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Resistência à medicina dificulta o combate ao ebola no Congo

ÁFRICA

Mais de 2000 pessoas já morreram no novo surto da doença que assola o leste da Republica Democrática do Congo. Enquanto a população desconfia da vacina, grupos rebeldes atacam centros médicos.

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Por Priscila Palermo, Thiago Lopes, Carolina Denari, Açucena Barreto e Felicio Henrik

Aepidemia de ebola na República Democrática do Congo (RDC) já matou mais de 2.000 pessoas desde agosto de 2018, quando a doença voltou a se manifestar na região leste, na fronteira com Ruanda e Uganda. Há cerca de 3.000 infectados. Apesar dos avanços da medicina e do desenvolvimento de oito vacinas contra o vírus, o Congo está longe de combater o novo surto. A resistência da população em geral em aceitar a vacina tem levado a uma alta mortalidade: 90% das pessoas que contraem ebola falecem, sendo um terço delas crianças. Kivu do Norte, província onde o surto está localizado (principalmente nas cidades de Butembo, Beni e Goma), vive em guerra há mais de vinte anos, com dezenas de grupos rebeldes locais e estrangeiros de diferentes etnias disputando territórios ricos em minérios. De acordo com analistas, a situação de constantes conflitos, a corrupção governamental e o baixo investimento em saúde e segurança levaram a população à desconfiança generalizada, a teorias de conspiração e à propagação de rumores. Muitos habitantes acreditam que o ebola

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seria uma manobra política, o que fez milicianos atacarem centros de tratamentos médicos, destruindo equipamentos, ferindo e matando profissionais da saúde, enfatizando que não queriam esse tipo de ajuda. Os rebeldes deixaram, inclusive, avisos escritos de que não queriam a presença dos agentes. Com medo, a população deixou de procurar ajuda nos centros de tratamento, o que aumentou o número de casos de ebola de fevereiro para cá. Também, devido ao desconhecimento sobre a doença, os infectados resistem em procurar os hospitais da cidade, porque quase todos que foram internados não saíram com vida. Embora seja uma característica da doença ter mortalidade alta, muitos congoleses acham que são os cuidados médicos que matam e não o vírus em si. A biomédica Maria Isabel Nogueira Caño, professora da Faculdade de Medicina da UNESP de Botucatu, salienta que questões culturais também impedem o combate ao vírus. “Uma boa parte da população não acredita nas vacinas, prefere acreditar em curandeiro”, comenta. Segundo ela, seria necessário fazer grandes campanhas de vacinação para o combate à doença. Mas há outros problemas a serem enfrentados, como a falta de higiene e o ritual de lavar o corpo dos mortos, além da dificuldade de levar a vacina aos animais silvestres, transmissores da doença. Prudence Kalambay Libonza, congolesa, modelo e ativista pelos Direitos Humanos que veio para o Brasil em 2008, mostra indignação com a indiferença do mundo às tragédias de seu país: “Do Congo, com uma guerra que matou mais do que a Síria, ninguém fala”. Prudence saiu de seu país fugindo dos conflitos e de perseguição política. Segundo ela, o grande problema em relação à doença é a desinformação, principalmente das pessoas que vivem em zonas rurais e não têm dimensão do perigo que correm diariamente. “A gente que está aqui de fora sabe mais, aqui de fora ficamos mais conectados e sabendo das notícias”, afirma. Apesar dos sete ataques que os médicos e enfermeiros locais e da OMS (Organização Mundial da Saúde) sofreram em 2019, os Médicos Sem Fronteiras (MSF) permanecem no Congo, com cerca de 2.800 profissionais. Além de médicos, há enfermeiros, psicólogos e profissionais de outras áreas, como logística, administração e comunicação, entre expatriados (profissionais estrangeiros) e pessoas contratadas. Igor Moraes, Diretor Internacio-

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nal da área de Recursos Humanos do MSF no Brasil, explica que há protocolos que os profissionais devem cumprir em caso de perigo: “Podem ser determinados toques de recolher ou redução dos contatos e da exposição”. O vírus do ebola é transmitido através do contato com sangue, saliva, urina e fezes de animais e humanos infectados. Sua transmissão só ocorre após a manifestação dos sintomas, que são, febre, dor de cabeça, fraqueza muscular, diarreia, vômitos, dor de garganta, falta de apetite e hemorragias internas e externas. No início da doença, muitos desses sintomas podem ser facilmente confundidos com uma virose mais simples, como a gripe, o que pode retardar a procura por um médico. O principal hospedeiro do vírus são os morcegos não frugívoros que vivem na floresta, mas macacos e chimpanzés também podem hospedá-lo. Provavelmente, o vírus descoberto em 1976, foi transmitido aos humanos a partir do contato com fluídos, sangue ou órgãos desses animais. E as epidemias são recorrentes por conta do frequente contato que muitas das populações africanas mantêm com esses animais. “O animal fica infectado pelo vírus ebola e lá, a população tem costumes, rituais religiosos ou até por questões de alimentação, comem o animal infectado e acabam se contaminando”, afirma Nogueira Caño.

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