DEREK JARMAN: CINEMA É LIBERDADE

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Fértil melancolia Juliano Gomes

O jardim de Jarman é sua própria casa de praia em Dungeness, é o jardim do Éden, é um jardim de lembranças, de prazer, de morte, de beleza e de vazio. É o lugar que ele escolhe para fazer essa mistura de filme caseiro, autobiográfico, épico, ritualístico, pop e medieval. Um lugar de encontros, afinal: “Matthew fodeu o Mark, que fodeu o Luke, que fodeu o John, que deita-se na cama em que eu me deito”, um lugar de passagem e de afeto, de criação, cultivo, prazer e caos. O jardim parece a figura ideal para fazer essa elegia impura, que carrega a perspectiva de um fim iminente (“Frio, frio, frio, eu morri tão silenciosamente”), sobre o que passa e sobre as dificuldades de passar. Jarman evoca imagens conhecidas, populares, pop (cristo, coca-cola, Papai Noel...), para justamente exercer sua notável força em fazer as ligações entre elas. Para fazer ver justamente as relações, os processos, que aproximam, afastam, transformam, uma imagem em outra. Há a mulher, que parece evocar Maria, a proteger seus filhos das intempéries (inclusive de paparazzi), um casal de homens, que tem mais tempo de tela, e que no decorrer do filme vê sua rotina de deleites interrompida por sucessivas perseguições, além da figura do criador, que retorna, com canetas na mão, pincel e câmera. Essa é a tríade desse jardim. Cada um deles com seu prazer e seu martírio. Figuras que precisam lutar e sofrer, “morrer silenciosamente”, para cumprir seu caminho e alcançar sua graça. Graça no sentido mesmo de otimismo, de prazer, humor e também de milagre. De alguma maneira, o que toma forma parece ser a jornada de figuras, cada uma à sua maneira, indo contra a corrente. A tarefa de Jarman é identificar as possibilidades de conexão e continuidade entre esses elementos tão díspares: a desilusão e melancolia do final dos anos 90, materializada pela emergência da AIDS como questão (este é o primeiro filme que Jarman realiza sabendo-se soropositivo), o martírio de Cristo, também o de São Sebastião, a Virgem Maria, a década perdida, a emergência do capitalismo de mercado (na Inglaterra é onde essa transição se opera com a violência mais visível nessa época), seus dramas pessoais e criativos, sua casa de praia. É notável a força com que o filme tece as conexões, para dentro e para fora das cenas. Alterna cenas com grande decupagem interna, com unidade de espaço e tempo, com falsos racords escandalosos que justamente têm o efeito de aproximar as duas operações: o grande é o pequeno, as mínimas diferenças podem ser enormes. O martírio parece inevitável, mas o verdadeiro

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