Into the wide blue yonder Tatiana Monassa
Chegaria até ao ponto de dizer, levando a coisa a um ponto caricatural, que se um dia me mostrassem um filme no qual não houvesse imagens, ou, mais exatamente, no qual as imagens fossem apenas choques de luz sucessivos, mas acompanhados de um texto ritmado em função deles, que isso é cinema.1 Alain Resnais
O que é o cinema? Talvez essa pergunta, feita e refeita ao longo do século XX, tenha tantas respostas quanto filmes existentes. No entanto, algumas obras, por terem como base uma proposição reflexiva, nos confrontam imediatamente com questões sobre a natureza do meio. Blue (1993) é uma delas. Ao esvaziar a tela de formas sem no entanto abolir a narração – a exemplo de João César Monteiro em Branca de Neve (2000) –, Derek Jarman distancia-se resolutamente da conformação habitual do filme, reposicionando assim também o seu espectador. Ocupada pela projeção de uma banda de filme invariável – cuja integralidade dos fotogramas é preenchida pelo IKB (International Klein Blue), o famoso azul intenso criado e patenteado por Yves Klein –, a tela em Blue não oferece pontos de fixação para o olhar, que se depara com a monotonia de um vasto espaço plano e uniforme. O texto que compõe a trilha sonora, situado entre monólogo teatral e recital e ritmado com ruídos e música, instaura uma progressão que funciona como contraponto à imagem monocromática. Sem estarem explicitamente articuladas, estas duas instâncias encontram-se, no entanto, diretamente conectadas, fornecendo estímulos simultâneos à visão e à audição durante um tempo determinado – o que basta para qualificar Blue de cinema. Vemos, portanto, que, de saída, o problema da “natureza” do filme em Blue não responde aos critérios ligados ao caráter indicial da imagem ou aos sistemas de organização espaço-temporal, mas a parâmetros vinculados sobretudo à experiência do espectador: a configuração técnica da projeção, de um lado, e a narração organizada temporalmente, de outro. Por outro lado, ao solicitar a imaginação de forma fundamentalmente diferente do filme 1. Alain Resnais em entrevista a Guy Gauthier sobre Chris Marker, Image et Son, no 161-162, abril de 1963, p. 52. [Tradução da autora.]
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