HOJE CHOVE EM MAPUTO Preview
título: Hoje chove em Maputo
autora: Ana Morais
edição: Edições Vírgula ® (Chancela Sítio do Livro)
revisão: Liliana Simões
grafismo de capa: Ângela Espinha
paginação: Paulo Resende
1.ª edição
Lisboa, março, 2023
isbn: 978‑989 8986 68 9
depósito legal: 510093/23
© AnA MorAis
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HOJE CHOVE EM MAPUTO ANA MORAIS
Preview
Paradoxal
Gosto de saber que não me és indiferente, Contigo, experimentar todo o espectro de emoções, Empenhar-me em logísticas só para te roubar um beijo.
Contigo, a minha timidez aflora estranhamente, Ainda assim, seguindo uma dança conduzida por ti, Vejo-me a transformar na mais fatal das felinas.
Roubar-te
Quero roubar-te a paz, a tranquilidade e a harmonia, Introduzir-me como um vírus na tua pele, Fundir-me no teu corpo e nesta utopia, Nós dois desvairados, fugindo para nenhures.
Quero roubar-te essa lucidez e a paz ilusória, Garantir que ficas louco por mim num segundo, Ouvir-te delirar o meu nome no prazer da carne, E fazer-te alucinar desejos satisfeitos da alma.
Quero, pois, e vou roubar-te, esse dia virá, Sabendo que o único proprietário que conta és tu, Sequestrar-te pelos caminhos do amor correspondido, E serás roubado no mesmo instante que és recuperado.
Essas mãos que tecem
Tecem sonhos que não os teus, Mas dos teus filhos perdidos no mundo, Vivendo dos sonhos que ajudaste a construir.
Tecem vidas esquecidas na dor, Marcadas nas costuras do teu corpo, Protegidas no tear das tuas preces.
Essas tuas mãos, mulher.
Costuraram coragem para aventurar na vida, Ergueram pontes que me levam aos mundos, São essas mãos que me fazem caminhar segura.
Teceram virtude para os dias da dificuldade, São mãos que aquecem no frio da solidão, Rescrevendo os sonhos vividos em muitos prismas.
Ah, mamã! Essas tuas mãos são mãos de Deus!
Magia
O teu beijo suave na minha face Faz transportar energia pelo meu corpo, Fertiliza os meus anseios de desejo profano, Ilumina os escombros de dúvidas e medos.
Cresce em mim a ânsia de te amar, Frívola e loucamente, Liberta de dogmas e amarras, Ânsia de entrega inconsequente.
O teu olhar derrete cada amarra, Despe-me completamente de consciências, Quero perder-me nos braços sedutores, E só me encontrar no desejo satisfeito.
As tuas palavras embalam os meus sentidos, Notas vibrantes de promessas ilusórias, Que me encantam e cativam.
Faz-me tua presa, Perdida no teu corpo, Promessas de encantar.
COVID
Lavei as mãos e cumpri requisitos, Rigorosa, cumpri os preceitos, Confinada, nem germes nem contentamento.
Horas longas deram lugar a dias fatídicos, Que, cansados, logo se tornaram meses, Eu, confinada, gritava, ávida de liberdade.
Dia lindo, cúmplice de um sol maravilhoso, Soltam-se amarras férteis, sonhos de liberdade, Confiança delirante, grito livre de euforia.
Abraços dei, fartei-me em beijos, No colher do prémio, cautela desmazelada, E na manhã seguinte, acordada pela COVID.
Teu nome, amor
Se pudesse dar nome ao amor Certamente teria o teu nome, A tua vibração, a tua luz exuberante.
No teu olhar, vi-me refletida, Eu sublime, como perfeitas são As criaturas mais belas da terra.
Nos teus braços, os meus medos morreram, E logo nasceram sonhos vívidos, Uma vida outrora inanimada.
No teu olhar, o meu reflexo imaculado, Confiante entreguei-me a ti, sem reservas, Perdendo todas aquelas defesas inúteis.
E o amor não tem amarras nem tempo, É boémio e só se nutre de liberdade, Festejando a morte do eu, no parto do nós.
Bipolar
Meu coração bipolar, Amante de margens, vagueia no espectro, Se te vejo, sol nítido, felicidade plena, Sem te ver, pura depressão, pura confusão.
Longe de ti, humor no chão, cheiro de fel, Decisões nefastas, qual dor, eu sou torpor, Perto de ti, euforia plena, sabor de mel, O tempo esfuma-se, destino fica consumado.
Como o sol, iluminas o meu sentido, o meu ser, Harmonia, doce vida, alegria e criação, Quando na noite, sem te ver, desejo morte, O meu palato entorpece, tristeza é situação.
Contigo, eu sou bipolar, Sem ti, no entanto, Nada quero ser!
Alienada
Nua e crua, a verdade fez-se anunciar, Quando te entregas enamorada, tua alma alienas, Para um mundo que mais parece carrasco E não se importa com todo o teu valor afectivo.
Por esse vício rastejas, tão sequiosa tu és, Feres com garras impiedosas teu ventre, Ofereces em carne teu sublime querer, Para expectante, teu ser confuso enterrar.
Que afecto é esse que te faz planar sonhos, Em caminhos lamacentos, rastos de dor, Quão grande é esse fervoroso querer, Que te aponta mel onde se encontra fel.
Na miragem de uma tórrida paixão, Teus olhos famintos arregalam-se encantados, E, neste encantamento claramente distorcido, Encontras-te em farrapos, alienada de ti.
Ode. Oh, crise existencial! Filha de um erro cometido, Pecado contra si própria, Que a culpa não deixa esquecer.
Suga-me forte. Oh, dor de Ícaro! Que dolorosa corrói ossos e sonhos, Tesouros escondidos nas dunas do medo, Que preceitos morais desejam castrar.
Desejos perdidos nos escombros imorais Vagueiam na alma que se esquece de reprimir, Forjam devaneios úberes até fartar e perecer.