AÇÃO DA CIDADANIA MEMÓRIA - MAIO 1994

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permitindo àqueles envolvidos diretamente com a campanha planejar livremente estas atividades e exercitar a sua criatividade para alcançar os objetivos nelas contidos. Cabe esclarecer, no entanto, que a liberdade vivida pelos comitês não significou uma ausência de controles sobre os recursos arrecadados e as instituições beneficiadas por suas atividades. No caso dos comitês de funcionários das estatais, é permanente a prestação de conta de seus membros aos demais empregados através de boletins, de folhetos, de correspondência personalizada, etc., de forma a evitar qualquer dúvida sobre o destino dos recursos, mesmo quando os mesmos não são imediatamente aplicados na compra de produtos ou destinados às instituições, ficando aplicados em contas correntes abertas com esta finalidade em bancos da rede pública. Por outro lado, as instituições beneficiadas, ao receberem tais recursos - normalmente não se entrega o dinheiro em espécie a elas, mas se compram os bens ou se paga a realização de serviços necessários -, assinam documentos comprovando aquilo que foi doado, discriminando as quantidades e o valor cios bens. A prática da prestação de contas indica também, na nossa opinião, que os membros dos comitês de funcionários apontam para uma gestão dos recursos públicos - pois disso se trata, tal como no caso dos recursos administrados pelo Estado -, diferente daquela que tem sido recentemente objeto da crítica da opinião • pública, levando à cassação de mandatos e à abertura de processos em distintas áreas da vida brasileira. A transparência no uso destes recursos é mencionada espontaneamente por seus membros, e é con- siderada um elemento importante da sua participação na campanha, marcada pela preocupação com o comportamento ético no trato da coisa pública; a informalidade nesse caso não se confunde, portanto, com "liberalidade" nem com ausência de idoneidade na gestão dos recursos solidariamente doados pelos funcionários das empresas públicas. Uma prova disto, é que as instituições que foram denunciadas no escândalo da LBA, deixaram de ser beneficiadas, por exemplo, pelo comitê da EMBRATEL, devido ao problema do desvio de recursos.

1.3 - O caráter a-político dos comitês de funcionários na Campanha Contra a Fome. Como já foi mencionado ao longo do texto, o Estado é, por assim dizer, a "encarnação" do "politico" nas sociedades contemporâneas; entretanto, nem tudo que acontece no âmbito do aparelho de Estado, ou nos setores vinculados a ele, assume, necessariamente, este caráter. Uma prova particularmente significativa desta afirmação, é o sentido dado pelos funcionários das empresas e instituições estatais à sua participação na campanha, e o fato de que, em praticamente todas as empresas pesquisadas, o papel dos sindicatos ou associações de empregados foi basicamente o de um coadjuvante das tarefas e das propostas dos comitês, os quais surgiram à margem e independentemente deste tipo de organização. Em relação à questão do sentido da participação na campanha, o argumento sempre utilizado passa pela "simples" demonstração de solidariedade frente à situação de miséria e fome que caracteriza a vida de milhões de pessoas em todas as regiões do país, e não teve, no geral, um caráter contestatório da política econômica do governo, embora fosse registrado que uma das fontes desta miséria é a má distribuição de renda vigente na sociedade brasileira. Tampouco foi observado, no material a que tivemos acesso, qualquer tentativa de politização e/ou partidarização do problema da fome e, muito menos, da campanha que se buscou 61


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