se apresentavam em perfeita sintonia com os valores do passado cultuados por Seu Juquinha. Questões que dizem respeito às instâncias que sustentam a diversidade de valores que regem a vida do lugar. Percebo que, a cada novo trabalho que desenvolvo, distancio-me do ato de fotografar propriamente, para através da fotografia, tratar de questões que surgem das relações que estabeleço com as pessoas ou grupos em minhas ações. É para o encontro propiciado pela fotografia que dirijo minhas atenções, para dele conceber minha prática no campo das artes. E assim, cada nova

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experiência aponta para um horizonte de novas questões que só o desenrolar da ação é capaz de elucidar.

Por dirigir o foco de minhas investigações poéticas para o campo da vivência, tenho encontrado no relato a melhor forma de apresentação de minha prática artística. Meus trabalhos têm assumido, cada vez mais, uma conformação final de espaços de narrativa, como estímulo imaginativo suficientemente capaz de, através de palavras e/ou imagens compartilhadas, conduzir o outro a um espaço de imanência – território de subjetivações capaz de recriar o momento vivido e assim potencializar outras novas vivências. Descrever um acontecimento ou um encontro é a melhor forma de prestigiá-lo, imprimindo-lhe nuances talvez ocultas no instante em que ocorreu, reforçando, assim, o privilégio de haverem existido. Mas, já que efetuar registros concretos não se constitui um hábito cotidiano, uma vez que poucas pessoas vivem a vida atentas a preservá-los, busco registrar na memória alguns momentos. Não tenho a pretensão de uma averbação do que efetivamente aconteceu, mas sim de somar personagens e fatos ao meu repertório particular, reunindo pequenos gestos, olhares e palavras numa trama alegórica, para que possa, num momento futuro como este, reconvocá-los, em diferentes graus e matizes, na crônica de minha vida. Tessitura que se faz da escolha e edição de fragmentos de momentos significativos vividos. Momentos como esses que divido com vocês aqui, e que me fazem almejar um sentido de documento capaz de acolher tantas formas de interpretação do real quantas possíveis. Documentos – sejam eles visuais ou não –, que reconheçam, por exemplo, o direito a existência de discos voadores ou da Mulher do Pé de Manga.

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notas

1. Resumo referente à Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Artes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Artes: http:// www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1 843/JSSS-8CMMP3/disserta__o_alexandre_sequeira___ entre_lapinha_da_serra_e_o_.pdf?sequence=1

2. Questões referentes a sobrevivência das imagens, a memória e o espírito, que podem ser aprofundadas na publicação Matéria e Memória, de Henri Bergson, publicada originalmente em 1939 por Presses Universitaires de France.

3. Questões referentes ao valor documental da fotografia que podem ser aprofundadas na publicação A câmara clara, de Roland Barthes, publicada originalmente em 1980 por Cahiers du Cinema/Gallimard/Seuil.

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FotoAtiva: reinventado o mundo através da fotografia

Luciana Magno II

Em Belém, um movimento amplo e único foi impulsionado em direção à fotografia, ao experimentalismo, enredando como teias viçosas os vínculos que formariam um grande casulo logo no início da década de 1980, e que se expandiria nos anos de 1990 fortificando e renovando uma geração contemporânea que explode em um fluxo vertiginoso e afeta o cenário de arte local, inscrevendo-se nacional e internacionalmente.

A história a qual iremos partilhar foi desenvolvida sobre a base vivencial, aliada ao desejo de transformação, de procura que encontrou no experimental um sopro de revolução tomando corpo no processo de seu exercício contínuo, anárquico, aberto e compartilhado: gerada no Pará em uma intensa dinâmica coletiva não-repressiva, ainda nos últimos anos da ditadura militar no Brasil, a associação FotoAtiva completou 31 anos em 2015.

O cenário borbulhava quando seu idealizador Miguel Chikaoka saiu de Registro, uma colônia japonesa no interior de São Paulo, planejando conhecer o Brasil. A itinerância teve início em 1980 em Belém, a cidade historicamente já apresentava um processo ligado ao fotográfico que remonta ao final do século xix1 e início do Século xx e desdobra-se em movimentos coletivos ligados à produção e discussão da fotografia desde a época do Foto Clube do Pará a partir dos anos de 1950.

Havia de fato na região um panorama em potencial para as provocações que estavam por vir através de ações isoladas como a coletiva Expofoto realizada em 1979 na Galeria Angelus no Theatro da Paz e exposições individuais de fotógrafos como Luiz Braga e Leila Jinkings, entre outros produtores de uma ampla gama de trabalhos autorais e fotojornalísticos. Este cenário configurava um movimento ainda pequeno, porém significativo e embrionário, de ações pessoais e também conjuntas, em

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uma escala menor comparado ao que viria a ser a fotografia contemporânea paraense nos anos posteriores às instigações da FotoAtiva.

A fotografia começava a ganhar maior visibilidade nacional com a criação do Núcleo de Fotografia da Funarte e da Galeria de Fotografia em 1979 no Rio de Janeiro sendo este o primeiro espaço expositivo no Brasil dedicado exclusivamente a esta linguagem. Em 1980 a inauguração da Galeria Fotóptica em São Paulo, do Salão Fuji de Fotografia, e a fundação da União dos Fotógrafos do Estado de São Paulo seguidos pela concepção do Instituto Nacional da Fotografia, o Infoto, pela Funarte que, entre outras atividades, promoveu os encontros nacionais de fotografia em diversas cidades do País (1982 a 1989) com o intuito de fundamentar propostas para uma política na nacional da fotografia e fomentar o desenvolvimento.

A época parecia ideal para iniciar qualquer movimento em direção à imagem, e foi neste período que Chikaoka ministrou a primeira oficina em 1981 intitulada Iniciação à Arte Fotográfica, a convite de Jeane Marie, umas das artistas da cooperativa do espaço ajir. Já dessa primeira proposta de oficina realizou um tubo de ensaio experimental que se segue de maneira continuada até os dias atuais e entrelaçou os primeiros vínculos com as pessoas que entre outras, viriam a formar o grupo FotoAtiva em 1983/1984, denominado em 82 de grupo FotOficina. Pode-se dizer que, de alguma forma, a potência FotoAtiva jáacontecia no ajir, no FotOficina, enquanto movimento coletivo de pessoas que se juntam para resignificar a vivência no plano de aspirações e desejos de interagir no mundo.

Durante os anos de 82 a 84 o Grupo FotOficina realiza diversas ações como a criação do salão sem seleção Fo-

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Lançamento do fotovaral no encerramento do FotoPará, Theatro da Paz, 1982.

acima: Espaço Fotoativa em 1985, Murilo Santos conversa sobre fotografia e sociologia. abaixo: Miguel Chokaoka fotogrado por pinhole, 1987.

toPará, concebido com o intuito de agregar as pessoas e de estimular a fotografia como objeto de pesquisa e criação aliada ao processo de desenvolvimento social e cultural. Devido ao incomodo gerado pelo horário restrito de funcionamento da Galeria Angelus, é proposto coletivamente a mostra de encerramento do FotoPará

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com um grande FotoVaral, montado na frente do Theatro da Paz, abrindo novamente o espaço para quem desejasse unir-se ao movimento.

Foi Regina Alvarez, fotógrafa, pesquisadora e difusora da técnica da fotografia artesanal no Brasil, quem ministrou em 1982 a primeira oficina em Belém de fotografia sem câmera, a fotografia pinhole. 2 A técnica desmonta o aparato fotográfico facilitando o entendimento das propriedades físicas da luz abrindo espaço para infinitas discussões e possibilitando o amadurecimento da linguagem fotográfica. A pinhole tem sido amplamente exercitada pela sua simplicidade e eficiência nas oficinas da FotoAtiva, tornando-se uma das suas principais práticas juntamente com o exercício do Fotovaral, ambos instrumentos fundamentais para os ideais implementados pela instituição, alcançando uma maior amplitude e diálogo entre si e com a comunidade.

O Fotovaral nos leva a crer que esta experiência faz sucesso, em parte, por romper, de certa forma, com o paradigma do custo alto da fotografia para exposições, possibilitando uma maior participação de todos e também uma independência dos espaços físicos expositivos que podem ser, às vezes, limitadores por diversas razões. É o exercício democrático da fotografia chegando a um número maior de pessoas, como o é, também, o exercício da fotografia “sem câmera” (pinhole), ou melhor, a fotografia feita a partir de uma câmera construída pelas próprias mãos, otimizando não somente o ato de se fazer uma imagem, mas, sobretudo o entendimento de formação desta imagem, democratizando informações e novas possibilidades de construção de imaginários.

Como um projeto aperfeiçoado da experiência do FotOficina, nasce entre 1983 e 1984, oficialmente, a FotoAtiva – o grupo, o espaço, o início do desejo de realizar pro-

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jetos conjuntos e as ações enquanto associação –, o projeto de oficinas permanentes do grupo FotOficina. Em julho de 1984 cursos permanentes de fotografia ministrados por Chikaoka começam a acontecer em diversos formatos, algo parecido com o que hoje é a oficina De Olhos Vendados. A dinâmica dos cursos funcionava, muito resumidamente, da seguinte maneira: duração de dois a três meses, 15 participantes em média por turma, encontros na FotoAtiva para práticas e trocas de informações, viagens para realização de exercícios aos arredores da cidade de Belém. Estes foram no decorrer do tempo expandidos e também aperfeiçoados, entre outras propostas de menor duração de oficinas dirigidas.

No período entre 1980 e 1990 a FotoAtiva foi um espaço aglutinador de errantes; entende-se aqui a FotoAtiva para além do local físico situado em uma cidade, mas como um espaço metafórico que se expande pela mesma, em bares, em casas, nas ruas, em praças, de segunda a segunda, em viagens e viajantes, um lugar que possibilitava encontros ricos de pluralidades individuais, experimentações colaborativas que eram exponenciadas pelo desejo-base das ações: estar juntos recriando o “real” através da fotografia.

Nos anos 2000, um redirecionamento de energia é vivenciado pela FotoAtiva que adquire a documentação final, jurídica, de Associação, passando por reformulação vivencial de direcionamento das ações. A mudança ganha mais força quando, em 2005, a FotoAtiva recebe da capital paraense a licença de uso de um casarão antigo, localizado na Praça das Mercês, número 19, sua atual sede, iniciando um período de crescimento que exige, sobretudo, preparo e profissionalização, fazendo com que a instituição, ao se expandir, diminuísse o foco experimental, tônica das duas primeiras décadas, que vem sendo retomado aos poucos.

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A fotografia como prática da liberdade é vivenciada durante ambos os períodos de maneiras distintas; se antes o processo era de extrema desconstrução, e uma quase “precariedade” de aparatos materiais, um estilo mais minimalista de aproveitamento da energia que buscava na criatividade formas de manutenção; atualmente segue-se um percurso que caminha em direção ao formal,

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acima: Oficina de camêra escura, Curitiba, 1991. abaixo: Exercícios sensoriais, 1994.

englobando um número cada vez maior de pessoas e com maiores necessidades administrativas.

A FotoAtiva engloba, para além de seu espaço físico, um ambiente de trânsito de fotógrafos e fotografias por diversos lugares da cidade, desde escolas e universidades até bares e praças. Entre as ações desencadeadas e desencadeadoras, difunde-se o ato fotográfico, promovese o encontro que, iniciado um processo de coletividade na fotografia em Belém em 1980, perpetua na atualidade os vínculos necessários para consolidar a sua base: o desejo de estar juntos “reinventando o mundo” através da fotografia.

notas

1. “Vários fotógrafos vieram à região por meio de expedições, como o alemão Albert Frisch, que viajou pelo Alto Amazonas por volta de 1865 e registrou índios brasileiros (as mais antigas fotos destes povos de que se tem notícia) e barqueiros bolivianos, bem como a flora, a fauna e a paisagem amazônicas” (maneschy, 2001, p. 17). Supõe-se que Charles Fredricks tenha sido o primeiro fotógrafo a chegar no Pará, entretanto, este não deixou registro fotográfico conhecido de sua passagem por aqui, a despeito de termos conhecimento de sua produção no Nordeste do Brasil e na Argentina. Para saber mais ver Las grandes fotografias del periodismo argentino: daguerrotipos, el nacimiento de la fotografia en la Argentina.

2. Do inglês, pin=agulha, hole=buraco, furo; buraco de agulha. Pinhole é a técnica de fotografia realizada com câmera artesanal que utiliza um pequeno furo como receptor de luz, o mesmo papel que uma lente industrializada exerce em uma câmera de fotografia convencional.

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acima: vi Semana Nacional de Fotografia. abaixo: Comemoração do aniversário de 31 anos da FotoAtiva no Largo Cultural das Mercês, 2015.

Um relato de como

passar a pertencer a um lugar ao qual não se pertence1
Rodrigo Braga II

mito imaginário através de narrativas domésticas

Um grande cocar de penas de araras vermelhas e azuis; pulseiras e tornozeleiras de fibras vegetais trançadas; diversas sementes coloridas; apitos de madeira que assobiam pássaros. Em minhas mãos, arco e flecha. Um chocalho de cabaça em punho e uma saia de palha e penas na cintura da minha irmã. Esta é uma das primeiras imagens que consigo trazer à memória da minha infância em torno de quatro anos de idade. Com essas indumentárias originários de aldeias indígenas da Amazônia, brincávamos de índios eu e Maíra. Nós dois nascemos em Manaus na década de 1970, por um desvio do acaso, enquanto nosso pai integrava a primeira turma de mestrado em Ecologia do Brasil, e nossa mãe pesquisava a flora amazônica e tinha filhos. Juntos vivemos em um dos alojamentos destinados a estudantes do Inpa – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. À época, a instituição ficava afastada do centro da cidade e tinha a mata bem próxima; de certa forma nossa casa era poeticamente limítrofe: tendo a frente voltada para a cidade e os fundos para a floresta. E essa situação muito própria rendeu grandes experiências à nossa família e histórias a contar ao longo dos anos subsequentes.

A certo momento do dia, de supetão aparecem dezenas de insetos, aracnídeos e pequenos rastejantes que, com velocidade, simplesmente passam. Tão rapidamente e na sequência, um “tapete” de formigas invade toda a casa, ganhando terreno pelo piso, móveis, objetos e, inclusive, o berço em que eu dormia. Todos recomendavam à minha mãe aflita: “Não tente tirar o menino, simplesmente feche o cortinado que elas passam!” Exatamente assim, por cima do berço passaram enquanto eu dormia. Outra vez, apavorada, minha mãe se tranca

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no banheiro comigo. Atrás de nós dois um macaco corre a fim de tomar minha mamadeira. Minha mãe grita enquanto o animal estica o braço entre a fresta da porta fechada tentando alcançar-nos.

Assim, surpreendentes e exóticas histórias se somam, como tucanos comendo à janela da cozinha, lentas e curiosas preguiças no terraço, etc. Contudo, minha memória não dá conta do passado vivido no Amazonas. Aquela imagem que tenho dos “indiozinhos” não era em Manaus, mas em Recife, para onde me mudei com apenas dois anos de idade. E em Pernambuco cresci fertilizando a imaginação com aqueles “fatos” que teria vivido tão próximo aos rituais da natureza. Nos anos que se seguem, cresce a expectativa de um dia conhecer aquele lugar ao qual eu pertencera, mas que ainda não me pertencia. Uma promessa do meu pai dizia que ao Norte voltaríamos quando eu completasse doze anos. A irregular situação financeira da família obrigou a postergação dessa viagem para os quinze anos, depois aos dezoito... até nunca se concretizar.

a arte como pretexto

As pessoas viajam para ver o que já sabem que vão encontrar 2

Mover-se em busca de experiências em outras paragens, a fim de (re)conhecer paisagens, culturas e histórias distintas, é o que motiva pessoas em deslocamento no mundo inteiro. Por outro lado, as conhecidas imagens icônicas de sítios distantes são publicadas ao redor do mundo, tornando tais lugares, monumentos e pessoas, de alguma maneira familiares. E, em busca dessas “memórias públicas” de um lugar em que nunca estiveram, seguem os ávidos turistas. Uma vez em seu destino, só dependerá do interesse individual a decisão de tão so-

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mente consumir o já esperado, ou se permitir aproximações mais intensas com cada realidade singular local. E assim vou eu, “turista” em minha própria cidade natal, após 32 anos de expectativas e construções de prováveis estereótipos, seja por relatos e fotografias da família, seja por “imagens postais” que nos chegam de várias maneiras.

No sentido de remontar uma história em parte nunca vivida, convido o meu pai para a minha primeira viagem de retorno ao Amazonas; ele que também não voltara àquelas terras havia décadas. Muitos e emocionantes reencontros se sucederam. Nos laboratórios do Inpa e salas de aula da Ufam, estranhamente o fato de os colegas de profissão dos meus pais terem me visto de fralda, parecia credenciá-los a tios legítimos. Próximo dali, para minha surpresa, a casa que me recebeu bebê, embora desgastada e servindo como sede à Associação dos Servidores do Inpa, permanece praticamente inalterada, ainda com mata chegando aos fundos. “Reconheço” o piso avermelhado, a escada de cimento, as janelas, o terraço. Meu pai aponta para um canto do quarto, e lá pude “ver” meu berço e as tais formigas. Sigo em direção ao banheiro e, mesmo três décadas depois, a porta desnivelada ainda é a mesma - de fato pela fresta de baixo seria possível passar o braço de um macaco brincalhão.

jornada à linha do horizonte

O artista não “tira” fotografias, ele “faz” fotografias 3

Provavelmente, um artista/fotógrafo viajante, a propósito de executar um trabalho, se diferencie de um turista clássico pela possibilidade de converter a habitual contemplação em ação e em imagens potencialmente

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incomuns, reveladoras, questionadoras, etc. Com vocabulários próprios e vivências imersivas, tomamos para si um território novo que se apresenta como um laboratório de inúmeros estímulos visuais e sensoriais. Para além da observação e do mero registro de passagem, nos permitimos relacionar e intervir no estado das coisas, seja com uma atitude direta, seja através de uma forma de ver e apreender, deslocando o trivial.

Foi com essa espécie de álibi de seguir vontades e fazer o que desejasse que procurei ser ativo ao longo dos meus sucessivos encontros com a Amazônia. Uma vez sozinho, permiti que minhas viagens fossem cada vez mais longas e mais distantes. Assim me lancei para muito além do Inpa, do Teatro Amazonas, do comércio da capital, e fora do encontro das águas e seus turistas. Depois de horas entre balsa e ônibus, aporto, em um dia de semana, no município de Novo Airão, às margens do rio Negro, uma porta de entrada ao arquipélago de Anavilhanas. E, quando se está sozinho e sem agenda, formulamos novas impressões sobre o tempo. Mais radicalmente, quando estamos sozinhos na linha do horizonte, passamos a nos relacionar de outra maneira com o espaço, sobretudo ao perceber o quanto somos ínfimos especialmente na magnitude amazônica.

o choque com o esperado

Sim, estava tudo lá. A vibrante luz equatorial que obriga qualquer cor a ser mais cor, o sublime por-do-sol, o riomar, o “céu-que-desaba”, as árvores-arranha-céus, as araras multicor, os botos cor-de-rosa, os peixes “pré-históricos”, os macacos de mil e uma identidades, enfim, tudo mais ou menos como o descrito e apresentado por outros, mas agora diante dos meus olhos e disponíveis ao meu corpo, sob minha interpretação. A sensação de encontro é excitante e estimula o desbravamento. Não

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houve hesitação ou espera; em poucas horas já provocara contato com pessoas, com o rio e com a mata. Alguns quilômetros percorridos a pé, tantos outros de bicicleta ou de jangada, e logo parecia que eu iria conter aqueles lugares. Então fui indo mais longe, muitas horas de viagem rio adentro em busca de novas paisagens, do que eu ainda não tivesse visto. De fato, alguns recantos distintos em beleza incomum se apresentam. Encontros esporádicos com caboclos ribeirinhos tornam esse laboratório mais vivo e trazem uma experiência mais humana à predominância natural. E assim os dias transcorrem, ou escorrem no lento tempo das águas. O que é grande torna-se imenso. O que é lento torna-se infinito. O que é espaço perde-se na imensidão.

Após algumas semanas e muitas viagens, a repetição da paisagem passa a me intrigar. Do ponto de vista do interior do rio, toda margem por entre as ilhas parece modulada no mesmo padrão. As “estradas líquidas” são inúmeras, mas praticamente só diferem na largura. Então me surge a oportunidade de embarcar junto à equipe técnica do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a partir de Manaus, em uma viagem de mapeamento e monitoramento pelo rio Negro e seus afluentes, com parada no município de Barcelos. Uma fantástica travessia de dois dias num avião monomotor anfíbio, realizando pousos estratégicos em bases flutuantes do instituto ao longo do rio. Sem dúvida as paisagens são estonteantes e cada ângulo descortina uma nova “foto/pintura”. Porém, olhar aquilo tudo de cima só reforçou a angustiante sensação abismal que tive de uma certa repetição infinita.

o momento crucial Espaço e tempo para nada, só para estar lá. Mas sei que “derivar sai mais caro”. Porque demanda mais tempo,

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demanda mais dinheiro para estar, para parar, para “nada fazer de produtivo”. Também “sai mais caro” porque atenção, percepção requer envolvimento, algo que, algumas vezes, estamos desacostumados a empenhar.

Livrar-se da encruzilhada da perplexidade foi um desafio para uma pretendida atuação artística na imponente Amazônia. Será que existe a possibilidade de qualquer ação artística não ser encapsulada por tal grandiosidade e magnitude da paisagem? Como ressignificar o lugar artisticamente em um ambiente já tão “pronto” e naturalmente poderoso de sentidos? Apropriar-se de quê exatamente, posto que infinitas são as possibilidades que se entrelaçam? Como construir esteticamente quando estamos rodeados por tão eloquentes visualidades? É possível um indivíduo sozinho pretender ser tão notável quanto a exuberante natureza que o circunda?

Bem sabemos o quanto a crise em um processo criativo é necessária. As chamadas “entressafras” criativas são inevitáveis para a maioria dos artistas e se constituem em saudáveis e valiosas pausas, que podem abrir espaço para a autocrítica e a entropia em seu fazer artístico. Às vezes é preciso parar e deixar que o mundo passe, sentir e inspirar o entorno com órgãos atentos. Mas parar torna-se mais complexo e arriscado quando se está em plena manobra, em pleno voo. Corro o risco, percorrendo noites e dias de silêncio em virgília; quando uma caderneta, um lápis, uma câmera fotográfica e um computador viram instrumentos do investigador. Aos poucos, uma coleção de imagens e palavras frescas vão se somando àquelas “memórias construídas” do passado. Oscilo entre a familiaridade e a estranheza. Observações de grandes e pequenos acontecimentos naturais aguçam a percepção, como distinguir o reluzir de diferentes temperaturas de cor solar nas nuvens e encontrar seus paralelos nas pedras e areias multicor tingidas de dife-

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rentes minérios; verificar mimeses de todos os tipos, como entre os peixes e as folhas, as raízes e os répteis, os berros de papagaios e os gritos de crianças; tudo é potência de vida e de criação.

Quando os elementos inicialmente em repouso são aquecidos em progressão, quase que de supetão, surge o ponto de ebulição. Há um momento em que um processo de criação é capaz de “mudar a chave” que converte o trivial em singular. Decodificando e movendo os signos, torcendo, criando paralelos, justaposições, adições... A ação que um artista provoca no seu meio pode modificar o lugar, como uma pequena pedra lançada em um lago, que não altera o lago, mas que em seu percurso – da superfície às profundezas - move águas e modifica seu entorno durante sua passagem.

Em dias férteis de janeiro, faço tucunarés flutuarem, aves se acumularem, peixes virarem minerais ou vegetais, troco habitats, construo esconderijos, manipulo águas e animais, em interações quase alquímicas. A prática de assumir o lugar da pequena pedra lançada ao lago demanda atenção às imensas forças nas quais nos atiramos. Sobretudo, requer também certa displicência face a elas, necessária curiosidade de quem não sabe, que encoraja e dá sentido à arte. E a flutuação entre estar atento e assumir essa displicência foi minha norteadora ao longo de meses entre 2010 e 2013, em que reinventei o lugar das minhas memórias construídas.

notas

1. Experiências vividas por Rodrigo Braga na Amazônia entre outubro de 2010 e junho de 2013, por ocasião das pesquisas e trabalhos para o Prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia 2010 e o Projeto lab verde via Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais – 9.° edição.

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2. Leonzini, Nessia. Brasil Desfocos: o olho de fora. Rio de Janeiro: Centro Cultural Banco do Brasil, 2007, p. 33.

3. phillips, Lisa. The American Century – Art & Culture 19502000. New York: Whitney Museum of American Art, 1999, p. 275.

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[]
B E L E M59

Espaço

Cristovão Coutinho II

Ufam. 2003/ 2011/2014
ilhático: memória.imagens – galeria caua.

procedimentos como artista/curador

O trabalho comentado nos Seminários 3 x 3 trata-se de um memorial em quase sua totalidade, de registros feitos por meio da fotografia sobre uma intensa programação expositiva exercida no período de 2003 a 2011, na Galeria do Centro de Artes da Universidade Federal do Amazonas, em Manaus.

No espaço de 5 x 12m, passamos a priorizar aspectosda relação curadoria de arte e artistas como possibilidades de aferir o processo de criação dos artistas do lugar, tentando manter sugestionamentos que os aproximassem dos estímulos curatoriais do sistema de arte.

A partir de 2003, com o objetivo de se formar uma expressão didática artística, iniciamos exposições de estímulo de doações para um acervo/reserva da universidade, como também coletivas e individuais locais e de outros lugares.

Em seguida, em intervalos no tempo, elaboramos e colocamos em prática o projeto Espaço Contemporâneo Ufam/Unibanco, realizado durante quatro anos. Por meio de uma convocatória de intenções e projetos, selecionávamos os participantes.

A parceria possibilitou em termos modestos, porém, conduzidos e focados no processo criativo do artista, na realização do trabalho em diálogos com a curadoria, mantendo aspectos positivos na matéria da obra, no texto e na ocupação espacial. Durante o período, fizeram parte da programação 12 exposições coletivas, com 36 artistas/propostas selecionados, assim como outras de artistas convidados e intercâmbios culturais.

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O registro das imagens do memorial construiu-se paulatinamente, sendo que, os envolvidos em captar as imagens foram e são portadores de sentimento estético e documental. Assim sendo, com os colaboradores, professores Renan, William e Sandro, ao longo dos nove anos registramos fotos.fatos, sem nos atermos a algum objetivo específico.

Com a ordenação e existência do memorial,1 identificamos as ferramentas usuais do fazer a fotografia, ou seja, documento, informação, estética, tempo e manipulação. Esse conjunto de ações pertence a esse trabalho, seja no registro expositivo, como também em muitas obras de artistas que, de maneiras diferentes, usaram a fotografia como meio para a concepção de seus trabalhos.

Nesse caminho, como agente artístico nas funções de curador e artista em uma década, além das atividades na galeria, em 2009 concluímos o projeto do livro/catálogo Extremos: relações de representações indicativos a uma curadoria (Edua), com 11 trabalhos de artistas da região norte (Grupo Urucum, Sergio Neiva, Lucia Gomes, Tadeu Lobato, Roberto Evangelista, Roosivelt Pinheiro, Silvia Feliciano, Bernadete Andrade, Naia Arruda, Turenko Beça e Armando Queiroz), em que “o hibridismo cultural de que nos fala o crítico Nestor Canclini, investido nas características do lugar, sugerindo potenciais de mudança e transformação das sensibilidades locais, às vezes amortecidas pelo hábito ou pelo tédio”, de acordo com o texto de apresentação da publicação escrito por Cristina Freire.

exposições e seminários

Em 2010, por edital da sec/am, realizei como artista o trabalho Põrõn: narrativas visuais, que consistia em des-

memorial
imagens
de
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locamento até o Alto Rio Negro, em São Gabriel da Cachoeira, com objetivo de uma vivência artística numa cidade cujo patrimônio maior é a presença indígena, territorialista, próxima de sua cultura material e linguística. Verificar na cidade o forte costume indígena de seus habitantes, como também o descaso em casa de passagem institucional, lembrando senzala e depósito de pessoas. O retorno realizado pelo rio, durante quatro dias, resultou em fotografias, desenhos, pinturas e objetos, particularizando-se como mapeamento e acervo de viagem. As séries de fotografias manipuladas Indipop e Ambar fazem parte desse itinerário.

Como artista, em 2013 a exposição Pedra–mutação: repouso e lembrança, com fotografias, vídeo e objeto/lixo, imagens de pedras na vazante do Rio Negro afirmando quietude, repouso, longevidade ou cobertas por plásticos na sua utilidade como registros ou como superfície de uso para utensílios, ou seja, a pedra transformada em uma natureza criada pela presença e ação humana.

Na função curatorial, em 2013 também organizamos o Amazonas Seminário de Artes Visuais, como pressuposto de aproximação com o sistema de arte contemporâneo. Durante os meses de setembro e novembro, palestrantes como curadores, críticos e professores fizeram parte de uma programação, tendo como foco a Amazônia Território como espaço expositivo, tradição, cultura, arte, antropologia, produção local global, desconstrução e reconstrução, arte e ambiente, circuito e formatos do sistema. Participaram Araci Amaral, Bitu Cassudé, Cristiana Tejo, Alexandre Sequeira e outros mestres e doutores em arte, no total de 32 palestrantes, em 4 etapas.

Nessa continuidade de aparelharmos os artistas e produtores de Manaus de conceitos e maneiras da arte contemporânea, em 2014 construímos o segundo Se-

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minário Transterritórios, com a presença de 9 palestrantes, entre eles Luísa Duarte, Marília Panitz, Marisa Florido, Orlando Maneschy, Oriana Duarte e Cristina Freire (mac/usp). No transcorrer do evento, além dos comunicados, tivemos a experiência da sala de comunicação, para que os artistas visuais da fotografia pudessem dialogar com os curadores convidados sobre processos criativos.

compartilhar

A fotografia na Amazônia caracteriza-se na possibilidade de muitas amazônias e vários meios para seu fim, naturais, manipuladas ou construídas de outros territórios redescobertos de paisagens urbanas da metrópole e suas relações de indiferenças, do imaginário da natureza animal e vegetativa, fontes agora intermináveis de novas demarcações e territórios, por desmatamentos e rios alterados, com a síndrome do eldorado tardio e destrutivo na sua geografia e antepassados. No encontro pudemos reconhecer a produção diversa da região através do “meio” fotográfico. As alterações nos processos criativos são evidentes e importantes na dinâmica das artes visuais contemporâneas, pois permitem abordagens de maneiras analógicas ou digitais, conferindo outras possibilidades estéticas, temáticas e relações interlinguagens na construção de imagens.

1. O autor se refere ao dvd Exposições Galeria/Acervo Caua/ Ufam – Memorial de Artes Visuais 2003/2011, lançado em 2013 (nota dos organizadores).

nota
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Moda, publicidade e fotojornalismo1

Alex Pazuello II

Nasci em Manaus, iniciei meu trabalho na década de 80 influenciado por Cesar Oiticica e Lula Sampaio, artistas de linguagem experimental e contemporânea. Em 1990, ingressei na Faculdade da Cidade no Rio de Janeiro, formando-me em Comunicação Social com especialização em Jornalismo em 1994. Ainda nessa época, trabalhei como assistente para fotógrafos publicitários como Sérgio Nedal, Dario Zalles e Ayrton Camargo. Para mim ter sido assistente foi fundamental para mergulhar de cabeça nesse mundo que, além do prazer, paixão e amor, tem que ser empreendedor, isso é, se desejar viver disso.

Em 1995, surgiu a oportunidade de estudar na School of Visual Arts para cursar fotografia de moda e publicitária, em Nova York, onde passei morando seis anos dedicados a fotografia artística e experimental. Para me sustentar acabei trabalhando como assistente para fotógrafos publicitários e da moda. Gille Berger, Marc Selinger, Guns Butera, David LaChapelle, Adriano Fagundes e Hashi Studio. Esse último onde fui studio manager e onde me especializei em fotografia publicitária. Paralelamente, trabalhei como correspondente freelancer para os jornais O Globo, Jornal do Brasil, Folha de São Paulo, Estado de São Paulo e para revistas Caras e Isto É Gente.

Foram longos seis anos dedicados aos estudos e ao mercado internacional. Minha passagem por New York me deu também um vasto conhecimento em equipamentos, tanto na parte de iluminação, como de câmeras de vários formatos, podendo utilizar de ferramentas variadas dependendo do resultado desejado. Além disso, pude também ter contato com agencias publicitárias e ver de perto como funcionava o mercado internacional.

De volta ao Brasil, em 2001, mudei para São Paulo com a intenção de experimentar o mercado trabalhando

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como freelancer para as revistas Isto É e Offshore. Voltei para o Rio de Janeiro, em 2003, mais por gostar do estilo de vida do que por conta do mercado. Lecionei como professor substituto na Universidade Estácio de Sá. Nesse mesmo período, fiz alguns trabalhos publicitários e, em 2004, retorno em definitivo para Manaus, minha cidade de origem, onde monto a instalação fotográfica Corpos Luzentes, idealizada quando ainda morava em Nova York. Foi um trabalho totalmente experimental em que fiz uma intervenção fotográfica. Sai de trás da câmera para ficar na frente dela, num quarto escuro reproduzindo a câmera escura, onde as únicas fontes de luz eram as das minhas lanternas, quase como uma brincadeira de criança, mas com intenções bem pensadas e pré-estabelecidas.

Comecei no fotojornalismo em 2005, no jornal Amazonas Em Tempo, onde tive a oportunidade de colocar e expressar minha linguagem eclética, fruto da fotografia publicitaria e de moda, através do olhar mais abrangente e contemporâneo. Consegui unir o fotojornalismo com o olhar publicitário e compreendendo que a fotografia vai muito além da técnica. Tem haver com as experiências vividas. Ouvi alguém dizer um dia: “Não é com o que se fotografa, mas sim como se fotografa”.

O fotojornalismo acabou me rendendo um reconhecimento nacional, o 9.° Grande Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo, em 2007, com a matéria Quando as Línguas Morrem, 2 veiculada pelo jornal Amazonas Em Tempo, onde retratei a luta indígena para preservar sua cultura e sua língua em São Gabriel da Cachoeira.

Atualmente, estou desenvolvendo um novo projeto, Invisíveis, no qual retrato o trabalhador portuário, os carvoeiros e carregadores que levam os alimentos para feiras. Esse projeto já se estende por oito anos, sendo

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várias vezes modificado e aperfeiçoado. Agora estou mais próximo do formato final e a ideia é que a instalação seja feita por meio de labirintos, com impressões translucidas em tamanhos originais sendo expostas em uma sala onde o publico terá uma visão sensorial dos aspectos do meu imaginário.

O que posso falar depois de 25 anos é que a fotografia está sempre se reinventando, quanto mais eu vejo, mais eu aprendo.

notas

1. Título dos organizadores.

2. A fotografia premiada intitula-se São Gabriel, a terra onde vivem os ancestrais e integra a reportagem referida pelo fotógrafo (nota dos organizadores).

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Do informativo ao subjetivo

Raphael Alves II

A fotografia surgiu para mim ainda na adolescência, como uma consequência da influência das artes. Com apenas 2 anos, pintei meu primeiro quadro. Não era uma obra de arte, mas já demonstrava o interesse que me acompanharia. O interesse por super-heróis me levou ao desenho. Na adolescência, o interesse pelo desenho passou para o interesse por grandes artistas. Nesse período, tive contato com os primeiros livros de fotografia e passei a fazer fotos em uma pequena câmera compacta.

Na decisão de qual curso seguir na universidade, optei por Jornalismo (Universidade Federal do Amazonas, 2000-2004), por ter a disciplina Fotojornalismo.

Fui repórter-fotográfico por 8 anos (tempo em que conclui duas pós-graduações –uma em Fotografia (Universidade Estadual de Londrina, 2007-2008) e uma em Artes Visuais (Senac, 2009-2010).

Deixei essa rotina para cursar o mestrado em Fotojornalismo e Fotodocumentarismo (London College of Communication – University of the Arts London, 20122014), pois queria me aprofundar nos temas que eu avaliava serem relevantes.

Quando as águas, meu projeto final desse curso, em que procuro relacionar o homem e a água em Manaus é um exemplo disso. No entanto, o trabalho ainda guarda características jornalísticas, mesmo que não de hot news: na diagramação do trabalho em forma de livro, as imagens possuem legendas (ainda que em uma lista ao final da obra), e têm o intuito de informar. A diferença é que a pauta é minha, ou seja, eu escolhi abordar o assunto sob a minha forma de percebê-lo. Mais que isso, editei a série de fotografias para criar uma narrativa à minha maneira.

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Mas existia algo mais subjetivo, mais pessoal que pedia passagem no meu trabalho. Vieram ensaios como Se essa Rua Fosse Minha, que gerou um audiovisual, e Limites Imprecisos. Ambos os trabalhos foram frutos de atividades relacionadas ao estudo no lcc. O primeiro surgiu de uma disciplina que tínhamos no mestrado, a qual foi apelidada pelo próprio corpo docente como Rethink Project, ou, como o próprio nome diz, a realização de um projeto para repensarmos nossa produção. Antes da execução do mesmo, veio-me a recordação um livro do Brassaï chamado Proust e a Fotografia, que li no período da pós-graduação em Fotografia, e no qual o autor relaciona a fotografia com a literatura produzida pelo escritor francês. O livro me levou à leitura de alguns volumes de Remembrance of Things Past, (Em Busca do Tempo Perdido, em português) do próprio Proust, em um dos quais ele diz “A verdadeira viagem de descobrimento não consiste em procurar novas paisagens, e sim em ter novos olhos”.

A partir dessa citação, decidi voltar meus olhos a um lugar por onde passei todas as vezes em que saía para a escola, na adolescência, ou quando ia para o trabalho, já adulto; ou ainda, o lugar por onde passava para atividades mais simples, como quando saía para fazer compras para casa, ou cortar o cabelo: a rua em que nasci e na qual voltei a morar depois dos 15 anos passados no Rio de Janeiro.

Limites Imprecisos foi fruto de um curso, uma verdadeira imersão fotográfica da qual participei com Ernesto Bazan (fotógrafo italiano, conhecido por sua trilogia de livros sobre Cuba, local em que viveu). Durante o curso, o objetivo era fotografar, livremente, sem tema específico para, depois, no processo de sequenciamento das imagens encontrar o thread, o fio da meada que liga as imagens. Aprendi, com esse trabalho, que as fotografias

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não são fruto apenas do momento em que disparamos o obturador da câmera, mas principalmente dos momentos em que baixamos o equipamento e vivenciamos o que nos cerca. Assim, fotografias de diferentes lugares, em épocas distintas passavam a fazer sentido entre si.

Esse trabalho foi essencial para que eu chegasse ao estágio atual da minha produção. E também Thisorder, fruto de um período que passei no Rio de Janeiro em 2015 para participar de um curso com fotógrafos da Magnum –Cristopher Anderson, Thomas Dworzak e Alex Majoli, que me orientou. No curso, poderíamos levar nosso portfólio para realizarmos edição e sequenciamento do mesmo junto aos “professores”, ou fotografar no local para o mesmo fim. Optei por fotografar, afinal, mesmo tendo vivido no Rio de Janeiro por 15 anos, nunca fotografei naquele lugar como penso hoje. Aliás, havia 11 anos desde a última vez que havia visitado o Rio.

Mas a consolidação dessa fotografia autoral –apesar de eu ainda viver de fotografias jornalísticas1 –acredito estar ocorrendo mais recentemente com Riversick. No começo deste trabalho, achei que estava fotografando Manaus. Aos poucos descobri que havia embarcado em uma viagem interna, não somente no lugar em que vivo, mas nos inúmeros lugares que vivem dentro de mim. O título do trabalho veio ao acordar numa madrugada: é um trocadilho com as palavras seasick (náusea durante trânsito sobre águas) e homesick (saudades de casa).

Nessa noite (5 de dezembro de 2014, conforme registrei no blog do meu site 2), acordei com esse pensamento. Já vinha com as palavras homesick e seasick na cabeça. E com as imagens que vinha fotografando em mente. Estranhamente, em inglês mesmo, talvez pela origem do título, anotei:

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Riversickness is a feeling. Riversickness is a disease.

It is wether a crazy love or a sudden passion that ends up in missing something really bad... But something that may not have even existed.

Riversickness is a nausea by the watercourses. It is also getting dirty water in your lungs...

It is losing a way ... Also losing yourself.

Riversickness is my personal Manaus. And I am Riversick. [Riversickness é um sentimento. Riversickness é uma doença.

É um amor louco ou uma paixão súbita que termina numa saudade profunda de algo... Mas algo que talvez nem tenha existido.

Riversickness é uma náusea à beira dos cursos d’água. É também ter os pulmões preenchidos por água suja. É perder o caminho... Também, perder a si mesmo.

Riversickness é minha Manaus “pessoal”. E eu estou com essa doença (sic)].

Acho que quis dizer que o trabalho tem sido um passeio entre a náusea causada pela diversidade desses inúmeros lugares vivos dentro de mim mesmo, e a saudade do que talvez eles sequer tenham sido.

Nessa trajetória, percebo que os meus objetivos mudaram. Se antes, eu procurava uma imagem para informar as pessoas; hoje, procuro produzir uma mensagem que não esteja totalmente fechada, pronta, mas que convide o espectador do meu trabalho a integra-se no processo.

As pessoas que conheci –ou reencontrei –ao longo desses três trabalhos também tiveram papel fundamental nesse processo, o qual considero um amadurecimento.

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O mais importante é que a cada projeto executado, tiro lições para os próximos.

Atualmente, procuro não gerar, mas causar sentido a partir das experiências sensórias que vivo ao fotografar. Esse sentido não é mais lógico ou cronológico, nem informativo. É estético, inerente, subjetivo. Transita por ícones, dispostos a serem interpretados e reinterpretados por qualquer pessoa que participe desse processo como espectador.

notas

1. Sou fotógrafo do Tribunal de Justiça do Amazonas e stringer da Agence France-Presse na região.

2. www.photoraphaelalves.com.

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Da Estética do Lavrado e suas imagens in progress

Anderson Paiva II

Imenoami, imenoami

Imenoami, imenoami

Orei ma, orei ma

Ê ikei, ikei

Muita onda

Ê ikei, ikei

É macuxi, muita onda

Os refrões acima destacados são parte de uma canção que tem por título “Eu sou Negão”, lançada pelo cantor baiano Gerônimo na década de 1980, nos primórdios do Axé Music. Eu cresci ouvindo essa música, no entanto jamais havia entendido qual o sentido destas palavras.

Em 2010, quando migrei para Boa Vista, capital de Roraima,1 pude compreender um pouco mais claramente não todas essas palavras cantadas (possivelmente em alguma das línguas indígenas do estado), mas o que pode ser o porquê desse “Muita onda”.

Para mim, trata-se se uma expressão de surpresa pela diversidade, singularidade e pelas ambiguidades de um jovem estado que porta tradições milenares com uma identidade em constante transformação, desde a herança cultural da matriz indígena à memória dos pioneiros e migrantes das diversas partes do Brasil. Não à toa, em Roraima o termo Macuxi é algo muito além do etnônimo de uma das sociedades indígenas do seu território, ele refere-se popularmente aqueles “nativos” ou nascidos no estado. Essa condição de pertencimento e reconhecimento a partir do local de origem ocorre em função da diferenciação entre roraimense (pessoas nascidas no estado mesmo sendo filhos de migrantes) e roraimados (migrantes que possuem vínculo afetivo com o estado).

O roraimense, enquanto macuxi, pertence a terra. O migrante, enquanto roraimado, se faz na terra.

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Acredito que esta questão é fundamental para tecermos nossas considerações sobre a produção de significados e a construção da visualidade roraimense presente, principalmente, na pintura e na fotografia contemporâneas, de modo a constituir o que denomino por Estética do Lavrado.

Essa estética marca-se, sobretudo, no estabelecimento da paisagem como elemento de diferenciação como uma “outra Amazônia”, ou seja, uma Amazônia singular em uma Amazônia plural. Mas não só, em seu aspecto amplo o lavrado passa a ser paisagem-personagem, como fundamento básico da produção artística contemporânea roraimense. Essa primeira dimensão da paisagem se inicia com a formação do Movimento Roraimeira, na década de 1980, como bem observado por Oliveira, Wankler e Souza (2009) ao tratar principalmente da relação entre as letras das músicas e os elementos identitários em disputa por consolidação. Contudo, essa paisagem do lavrado, descrita no primeiro período deste movimento, de 1984 a 2000, como atribuem estes autores, é ainda uma paisagem enquanto locus e ideação estetizada que se faz pela contemplação e inventariação dos seus elementos (Monte Roraima, Lago Caracaranã, Pedra Pintada e Rio Branco) em um percurso narrativo que parte da paisagem cultural de uma cidade que se percebe “linda de se ver” quando olha para o lavrado à paisagem natural símbolo do estado, como na música “Cidade do Campo”, de Eliakin Rufino.

A Estética do Lavrado não se estabelece na tradução da distinção dicotômica entre paisagem cultural (cidade) e paisagem natural (lavrado), ou seja, não se trata somente como paisagem-território. Ela se configura enquanto processo de devir e se constrói como paisagem-personagem. Podemos elencar como suas principais características no plano da visualidade: (a) o valor da aura da

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imagem em seu destaque da fauna e flora local, (b) captura do sentimento nativista, (c) ressignificação da dimensão do espaço na composição, (d) representação do elemento humano secundário a natureza, (e) construções afetivas da memória e (f) incorporação de cores fortes e contrastes. Desse modo se percebe a importância para os artistas que atuam nessa dimensão estética em dialogar com as mitopoéticas presentes nesta atmosfera cultural em que aspectos como a cor-terra e a calor-cor se evidenciam plástica e visualmente. As características que elencamos da Estética do Lavrado podem ser notadas nas práticas contemporâneas desenvolvidas nas artes visuais (Augusto Cardozo, Amazoner Okaba, Carmézia Emiliano, Jaider Esbell, Isaías Miliano), no cinema e audiovisual (Alex Pizano, Claúdio Lavôr, Thiago Briglia) e na fotografia (Jorge Macêdo, Devair Fiorotti, Adílson Brilhante). Estes são alguns exemplos. Contudo, trataremos brevemente apenas da obra destes dois últimos fotógrafos para ilustrar brevemente a noção de paisagem-personagem na fotografia artística em Roraima.

Devair Fiorotti (Itarana – es, 1971) é artista plástico, fotógrafo, professor e músico. Seu trabalho em fotografia artística apresenta um tratamento sensível da luz na diluição da paisagem na atmosfera poética da cor e da temperatura. Os contornos relevam aspectos de um lavrado ressignificado em que o amarelo suplanta a cromática natural, reconhecível, operando em domínio próprio a criar uma aura que se dissipa gradualmente entre planos de contraste ressonantes sob as serras e montanhas do estado.

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fotografia: Devair Fiorotti (Acervo do Artista). fonte: https:// youpic.com/photographer/DFiorotti/devair-fiorotti-from?flow=pic

Adílson Brilhante (Rosário do Sul – rs, 1942) é um fotógrafo incansável em experimentar novas abordagens sobre a paisagem roraimense. Suas fotografias em infravermelho capturam e traduzem a essência do lavrado depurado segundo uma lógica própria que encanta pelo estranhamento/reconhecimento dos elementos quase personificados, mas que são dessacralizados para assumir uma outra identidade enquanto paisagem.

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fotografia: Adílson Brilhante (Acervo do Artista)

A Estética do Lavrado, em seu process in progress, não é, portanto, uma noção pronta, mas antes se constitui como uma postura de se encarar a paisagem roraimense e as possibilidades singulares da sua constituição imagética pelos artistas, fotógrafos e cinegrafistas (roraimenses e roraimados) atribuindo sentido às suas vivências e subjetividades no diálogo com esse personagem natural que está presente nos campos e lavrados para aquém e além da fronteira.

Ela está inscrita no plano da visualidade e da identidade e se faz notar nas práticas artísticas e no imaginário daqueles que se dispõem a contemplá-la para além de meramente pousar os olhos no campo. Estética da apropriação e ressignificação de uma paisagem-símbolo que se faz paisagem-personagem.

referências

cauquelin, Anne. A invenção da paisagem. Lisboa: Edições 70, 2014.

oliveira, Rafael da Silva; wankler, Cátia Monteiro; souza, Carla Monteiro de. Identidade e poesia musicada: panorama do Movimento Roraimeira apartir da cidade de Boa Vista como uma das fontes de inspiração. Revista Acta Geográfica, Ano III, n. 6, 2009.

rangel, Adriana Moreno. “Cultura e identidade híbrida na obra do artista plástico roraimense José Augusto Cardozo”. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Letras. Universidade Federal de Roraima. Boa

Vista – rr, 2012. nota

1. Roraima é dos mais novos estados do Brasil, tendo sido criado através da Constituição Federal de 1988, quando passou da condição de território a estado federativo.

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[] M A N A U S

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Orlando Maneschy II

Processos de construção da pesquisa na Amazônia, ou breves notas sobre uma experiência compartilhada

Ao ser convidado para participar dos Seminários 3x3: Fotografia Contemporânea Amazônica foi me apresentada a missão de articular acerca da pesquisa sobre imagem e fotografia e minha vivência neste território. Assim, busquei relacionar o que vi, participei, e ajudei a constituir em termos de pesquisa em imagem na cidade de Belém e na região, ciente de que o que apresento aqui é apenas um pequeno recorte, dentro de um campo vastíssimo, e uma visão parcial, dentro de minha perspectiva, não intencionando, de forma alguma, estabelecer uma leitura totalizante, mas falar de um campo de experiência que me é caro.

Em Belém, um dos maiores referenciais em termos do que se entende como prática de investigação pela imagem é a FotoAtiva – mix de grupo e espaço de oficinas, que hoje se configura no formato de associação -, que nasceu na década de 1980, com a chegada do fotógrafo e agitador cultural Miguel Chikaoka, que com suas dinâmicas estimulava os interessados, por meio da fotografia a ter experiências sensoriais e visuais, a descobrir maneiras próprias de olhar e se relacionar com o mundo. Esta forma de condução empreendida por Chikaoka não só fomentou o surgimento de fotógrafos diferenciados, que constituíram olhares particulares, mas estimulou o desejo de compartilhamento, reverberando por meio de produções, projetos e grupos que nasciam e/ou dialogavam com a FotoAtiva. Assim foi com o Caixa de Pandora, grupo formado por Cláudia Leão, Flavya Mutran, Mariano Klautau Filho e eu, que desenvolveu entre 1992 e 1998 projetos expositivos coletivos, encontros, debates, dentro de um território de experimentação fotográfica. Buscávamos um campo de experimentação para uma imagem que não encontrava em Belém um lugar confortável. Alguns fotógrafos não consideravam como sendo “fotografia” o que constituíamos e alguns

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artistas plásticos diziam que aquilo não era “arte”. Isto ocorreu no início dos anos 1990, quando no Brasil a “fotografia construída”, depois chamada de “fotografia expandida” pelo pesquisador Rubens Fernandes Júnior, ainda buscava um local de afirmação, mesmo décadas e décadas depois de Duchamp afirmar: “A Fotografia morreu. Viva a Fotografia!”. Em Belém e mesmo em vários lugares no país a fotografia que jovens vinham produzindo, desenvolvendo projetos de pesquisa, ainda eram aceitas com alguma ressalva, excetuando-se projetos que abriam justamente espaço para este tipo de estudo, trazendo a questão ao centro da discussão, acerca de uma imagem que não se alinhava com a fotografia direta, como o Panoramas da Imagem, (formado por Eli Sudbrack, Everton Ballardin, José Fujocka e Rubens Mano), que, entre 1992 e 1998, organizava mostras, oficinas, debates sobre a fotografia na produção artística contemporânea. Este cenário que tanto eu como meus colegas do Caixa de Pandora vivenciamos nos estimulou a buscar respostas para nossos anseios por meio da arte da imagem e nos estimulou a mergulhar na academia, entrando em pós-graduações, no desejo de refletir sobre a produção contemporânea.

Ao voltar a Belém, por ingressar como docente da Universidade Federal do Pará (ufpa) em 2005, iniciei na instituição a pesquisa A relação da imagem nas artes visuais: mapeamento da produção imagética na arte contemporânea paraense, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (cnpq), com concessão de bolsas de iniciação científica, (o primeiro projeto a ser cadastrado na Propesp1 e a receber este tipo de fomento na área de artes na ufpa). Este projeto realizou um significativo mapeamento da produção fotográfica e videográfica paraense realizada nas últimas três décadas e teve artigos publicados em eventos de caráter

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nacional e internacional, bem como resultou no livro e exposição Sequestros: Imagem na Arte Contemporânea

Paraense, apoiado em 2007 pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (sbpc). Outra importante experiência desenvolvida na instituição trata-se do Programa de extensão processos artísticos e curatoriais contemporâneos, com o apoio da Pró-Reitoria de Extensão da ufpa, que serviu de plataforma para experimentações com discentes e docentes, propiciando práticas artísticas, curatoriais e museográficas, debates e experiências propostas por alunos, bem como gerou o seminário na forma de livro Já! Emergências contemporâneas, editado com Ana Paula Felicíssimo de Camargo Lima.2

Ao longo desse período, além da atividade pedagógica e da produção artística desenvolvida por mim, senti a necessidade de dar materialidade a reflexões acerca da produção artística que via por meio de projetos de pesquisa e curatoriais. Aspectos que se desenharam, em sua grande maioria, por meio de processos dialógicos e, em muitos casos, compartilhados, fazendo com que constituísse um percurso em que pesquisa científica, curadoria e relação dialogal com atores sociais se estabeleceram de forma amalgamada, levando-me a tomar parte de projetos significativos, como, dentre outros: Inscrições videográficas no Pará (realizado com os auspícios do Programa de Bolsas de Estímulo à Produção Crítica em Artes – Funarte, 2008), com o qual materializamos um levantamento de cerca de cinquenta obras em videoarte, sua catalogação e ordenação; Contigüidades: dos anos 1970 aos anos 2000, uma pesquisa que originou a mostra homônima, mapeando, pela primeira vez, a produção do período realizada juntamente com Marisa Mokarzel e Alexandre Sequeira; Projeto Arte Pará (2008 a 2010), maior projeto de arte da região Norte, no qual fiz curadoria realizando mostras com ar-

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tistas selecionados e convidados, o que me fez mergulhar, ao voltar a Belém, nas questões da região, suas carências, especificidades, passando a propor processos que dinamizassem o projeto e que favorecessem as proposições dos artistas por um lado, e por outros, constituísse um fluxo de contatos com os membros dos juris de seleção estabelecidos e incrementasse os processos do educativo, para que efetivamente o projeto ativasse suas funções com a sociedade; Amazônia, a arte, curadoria que ampliou e me fez aprofundar o conhecimento acerca dos artistas da região, levando a Vila Velha, no Espírito Santo e ao Palácio das Artes, em Belo Horizonte, uma mostra que revelava a produção de artistas com um olhar profundo e crítico sobre a região; e ainda Amazônia, lugar da experiência, projeto que se propunha a iniciar um acervo de artistas da região, a partir da aquisição de obras de seis autores, sendo contemplado com o Prêmio de artes Plásticas Marcantonio Vilaça / Prêmio Procultura de Estímulo às Artes Visuais 2010, o que repercutiu imensamente, devido a carência de um acervo que não apenas colecionasse obras de artistas que se propõem a pensar a região, mas de constituir, à partir destas uma dimensão de construção de debates e reflexão acerca do lugar de diferença desse artista, longe dos grandes centros culturais do país, a constituir um olhar sobre o seu universo e o que afeta esse ambiente, e da necessidade de por em discussão processos e experiências vividas na Amazônia. Com a grande receptividade obtida, formatamos o projeto para o edital de Circulação | Mediação do Instituto de Arte do Pará – iap –2012, que também foi aprovado. Assim, pudemos ampliar o raio de ação de Amazônia, Lugar da Experiência, agregando um número maior de autores no projeto, cujas obras estão depositadas no Museu da Universidade Federal do Pará, bem como constituindo site na internet,3

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realizando duas exposições, uma mostra de cinema e intervenções urbanas, bem como articulando o ciclo de Seminários Conversações, entre outubro de 2012 e fevereiro de 2013, na cidade de Belém – tudo isso em um processo de diálogo continuado com o circuito artístico, e com a agraciamento do Prêmio Conexões Artes Visuais – minc | Funarte | Petrobras, em parceria com a ufpa, pudemos realizar a organização e publicação de um significativo conteúdo crítico, bem como das obras presentes na Coleção Amazoniana de Arte, (sob nossa curadoria), na forma de livro, que lançamos e distribuímos gratuitamente a instituições e pesquisadores, estabelecendo um campo de circulação, de trocas e procedimentos voltados à coletividade.

A coleção Amazoniana de Arte da ufpa foi um veículo essencial para percebermos como um projeto pode agregar pessoas, criar plataformas de diálogo, estabelecer processos de construção transversais, envolvendo alunos, pesquisadores, artistas, que somando suas experiências podem amplificar estas relações para além do campo da Universidade, em diálogos horizontais, na comunidade e propiciar um território rico para a experiência artística. Assim, a partir daí, em 2012 e 2013 realizamos os projetos Audiovisual no Ensino Médio: videoarte paraense como conteúdo e material didático e Construções expressivas: videoarte paraense transversalizada no Ensino Médio, com o apoio do edital do Programa de Apoio a Projetos de Intervenção Metodológica (Papim) da Pró-Reitoria de Ensino de Graduação da ufpa, para pensar experiências inovadoras de ensino a partir do estudo da produção de videoarte paraense no Ensino Médio da Educação Básica, em parceria com profissionais da Escola de Aplicação da Universidade Federal do Pará. Destas ações resultou a produção de dois materiais didáticos em dvd-rom que versam sobre a produção de videoarte pa-

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raense em uma perspectiva didática e que serão distribuídos aos professores de arte da rede pública de ensino, na perspectiva de uma formação continuada. Este projeto direcionado ao ensino médio nasce no desejo de meu ex-bolsista de Iniciação Científica, Danilo Baraúna, de implementar experiências, a partir do material coletado em nossas pesquisas na Escola de Aplicação da ufpa, aonde estava como professor substituto e local onde fiz toda a minha educação. Este tipo de inter-relação revela a mim como a pesquisa, a arte e a vida podem se amalgamar e nos conduzir por caminhos que revelam-se extremamente pertinentes.

Os processos, a construção do conhecimento não se dá de forma isolada. Sempre existirão outras vozes com as quais estaremos dialogando, imagens que estaremos constituindo. Ainda, tendo a produção em videoarte como matéria, realizamos o projeto Acervo de Videoarte

Paraense: Sistematização e Análise Crítica, contemplado pelo edital de Economia Criativa do cnpq/sec/minc em 2014, desenvolvendo mapeamento, catalogação, e ordenação da produção em videoarte e video instalação do Pará, mapeamento este que hoje faz parte do ]Arquivo[, bem como mapeado no livro, que cataloga a produção desde 1989 até 2015, Pará+Video+Arte: Notas Preliminares à uma Historiografia da Videoarte no Pará, (no prelo), projeto desenvolvido junto com um antigo bolsista de iniciação científica, que se torna parceiro de trabalho, reunindo a produção catalogada, textos de autoria própria, fruto da análise, textos construídos com ex-bolsistas e textos de pesquisadores convidados. Este projeto teve grande participação de Danilo Baraúna, que convido a assinar a organização do livro comigo. Também, motivado pelo desejo de pensar os fluxos de saberes artísticos que se deram na Amazônia, decidi olhar para o passado para pensar o presente, o que me levou

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a Portugal em estágio pós-doutoral: Percursos de Lisboa a Belém do Pará –Brasil: imagem e imaginário para a compreensão da Amazônia, sendo realizado na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa.

Todos esses movimentos, bem como a liderança do grupo de pesquisa Bordas diluídas: questões da espacialidade e da visualidade na arte contemporânea –cnpq, reiteram a compreensão de que o conhecimento e seus processos não dão-se de forma unidirecional, bem como não apenas por meio de construções formais, mesmo que dentro delas nos encontremos e lancemos mão de suas qualidades, mas acreditamos que os processos ricos dão-se na inter-relação de diversos agentes, em instâncias diferenciadas que somam-se na construção de um campo.

Ao me deparar com minha trajetória, longe de estabelecer uma ego-trip, reitero valores consolidados no início de meu percurso na FotoAtiva, compreendendo que a construção do saber se dá na perspectiva da soma de distintos desejos de muitos atores que unem-se em esforços e vozes – dos artistas que doaram seus materiais, dos pesquisadores que somaram seus olhares, dos discentes, em processos de iniciação científica, que constroem junto reflexões acerca do que moveu os artistas e constitui a história da arte na Amazônia, dentro daquilo que se encontra em processo na Coleção Amazoniana de Arte da ufpa, dos desdobramentos propostos por colegas –, a partir dos materiais depositados, constituindo outras possibilidades e criando caminhos próprios, ativando um território para além dele mesmo.

Nesse sentido, creio que a possibilidade da edificação do saber se estabelece a partir dos caminhos que desenhamos e das pessoas com as quais estabelecemos vínculos. Acredito que a generosidade pode e deve ser um

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caminho na construção e no compartilhar do conhecimento e que este, se estabelece no território das trocas, acadêmicas, mas especialmente sensíveis, pois são estas as que operam verdadeiras transformações, para além dos conhecimentos técnico-científicos, mas que ampliam horizontes e ativam verdadeiras mudanças, na soma de esforços para o fluxo de conhecimentos dentro e fora da Universidade, processos nos quais, somos apenas um dos vários atores que unem esforços na instalação de um possível lugar comum para a articulação viva do pensamento.

notas

1. Pró-reitoria de pesquisa e pós-graduação (nota dos organizadores).

2. Pesquisadora em História e Artes (nota dos organizadores).

3. www.experienciamazonia.org

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Arte e fotografia em Belém: relato sobre o Diário Contemporâneo de Fotografia –2010/2015

O Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia nasceu em 2010 movido por uma iniciativa privada interessada em valorizar a produção fotográfica na cidade de Belém. O jornal O Diário do Pará manifestou a intenção de propor algo tendo como referência os modelos de concurso fotográfico onde se pauta uma classificação dividida em 1.0, 2.0 e 3.0 lugares.

A proposta do jornal chegou até mim por meio da artista Walda Marques que mediou a primeira conversa com o diretor da empresa, Camilo Centeno. Diante da produção constante de fotografia na cidade de Belém, desde os princípios da década de 1980 e do reconhecimento que a cidade havia alcançado no circuito brasileiro, propus um esboço de projeto, que pudesse desmontar o modelo antigo dos concursos e abrir-se ao contexto da arte contemporânea e ao território nacional. Nessa perspectiva, o projeto não estaria restrito ao campo delimitado da fotografia concebida tradicionalmente e tampouco à geografia do Estado do Pará. Para alargar esse debate, era preciso ampliar as potencialidades de um projeto que se utilizasse de um modelo de convocatória e/ou edital, mas que pudesse ir além dos vícios de salão de arte ou editais voltados a um campo também limitador da “produção emergente” ou do “artista jovem”. E ainda: o tema pensado para cada edição seria uma proposição para o artista e não uma ilustração, no sentido convencional da representação fotográfica. O tema seria problematizado e apresentado no texto do edital como uma proposição da curadoria.

Para isso foi apresentado um pré-projeto, cuja nomenclatura “prêmio”, abrangeria mostra com 25 artistas selecionados de todas as partes do país, exposição de artistas convidados atuantes em Belém; programação de palestras, oficinas e encontros com artistas e a parceria com uma instituição pública que abrigasse as

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atividades do projeto e contribuísse com um trabalho de ação educativa. Aprovada a proposta, o Museu da Universidade Federal do Pará 1 foi convidado a ser o parceiro institucional do projeto, batizado de Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia. A primeira edição propôs como tema Brasil Brasis e apresentou os trabalhos de Cláudia Leão e Dirceu Maués como artistas convidados, cujas poéticas transitam entre a fotografia, instalação e vídeo. Entre os 25 artistas selecionados na primeira edição estão Sofia Borges e Yukie Hori de São Paulo, José Diniz do Rio de Janeiro, Mateus Sá de Pernambuco, Alberto Bitar do Pará e Pedro Mota de Minas Gerais. Os premiados foram o paraense Octavio Cardoso, o Coletivo Parênteses de São Paulo e o carioca Paulo Wagner.2

A comissão de seleção da primeira edição foi constituída por Cláudia Leão, artista e pesquisadora, o curador Eder Chiodetto, de São Paulo e por mim, curador do projeto. A comissão realizou uma pré-seleção com aproximadamente 40 dossiês com qualidade de exibição. Para adequar-se ao espaço do museu e aos propósitos do edital, foi necessária a redução final para 25 artistas. Os trabalhos que compuseram a mostra refletiram de imediato as pretensões do projeto: a fotografia como eixo, ampliada em sua materialidade, com a presença de trabalhos em vídeo, objeto e instalação. Os prêmios, não hierárquicos, obedecem a procedimentos poéticos diversos: um dedicado às diferentes abordagens documentais; outro voltado para trabalhos experimentados em linguagens e suportes diversos, e um terceiro exclusivamente dirigido aos artistas atuantes no Pará, atendendo a uma demanda grande da produção local nessa área da imagem e da fotografia. A programação de palestras e oficinas durante o período do projeto, de fevereiro a abril de 2010, efetivou o conceito do prêmio voltado para a fotografia no contexto da arte contempo-

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(Para Takuma Nakahira) Noturnas_Yukie Hori,artista premiada, 2014 (original em cor).

(original em cor).

Derrelicao_Daniela Alves e Rafael Adorjan, artistas premiados, 2012

rânea. Oficinas de Luiz Braga, Miguel Chikaoka e Dirceu Maués e palestras de Eder Chiodetto e Patrick Pardini

fizeram parte dessa estratégia tornando o projeto um espaço para o debate e a pesquisa sobre arte e fotografia.3

a publicação do projeto

Desde o início, o Diário Contemporâneo de Fotografia incluiu em seu projeto uma publicação que pudesse avançar os limites de um catálogo de imagens. Nesse sentido, além das imagens de todos os trabalhos dos participantes das mostras, foi incorporado um conjunto de textos: ensaios, artigos críticos e entrevistas extraídas da programação de palestras e encontros com o público. Parte considerável das falas dos pesquisadores e artistas gera conteúdo para o livro, que tornou-se uma espécie de catálogo ampliado, caracterizando o perfil de uma publicação de pesquisa sobre arte e fotografia com a participação de pesquisadores do Pará e de outras regiões do Brasil. Na primeira edição, as apresentações de Eder Chiodetto, Cláudia Leão e Patrick Pardini se transformaram em ensaios, e a conversa de Dirceu Maués com o público sobre seu projeto realizado em uma residência em Berlim foi publicado na forma de entrevista. Todas as edições seguintes vêm produzindo conteúdo para suas respectivas publicações e hoje refletem um panorama de trocas entre pesquisadores, artistas, curadores de todo o Brasil. Dentre os diversos pesquisadores; na condição de palestrantes e membros das comissões de seleção, que produziram para a publicação do projeto; estão Maria Helena Bernardes e Alexandre Santos de Porto Alegre, Joaquim Marçal do Rio de Janeiro, Tadeu Chiarelli, Rubens Fernandes Junior, Heloisa Espada e Lívia Aquino de São Paulo, assim como Marisa Mokarzel, Alexandre Sequeira, Val Sampaio e Andrea Feijó, atuantes em Belém do Pará. Em 2015, tivemos ainda

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acima: Head pixel 1_serie mil palavras_Flavio Araujo,artista selecionado, 2010. abaixo: Welcome home_gui mohallem, artista selecionado, 2013 (originais em cor).

como palestrante o teórico belga, radicado na França Philippe Dubois, como a primeira participação internacional na publicação do projeto.4

o percurso das edições e as perspectivas futuras

A partir da 3.0 edição, em 2012, o projeto incorporou como parceiro institucional, além do Museu da Universidade, o Espaço Cultural Casa das Onze Janelas, museu de arte contemporânea inserido no Sistema Integrado de Museus do Estado do Pará. Com isso, a mostra dos artistas selecionados de todo o país se transferiu para o amplo espaço expositivo constituído de três salas, atendendo a um crescimento significativo da participação dos artistas inscritos e principalmente a política do projeto em expor em sua totalidade a proposta do trabalho apresentado do artista selecionado. Quando selecionado, o trabalho do artista é exibido na íntegra, conforme o dossiê apresentado.5 Trata-se de um critério estabelecido pelo projeto para evitar fragmentações e pulverizações características de mostras coletivas e salões. Busca-se não uma coletiva generalista composta de pedaços “representativos” do dossiê do artista e sim uma mostra em que a unidade e a completude do projeto do artista sejam respeitadas e consideradas.

Com a mudança para a Casa das Onze Janelas, o Museu da Universidade Federal, passou a abrigar exclusivamente a produção das exposições dos artistas convidados e mostras especiais. Tanto a individual do convidado quanto as mostras especiais dedicam-se à produção de artistas atuantes em Belém. O convidado sempre se configura na escolha de um fotógrafo com trajetória mais

longa e que permite à curadoria do projeto realizar uma exposição inédita a partir de uma pesquisa nova no acervo do artista. É o caso das exposições Solitude de

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Reflexoes II, Mateus Sa, artista selecionado, 2010 (original em cor).

Luiz Braga; Para ter onde ir de Miguel Chikaoka; Românticos de Cuba de Walda Marques; Cidade invisível de Janduari Simões e Diante das cidades de Jorane Castro, todos artistas convidados da 2.0 à 6.0 edição, entre os anos de 2011 e 2015.

Quanto às mostras especiais, elas reúnem a produção recente de artistas das mais variadas linguagens que tem a imagem como matéria principal, independente de suas idades ou trajetórias.6 O interesse primordial das mostras realizadas no Museu da universidade é trazer à tona a produção do Pará, pesquisá-la, exibi-la e fazer um diálogo com a produção brasileira, somado aos artistas paraenses selecionados formalmente pelo edital e que figuram na mostra maior constituída pelos 25 artistas do Brasil todo.

Assim, ao longo desses seis anos de atividade – o projeto se prepara para produzir a 7.0 edição para 2016 –busca-se com o Diário Contemporâneo de Fotografia construir um espaço para o debate, a pesquisa e a difusão da fotografia no campo da produção contemporânea brasileira, permitindo que Belém contribua para a reflexão artística em todas as regiões do país. A presença dos artistas de diversas partes do Brasil durante a montagem e a abertura das exposições vem aproximando as experiências regionais e colaborando na preparação das ações educativas realizadas no projeto. Ainda em fase de organização documental, o Prêmio prepara a constituição da coleção Diário Contemporâneo de Fotografia, formada ao longo do período por obras premiadas e doações de trabalhos selecionados e convidados, abrigados nos acervos das duas instituições (federal e estadual) parceiras do projeto, o Museu da Universidade e a Casa das Onze Janelas. Além da difusão e pesquisa sobre fotografia, a coleção tem o objetivo de dar consistência ao projeto como um bem público, livrando-o do risco de ser um mero evento. Sem as ins-

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tituições de arte envolvidas o projeto não poderia pertencer plenamente ao patrimônio público.

notas

1. O Museu da Universidade Federal do Pará tem sido parceiro do prêmio sob a direção da professora Jussara Derenji. A instituição vem contribuindo como aliado na construção da identidade conceitual do projeto. O prêmio tem patrocínio da Vale e apoio da empresa Sol Informática que disponibiliza os equipamentos tecnológicos para os trabalhos que usam mídias digitais e videográficas. A equipe permanente do Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia é formada por Lana Machado, coordenadora de produção; Irene Almeida e Luís Laguna, produtores e por mim, Mariano K. Filho, na curadoria geral.

2. Os artistas selecionados recebem uma ajuda de custo para realização das obras. Os três premiados recebem R$ 10.000 reais em dinheiro cada um. Nessa primeira edição ganharam destaque ainda sob o título de menção honrosa, os artistas Flávio Araújo (pa), Walda Marques (pa) e Gina Dinucci (sp). A decisão sobre a menção honrosa foi sugestão de Eder Chiodetto, participante da comissão, em face da grande quantidade de projetos de qualidade inscritos naquela oportunidade. A sugestão foi acatada pela comissão, no entanto hoje faço uma reavaliação sobre o uso de tal nomenclatura. Se por um lado, as menções honrosas tiveram a intenção de valorizar mais trabalhos selecionados, por outro, usou-se um protocolo antigo de valorização e que não condizia com o conceito do projeto. A partir dali nenhum outro membro de comissão sugeriu a utilização de nomenclatura. E do ponto de vista da curadoria, tal termo não se adequa aos propósitos do projeto.

3. A programação completa do projeto em sua primeira edição em 2010 foi constituída pelas seguintes atividades: as palestras Fotojornalismo contemporâneo – crise e reinvenção por Eder Chiodetto; Das imagens e dos esquecimen-

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Série Românticos de Cuba_Walda Marques_Artista convidada, 2013 (original em cor).

tos por Cláudia Leão; De outeiro a Berlim por Dirceu Maués; O mundo como fisionomia – retrato ou paisagem? por Patrick Pardini e Territórios da fotografia contemporânea por Mariano Klautau Filho. As oficinas realizadas foram Olhos vendados por Miguel Chikaoka; Margem da cor por Luiz Braga e Fotografia para brincar de fotografia por Dirceu Maués.

4. Os livros do Diário Contemporâneo de fotografia são distribuídos para bibliotecas de museus, universidades e instituições de arte em diversas regiões do Brasil e podem ser acessados pelo site do projeto e baixados em formato pdf.

5. Os casos que sofrem algum ajuste na edição são muito raros e acontecem quando a comissão entende que o conjunto dos trabalhos possui qualidade para se apresentar dentro do contexto temático da edição.

6. Como já dito anteriormente, o projeto recusa o uso da categoria “artista emergente”. Essa posição norteia igualmente as mostras especiais, por entender que se trata de protocolo limitador (muito utilizado em editais e projetos de arte contemporânea) da pesquisa e produção curatorial.

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Coleção

Patrimônio

imaterial: fotografia, cartão-postal e a renovação do olhar

amazonense

Sávio Stoco II

Apresento um esboço de estudo que considero no horizonte de uma História da Arte, já que pretendendo analisar e historicizar uma produção em específico, ou seja, promover um estudo de caso. É um trabalho que se inicia, pensado para a ocasião destes seminários. Será minha primeira aproximação a esta coleção de imagens e também ao universo da produção de um grupo de fotógrafos de diferentes gerações que na virada para o século xxi residiam em Manaus, sendo nascidos ou não.1 Infelizmente não localizei outros trabalhos acadêmicos ou de outros segmentos que pudessem me munir de melhor forma, portanto faço a sugestão da importância deste tema para outros colegas pesquisadores. Falaremos de artistas da fotografia que marcaram particularmente a formação do meu olhar, e acredito que de um público amplo, na atenção para com a imagem fotográfica no ambiente amazonense, muitos ainda atuantes marcando a cena atual.

Apesar de minhas pesquisas acadêmicas tanto no mestrado como a no doutorado, em andamento, se dedicarem ao universo do cineasta luso-brasileiro Silvino Santos (1886-1970), meu propósito não é seguir fugindo da significativa influência e importância dos artistas contemporâneos que me nos rodeiam – muito pelo contrário. A proposição destes seminários deixaria isso a mostra.

Escolhi me debruçar propositalmente sobre uma coleção de imagens que poderiam ser consideradas um tanto alheias ao “circuito da arte”, se mantivermos um entendimento restrito do que isso significa. Pois esta coleção não teria sido incluída em exposições de arte, nem em catálogos ou livros artísticos – meios mais reconhecidos considerando as práticas manauaras, pelo menos na época do seu lançamento. Trata-se da coleção de cartões-postais denominada Patrimônio Imaterial, editada

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pela Secretaria Estadual de Cultura do Amazonas por volta de 2003.2 Um projeto que tinha muito para se tornar uma previsível propaganda governamental aliando um órgão estadual com os cartões-postais – suporte este que se tornou para todos nós sinônimo de clichê de um lugar, de uma cidade, estado ou nação. Mas que por conta do ponto de vista de experientes ou jovens fotógrafos nos coloca uma diversidade de imagens de importância para o repertório artístico; por conta disso, penso até mesmo que poderíamos usar o termo “postais de autor”.3

Estes cartões-postais foram dispostos em bancas de revistas, vendidos como outros menos diferenciados. Hoje localizar esses cartões é uma verdadeira tarefa de pesquisador.4 Quero dizer com isso que, doze anos após seu lançamento, sumiram da maior parte dos pontos de venda no centro de Manaus. Devem figurar em álbuns de colecionadores de postais ou em gavetas de quem os recebeu quando enviados, junto a outros postais convencionais –sendo esta rica coleção de imagens fotográficas relegada ao destino pouco analisado das imagens postais. Assim, parece que prematuramente sumiram também da memória mais geral; alguns colegas do meio artístico que pude consultar preliminarmente pouco ou nada recordavam da iniciativa.

O que me parece lamentável já que as fotografias nos trazem instigantes e renovadores olhares para os lugares e práticas amazônicas, distanciando-se do que poderíamos considerar um tanto mais previsível: belas vistas dos monumentos históricos conhecidos, paisagens naturais ou convivências exóticas (cobras, botos, macacos ou pássaros apoiados em ombros humanos). Assim são até hoje os cartões-postais convencionais produzidos, indicando a permanência e força de um repertório sedimentado e sugerindo a particularidade da coleção que

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acima: Mandiocas, rio Tiquiê, am.abaixo: Cuias, rio Tiquiê, am (originais em cor). Cartões-postais a partir de fotografias de Andrea Hagge.

comentaremos, motivo também pelo qual vejo a importância de retermos estas imagens em um horizonte de uma cultura visual 5 mais amplificada. que significados apreendemos do amazonas distante ou próximo à capital a partir da coleção patrimônioimaterial?

As fotografias de Andrea Hagge nos levam a uma descoberta mais declaradamente longínqua, pois citam os rios Tiquié, um braço do Uaupés no município de São Gabriel da Cachoeira, um dos mais afastados à Noroeste de Manaus, e também festividades de Santo Antônio de Borba no rio Madeira, à Sul do estado. Captados naquele primeiro curso d’água, temos dois cartões indígenas femininos. Em formatos fotográficos aquadradados, as imagens nem mesmo se curvam à dimensão retangular tradicional da mídia postal (10 x 15cm). Na beira do rio a paisagem da floresta se destacaria, como em muitas das imagens amazônicas – isso se não fosse a comedida cena da mulher que descasca montes de macaxeiras dispostos em quatro grandes cestos. A roupa ocidentalizada e recatada da trabalhadora contrasta com a imagem da mulher indígena mais comumente imaginada e explorada na tradição iconográfica, em que a sensualidade é almejada – e o trabalho escamoteado. Fica aos observadores o destaque do duro trabalho enquadrado por Hagge a partir da compreensão da sua leitura contemporânea da tradição indígena. No segundo cartão, mais trabalho: o artesanato da pintura de cuias pinceladas com os próprios dedos. Chama a atenção mais uma vez a vestimenta, um short e uma blusa sem mangas com chinelos de borracha e cabelos com presilhas e arrematados num rabo-de-cavalo. A silhueta desta figura descrita formada pela luz que entra de fora do ambiente prepondera e só ao fundo outra paisagem mais comu-

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mente trabalhada pela tradição visual aparece desfocada: uma maloca de palha. Assim, somos aproximados destas mulheres.

Antônio Iaccovazo capta no cartão-postal nomeado de Canoas não apenas este meio de transporte, o que seria um tema amazônico mais previsível a meu ver. Mas temos, sim, como que uma “terceira margem” formada no Lago de Coari; pois embarcações diversas e multicoloridas acumulam-se compactadas. Estão sutilmente habitadas,contendo cenas de comerciantes e crianças, com roupas a secar em um dos tetos no sol ardente que rebate nas lonas plásticas azuis. Dinâmicas fotográficas sugerem a vivência efervescente nas cidades amazonenses e não a caça do tipo exótico. Ao fundo, nesta mesma imagem vemos ainda uma “quarta margem” do lago formado por uma fábrica de gelo, frigorífico, posto de gasolina e algumas casas – todos flutuantes.

Neste sentido de uma imagem que articularia fundo e primeiro-plano dialogicamente, temos também Festa na água, de Lula Sampaio.6 A comemoração a que o título se refere está ao fundo, enquadrada com espontaneidade. Movimento, conversas, danças, banho de chuveiro, homens e mulheres bronzeando-se ao sol ou protegidos pela cobertura de zinco e palha, treliças, arcos e as cores fortes da construção, dando a ver o complexo de uma arquitetura tradicional reprocessada. E mais próximo do fotógrafo, um sorridente e publicitário vendedor de óculos solares made in China, com camisa tipo “polo” para dentro da bermuda com cinto, ladeado de uma porção de mesas e cadeiras metálicas também a apresentar cada uma sua marca de bebidas que hidratam os festivos personagens.

Outra fotografia de Lula Sampaio, Equilíbrio, nos mostra, também com um enquadre flagrantemente despre-

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tensioso, um grupo de trabalhadores incomuns no clichê amazônico: produtores de redes multicoloridas, expostos ao sol no teto de um barco regional. Ao fundo, vemos novamente uma paisagem fluvial ceder lugar ao tema desta atividade mais renovada. Coisa que também vale para os barcos regionais que vemos em cena (os redeiros estão no teto de uma das embarcações) e para um grupo de pescadores que manejam suas redes mais ao fundo.

Um garoto absorto em sua atividade de escorrer seu tempo enchendo a vigésima primeira garrafa pet com tucupi, com outras tantas a lhe esperar esperar, marca a fotografia Domingo no mercado, de Carlos Navarro. Em O alquimista, do mesmo fotógrafo e no mesmo mercado municipal Adolpho Lisboa, observamos o canto privilegiado do “elixir da longa vida”: ervas, temperos e condimentos, assim como sucos dos mais diversossabores (maracujá, goiaba, tapereba, açaí, carambola, murici, acerola, abacaxi, buriti, camu-camu, caju, capuaçu, goiaba, manga, graviola), coco e gelo. Ficamos também absortos lendo as placas sortidas.

O título dá o tom e direciona o imaginário junto à imagem captada em Início do fim, do mesmo Navarro. Recobramos os seringueiros do passado nestas fotografias de utensílios feitos de latão (lamparinas, baldes e coifão) enfileirados em algum tipo de ambiente museográfico atual. Em Início do fim II, um superclose em uma pequena lamparina apagada, iluminada sim com uma luz entardecente, parece não deixar dúvidas de que “ouvimos” falar de um passado dos seringais.

Roumen Koynov capta o olhar singular do estivador que descansa do trabalho, apoiando um papagaio em seus ombros recém saído do seu trabalho e ainda com sua cabeceira e tão queimado pelo sol que sua tatuagem desaparece em seu braço. Uma cena urbana, captada na

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orla manauara, que recoloca o pássaro num local menos idílico do que outras imagens postais. Penso que o mesmo aconteceria na imagem de Iacovazzo, Menino com Jibóia, que nos traz aparentemente um clichê turístico, mas numa tão dada distância e ao invés de fazer o sensacionalismo do close nas serpentes amazônicas seguradas por nativos, mais nos dizem de uma atual prática turística em si – isso porque avistamos o jovem, o animal e sua canoa de um ponto de vista como do alto de uma embarcação mais privilegiada.

uma produção contemporânea não se conectaria com o passado das imagens do lugar do qual se pronuncia?

Um percurso rumo à historização para compreendermos esta produção em nossa época começa na observância do fato que pode ser o mais óbvio, o lançamento do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial –considerando que a coleção analisada, por conta do termo que a nomeia, tenha sido formatada institucionalmente rente a este entendimento. Ideia que no geral pode não ter entrado tão diretamente em pauta para os artistas, pois muitas das imagens e contextos de produção pesquisados possuem estímulos outros e anteriores.7

Instituído no ano 2000, o pnpi provocou mudanças importantes na forma de atuação da política cultural, trazendo a cultura popular –bens imateriais –para o campo do patrimônio, antes entendido mais focado nos edifícios e monumentos. Essa mudança de foco impacta a concepção das políticas culturais por algumas razões, sendo a primeira delas o destaque que a cultura popular ganha na agenda política, deixando de lado certa visão romântica dos folcloristas – e da arte, diga-se de passagem –de isolá-la como algo imutável.

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acima: Equilíbrio abaixo: Festa na água (originais em cor) Cartões-postais a partir de fotografias de Lula Sampaio.

As políticas públicas relacionadas com o patrimônio preocupam-se em manter preservada a visão cultural do Estado, por meio dos heróis nacionais e dos prédios históricos (algo bem mais familiar aos postais tradicionais), mas o que o novo conceito coloca em voga é a atenção voltada à cultura cotidiana das pessoas, o saber popular, os modos de fazer, as relações sociais da comunidade. É neste ponto que entendo tocar no seu geral essa coleção de postais – claro, com alguma variação entre as imagens, fotógrafos de trajetórias distintas e com imagens produzidas em diversos contextos.8

Essa dimensão está contida nas imagens da coleção delimitada. Mas haveria outro fator a se considerar na historicização que tem a ver com a materialidade desta série – por serem cartões-postais. Esta mídia em papel de intensa circulação, fácil de transportar e que a partir das duas últimas décadas do século xix se inscreve na história da cultura fotográfica de forma ampla, fazendo das cidades brasileiras partícipes.

Quando a coleção Patrimônio Imaterial é lançada em Manaus em 2003 é um período pouco posterior a um resgate importante particularmente no repertório visual amazônico. É quando se redescobre um dos principais fotógrafos e pioneiro na edição de postais na Amazônia brasileira – o fotógrafo alemão George Huebner (18621935). Primeiramente isso ocorre com a edição francesa do livro George Huebner: Um Fotógrafo em Manaus (Musée d'ethnographie de Genève, 2000), do pesquisador alemão Daniel Schoepf.9

Manaus vai se interessar por essa pesquisa a partir desta iniciativa; em 2001 o Centro Cultural Palácio Rio Negro, administrado pelo estado, recebe uma exposição baseada nesta publicação e de mesmo nome. E o mesmo órgão que edita a coleção Patrimônio imaterial, a sec,

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financia a edição do livro sobre Huebner em português em 2005. Para avaliarmos rapidamente a pertinência deste lembrete, basta dizer que Huebner marca o repertório visual da sua época com criações que atualizam ideias visuais anteriormente postas, destacando monumentos de uma capital amazonense recém-reformada, mas também de seus arredores bucólicos; diversas vistas de rios com vilas seringalistas, trabalhadores destas e algumas etnias.

Tendo esses dois fatos, o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial (2000) e a revalorização de Huebner e seus postais – alçados a uma produção de valor na tradição visual amazônica e apontados por Shoepf como rigorosas criações dos artistas Huebner e seu sócio Libânio do Amaral10 –, teríamos um contexto em que se encontra a concepção da coleção Patrimônio Imaterial. Juntar estes fios distanciados pelo tempo nos recolocam a intertextualidade e aprofundam o significado da coleção, e da produção de seus fotógrafos, no esforço de renovar o olhar direcionado a lugares e dinâmicas amazonenses pouco revelados.

notas

1. A história da fotografia amazônica nas décadas de 1980 e 1990 perpassa as mostras e as publicações Fotonorte I (1987) e Fotonorte II (1998) empreendidas pela Fundação Nacional de Arte. Da primeira edição participaram 7 nomes do Amazonas, na segunda, 9. Há ainda os livros Amazônia, Luz e reflexão (1998) e Fotografia no Brasil: um olhar das origens ao contemporâneo (2008), ambos da mesma instituição. Dentre os nomes que trabalhamos neste texto,AndreaHaggeeLulaSampaiosãoincluídosnesteslivros.

2. Este dado careceria de apuração mais certeira, pois não consta indicada nos postais, nem mesmo na catalogação da coleção nos documentos do Museu da Imagem e do Som do Amazonas, onde podem ser encontrados em Ma-

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naus. Porém sua entrada neste acervo foi no ano de 2003 gerando esta hipótese quanto ao ano da sua publicação.

3. Agradeço à apresentação deste termo pelo fotógrafo Patrick Pardini, que prestigiou a apresentação em Belém e gentilmente relatou sobre sua própria participação em um projeto de “postais de autor” no contexto belenense nos anos 1980.

4. Ao todo localizei 26 tipos diferentes dos seguintes fotógrafos: Andreia Mayumi (2), Andrea Hagge (5), Antonio Iaccovazo (4), Lula Sampaio (3), Wesley Andrade (3), Carlos Navarro (6), Roumen Koynov (3). Agradeço a Andrea e Lula pelos dados e autorização para publicação.

5. Sobre este conceito ver o texto disponível na internet Fontes visuais, cultura visual, História visual. Balanço provisório, propostas cautelares, de Ulpiano T. Bezerra de Meneses.

6. Ver no texto de Alex Pazuello neste livro uma referência a este fotógrafo.

7. É o caso das fotografias de Hagge do Tiquiê que datam de 1996-97 e fazem parte de uma iniciativa pessoal da artista de criação fotográfica.

8. Por exemplo, as duas imagens em preto e branco da jovem fotojornalista Andreia Mayumi – há anos afastada da criação fotográfica –foram feitas para a ocasião da reportagem especial para o jornal A Crítica, retrabalhadas em formato livro-reportagem e fotográfico no contexto do seu trabalho de conclusão de curso de Comunicação

Social – Jornalismo pela Ufam, intitulado O beiradão de Humaitá: retratos da solidão (2002) e republicadas em diversos meios.

9. É este autor quem argumenta sobre o pioneirismo de Huebner na edição de postais.

10. É importante também notarmos a influencia do discurso de Daniel Shoepf apresentando a trajetória de Huebner, notável na tese de doutoramento (ufrj, 2009) de Andreas Valentin.

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CRÉDITOS DO ENSAIO FOTOGRÁFICO

por páginas:

1. Sem título – exposição Pedra (São Gabriel da Cachoeira – am, 2013). Fotografia de Cristovão Coutinho;

2. Sentinela do rio (Anavilhanas – am, 2010). Fotografia de Rodrigo Braga;

3. Sem título (fotojornalismo), (Manaus – am, 2010). Fotografia de Alex Pazuello;

4. Sem título – ensaio Limites imprecisos (ba, 2013). Fotografia de Raphael Alves;

5. Sem título – exposição Invisíveis (Manaus – am, em processo). Fotografia de Alex Pazuello;

6. Sem título – exposição Pedra (São Gabriel da Cachoeira – am, 2013). Fotografia de Cristovão Coutinho;

7. Armadilha para discos voadores – série Entre Lapinha da Serra e o Mata Capim (Lapinha da Serra – mg, 2010). Fotografia de Alexandre Sequeira;

8. Campo de espera (Anavilhanas – am, 2010). Fotografia de Rodrigo Braga;

9. Sem título – exposição Corpos luzentes (Manaus – am, 2004). Fotografia de Alex Pazuello ;

10. Sem título – ensaio Quando as águas (Manaus – am, 2014). Fotografia de Raphael Alves;

11. Biólito 1 (Anavilhanas – am, 2010). Fotografia de Rodrigo Braga;

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12. Sem título – exposição Pedra (São Gabriel da Cachoeira – am, 2013). Fotografia de Cristovão Coutinho;

13. Mentira repetida (Anavilhanas – am, 2011). Frame de vídeo de Rodrigo Braga;

14. Sem título – ensaio Riversick (Manaus – am, 2014). Fotografia de Raphael Alves;

15. Cucuí – exposição Põrõn: narrativas visuais (São Gabriel da Cachoeira – am, 2011). Fotografia de Cristovão Coutinho;

16. Eu e seu Juquinha – série Entre Lapinha da Serra e o Mata Capim (Lapinha da Serra – mg, 2010). Fotografia de Alexandre Sequeira,

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DOS AUTORES

alex pazuello. Nasceu em 1969, em Manaus. Graduado em Comunicação Social com ênfase em Jornalismo pela Faculdade da Cidade no Rio de Janeiro em 1994; especialização em Fotografia Publicitária na School Visual Arts (sva) em 1996 e em Fotografia Grande Formato na International Center of Photography (icp) em 1998 em New York. Correspondente free lancer para O Globo, Jornal do Brasil e Estadão. Trabalhou para Editora Três em São Paulo em 2001. Realizou a exposição e instalação fotográfica Corpos Luzentes, em Manaus. Vencedor do Premio Aryton Senna de jornalismo na categoria fotojornalismo em 2007. Trabalhando atualmente na fotografia política e projetos e exposições.

alexandre sequeira. Nasceu em 1961, em Belém do Pará. Formado em Arquitetura pela ufpa em 1983. É professor da Faculdade de Artes Visuais da ufpa, com especialização em Semiótica e Artes Visuais. Mestrando em Arte e Tecnologia – ufmg, desenvolve trabalhos em fotografia e participou de exposições no Brasil e exterior podendo-se destacar Une Certaine Amazonie na França; Bienal Internacional de Fotografia de Liège na Bélgica; Quatro Artistas Brasileiros, em Engrame, Canadá; e do Projeto Portfólio em São Paulo.

anderson paiva. Artista visual e pesquisador. Doutorando em Arte Contemporânea pela Universidade de Coimbra e Mestre em Artes Visuais pela Universidade Federal da Bahia. E professor do Curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Roraima, pesquisador e lider do Artefacto

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Grupo de Estudos e Pesquisas em Arte e Tecnologia, Ama[z]oom – Observatorio Cultural da Amazonia e do Caribe (CNPq) e pesquisador colaborador do m-iti – Madeira Interactive Technologies Institute (Portugal). Realizou curadoria independente em projetos artísticos e colaborativos como o Vida no Mato (Brasil, 2012), Rotação das Culturas (Brasil, 2013) e Trans[acto] (Portugal, 2015) e participa de exposições no Brasil e exterior. Na área de políticas culturais integrou os grupos técnicos de avaliação de projetos culturais (2010-2012) e de elaboração do Plano Estadual de Cultura (2012- 2013), ambos pela Secult-Roraima. Atualmente explora a poética e precariedade das imagens e desenvolve pesquisas em arte e tecnologia.

cristovão coutinho batista. artista plástico e curador, nascido em Manaus, am. Especialista em Artes Plásticas e Contemporaneidade pela Universidade do Estado de Minas Gerais (uemg). Foi Curador Adjunto do Programa Rumos Visuais, do Instituto Itaú Cultural/sp –Região Norte (20012003). Participou do Catálogo Itaú Cultural com o texto "Manifesto das Indiferenças" (2003), como também da Revista Folio de Artes Visuais da Escola Guignard uemg (2004). Em Belo Horizonte, participou do Projeto AtelierProposta de um espaço de investigação e experimentação, coordenado por Laura Belém e Marco Paulo Rolla, no Centro Cultural da ufmg (setembro a novembro/2002). Participou dos Seminários "Reconstrução" e "Vida Coletiva", da 27.a Bienal de São Paulo, coordenados por Cristina Freire e Lisette Lagnado, respectivamente (2006). Participou, no Paço das Artes/SP, do Workshop "Tão sério quanto o prazer", com a curadoria da espanhola Chus Martinez (2005). Fez parte do Guia de Texto/Curador-entrevista da 27a Bienal de São Paulo (2006). Publicou o Livro/Catálogo de Artes Extremos: relações de representações indicativos a uma curadoria (2009). Realizou a exposição Põrõn – Narrativas Visuais, Casa das Artes da Secretaria de Cul-

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tura do Governo do Estado do Amazonas (2011) Professor, Coordenador e Curador da Galeria do Centro de Artes da Universidade Federal do Amazonas (2003-2012), onde desenvolveu projetos voltados para a investigação na arte contemporânea. Artista-Curador da Exposição Off Copa. Não é Futebol. Galeria Caua/Ufam (Junho/2014). Conselheiro Municipal de Política Cultural/Artes Visuais –Concultura /Prefeitura Municipal de Manaus (2013-2015).

luciana magno.Nasceu em Belém em 1987. Graduada em Artes Visuais e Tecnologia da Imagem pela Universidade da Amazônia, mestre em Artes pela Universidade Federal do Pará, Instituto de Ciência e Arte na linha de pesquisa em arte contemporânea. Desenvolve projetos de pesquisa e experimentação que exercitam fricções nos espaços da arte. Participou de exposições de arte nos estados do Pará, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e na Guiana Francesa e no Reino Unido. Em 2015 venceu o Prêmio Pipa online. Com o projeto Telefone sem fio: Chuí – Oiapoque foi vencedora do Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais 10.° edição; e com Orgânicos ganhou a Bolsa de criação e experimentação artística (performance) do Instituto de Artes do Pará.

mariano klautau filho. Atua como artista e pesquisador. Doutor em Artes Visuais pela eca/usp e Mestre em Comunicação e Semiótica pela puc/sp. Professor da Universidade da Amazônia e coordenador e curador independente em projetos como Fotografia Contemporânea Paraense –Panorama 80/90, Colóquio Fotografia e Imagem, da FotoAtiva e Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia. Participação na ix Bienal de Arte de Havana e na I Bienal do Fim do Mundo, em Ushuaia na Argentina. Possui obras nos seguintes acervos: Museu de Arte Moderna de São Paulo –mam,sp; Museu de Fotografia da Cidade de Curitiba, pr; Museu do Estado do Pará, Belém, pa; Coleção Joaquim

Paiva, Rio de Janeiro, rj e Coleção Pirelli/Masp – Museu

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de Arte de São Paulo, sp. Ganhou o Grande Prêmio (Fotografia) no Salão Arte Pará em Belém, nos anos de 2001 (fotografia) e 2007 (videoinstalação).

orlando maneschy. Curador independente, artista e pesquisador. Doutor em Comunicação e Semiótica pela pucsp, atua como docente na Universidade Federal do Pará. É curador da Coleção Amazoniana de Arte da ufpa, e entre outras realizou a curadoria do Projeto Correspondência (plataforma de circulação via arte-postal), 2003-2008; Contiguidades – dos anos 1970 aos anos 2000 (40 anos de história da arte em Belém), 2008; Contra-Pensamento Selvagem (dentro de Caos e Efeito), (com Paulo Herkenhoff, Clarissa Diniz e Cayo Honorato), 2011; Projeto Amazônia, Lugar da Experiência, 2012. Como artista tem participado de exposições e projetos no Brasil e no exterior, como Pororoca, Museu de Arte do Rio de Janeiro – mar, 2014; Encontro entre Mundos, Museu de Arte do Rio de Janeiro –mar, 2013; Rotas: desvios e outros ciclos, cdmac, Fortaleza, 2012; Entre o Verde Desconforto do Úmido, ccsp, São Paulo, 2012; Wild Nature, Alemanha, 2009; Equatorial, Cidade do México, 2009.

raphael alves. Estudou Comunicação Social na Ufam, Fotografia na Universidade Estadual de Londrina (uel) e Artes Visuais no Senac. Concluiu também o Master of Arts em Fotojornalismo e Fotografia Documental na London College of Communication / University of the Arts, em Londres. Além de colaborador da Agence France-Presse em Manaus (am), Brasil, dedica-se aos seus projetos pessoais. Premiado na 31.°edição do The Best of Journalism da Society for News Design, 2010. Também ganhou o prêmio Fiema (Feira Internacional de Tecnologia Para o Meio Ambiente) de Jornalismo Ambiental, em 2010. Em 2012, recebeu uma menção honrosa no Concurso Cultural Leica Fotografe. Em 2014, com o ensaio Limites Imprecisos foi premiado com o primeiro lugar no Leica X Photo Contest. Em 2015, recebeu

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o prêmio Fapeam de Jornalismo Científico na categoria Fotojornalismo.

rodrigo braga. Nascido em Manaus em 1976, logo mudou-se para Recife, onde graduou-se em Artes Plásticas pela ufpe (2002). Atualmente vive no Rio de Janeiro. Expõe com regularidade desde 1999 e em 2012 participou da 30.a Bienal Internacional de São Paulo. Em 2009 recebe Prêmio Marcantonio Vilaça – Funarte/MinC; em 2010 o Prêmio Marc Ferrez de Fotografia, em 2012 o Prêmio Pipa/mam-rj voto popular e em 2013 o Prêmio Masp Talento Emergente. Possui obras em acervos particulares e institucionais no Brasil e no exterior, como mam-sp,mam-rJ e Maison Européene de La Photographie, Paris.

sávio stoco. Pesquisa e realiza projetos de criação, reflexão e divulgação relacionados à arte contemporânea e história da cultura visual nos estados da Amazônia brasileira – especialmente no âmbito da fotografia e do audiovisual. Doutorando pelo Programa de Pós-graduação em Meios e Processos Audiovisuais pela eca-usp; linha de pesquisa História, Teoria e Crítica (bolsista Fapeam). Mestre em Artes Visuais pelo IA – Unicamp; linha Multimeios e Arte. Especialista em Artes Visuais: Cultura e Criação (Senac). Graduado em Comunicação Social – Jornalismo (Ufam). Integrante do Núcleo de Antropologia Visual (Navi/Ufam); em 2009 integrou a curadoria da Mostra Amazônica do Filme Etnográfico, promovida pelo Navi. Proponente do Seminários 3x3 –Fotografia Contemporânea Amazônica vencedor do Programa Rede Nacional Funarte 2014 – 11.° edição. Bolsista da Fundação Biblioteca Nacional/Funarte de Circulação Literária com o projeto Crítica do Audiovisual Brasileiro: Leituras Regionais. Integrou o Coletivo Difusão, grupo de artes integradas de Manaus com o qual desenvolveu parte de sua criação videográfica, focada na pesquisa da imagem de arquivo.

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