Documentando novos espaços: os vídeos caseiros de Derek Jarman Adriana Pinto Azevedo
“Make your desires reality”, uma garota punk diz diretamente para o espectador. “I started to dance. I wanted to find... gravity”. O longa Jubilee (1978), de Derek Jarman, é então atravessado por uma cena com outra textura, como em um devaneio. Nela, uma bailarina rodopia diante de uma fogueira, alimentada por páginas de livros. A câmera ágil acompanha as cinzas que voam com o vento, e revela outros personagens saídos do mesmo universo onírico: um rapaz com o rosto coberto por uma máscara feita com saco de papel, e outro, nu, que veste uma máscara do filósofo grego Sócrates. A interferência é o curta Jordan’s Dance, filmado por Jarman em Super-8 um ano antes de decidir incluí-lo na composição do longa. Menos conhecida do público, a produção de curtas-metragens de Derek Jarman é bastante expressiva. Eles começaram a ser criados em 1972, quando estudante norte-americano Marc Balet o apresentou à Super-8 portátil da Kodak. Jarman se referia a eles como home movies, referência direta aos filmes caseiros que povoaram sua infância, obras de seu pai e de seu avô, ambos cineastas amadores. Inspirado pela estética da colagem punk, o diretor incorporou algum desses filmes no seu longa The Last of England (1989). “Eu tento deixar tudo muito próximo do conceito de casa, o que talvez seja algo difícil já que eu sou gay. É difícil construir um lar sendo um homem gay. Meus filmes caseiros, portanto, retrataram um mundo muito diferente daquele apresentado pelo meu avô e pelo meu pai”, declararia Jarman . Na análise de Jim Ellis, “A função ideológica dos filmes caseiros não é documentar mas de trazer o que é ser uma família e um lar para a tela, e os Super-8 de Jarman não são diferentes, constituindo o mundo das festas de Bankside como uma nova versão do lar”. A ressignificação do “familiar” e do “lar” é uma pista do que Derek Jarman viria a fazer nos filmes do New Queer Cinema nos anos 90. Vinte anos antes, em seus primeiros home movies e filmes experimentais, já podemos notar elementos da nova vanguarda estético-política em formação, como a experimentação radical da forma e o interesse na criação de novos imaginários geográficos e desejantes. Os seus curtas em Super-8 são divididos em três grupos. O primeiro é composto de filmes com temáticas que envolvem pessoas, lugares e eventos, 130