Júlia, nos campos conflagrados do Senhor — B. Kucinski

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19 busca nos jornais

Desde o encontro com o vigia, Júlia não consegue se concentrar no trabalho. Não vive o presente, só pensa no passado, na adoção, na mentira que vivera até então. O Vale Paraibano, que noticiou o fechamento do orfanato, não existe mais. Foi engolido por este de São Paulo, explicara o jornaleiro da pracinha de Jacareí, um velhinho com boina de espanhol, apontando para o Diário da Manhã. Júlia nunca tinha lido o Diário da Manhã. O pai assinava o Estadão. Surge na sua mente a imagem do pai lendo o jornal à mesa do café e meneando a cabeça em sinal de desgosto. A mãe ralhava, larga esse jornal, homem, ele punha o jornal de lado, mas não resistia a olhar de soslaio. Dias depois repetia-se a mesma cena. Numa segunda-feira, Júlia vai a São Paulo, matando um dia de serviço. Quem sabe o Diário da Manhã possui a coleção do Paraibano? Na sede do jornal é informada que a coleção fora doada à biblioteca municipal de Taubaté. Antes de regressar, visita os irmãos. Pensa em compartilhar a história do orfanato. Talvez se lembrem de alguma frase do pai que dê a pista de sua mãe biológica.


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