32 minute read
Princesa Raya: diálogos sobre empoderamento feminino na educação de meninas
EIXO 2 - GÊNERO, EDUCAÇÃO E COMUNICAÇÃO PRINCESA RAYA: DIÁLOGOS SOBRE EMPODERAMENTO FEMININO NA EDUCAÇÃO DE MENINAS
1 APRESENTAÇÃO Mirella Fernanda Nascimento
Advertisement
mirellismo@gmail.com Universidade CEUMA
A Disney é uma empresa voltada primariamente ao público infantil. Milhares de crianças são influenciadas por seus produtos todos os anos. A franquia “Princesas Disney” foi criada com o intuito de alcançar o mercado feminino dentro deste setor. Mas hoje em dia meninas e meninos assistem os filmes de princesas em todo o mundo. Raya é a última princesa criada para a franquia até então e seu filme foi o objeto de pesquisa neste trabalho. Para Breder (2013), as imagens produzem influência na cultura e na sociedade. Crianças do mundo inteiro podem internalizar discussões encontradas pela Disney e primar seus comportamentos a partir disso. Por anos crianças cresceram achando que o ideal de mulher é o ideal frágil, dócil e submissa das princesas. A empresa vem se reinventando justamente por perceber essas alterações de mercado, pois esse modelo ideal de mulher tem sido desmistificado cada vez mais na atualidade. O velho Walt Disney, foi responsável por reinventar os filmes de animação como um todo e ele personificava exatamente “o sonho americano” proposto pelo capitalismo, em que um jovem sai da pobreza e anonimato em direção à fama, dinheiro e uma empresa gigante. Ele foi o primeiro magnata do cinema a perceber o potencial que seria expandir sua empresa para outros meios de comunicação, tais como tv, livros, parques, brinquedos, etc. Assim ele dominou toda uma indústria promissora de público infantil e ainda hoje é a maior empresa do segmento (BREDER, 2013). Cada lançamento é muito bem pensado e calculado. Se observa os potenciais do mercado, as discussões sociais e os possíveis lucros. Se tratando de princesas, esse segmento produziu muito sucesso porque iniciou com adaptação de histórias conhecidas como contos de fadas, em que havia magia e grande apelo do
público. Eram histórias que já tinham dado certo dentro do capitalismo. Com o tempo passou a utilizar histórias fora dos clássicos, mas com a mesma fórmula mágica já criada anteriormente(BREDER, 2013). O filme “Raya e o último dragão” traz consigo as fórmulas mágicas sempre utilizadas pelo velho Walt Disney, mas tem um apelo étnico, é baseado em contos e lendas do sudeste asiático. A empresa trouxe essas histórias e adaptou às novas demandas de gênero encontradas no mercado, em que o público anseia por uma princesa empoderada. Ser mulher é uma construção social, as regras dos papeis de gênero são passadas de geração em geração. Para Scott (1989, p. 7) gênero é “uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado”. A partir disso, nos encaixamos em uma sociedade que construiu o ideal do feminino e que com muita luta estamos aos poucos desconstruindo. As mulheres são muito diversas e cada uma constrói o seu próprio jeito de ser mulher hoje em dia. O ideal construído de mulher foi muito representado no cinema durante o século XX. A Disney, maior empresa com um cinema voltado a crianças, não fez diferente nos seus primeiros filmes de animação sobre princesas. Então havia uma representação de uma princesa frágil, delicada, que precisava ser salva por um príncipe. Elas eram vaidosas, sensíveis, meigas, dispostas a casarem e terem filhos (ANDRADE; CUNHA, 2021, p. 5). Breder separou as princesas em três gerações: Na primeira estavam as princesas clássicas (Branca de Neve, Aurora e Ciderela); na segunda estão as princesas revolucionárias, que são Ariel, Bela, Pochontas e Mulan; já na terceira temos Tiana, Rapunzel e Merida (BREDER, 2013, p. 10). Não seria a hora de criar um quarto grupo com Elsa e Anna, Moana e Raya? Até o momento não há essa discussão em artigos científicos, mas talvez seja uma possibilidade de iniciar essa discussão por aqui. Até Merida se via a necessidade do casamento, a partir de Elsa e Anna o casamento se tornou facultativo no enredo, Moana nem menciona essa possibilidade e muito menos Raya. Nessa possível quarta geração de princesas há mulheres que têm outros interesses e que atuam como líderes de Estado tal qual elas são. Salvar o mundo é uma prioridade para elas. Se impor como empoderadas também já não é mais uma questão, pois elas não precisam de nada disso, elas já
104
nascem empoderadas, elas não precisam provar nada para ninguém. Até a terceira geração, embora as princesas sejam empoderadíssimas, elas ainda viviam em um mundo machista. Já na possível quarta geração não há um mundo machista, elas já nascem em um mundo igualitário em gênero. As tramas giram em torno de outras aventuras em um mundo que meninos e meninas podem fazer as mesmas coisas e tudo bem também. Sem qualquer dificuldade as meninas podem se ver no melhor cenário possível de um mundo sem machismo.
1.1 Justificativa
A Disney influenciou meninas em todo o mundo, mas observando que a sociedade estava mudando, é visível que a empresa foi mudando também lentamente a sua representação do que deve ser uma princesa. Desde Branca de neve (a primeira da franquia) as princesas foram se empoderando aos poucos, se tonando mais fortes e donas de seu próprio destino. O ideal de princesa de antes prezava pelo “felizes para sempre”, uma garota que estava pronta para apenas ser bonita, casar e ter filhos (ANDRADE; CUNHA, 2021, p. 10). Entretanto em Raya visualizamos a princesa mais empoderada de todas, a pessoa mais forte e mais bem treinada do filme para salvar o mundo. Entende-se que as crianças visualizando cada vez mais ideais de mulheres fortes, empoderadas e que podem ser o que quiserem influencia na educação positivamente. Acredita-se que as crianças de hoje estão muitos mais empoderadas do que as primeiras que viram as princesas mais antigas. Esse trabalho se justifica à medida que reforça pontos importantes das novas influências que as crianças têm recebido e reforça a vontade de que filmes como Raya e o último dragão possam ser cada vez mais normais no entretenimento de crianças.
2 OBJETIVOS
Esta pesquisa visa como objetivo geral discutir o empoderamento feminino da princesa Raya em Raya e o último dragão (2021), bem como perpassar por objetivos específicos tais como: observar em quais pontos o filme pode demonstrar empoderamento feminino para as crianças; elencar as principais diferenças entre Raya e as demais princesas clássicas; projetar possíveis discussões de filmes de
princesas para o futuro.
3 METODOLOGIA
Busca-se discutir um pouco acerca do avanço do empoderamento feminino na animação em longa metragem “Raya e o último dragão” (2021). Foi utilizada uma pesquisa bibliográfica qualitativa e descritiva sobre gênero e princesas, após essa fase, o filme foi assistido e analisado qualitativamente a partir do referencial teórico.
4 CONSIDERAÇÕES PARCIAIS
No início do filme de Raya e o Último Dragão (2021), a personagem com apenas 12 anos já era capaz de vencer seu próprio pai nos treinos. Ao que parece era filha única e ao seu pai não era uma questão pensar em ter um filho homem para treinar e ser guardião da joia do dragão. Se fosse em um filme há anos atrás, talvez o enredo seria sobre um pai rei descontente por não ter um filho homem para assumir o reinado, ou talvez um pai procurando um homem para casar com sua filha e manter o reinado. Dessa vez nada disso entrou no enredo, o pai simplesmente ensinou sua filha que ela era forte e capaz de proteger seu reino. Quando Raya completou 18 anos iniciou a sua jornada em busca do último dragão e os pedaços da joia. Quando ela encontra Sissu, o dragão fêmea que precisava para salvar o mundo, a sua jornada começou em busca dos fragmentos da joia. Temos aqui uma heroína forte, que luta bem a espada e uma dragão fêmea igualmente empoderada. A Sissu coube o destino de salvar o mundo há 500 anos atrás, ela tinha irmãos machos, mas foi agraciada com a missão, eles confiavam nela.
Temos aqui uma nova geração de crianças sendo educadas para serem fortes, empoderadas, aprendendo tudo isso com Raya. A personagem sequer menciona casar e em uma cena verbaliza que não quer ter filhos. Raya é a primeira princesa em longa metragem de animação da Disney que não deseja ter filhos abertamente, isso é importante para que meninas do mundo inteiro compreendam que ser mãe é uma opção hoje em dia, mas não a única para uma mulher. Desde a década de 1990 que a Disney vem investindo em etnias não europeias nos filmes de princesas. Raya representa o sudeste asiático e toda a cultura de lá de forma fantasiosa e cheia de magia. É importante que as crianças
106
possam ver representação de outras culturas, outros tipos de beleza, outros tipos de corpos. Ainda não é possível mensurar o impacto dessas discussões neste filme, pois ainda está muito recente a sua estreia, mas é possível projetar baseado em outras princesas que também foram se empoderando ao longo do tempo. Não há uma história romântica em cena, Raya tampouco é desejada por algum príncipe. O foco da história está em salvar o mundo. Se antes as princesas precisavam serem salvas, agora elas salvam o mundo. A rivalidade entre Raya e Namaari não se trata de uma rivalidade feminina como antes visto entre princesas e bruxas brigando para saber quem era a mais bonita. A rivalidade cria um novo tom nas personagens, aqui a rivalidade é de ideologias e não tem teor de querer diminuir a outra só por ser mulher. Ambas são muito fortes, valentes, guerreiras e empoderadas. Um homem não é uma questão para nenhuma das duas. Entretanto, Raya só conseguiu salvar o mundo de verdade quando se uniu com sua inimiga e juntas trabalharam para o bem maior. Desta forma, Namaari não é uma vilã e sim uma outra mulher com um projeto de governo diferente de Raya. Elas ocupam não tão somente o papel de guerreiras, como também o papel de chefes de Estado. Tecnicamente príncipes e princesas deveriam se ocupar com os assuntos do Estado, mas nas histórias mais clássicas de princesas isso não era visto nessas personagens femininas. A batalha entre Raya e Namaari é uma batalha política e ideológica, não há vilã aqui e nem a mocinha. Ao final elas juntaram forças para salvar o mundo, pois perceberam que a união era a solução para o momento. Namaari ter voltado atrás e mudado seu ponto de vista ideológico se torna interessante para influenciar as crianças dessa geração. Precisamos compreender que na vida real não existe vilã e mocinha e que a pessoas podem ter oposições políticas, mas no fim elas devem visar o bem comum. Essas pequenas questões são importantes para que as crianças possam ser educadas em ambientes empoderadores para elas, assim elas assumem seus próprios espaços e protagonismos sem ter que brigar por eles. Esse tipo de filme passa a normalizar para crianças um mundo que meninos e meninas podem fazer as mesmas coisas sem problema algum, isso é revolucionário e precisa continuar a ser fomentado.
A Disney já tem alguns personagens LGBTs em suas animações, mas ainda não há uma princesa abertamente LGBT nas animações da franquia “Princesas Disney”. Talvez essa seja a próxima barreira a ser enfrentada nos próximos lançamentos. Uma princesa lésbica talvez ainda seja algo completamente fora de possibilidade por enquanto, mas a Disney é uma empresa e como tal visa o lucro e avança nas pautas conforme a sociedade vai tornando mais aceitável cada uma delas. Por isso que é importante que continuem sendo discutidas essas pautas na sociedade, para que algum dia possamos ter uma princesa lésbica, ou bissexual, ou pansexual e quem sabe em um ponto mais adiante ainda uma princesa transexual.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Lays Christine Santos de; CUNHA, Renata Cristina da. Brave e a desconstrução da imagem de princesa da Disney. Macabéa – Revista Eletrônica do Netlli, Crato- CE, v.10, n.1, JAN-MAR, 2021. Disponível em: <http://periodicos.urca.br/ojs/index.php/MacREN/article/view/2759/pdf>. Acesso em: 13 fev. 2021. BREDER, Fernanda Cabanez. Feminismo e príncipes encantados: a representação feminina nos filmes de princesa da Disney. 74 f. 2013. Monografia (Graduação em Jornalismo) - Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro Rio de Janeiro, 2013. Disponível em: <https://pantheon.ufrj.br/bitstream/11422/4022/3/FBreder.pdf>. Acesso em: 13 fev. 2021. Raya e o Último Dragão. Direção: Don Hall, Carlos López Estrada, Paul Briggs e John Ripa. Produção: Osnat Shurer e Peter Del Vecho. Walt Disney Pictures, 2021. 117 min, cor. SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Nova Iorque: Columbia University Press, 1989.
EIXO 2 - GÊNERO, EDUCAÇÃO E COMUNICAÇÃO O FEMINISMO NOS SERTÕES DE QUIXERAMOBIM: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA DO PROJETO SEVERINAS MULHERES DO SERTÃO Mayara Cruz Albuquerque
mayara.cruz.albuquerque@gmail.com Mestra em Historia e Letras (UECE)
1 APRESENTAÇÃO/INTERESSE DO TRABALHO A SER APRESENTADO
Assim como o narrador-personagem Rodrigo S.M., na verdade Clarice Lispector, em “A Hora da Estrela”, também acreditamos que tudo no mundo começou com um sim. O Severinas começou da mesma forma. Duas mulheres que disseram sim uma para a outra, como as moléculas clariceanas, e assim nasceu um projeto que desde 2018 vem viajando pelos sertões de Quixeramobim, e quando possível, pelo Sertão Central do Ceará, para conhecer mulheres e aprender com elas.
A história da nordestina Macabéa sempre me emociona e de tantas vezes que li sei que parece com a vida de muitas mulheres que conheci. Quando a personagem se mira no espelho e não se vê na imagem refletida nele, quantas Severinas ao contarem suas vidas relataram as dificuldades que sentem para reconhecer a importância do seu trabalho ou questões de amor próprio e autoestima? Não foi uma ou duas, mas várias vezes em que o patriarcado afetou a construção da identidade dessas mulheres e o prazer do autorreconhecimento e de se verem fortes, de luta e essencial para a comunidade em que vivem. A partir disso, pensamos em rodas de conversa, exposições fotográficas e oficinas para empoderar a elas e a nós, pois o empoderamento feminino nunca será uma tarefa fácil, sendo, na verdade, um processo que perdurará por toda a vida de uma mulher.
1.1 Importância
Uma das leituras que atravessam o projeto e sempre está presente quando contamos o que fazemos é “O Perigo de Uma História Única” da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. É difícil destacar apenas um trecho da obra, no entanto esse em especial dialoga muito com a nossa reflexão constante do quanto mulheres
nordestinas sofrem com a criação e banalização de estereótipos acerca do que é ser ou não uma mulher nordestina e sertaneja: “a história única cria estereótipos, e o problema com os estereótipos não é que sejam mentira, mas que são incompletos. Eles fazem com que uma história se torne a única história” (ADICHIE, p. 21, 2019). Criar uma história única não é difícil, a própria Adichie afirma que basta apenas mostrar um povo como uma coisa só, repetidas vezes, para que este seja visto unicamente dessa forma. Múltiplas, multifacetadas, complexas, diversas e desdobráveis, como diria a poeta mineira Adélia Prado, contudo, a grande mídia vê mulheres rurais com enquadramentos tão limitados que quando não são “sofridas”, são muito “guerreiras” e até a seca não é páreo para elas, além de ignorantes, iletradas, feias, ingênuas e masculinizadas. Com alguns anos de experiência em espalhar a palavra do feminismo Sertão afora, percebi que cada mulher é um universo e as semelhanças ou diferenças é o que nos humaniza. Como projeto não damos voz às mulheres e nem a empoderamos, acreditamos que esse é um processo mútuo que acontece quando nos conhecemos e temos a oportunidade de trocar as nossas histórias e o que aprendemos ao longo de nossas vidas. Por isso viajamos de moto, Maria Oliveira e eu, percorrendo muitos quilômetros, para conhecer os feminismos que florescem no sertão, que nascem na horta, como intitula a pesquisadora Maria Ignez Silveira Paulilo. Iniciamos nossas atividades no ano de 2018, através do edital Ceará de Incentivo às Artes 2015 da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará (SECULT) e de lá para cá nunca mais foi possível parar e nem queremos. Assim como a universidade pública, temos um tripé que se sustenta em: formação, rodas de conversa e exposições fotográficas rurais. As oficinas são realizadas em escolas públicas municipais e estaduais da cidade de Quixeramobim e zona rural (agora com o Google Meet, estamos chegando a mais escolas do Sertão Central), as rodas de conversa que chamamos carinhosamente de “Ciranda das Mulheres Sábias” (em referência ao livro da psicanalista e poeta Clarissa Pinkola Estés) com mulheres de assentamentos e comunidades, e, por fim, as exposições que acontecem nas zonas rurais, com as fotografias das mulheres que vivem lá. É como costumamos falar quando estamos reunidas, o projeto não é nosso, é de vocês, das Severinas. Não faria sentido expor na cidade quando a maioria não poderia ver a sua foto e levá-la
para casa. Um dia pretendemos ocupar outros espaços, mas por enquanto queremos descentralizar e estar com elas ou quem sabe um dia encher um ônibus de mulheres para verem suas fotos em um centro cultural. Em uma das exposições, que reunia mulheres de três comunidades diferentes, às 7 horas da manhã, já tinha uma fila esperando do lado de fora do salão paroquial do assentamento para entrar, e, em outra, Maria com seus 70 anos, levou a peça de crochê para continuar fazendo enquanto estava com a gente, depois de ver a sua foto e projeção na parede. Tomou café e proseou com as amigas queridas enquanto tecia e não via o tempo passar. São histórias que só as nossas exposições têm, por isso tão importantes e memoráveis para nós. Escrevi um texto sobre o Severinas que fica disponível em um painel nas exposições que fazemos e acredito que ele representa muito bem alguns dos nossos objetivos infinitos enquanto projeto:
A exposição fotográfica Severinas Mulheres do Sertão não é só sobre mulheres que carregaram água na peneira a vida toda, que foram silenciadas ou excluídas, é sobre força também. A força de ser mulher, de mover o mundo com o ventre e a dor, com o sexo e o desejo, com as mãos e os pés, cabelos longos ou não. Severinas é sobre mulheres que vivem no Sertão e os seus cotidianos e o que aprendemos quando temos a oportunidade de compartilhar a vida com elas. O que nos lança nessa 'retirância' é transformar registros de viagens pelo interior do Ceará em exposições por comunidades e assentamentos para que as mulheres possam se reconhecer de uma maneira digna: com amor próprio, orgulhosas de suas identidades e raízes, desconstruindo o perigo da história única para assim revelar narrativas múltiplas e quebrar o processo de invisibilidade que carregam ou carregaram ao longo de suas vidas.
O segundo edital aprovado foi um verdadeiro divisor de águas para o Severinas. Tiramos o primeiro lugar no Prêmio Funarte Artes Visuais Periferias e Interiores. O primeiro lugar em mais de 300 projetos oriundos de todo o Brasil. Foi a partir dessa conquista que percebi que estávamos apenas começando, que tínhamos potencial e muito o que conquistar pela frente. Eu sou professora de escola pública concursada do estado, Maria é agente social concursada do município e não nos consideramos artistas, fotógrafas, videomakers, mas desenvolvemos um trabalho envolvendo fotografia, audiovisual, artes visuais e seguimos atravessando várias linguagens para criarmos a nossa. Na verdade, o que queremos mesmo é viver em um estado menos machista e ver mulheres mais
empoderadas e derrubando o patriarcado com frases muito simples como a que um dia ouvimos: “sai pra lá um pouquinho que hoje elas vieram me fotografar”. Foi o que uma das mulheres fotografadas disse para o marido enquanto eu fazia um registro seu segurando minhocas. Atualmente estamos finalizando a parceria com o apoio do Prêmio Funarte Descentrarte, que tem como proposta descentralizar ações de formação e produção artísticas, como também de inclusão “cidadã nas artes”. Assim, mesmo com a pandemia da COVI-19, estamos dando continuidade ao nosso trabalho em escolas públicas, em assentamentos e comunidades, fomentando espaços de troca e fazeres artísticos. Ao final, faremos uma espécie de exposição rural virtual/seminário de despedida dessa ação na Casa Severinas com a participação das oficineiras, mulheres e alunas de escolas públicas que passaram pelos nossos encontros. Recentemente o Severinas foi selecionado em mais dois editais públicos estaduais: o Circula Ceará da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará (SECULT), em parceria com Fundação Nacional das Artes (FUNARTE) e o XII Edital Ceará de Incentivo às Artes, também da Secult, além de ter realizado ações com o apoio da lei Aldir Blanc através da Prefeitura Municipal de Quixeramobim e ter as fotografias do projeto compondo o Painel da Fotografia Cearense ao lado de 120 artistas selecionados de todo o Ceará.
2 OBJETIVOS
- Visibilizar as mulheres sertanejas e suas histórias de vida, desconstruindo estereótipos arraigados pela grande mídia; - Contribuir para a construção e o fortalecimento do movimento feminista no interior do Ceará; - Divulgar o trabalho de mulheres na fotografia, audiovisual, pintura, performance, literatura, desenho, entre outras formas de arte, bem como possibilitar que comunidades do interior do Ceará sejam também lugares possíveis de apreciação da arte e tenham acesso a formação em arteeducação como os grandes centros do país possuem.
3 METODOLOGIA
A fotografia no Severinas é o dispositivo que nos permite ir além da escuta, é quando podemos compartilhar com mais pessoas a imensidão de narrativas e corpos que existem, as várias possibilidades de ser mulher. É quando a voz se torna uma memória visível e essa visibilidade pura representatividade.
4 CONSIDERAÇÕES PARCIAIS OU FINAIS
Somos tantas que há várias formas de existir e causas para lutar. O Severinas tem nas mulheres rurais, que vivem no interior do país, a sua causa, pois são elas, agricultoras, costureiras, rezadeiras, parteiras, curandeiras, donas de casa e mães de família que fazem parte da nossa história e tanto nos inspiram. Queremos ver essas mulheres com poder de voz dentro de casa e em suas comunidades, com tomada de decisão potente e sendo ouvidas de forma atenta e respeitosa. Que o machismo não as silencie, não as mate, não se torne a herança das mulheres da família. Para isso, precisamos nos movimentar, nos encontrar em rodas de conversa, oficinas, e ações que reverberem nossas vozes e pensamentos. O projeto Severinas Mulheres Sertão é a forma que encontramos de conhecermos mulheres e não nos sentirmos sozinhas na caminhada árdua que é lutar pela equidade de gênero, pelo empoderamento feminino e por representatividade. Precisamos de espaços de formação, em que mulheres se encontrem e se sintam acolhidas, contem suas próprias histórias, e aprendam umas com as outras. É urgente a nossa organização enquanto mulheres e como seres políticos, a arte pode e deve ser essa ponte. Por meio da fotografia, da performance, da poesia, do audiovisual ou de um processo colaborativo de fanzine podemos encontrar a nossa voz e ecoá-la pelo mundo.
REFERÊNCIAS
ADICHIE, Chimamanda Ngozi. O Perigo de Uma História Única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. LISPECTOR, Clarice. A Hora da Estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
EIXO 2 - GÊNERO, EDUCAÇÃO E COMUNICAÇÃO MENINAS PRETAS E A CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA A PARTIR CAPOEIRA:
ENSINO APRENDIZAGEM NA COMUNIDADE DO ALTO DAS POMBAS
RESUMO Letícia de Oliveira Menezes (Flor de Liz)
leticia.menezes979@gmail.com Mestranda em Educação (PPGE/UFBA)
Este relato de experiência busca abordar sobre a vivência, numa perspectiva interseccional, do Programa de extensão “Projeto Griô: memória e cultura na Comunidade do Alto das Pombas”, com foco nas oficinas de capoeira angola com crianças de 8 a 12 anos da comunidade do Alto das Pombas (Salvador-BA). As reflexões são sobre a possibilidade de construção identitária para as meninas pretas que, compuseram essas oficinas, através das práticas semanais de capoeira angola, ministradas por estudantes de Educação Física e Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades. Será relatado o processo de ensino aprendizagem do projeto no ano de 2019 e as valores raciais, sociais e de gênero.
PALAVRAS-CHAVE: meninas pretas; construção identitária; capoeira angola;
1 INTRODUÇÃO
Nos últimos anos a capoeira tornou-se um conteúdo frequente nas academias, revistas e congressos. Entretanto, a questão de gênero e racial, em se tratando de mulheres negras é escarça. Tendo em vista a perspectiva interseccional, após vivência na comunidade do Alto das Pombas (Salvador-BA) com crianças de 08 a 12 anos, passo a analisar de que forma a construção identitária das meninas pretas, desse grupo de trabalho, pode ser influenciada pela prática da capoeira angola. O Programa “Projeto Griô: memória e cultura na Comunidade do Alto das Pombas” se propõe a continuar e intensificar atividades de ensino, pesquisa e extensão que acontecem desde 2011, pelo Grupo de Pesquisa “GRIÔ: Culturas Populares, Ancestralidade Africana e Educação”, da Faculdade de Educação da
UFBA, em conjunto com o Grupo de Mulheres do Alto das Pombas (GRUMAP), na Comunidade do Alto das Pombas que se localiza na cidade de Salvador (BA). O intuito é alavancar um diálogo entre o espaço acadêmico da universidade e os saberes e fazeres compartilhados na comunidade. Esse programa visa desenvolver ações voltadas para crianças, jovens e adultos. O foco é contribuir na reapropriação da memória da comunidade, pensando na formação da identidade cultural. Na disposição desse projeto é oferecido oficinas semanais de capoeira angola, dança, teatro e música, por estudantes bolsistas e voluntárias(os) do programa de extensão, para a comunidade. No ano de 2019, as oficinas de capoeira angola foram ministradas nas quartas-feiras, no final da tarde com três estudantes como oficineiros(a). Dois estudantes da graduação de Educação Física e uma estudante do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades sob a orientação do professor pós doutor Pedro Rodolpho J. Abib.
2 OBJETIVO
Descrever uma experiência de ensino aprendizagem de extensionista voluntária do “Projeto Griô: memória, arte e cultura na comunidade do Alto das Pombas” (Faculdade de Educação da UFBA) na comunidade do Alto das Pombas (Salvador-BA) com crianças de 8 a 12 anos. As vivências observadas são das oficinas de Capoeira Angola.
3 CAMINHOS METODOLÓGICOS
A metodologia utilizada na elaboração deste relato de experiência foi qualitativa, descritiva e da construção compartilhada do conhecimento, tendo como referencia a Pretagogia, cunhada por PETIT (2015) como sendo um referencial teórico-metodológico baseado nos elementos das cosmovisões africanas. O trabalho realizado na comunidade, foi elaborado a partir das vivências prévias dos(a) três oficineiros(a) na capoeira angola com auxílio do coordenador Pedro Abib.
4 RELATOS DE EXPERIÊNCIA
As atividades foram realizadas no período de Julho a Novembro de 2019, durante esse período analisei questões que podem gerar discussões importantes.
Pedro Abib (2019) sugere como as culturas populares tem um papel fundamental dentro do projeto decolonial na educação, trazendo como foco de debate o exemplo da capoeira. Entendendo o processo na prática, utilizamos dessas reflexões na realizações das atividades dessa experiência de extensão. Na realização das oficinas, as aulas eram compostas majoritariamente por meninas (e negras), que inclusive, além de fazer as oficinas de capoeira angola também faziam as oficinas de Teatro e Dança, ministrada por outras mulheres negras. Os planejamentos de aula eram diálogos semanais para pensar as possíveis temáticas de cada oficina. Além disso, acontecia uma reunião quinzenal com o orientador do programa e com as demais pessoas que oferecem oficinas na comunidade. As oficinas eram divididas em parte prática e teórica, sendo conduzida a partir de um viés lúdico. Como é trazido por Castro Junior et al, 2000.
A prática da Capoeira adquire dimensões bem mais amplas do que uma simples atividade corporal relacionada a uma determinada etnia, e passa a ter um significado de pratica social, ampliando o eixo da discussão sobre as questões raciais e étnicas, para as questões de classe social dentro do sistema capitalista, pois envolve elementos importantes que podem levar a uma reflexão crítica sobre a realidade e o contexto social que envolve o seu praticante (CASTRO JUNIOR, ABIB, SOBRINHO, 2000, p.165 apud AMORIM, 2017). Em primeira análise, o que percebi durante as aulas foram como a questão da territoriedade atravessam essas meninas. Se entender como uma criança negra da favela dá um outro lugar de pertencimento e entendimento espacial da cidade. A partir das construções cotidianas do Grupo de Mulheres do Alto das Pombas (GRUMAP), há anos, fica nítido o enquanto isso se reflete nessas meninas com a potencialidade de conseguir liderar e estar à frente das futuras atividades dessa comunidade. Tendo em vista que, nas oficinas, pensamos a capoeira também como uma produtora de valores sociais e individuais, quando tínhamos oportunidade de discutir sobre questões históricas da capoeira, ou sobre nosso lugar no mundo, conseguíamos observar como a compreensão territorial, que elas carregam, parte de uma percepção matriarcal, colocando sempre suas mães, avós, tias, irmãs, como referências das histórias que queriam compartilhar. Sendo assim, pensando o contexto comunitário em que são trazidas essas demandas, não podemos deixar de pensar o quão é importante que essas meninas ginguem sabendo que suas
referências são mulheres negras e guerreiras cotidianas que trazem um corpo território e deixam essa herança para essas meninas que somam imensamente nas oficinas de capoeira. Durante a realização das oficinas, observei em cada aula como a capoeira pode ser uma potente ferramenta na mobilização da construção identitária negra e de gênero. Pensando essa mobilização não só para as meninas, mas como para todas as pessoas que compuseram essas vivências, como os oficineiros e as outras crianças. Cada oficina foi pensada para trabalhar um tema da capoeira e um valor social que essas crianças precisam ter para a vida, quanto capoeiristas, cidadãos e filhas(os). Para isso, foram trabalhadas algumas brincadeiras de reflexão. Dentre elas, um jogo em que contamos uma história em que o chão se tornaria um rio e que dividiria dois quilombos. Uma pessoa ficaria no meio, interpretando os “capitães do mato” (serviçais responsáveis por capturar os escravizados fugitivos) e as crianças se dividiriam em dois quilombos que teriam que passar por esse rio para se unirem e não podiam ser tocados pelo “capitão do mato”. Um detalhe: para passar de um quilombo para o outro era necessário usar apenas dois apoios (que não fossem os pés) ou quatro, fazendo com que elas trabalhassem as habilidades da capoeira, como o aú. Nessa brincadeira, tivemos que explicar o que são os quilombos, contar um pouco da história da colonização e relacionar isso com a vida contemporânea. Quanto pessoas negras, temos sempre que está aprendendo a achar alternativas para passar por esses rios que nos atravessam. Para além de conceitos sobre nossas ancestralidades, uma simples atividade como essa, pode proporcionar à essas meninas que se empoderem um pouco mais sobre as questões raciais. Outra ação que trabalhamos foi a capoeira como mobilização da construção identitária de meninas, que estão se tornando mulheres, foi através da musicalidade. Por meio das cantigas, podemos refletir em uma oficina, sobre o lugar das mulheres na história da capoeiragem. Refletimos o quanto estamos sendo “privilegiadas” de sermos do gênero feminino e conseguir estar praticando a capoeira com liberdade. Desde o princípio, existia a presença feminina de diversas formas nas rodas de capoeira. Entretanto, não fazíamos parte do protagonismo dos jogos. Mas sim nas assistências. Por meio das cantigas, iniciamos os debates sobre as canções e o
117
que elas representavam. Ao longo dessa vivência, podemos trazer algumas músicas de capoeira que versam sobre as mulheres. Dentre elas. “Maria Conga, esse quilombo é meu, é seu, esse quilombo é nosso” e “Dona Maria do Camboatá, ela chega na roda ela manda botar”. Duas canções que falam positivamente sobre a presença das mulheres na capoeira, o protagonismo e o conceito de comunidade. No livro “Para educar crianças feministas”, ADICHIE (2017) reforça a importância de ações como essa. Pensando sobre a representação e empoderamento:
Esteja atenta também em lhe mostrar a constante beleza e capacidade de resistência dos africanos e dos negros. Por quê? A dinâmica do poder no mundo fará com que ela cresça vendo imagens da beleza branca, da capacidade branca, das realizações brancas, em qualquer lugar onde estiver. Isso estará nos programas de TV a que assistir, na cultura popular que consumir, nos livros que ler. Provavelmente também crescerá vendo muitas imagens negativas da negritude e dos africanos. (ADICHIE, 2017, p.19) No terceiro sábado de todo mês, uma outra iniciativa organizada em conjunto entre o Grupo Griô e o GRUMAP é o “Sarau do Pombal”. Organizado na praça principal da comunidade, o protagonismo é das crianças e jovens que participam das oficinas semanais. O sarau é uma possibilidade de exposição do que foi trabalhado durante o mês. O Sarau do Pombal sempre se inicia com uma roda de capoeira e também permite o “microfone aberto”. Esse espaço proporciona uma autonomia para as crianças. As meninas ficam a vontade de ter voz e poder falar no microfone; ou de dançar e cantar; ou de se permitir a um diálogo corporal com as outras pessoas através da capoeira. Apensar de que, em algum nível, ainda existe uma timidez em jogar capoeira no meio da praça, com as pessoas da comunidade assistindo, foi considerável está incentivando ela nesses momentos também. “Três palavras vêm à minha mente: informação, afirmação e corpo. Porque isso passa pelo corpo, um corpo que se sente à vontade em qualquer ambiente e que sente pertencimento onde quer que esteja”.( RAMOS, 2017. p. 126). Concordo com Lázaro Ramos quando ele fala que temos uma tríade de fundamentos significativos para serem postos em prática e que vão ter reflexos futuros. No entanto, também tivemos adversidades durante o processo. Todo jogo de capoeira a gente leva rasteira. Mas, é importante aprender a se esquivar. Algumas questões interferem na totalidade desse trabalho, não por uma questão especifica da localidade ou das crianças ou dos(a) oficineiros(a), e sim por uma questão
estrutural chamada sexismo. Me apoio no escrito de Chimamanda Adichie (2017) para essa reflexão:
A vergonha que atribuímos à sexualidade feminina se refere a uma questão de controle. Muitas culturas e religiões controlam o corpo feminino de uma ou de outra forma. Se a justificativa para controlar o corpo das mulheres se referisse a elas mesmas, seria compreensível. (ADICHIE, 2017, p.24) Como já arrolado no texto, por muito tempo era difícil ter mulheres sendo protagonistas das rodas de angola, assim como de muitos espaços da sociedade, e ficamos felizes por essa turma do Alto das Pombas ser majoritariamente feminina. Entretanto, existe a complexidade externa que se refletia dentro das nossas aulas. Tivemos algumas dificuldades porque mesmo que sem perceber o machismo está presente nos detalhes, e precisamos estar sempre muito atentas e mediando essas situações para que não ecoasse nem na vida e nem capoeira dessas meninas. Por isso, achei importante ser uma das pessoas que estava a frente desse processo porque as meninas também se sentiam mais a vontades comigo, seja para contar incômodos quanto para se referenciarem no meu corpo para criarem os movimentos nos seus corpos.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Essa experiência, me fez ficar de cabeça para baixo (assim como quando damos um aú) e aprender mais do que ensinar. Nós, mulheres pretas, temos que ter um cuidado redobrado e prestar atenção em cada detalhe para não reproduzir padrões opressores e sim, sermos multiplicadoras da resistência. Na minha minúscula trajetória na capoeira, desde quando era pequena sentia falta de ter outras meninas gingando comigo, hoje, fico muito feliz de ver essas meninas brincantes na capoeira angola. São movimentos pequenos, mas que fazem a diferença, em algum nível, na vida delas, e na minha também. Dentre as possibilidades que essa experiência fosse melhor, é um maior cuidado com o planejamento semestral das aulas. Sem intenção de projetar oficinas engessadas em cada dia, mas uma temática possível de ser trabalhada. Foi observado que o planejamento sem uma antecedência favorável, diminuía a potência das questões a serem trabalhadas entre os(a) oficineiros(a) e, as vezes, as atividades se repetiam. Nessa perspectiva, acabávamos ficando desarticulados(a)
quanto mediadora(es) e influenciava na forma como as coisas poderiam ser passadas para essas meninas de maneira antissexista e mais potente. Além disso, em alguns momentos, existiu a dificuldade em deixar as crianças atentas e houveram muitas dispersões. Contudo, as oficinas renderam boas discussões e aprendizados de todas as partes: seja nos oficineiros(a) e nas crianças, quanto nos movimentos práticos ou nos momentos de reflexão. Cada detalhe compôs o processo de educação popular através da capoeira. A capoeira é uma grande ferramenta de construção identitária, por si só, e conseguir investir nas oficinas através da capoeira angola possibilitou, mesmo que nem todos resultados sejam imediatos, a inferência nas vidas dessas crianças. Em reunião com as lideranças do GRUMAP foi pontuado o quanto era visível a mudança, em detalhes do comportamento, das crianças que participaram das oficinas. Um dos exemplos que elas deram foi sobre como as crianças que faziam as oficinas estavam mais proativas nas atividades da comunidade. Não se tem um desfecho concreto ou resultado efetivo sobre como se desencadearão essas oficinas na história dessas meninas pretas, todavia, não resta dúvidas que a iniciativa, em sua essência, busca que cada oficina (e também os saraus) possam motivar ampliação da autoestima; da representatividade; da consciência de gênero e de raça; de pertencimento ao território e do enriquecimento da autonomia. Todos esses estratos de valores, não se constrói só com a capoeira angola, mas também com o processo contínuo do GRUMAP, das famílias, instituições escolares e toda educação formal ou não formal. O que espero é que a parcela de contribuição da capoeira angola, seja de grande potência, para essas futuras mulheres negras empoderadas.
REFERENCIAS
ABIB, Pedro. Culturas populares, educação e descolonização. Revista Educação em Questão, Natal, v.57, n.54, p.1-20, out/dez. 2019 ADICHE, Chimamanda Ngozi. Para educar crianças feministas: um manifesto. tradução Denise Bottmann. — 1a ed. — São Paulo: Companhia das Letras, 2017. AMORIM, Alexandra da Paixão Damasceno de. Vem dançar mais eu, camará! Gingar/dançando na capoeira: uma proposta na educação infantil. 2017. 124 p. Dissertação (Mestrado - Programa de pós-graduação em Dança) - Universidade
120
Federal da Bahia, Escola de Dança, 2017. PETIT, Sandra. Pretagogia: Pertencimento, Corpo-Dança afroancestral e Tradição Oral. Contribuições do Legado Africano para a Implementação da Lei nº 10.639/03. Fortaleza: EdUECE,2015 RAMOS, Lázaro. Na minha pele. 1ª ed. Rio de Janeiro. Objetiva. 2017