Escritores Brasileiros Contemporâneos - n. 23 - Março/2021

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ESCRITORES BRASILEIROS CONTEMPORÂNEOS EDIÇÃO 23

Nº. 23

Março/2021


Estamos vivenciando nas últimas semanas uma tragédia devido ao avanço da pandemia do Coronavírus no Brasil. São centenas de mortes anunciadas diariamente. A vacinação é lenta. Na política, situação de incerteza perante à má vontade e falta de ações eficazes dos políticos. Hospitais em colapso, profissionais da saúde exauridos, o serviço funenário não dá conta da demanda. Parentes choram a perda de seus entes queridos. Pessoas continuam a não acreditar na real situação e insistem em aglomerações, não usam máscaras. A miséria só cresce no país. Lamentável situação! Apesar de todo esse caos, para manter acessa a chama da esperança e a luz lenitiva das artes, nossos poetas, escritores e colunistas continuam a nos brindar com suas produções literárias. A edição de março é dedicada às mulheres. Nas próximas páginas teremos homenagens, matérias, poemas, e depoimentos de mulheres fortes e corajosas de todos os tempos. Elas nos ensinam a superar situações difícies, a importância do amor ao próximo e a pratica de boas ações. Boa leitura!

Edição 23 - Nº 23 Ano II - Março/2021. A opinião e conceitos emitidos em matérias e colunas assinadas não refletem necessariamente a opinião da revista Escritores brasileiros contemporâneos. Contatos www.editoramatarazzo.com.br www.editoramatarazzo.com Facebook: @editoramatarazzosp Instagram: @editoramatarazzo

Março/2021

Revista pertencente à Editora Matarazzo. Email: versejandocomimagens@gmail. com Telefone: (11) 3991-9506. CNPJ: 22.081.489/0001-06. Distribuição: São Paulo - SP. Diretora responsável: Thais Matarazzo - MTB 65.363/SP. Depto. Marketing: Ana Jalloul (11) 98025-7850 Depto. Jurídico: Tatiane Matarazzo Campos. Periodicidade: mensal. Formato: digital. Capa: nossas counistas!

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EDITORIAL

Escritores brasileiros contemporâneos

EXPEDIENTE

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SUMÁRIO VI aniversário da Editora Matarazzo, 5 Concurso Literário “Zezé Macedo”, 6

No mês internacional em homenagem às mulheres, uma homenagem às nossas colunistas, 42

Carteiros Literários chegam 8 Elisangela Alves Silva

Perfis Mulheres Eunice Coppi, 44 Sandra Regina Alves, 45 Ana Lúcia Lopes Meira, 46 Silvia Rodrigues, 49

Os Palacetes

Contos

ao Jabaquara,

do

Conde Prates

nos antigos cartões postais do

Anhangabaú e curiosas, 11 Geraldo Nunes Um

voz,

suas histórias

teto para encontrar sua

16 Mari Vieira

Poesias

Alfabetização & Gibis, 17 Um dia por vez: Sapatos azuis, 51 Thais Matarazzo A Poesia como escolha, 25 Cynthia Panca Sobre a Síndrome de Down, 29 Noadias Novaes Impelido

mais por dúvidas do

que por certezas,

Atilio Ciraudo

E aconteceu, 23 Regina Brito A dama da água que dança, 24 Newton Nazareth

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Aparecida de Souza Castro, 19 Sandra Regina Alves, 20 Fernanda Luiza, 22 Nazareth Ferrari, 27 Marcinha Costa, 33 Luiz Negrão, 34 Ricardo Hidemi Baba, 28 Ricardo Cardoso, 37 Direito O Indescritível “Mulher”, 38 Gisele Luccas

ser chamado



Nossos livros podem ser encontrados em diversas bibliotecas públicas paulistanas e em outras cidades brasileiras

19 de março de 2021: comemoramos o sexto aniversário da Editora Matarazzo. Em tempos de pandemia, como todos os editores, precisamos nos reinventar para continuar nossas empreitadas literárias. Desde março do ano passado, a demanda por publicações digitais cresceu na editora, mas não abandonamos o impresso. Os eventos presenciais, saraus e lançamentos, tão marcantes em nossa agenda, passaram para o formato online, as famosas “lives”. Naturalmente, não é a mesma coisa, mas se não fosse a internet, não poderíamos desenvolver as atividades virtuais e nos vermos em tempo real. A vantagem das lives é potencializar o público, nos reunimos com escritores, poetas e artistas de outros lugares de mundo. É fascinante! Mesmo assim... Tomara que em 2022 possamos nos encontrar pessoalmente para comemorarmos o 7º aniversário da Matarazzo!


Vem aí...

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O concurso é um projeto do Coletivo São Paulo de Literatura e faz uma homenagem à atriz, comediante e poetisa Zezé Macedo (1910 - 1999). Muitas pessoas se recordarão de Zezé: na década de 1990 ela fazia parte do elenco de alunos da Escolinha do Professor Raimundo, da TV Globo, interpretava a pudica Dona Bela, que dizia: “Ele só pensa naquilo!”. Uma outra face de Zezé Mace-

do foi a poesia. Escrevia poemas desde os 12 anos. Natural de Silva Jardim, interior do Rio de Janeiro, a menina nasceu em uma família abastada e teve pais amorosos. Columbano Santos, pai adotivo de Zezé, era poeta e incentivador do teatro amador na cidade. Chegou a contruir um teatrinho para os atores encenarem peças, algumas escritas pelo próprio Columbano. Zezé desejava ser atriz dramática, mas o destino quis que ela fosse uma cômica. Participou de mais de 100 filmes nacionais, também fez rádio, televisão, teatro e shows por todo o Brasil. Passou por muitas dificuldades na vida e algumas tragédias pessoais, com muita força e apoio familiar, conseguiu superar todos os problemas. Durante toda sua vida, a poesia foi uma constante e escreveu centenas de poemas, uma parte foi publicada em livros, outros apresentados em programas radiofônicos, e ainda existe uma

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Ilustração: Camila Giudice

Concurso literário “Zezé Macedo”

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Capa do livro “A Menina do gato”

Nas próximas edições publicaremos, em capítulos, mais informações e curiosidades sobre a biografia da artista e seu trabalho literário.

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O Concurso O evento será virtual. Os dois gêneros contemplados serão: a poesia e o microconto. O primeiro tema será SUPERAÇÃO, inspirado na trajetória de Zezé Macedo e também refletindo o período que estamos vivenciando com a pandemia do Covid-19. O segundo assunto será ANIMAIS, pois Zezé era apaixonada por bichos, principalmente por gatos. Costumava adotar gatos vira-latas, foi sócia e benemérita da Sociedade União Internacional Protetora dos Animais, SUIPA, no Rio de Janeiro. Fez parte da direção e teve um berçário de cães e gatos resgatados das ruas batizado com o seu nome. Serão contemplados 10 poemas e 10 microcontos, selecionados por um júri especial. A premiação consitirá na entrega de certificados aos ganhadores e a publicação graciosa do poema ou conto na revista Escritores Brasileiros Contemporâneos. Mais detalhes sobre o certame na próxima edição da revista EBC. Em breve o regulamento será publicado página do Coletivo @spliteratura no Facebook, e no Blog: www.coletivoliteratura.blogspot. com/

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boa soma de poemas inéditos. E m 1953 lançou a primeira obra, Coração Profano, sendo um sucesso. Depois vieram: Uma Estrela Caiu, Meu Breviário (1981), A menina do Gato (1997) e Estrelas Azuis (1997).

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As bibliotecas não são organismos isolados da sociedade, são ainda reflexos dos hábitos culturais de um povo e sua história. Os estudiosos da área afirmam que a fórmula ideal das bibliotecas públicas é como um tripé (acervo, mediação e espaço) tendo em vista o território e seus impactos. Porém, de nada vale ter um acervo impecável e um local aconchegante sem a presença de um mediador. A mediação pode

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Elisangela Alves Silva

contribuir como a ponte entre o acervo, o espaço físico e o território, é quem apresenta todas as possibilidades, aguça a curiosidade e ajuda a extrapolar os muros impostos por uma sociedade que olha a leitura destinada a quem tem tempo (bem precioso na fase de imediatismo que vivemos), ou como útil para as provas da vida, para uma finalidade específica, sem enxergar os tijolos e alicerces que a boa leitura constrói ao longo de toda vida. Mas e quando surge uma pandemia cuja necessidade de isolamento se faz urgente para a preservação de vidas? E quando

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C arteiros Literários chegam ao J abaquara

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estamos impossibilitados de acessar o acervo de livros, ou de realizar as atividades básicas como o serviço de empréstimo porque até o papel pode ser condutor de transmissão de vírus? Dilemas de um momento nunca antes imaginado, nem na ficção e, diante de um cenário cuja tecnologia parece ser a solução no combate ao isolamento social, é dado um passo à comunicação de antigamente, que mediava não apenas as palavras, mas também os afetos e trazia as boas-novas. É essa a proposta dos Carteiros Literários, atividade já realizada na Biblioteca Hans Christian Andersen, no bairro do Tatuapé, zona leste da cidade de São Paulo, entre os anos de 2015 e 2017 com a mediação dos artistas da Cia. Núcleo Educatho e posteriormente assumida pela própria equipe da Biblioteca. Contudo, o ano de 2020 trouxe muitos desafios, além da pandemia e todas as implicações houve também uma mudança de residência e desde fevereiro a adição à atuação também como bibliotecária em apoio na Biblioteca Pública Paulo Duarte, no bairro do Jabaquara. Assim, veio à tona a ideia da entrega de poemas nas caixinhas dos correios das casas próximas à Biblioteca, como forma de dialogar com

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mília e no acordo de duas bibliotecárias (Elis da Biblioteca Hans C. Andersen e Bruna Cavalcante da Biblioteca Paulo Duarte), procura manter sobretudo nesse tempo de pandemia um vínculo com o território e a população local, pois como indica Petit (2008, p. 154)1, “um conhecimento, um patrimônio cultural, uma biblioteca, podem se tornar letra morta se ninguém lhe der vida”. Assim, é o momento de lembrar que há uma Biblioteca Pública ansiosa por receber novamente o seu público e mostrar que muito mais que um acervo de livros, há também mediadores, uma abertura para a escrita, a escuta e a leitura potente e sensível.

Elisangela Alves Silva Biblioteca Hans Christian Andersen eBiblioteca Paulo Duarte, São Paulo, SP. eli.alves.silva@gmail.com

1 PETIT, Michele. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva. São Paulo: Editora 34, 2008. 192 p.

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parte da comunidade e não permitir que o equipamento cultural fosse esquecido por seus vizinhos nesse momento de pandemia. É também um modo de colocar a população em contato com poemas e pequenos contos, sem gerar aglomeração ou colocar em risco a população. Além disso, é possível envolver simbolicamente meus filhos de 3 e 6 anos, já que ajudam a decorar os envelopes com desenhos, a fazer a dobradura e na entrega das correspondências-poemas. A biblioteca é o lugar das memórias, onde guardamos nossas histórias, que esse projeto possa fazer que a população vizinha à Biblioteca Paulo Duarte crie novas histórias e relações com esse espaço tão significativo e importante. Que possa aflorar as memórias, o desejo por mais leituras e o registro ou troca de correspondências, já que há sempre um convite para escreverem à Biblioteca. Que os poemas sejam bálsamos aos leitores tal qual, Andersen, patrono da Biblioteca onde o projeto iniciou, fazia ao presentear amigos. Esse projeto, que surgiu na simplicidade do cotidiano em fa-

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São Paulo

de todos os tempos

Geraldo Nunes

C onde

nos antigos cartões

postais do

Anhangabaú

e

suas histórias curiosas

Os prédios gêmeos do Anhangabaú que aparecem nos antigos cartões postais da Pauliceia, trazem a marca de um estilo de construção que a cidade perdeu, o art nouveau. Não ficaram remanescentes, no lugar surgiram arranha-céus também requintados, mas sem o mesmo glamour. Os Palacetes Prates servem de exemplo de como era aristocrática

a São Paulo de antigamente, foram inaugurados em 1911 e durante anos serviram de sede para a Prefeitura Municipal, a Câmara de Vereadores e o Automóvel Clube de São Paulo, cuja história é cheia de curiosidades. No limiar do século 20 surgiram os primeiros carros motorizados em São Paulo. Eram veículos caríssimos trazidos inteiros dentro de navios e que ao serem desembarcados, eram trazidos de trem até a capital paulista. Os proprietários desses carros eram cidadãos requintados e entre eles já existia o espírito de competição. Todos queriam saber quem possuía o carro mais possante ou dirigia melhor em altas velocidades. Além disso, já se reclamava das ruas esburacadas e da falta de rodovias.

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Prates

do

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Os Palacetes

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Jornalista, escritor e blogueiro, participa das publicações da Editora Matarazzo desde 2016.

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vel Clube de São Paulo, em 11 de junho de 1908, antes ainda da construção desses dois palacetes.

empreendedor do setor imobiliário que foi também presidente da Associação Comercial de São Paulo.

A iniciativa de se implantar os prédios “gêmeos”, partiu do conde Eduardo da Silva Prates, um

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Para organizar as competições esportivas e pressionar as autoridades pela melhoria das vias públicas foi inaugurado Automó-

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truía edifícios, custeava reformas como as verificadas na Igreja de Santo Antônio, na Praça do Patriarca. A título de benemerência, se fez mordomo da Santa Casa de Misericórdia. Em sua homenagem os dois prédios passaram a ser chamados de Palacetes Prates.

versidade da Filadélfia, nos espaçosos sobrados também funcionaram a Prefeitura Municipal e a Câmara de Vereadores.

Projetados pelo engenheiro agrônomo Samuel das Neves e seu filho Christiano Stockler das Neves, formado em arquitetura pela Uni-

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Prates era muito bem visto pela população, se preocupava com coisas que os empresários de hoje não levam em conta, como a preservação do patrimônio histórico e cultural. Ao mesmo tempo em que cons-

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fício Matarazzo, inaugurado em 1942. A prefeitura continuou em um dos Palacetes Prates até 1948 e ao se mudar deixou todas as dependências disponíveis para a Câmara de Vereadores que deu ao prédio o nome Palacete Anchieta. Alguns anos depois o Automóvel Clube vendeu seu edifício a uma construtora que após a demolição ergueu no lugar um arranha-céu que levou o nome Edifício Prates. Como os vereadores também buscaram novas instalações, no atual Palácio Anchieta, o segundo palacete veio abaixo em 1969.

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► No lugar se construiu o Edi-

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► Um terceiro prédio do conde Prates, foi inaugurado do outro lado do Viaduto do Chá. A princípio abrigou um hotel, depois recebeu novo inquilino, o jornal Diário da Noite. Só que em 1938 o imóvel foi vendido para o conde Chiquinho Matarazzo. Ele decidiu demolir o prédio antigo e construir um novo para servir aos escritórios de suas empresas. O dono do Diário da Noite, Assis Chateaubriand, não aceitou a ideia de retirar as pesadas rotativas do prédio alugado e se negou a desocupar o recinto. Depois de muitas brigas com ameaças de morte em ambos os lados, Chateaubriand retirou suas máquinas e as transferiu para um edifício próprio na Rua 7 de Abril.

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altura, 10 elevadores e 40 andares. Bem a seu lado está o irmão gêmeo do mesmo tamanho e altura.

A derrubada desses palacetes é apenas um dos tantos casos de demolição já acontecidos nesta cidade e lembrados por Caetano Veloso na letra da música Sampa: “A força da grana que ergue e destrói coisas belas”.

No cartão postal acima, de 1968, ainda aparece um dos palacetes que na época já estava com os seus dias contados. Em São Paulo, as pessoas duram mais tempo que suas casas.

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Agora temos na esquina da Rua Líbero Badaró com Viaduto o Chá, conforme a foto, o Edifício Grande São Paulo, de 128 metros de

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VOZ-LEVANTE Mari Vieira

encontrar sua voz As mortes por Covid-19 atingiram um índice alarmante no Brasil. Ficar em casa mais que recomendação é necessidade para evitarmos a piora do cenário. No entanto, o que seria proteção tem se revelado um sofrimento terrível para muitas mulheres no mundo todo. No Brasil, as denúncias ao 180 subiram cerca de 40%, somados aos números de feminicídios temos uma pandemia dentro da pandemia cujas vítimas são mulheres. As notícias me rememoram Virginia Woolf que afirma “uma mulher precisa ter dinheiro e um teto todo seu, um espaço próprio, se quiser escrever ficção”. A mulher tem essas necessidades para exercer qualquer trabalho, para realizar qualquer conquista, além de sobreviver as demandas do mundo pandêmico. Sob o julgo de companheiros violentos a segurança das mulheres está ainda mais ameaçada durante o confinamento, além de enfrentarem o empobrecimento com a perda de empregos.

O início da vacinação sinaliza para um novo normal, mas, e para as mulheres quando será possível uma vida sem violência? No livro, Quarto de despejo - diário de uma favelada, Carolina Maria de Jesus fala de sua rotina e relata as agressões à algumas vizinhas: “O senhor Alexandre começou a bater na esposa. (...) Ele dava ponta-pé nos filhos. Quando ele ia enforcar a Dona Nena, a Dona Rosa pediu socorro”. Quantas Donas Nenas, neste Brasil de 2021, estão convivendo diariamente com a violência?

Continua na próxima edição.

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teto para

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Um

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Instagram: @amarivieira Facebook: Mari Vieira

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Crônica de Thais Matarazzo Meu primo Márcio Matarazzo é três anos mais velho do que eu. Na infância, nossas famílias eram vizinhas. Ele possuía, na estante da sala de estar da sua casa, uma considerável coleção de gibis: era o meu fascínio!

Como era menor, pedia para ele ler as histórias pra mim. Márcio lia com gosto, até que um dia perdeu a paciência e resolveu que iria me alfabetizar! — Você precisa aprender a ler sozinha! — resolveu o garotinho, no alto dos seus 8 anos. Pegou uma cartilha usada, me apresentou o alfabeto e a juntar as sílabas. Mostrei-me boa aluna, memorizei rapidamente. Tinha 5 anos

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Ilustração: Alexandre de Morais Almeida

Alfabetização & G ibis

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Quando calhava de ver o homem, não aguentava e falava. “– Olha lá o Louco!”. Uma vez, ganhei de algum parente uma moedinha com a estampa do tio Patinhas. Era a pataca número 1, do Banco de Patópolis – moeda valiosa e de estimação do rico e avarento pato, pois foi a primeira que ele ganhou na vida aos 10 anos, quando vivia na Escócia, sua terra natal. Ela ficava deitada em uma almofada e coberta por uma cúpula de vidro. Mesmo tendo somente um valor sentimental, vários personagens queriam pegá-la, pois a consideravam um talismã, Pato Donald, Huguinho, Zezinho, Luisinho, Gastão e a Maga Patalójika. Entre muitas histórias e gibis, guardo essa moedinha até hoje. Eu amava passar em frente das bancas de jornal! Minha mãe sempre repetia “prefira os livros!”. Bah, que nada. A leitura das histórias em quadrinhos em nada prejudicou minha alfabetização, pelo contrário, despertava a curiosidade e o desejo de aprender mais. Soltou minha imaginação! Depois da leitura, eu recortava as tirinhas, os personagens, os cenários, e colava-os em um caderno ou folha de sulfite, inventando novos enredos, à minha maneira. Acredito que já ensaiava para ser escritora no futuro!

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e estava empolgada com a descoberta da leitura. Não demorei e passei a treinar a leitura nos gibis da Turma da Mônica e do Tio Patinhos, os meus preferidos. Na minha casa, tínhamos alguns livros infantis, também passei a lê -los. Não queria ajuda, só quando tropeçava em algum novo vocábulo. Aliás, passei a ler tudo o que achava: revista, jornal, propagandas, outdoors. Quando passava em frente a uma banca de jornal, pedia gibis, minha mãe achava que ler revista em quadrinhos não era bom e não comprava. Ai de mim! O negócio era recorrer ao primo. Ele ficava furioso, não queria me emprestar, então eu pegava escondido e depois devolvia. Mas se ele dava falta... começava a briga. Um dia, falou muito sério para minha mãe: — Ô tia Ia — assim os sobrinhos a chamam — vê se compra gibis pra sua filha lá na banca. Ela vem aqui e pega os meus. Deixa de ser “mão de vaca”! — aquela “bronca” surtiu efeito. Mamãe passou a comprar semanalmente quadrinhos variados. Foi uma festa! Eu gostava muito das edições do Chico Bento e do Cebolinha. Tinha um homem que morava aqui no bairro que parecia o personagem Louco, o cabelo era igualzinho!

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Série Prosa poética – Mulher

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O tempo das mulheres é o tempo que vai e vem, se entrelaça no universo feito seus cabelos sob diversos olhares e valores em quebra de dores. Valores construídos por conceitos e preconceitos vencidos pelo poder da fala que vai muito além da queima de sutiãs, luta por direitos igualitários que acarretaram uma carga horária de três turnos nada eleitos. Atuação dinâmica, parceira e empreendedora, todas as mulheres merecem comemorar a força transformadora que o tempo lhe dá em seu caminho de cada dia. Seja para a esquerda ou para a direita, cada mulher segue e planta sua história onde colhe uma diversidade de vitória e flor. Tempo da mulher, é de colheita na estrada da vida sem fronteira mas que levam ao sentido humano e plural da essência feminina de uma pele sem cor.

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Aparecida de Sousa Castro

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Poemas

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Somos a força Que enleva a determinação, Somos medo, coragem, evolução Empoderamento Movimento e ação Somos ternura, amor e afeto Família em primeiro lugar Somos graça O dom divino da existência O milagre da vida Nascemos de uma mulher guerreira Nossa maior referência Somos acolhedora, amorosa Bondosa, caridosa, corajosa

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MULHER, SOMOS

Somos a essência Que gera vida Independe do gênero Que no ventre abriga Somos flor, com ou sem espinho, Somos beleza, doce, delicada, sensível Quando necessário Somos amarga, dura, implacável Impossível! Somos o sonho e a realidade Que se divide ao longo do tempo Somos resistência! Vivemos na raça Na luta e batalha diárias Sobrevivemos Com muita fé Resistimos! Batemos no peito Exigimos respeito A equidade dos direitos A liberdade de escolha Sororidade - irmandade Juntas somos mais fortes Somos a união

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Sandra Regina Alves Poeta, cantora e compositora @sandraamoura5@gmail.com

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Herdamos a força que esmera A força de quem gera, Que vem da dor do parir Do ato libertador Da luz do existir Herdamos a força que esmera De quem também não gera Estado permanece lutador Vem do intuir Já nascemos assim Referências Marias De todas a cores Reverberam-se dia a dia Reagindo e resistindo protagonizando a vida Ama, cria, trabalha Batalha pelo espaço merecido Lava o corpo e a alma abusada No rosto, lágrimas derramadas Acuada, imobilizada Nas mãos, De quem não aceita a gana Que nela inflama Se cai, logo levanta Enfrenta o desafeto E todo desencanto Mulher, somos... Diferentes e ao mesmo tempo iguais Representamos A força que herdamos

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HERDAMOS

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que não se desmancha com o tempo Somos transformação A esperança um dia almejada Pelas mulheres que vieram antes Somos transformação Atitude e perseverança Somos fera, Quando se trata de filho Somos ferida Que se alastra pelo corpo Somos as marcas da violência Em suas várias vertentes Somos o grito Muitas vezes calado porém, retumbante Somos diferentes sim, mais, iguais na luta Mulher, somos!

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O usado A mor *

* No mês destinado a luta das mulheres pela igualdade de gênero, lembremos das amizades sinceras que encontramos no caminhar de nossa existência. Um poema a todas as mulheres que são capazes de acreditar em outras mulheres.

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Os escritos desse poema Foi gestado por outra mulher. Ao contemplar com profundo afeto Uma amiga levada ao chão. Ao olhar irmã preta em prantos Acolheu as lágrimas caídas. Recomendação? Por que não escreve? Falou com amor sem medida. As palavras desse ousado amor, capaz de sentir, transformar, brotou nas mãos retintas que escreve O desejo de sonhar. O sonho, virou linhas secando as lágrimas caídas. Nasceu do amor confiança, o poema da amizade fraterna. Fraternidade imanada, que além de acolher, É capaz de ACREDITAR.

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F ernanda L uiza

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E

aconteceu ...

R egina B rito C oletivo C ultural B orboletas V oadoras

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... foram anos vividos, dias de carícias e promessas. Quanta alegria! Ao longe todos poderiam escutar seus “ais” de prazer e ardor. Convive-se; pensa que se conhecem todos os sinais daquele corpo altivo e depois a decepção mórbida. Ele não a merecia e ela nada sabia... Em um determinado dia ele a feriu por dentro e por fora. Ela defendeu-se como podia, mas não tinha um álibi. Resolvera fugir, correr, subir morros e descer trilhas sem deixar rastros. Queria achar a saída. Encontrar a luz e encontrar-se. Meio perdida, até que uma mão forte e viril a salva. Surgiu a luz que faltava, a voz que a acalentava e a salvaria e um novo horizonte se abriu. Era o poeta que a acolheu com amor, carinho e poesia.

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Ali perdida entre os arbustos, trêmula, acovardada, insegura e impura. Ninguém para salvá-la! Quanta culpa carregava em sua bagagem pesada.

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dama da água que dança

N ewton N azareth Que poderia fazer? Eu só pude observar. E a música vinha a mim. Mulher imersa no mar. Mulher que era só encanto, Alma que aprendeu tanto E tanto tem a derramar.

Por mim Ficava sempre assim: Eu a olhava, Ela flutuava só pra mim.

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A música ainda vem, A água ainda dança.

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Fêmea que pariu seu destino Partilhando desafios Com seu novo par.

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O ano de 2020 foi um ano de superação para muitas pessoas. Superação ao inesperado, ao novo e aos desafios apresentados. A forma como um vírus mortal se apresentou ao mundo, desafiando todos a mudarem seus hábitos e costumes, fazendo-nos reféns das incertezas, máscaras, álcool gel, aprisionando-nos em nossos lares, foi brutal. Para aqueles que vêm se preparando há algum tempo, para receber a tão almejada Nova Era, acredito que a adaptação às mudanças estejam sendo mais brandas, conscientes, do que para aqueles que ainda vivem como robôs num mundo sem cor. E aqui, valha-me uma ressalva, dizendo que não se trata de julgamento, mas mera constatação, diante da observação dos fatos.

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Por Cynthia Panca

Observo que, nós viventes conscientes lidamos com a adversidade de um modo mais tranquilo, por sermos livres, enquanto que aqueles que seguem a massa ainda estão procurando uma solução fora de si. Sou poetisa e terapeuta quântica, quando cheguei da Índia ao Brasil em Abril de 2020 (ápice da epidemia), sem emprego, sem casa, mas com muitos projetos e sonhos dentro de mim. Incentivada por meu mentor, o produtor cultural Fábio Luiz Salgado, criei o Curso POETERIA Poesia e Terapia, hoje disponível na plataforma digital Hotmart, assim como iniciei o processo de criação do livro de contos infanto juvenis Conto-te Encantos, posteriormente, veio o Viva Fluida (um SPA Digital para corpo, mente e espírito). De forma consciente continuei meu trabalho como poetisa e terapeuta quântica, contando com a ajuda da meditação, da poesia e dos bons relacionamentos para manter e elevar as energias de alegria, amor e gratidão. Em pouco mais de 7 meses, dois de meus projetos foram contemplados pela Lei Federal Emergencial à Cultura n° 14.017, lei Aldir Blanc: o livro de contos infanto juvenis Conto-te Encantos, publicado pela Editora Matarazzo, com ilustração na capa de Camila Giudice e o Sarau Poético Flores em Nós (parte 2). O livro de contos Conto-te Encantos traz 20 contos, a maioria escritos

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como escolha

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A Poesia

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Instagram @cynthiapancavivafluida

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Cynthia Panca WhatsApp +55 (13) 99783-3109 Facebook.com/cynthia.mpanca

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Contatos

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na minha adolescência, durante as aulas de redação de língua portuguesa. Os textos mostram como a arte e a cultura são importantes e benéficas na formação de crianças e jovens como cidadãos conscientes e engajados na construção de um mundo melhor, assim como as aulas de Filosofia e Educação Moral e Cívica, na formação dos valores sociais. O e-book Conto-Te Encantos encontra-se disponível na plataforma Amazon. O Sarau Poético Flores em Nós (parte 2), traz poesias autorais minhas e, também, das poetisas Ana Rosa Zuffo e Silvana Souza, além de músicas autorais dos violonistas Luiz Mateus e Thiago Moura e fotografias de Daura Menezes. As apresentações mostram a importância do uso consciente das redes e mídias sociais para levar o bem, o belo e a verdade às pessoas,

nesse momento de isolamento social. O Curso POETERIA Poesia e Terapia em breve será disponibilizado, também, à população do município de Santos, SP, através de aulas gratuitas nas plataformas da Fábrica Cultural da cidade. Momentos de superação, foco e dedicação somaram-se ao prazer de trabalhar pela arte, acima de tudo pela arte de promover a beleza ao mundo, fazendo o que se ama com todo coração. Comece por você, desenhando seus pensamentos, observando seus hábitos, emoções, sentimentos, busque ajuda e abra-se à novas possibilidades e habilidades. NAMASTE

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Nazareth Ferrari Natural de Taubaté, SP. É pintora, escultora, escritora, professora, Pós-Graduada em História da Arte, Engenheira Civil e Membro Titular da Academia Valeparaibana de Letras e Artes. Conquistou inúmeros prêmios em literatura e artes visuais, possuindo obras na Alemanha e na França.


C horo

de

E sperança

Ricardo Hidemi Baba

De repente, as redes sociais se inundaram de luto O choro se tornou profundo e absoluto Estamos morrendo! Estamos nos desumanizando! Não é questão de força, mas de humanidade! Há uma pilha de mortos e há discursos minimizan-

Precisamos de todos, precisamos de empatia e solidariedade! Esta noite, chorei! Chorei por acreditar que pode ser diferente! Se estas lágrimas secarem, meu coração estará endurecido e descrente!

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sidade!

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Precisamos de todos e há discursos contra a diver-

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do!

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Sobre a Síndrome de Down Noadias Novaes Professora AEE e amante da inclusão Email: noaquimica@gmail.com

Pessoas com Síndrome de Down podem falar – Mito ou verdade? Verdade. As pessoas com Síndrome de Down não apresentam barreiras para acessar o código da

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Síndrome de Down tem cura – Mito ou verdade? Mito. “A Síndrome de Down não é uma lesão ou doença crônica que através de intervenção cirúrgica, tratamento ou qualquer outro procedimento possa se modificar”.

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Você sabia que 21 de março é o Dia Internacional da Síndrome de Down? O dia foi criado para celebrar a vida das pessoas que tem essa condição genética e para garantir que elas tenham as mesmas liberdades e oportunidades que todas as pessoas. Entretanto, a escolha desta data 21 de março (21/3) se refere às 3 cópias do cromossomo 21 que as pessoas com síndrome de Down possui. Com isso, por sugestão do geneticista Stylianos E. Antonarakis, da Universidade de Genebra, e pela iniciativa do Brasil, que em 2012, a ONU reconheceu a celebração em seu calendário oficial. Por tanto, um das formas de diminuirmos o preconceito e respeitar o considerável “diferente” é conhecermos algo sobre. Para isto, prepa-

Síndrome de Down é uma doença – Mito ou verdade? Mito. A Síndrome de Down é uma alteração genética causada pela presença de um cromossomo a mais (o par 21). Por isso também é chamada de como trissomia 21. Não deve ser tratada como doença, é preciso olhar para as pessoas além das características da Síndrome.

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rei alguns Mitos e Verdades sobre esta síndrome. Confira abaixo:

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linguagem, sendo assim, todas as crianças (se não apresentam outros tipos de comprometimentos), podem falar.

que irão determinar quando e como uma criança começará a falar são muitos, como: estimulação, características de cada indivíduo, entre outros.

As pessoas com Síndrome de Down apresentam atraso no desenvolvimento da linguagem – Mito ou verdade? Verdade. Ao longo da infância e com o surgimento das primeiras palavras e frases, pode-se observar certo atraso no desenvolvimento da linguagem e também dificuldade articulatória para emitir determinados sons. Os fatores, porém,

Pessoas com Síndrome de Down são carinhosas – Mito ou verdade? Mito. Segue o mesmo pressuposto da questão acima. Além do que, muitas pessoas acreditam que os indivíduos com Síndrome de Down são extremamente carinhosos pelo fato de associa-los às crianças, infantilizando-os e mantendo-os em uma “eterna infância”.

nº.23 Escritores brasileiros contemporâneos

Ilustração da Artista Plástica Camila Giudice, onde retrata a empatia da professora com seus dois alunos com Síndrome de Down.

Pessoas com Síndrome de Down são agressivas – Mito ou verdade? Mito. Assim como todas as outras pessoas, o temperamento e comportamento são influenciado por diversos fatores, como ambiente familiar, meio em que vive e frequenta, acontecimentos vivenciados, personalidade, entre outros.

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Pessoas com Síndrome de Down podem andar – Mito ou verdade? Verdade. Entretanto, pode-se observar também certo atraso no desenvolvimento motor em relação à maioria das crianças.

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Pessoas com Síndrome de Down podem trabalhar – Mito ou verdade? Verdade. Assim como para todas as pessoas, o trabalho faz parte da formação da identidade adulta, por isso, quem tem Síndrome de Down pode e deve trabalhar.

Existe uma idade ideal para a criança com Síndrome de Down entrar para a escola – Mito ou verdade? Mito. “A criança deve entrar na escola quando for conveniente para ela e para sua família.”

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Pessoas com Síndrome de Down devem frequentar escola especial – Mito ou verdade? Mito. As pessoas com Síndrome de Down tem direito de participação em todos os âmbitos da sociedade e a escola é a representação da sociedade em geral. Assim, devem estar incluídas na rede regular de ensino e esta deve estar preparada para tal.

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Pessoas com Síndrome de Down podem adoecer mais – Mito ou verdade? Verdade. Por conta de uma resistência imunológica mais baixa, as crianças com Síndrome de Down, especialmente nos primeiros anos de vida, podem ser mais suscetíveis a infecções, principalmente no sistema respiratório e digestivo. Com o passar dos anos e com o crescimento da criança, esta propensão diminui.

Estudante Carlos Eduardo da EEB Alonso Pinto de Castro, localizada no sertão do município de Itapipoca no Ceará. Foto: Vaguinho Fotografia

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Pessoas com Síndrome de Down tem a sexualidade mais aflorada – Mito ou verdade? Mito. O que acontece é que em muitos casos, as pessoas com Síndrome de Down não recebem orientação sexual adequada, tendo sua sexualidade reprimida e algumas vezes ocasionando comportamentos considerados inapropriados. A sexualidade de quem tem Síndrome de Down, porém, é exatamente igual à de todas as outras pessoas.

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Pessoas com Síndrome de Down podem praticar esporte – Mito ou verdade? Verdade. As atividades físicas são essenciais para o bem estar físico e emocional, não só das pessoas com Síndrome de Down, mas para todos. Pode ser realizada onde for mais conveniente para a pessoa (academia, parques, etc) e sempre com uma avaliação física prévia, assim como deve ser para todos.

E aí gostaram ? Vamos compartilhar empatia e o conhecimento para diminuirmos o preconceito e o capacitismo. Abraços inclusivos e não esqueçam de me repassar aquele feed back e sugestões para as próximas edições!! Até mais!!!

♥♥♥

Estudante Diogo Rodrigues da EEB Alonso Pinto de Castro, localizada no sertão do município de Itapipoca no Ceará. Foto: Vaguinho Fotografia

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As pessoas com Síndrome de Down só se comunicam através da fala – Mito ou verdade? Mito. A comunicação ocorre normalmente através de gestos, ex-

pressões faciais e corporais, choro e escrita, além da fala. “Para haver comunicação é necessário estar numa relação onde seu desejo é reconhecido e respeitado”.

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De Alma Limpa M arcinha C osta Na estante empoeirada os objetos se escondem, porta retratos e enfeites somem.

Marcinha Costa: Baiana de Feira de Santana. Caçula de quatro irmãs.

Atriz, professora da Rede pública, mestra em Estudos literários com ênfase em Literatura preta africana / moçambicana (UEFS). Publica poemas em coletâneas. Mulher preta em constante transformação. marcianeide@gmail.com Instagram: @marcinha1407

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Diante das impurezas que vejo percebo que minha autoestima jamais será suja e meu amor-próprio jamais será imundo.

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Não permito que a poeira do mundo invada meu peito, corpo e mente. Não permito que meus sonhos sejam cobertos de poeira diariamente.

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Sem pressa, retiro as impurezas dos móveis. Mas a limpeza da alma é a prática constante.

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P oemas L uiz N egrão

ODE À JUSTIÇA* Ó Justiça, que o coração das pessoas acalenta Dá a esperança de melhores dias

*Homenagem a Bruna Carbonel da Silva (1986-2020)

Pezinhos descalços Antes direita depois esquerda A espada corta o vazio falso Com o Ki e o jeito berda Nem a sombra no encalço Kataná, naginata, kaiken, arco e flecha com cerdas Pela Casa, Família e Honra supera percalços A Mulher Samurai luta até o fim – sem perda!

Luiz Negrão Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito (EPD), publicou os textos históricos: “125 do Café Jardim”, “Homenagem do Dia do Patrono do Fórum de Artur Nogueira e “A atuação do Ministério Público no Caso Emeric Levai”.

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ONNA BUGEISHA

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Da mãe o X e outros cromossomos, Com testosterona e estrógeno somos Vida, dignidade, integridade física Também a psíquica, Nome, projeto de vida, confiança, respeito, Amor, Sem causar dor, Proteção contra toda a espécie de violência, Em especial, a política Poder ser crítica Ter voz e liberdade sobre o próprio corpo O lar como lugar seguro E não, como leito de morte Ter acesso à Saúde e à Educação, Estudar, escrever e ser lida Sobre sua experiência vivida Ter direito a ter direitos É o mínimo todos os dias a ser feito.

Que a Humanidade intenta Envolvendo riscos e ousadia!

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LEGÍTIMA DEFESA DAS MULHERES

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Impelido mais por dúvidas do que por certezas

* atiliociraudo@gmail.com nas dúvidas as certezas que buscam caminhos.

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Vamos? Seria por insistência que venceria todos os pedidos, assim como que nada mais poderia ser feito? Incluir em todos os momentos, todas as situações, sempre que o motivo levasse a se isolarem? Tinha o cuidado de não se expor para que a intenção ficasse somente naquele nível básico, se for, seremos um a complementar o outro. Mas existia muita sutileza nos atos, nas palavras, que até em si embaralhava os sentidos. O que sentia ainda estava indefinido, era algo novo, mas a sensação já era por demais conhecida, leves, porém determinantes para aquele propósito, que ia além do que imaginava poder ser. Às vezes minguavam as esperanças, era ilusória a idéia de que aquilo estava acontecendo sem que nada levasse ao concreto. Sabia que poderia ir além, mas prendia para que no momento oportuno as coisas surgissem com mais clareza, na-

turalmente assim visse que estava acontecendo não por medo, mas por pudor de quanto delicado assim via. Certeza não teria se não passasse do jogo de pequenas e poucas palavras, algumas chaves, porém dúbias para o lance que poderia ser definitivo e se chegar à reta final. Algumas vezes pensava em recuar, passar por cima e concluir que tudo não foi mais do que uma fantasia, mas não era chegado a se entregar sem ver claro o que buscava, mesmo se o resultado viesse de uma forma imprópria, triste ou dolorosa. Vivia a angústia do tempo. Tempo de espera, tempo de ausência, tempo de presença que limitado era insuficiente por demais para expor os seus anseios e desejos. Sabia que estavam próximas as respostas daquilo que buscava, se é que sabia, e que mais temia era que na insistência do vamos, nunca viesse a acontecer.

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caminho foi traçado A rota coube a ambos O destino, a mim, que cri em ilusões.

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Atilio Ciraudo*

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M ulher

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De tudo que és belo, És tu mulher Mulher, tua beleza é como um pôr do sol, Irradia o anoitecer Mulher, tu atordoa como um cálice Dos mais raros dos vinhos Mulher, teu perfume é como um Jardim de rosas, capaz de seduzir Mulher, tu és frágil como um beija flor, Porém forte o bastante para ser mãe Mulher, tu amas e será amada Pois tu és mulher.

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R icardo C ardoso

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1) Amélia Earht (1897-1939), foi a primeira mulher a voar sozinha sob o oceano atlântico. Por sua proeza recebeu a Cruz de Voo Distinto, uma condecoração militar atribuída a atos de heroísmo e bravura, concedida pelas Forças Aéreas dos EUA.

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Ao longo da história, as mulheres conseguiram alcançar direitos e ocupar lugares, até então, pertencente apenas aos homens. Esse período foi marcado por profundo preconceito, discriminação e menosprezo, lamentavelmente, ainda existente. A incansável luta por igualdade social, salarial e respeito à sua sexualidade, renderam as mulheres um empoderamento fenomenal, não só no Brasil, como no mundo. Dentre tantas qualidades que uma mulher possui, destaca-se sua de-

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Dra. Gisele Luccas

terminação inabalável quando foca um objetivo, sem que para isso, perca sua ternura. Em homenagem ao mês dedicado às mulheres, necessário falar de algumas delas e seus feitos extraordinários, dignos de aplausos, incentivo e exemplo a ser seguido. Algumas são muito conhecidas, outras nem tanto, mas em comum todas elas possuem um imenso VALOR!

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O INDESCRITÍVEL SER CHAMADO “ MULHER”

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8) Anita Garibaldi (1821-1849). Foi combatente da Revolução Farroupilha e da Unificação da Itália. Sua garra e determinação inspiraram 2 cidades em Santa Catarina a homenageá-la com os nomes de Anita Garibaldi e Anitópolis. 9) Marie Curie (1867-1934). A cientista polonesa foi responsável pela descoberta de dois elementos da Tabela Periódica (Polônio e Radio), bem como descobriu e cunhou a Teoria da Relatividade. Foi a primeira mulher a receber por duas vezes o Prêmio Nobel. 10) Maria da Penha (1945). Lidera o movimento pela defesa dos direitos das mulheres. Foi vítima de violência doméstica perpetrada por seu ex marido, que a deixou paraplégica. A Lei Maria da Penha recebeu seu nome, como uma homenagem por sua incansável luta visando a condenação de seu agressor. 11) Malala Yousafzai (1997). A mulher mais jovem a receber o Prêmio Nobel da Paz, com apenas 17 anos. Conhecida por sua luta para que mulheres e crianças paquistanesas tivessem direito a educação, o que não era permitido no Regime Talibã. 12) Anne Frank. A escritora judia relata com brilhantismo todo sofrimento de sua família,

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2) Joana D’Arc. De origem francesa, passou de camponesa analfabeta à Chefe de um Exército durante a Guerra dos 100 anos. Foi executada como herege em 1431 e canonizada Santa pela Igreja Católica em 1920. 3) Margaret Thatcher. Conhecida como a “Dama de Ferro”, foi a primeira mulher a ocupar o cargo de Primeira Ministra do Reino Unido. 4) Rosa Parks (1913-2005) foi ativista símbolo do movimento dos Direitos Civis dos Negros nos EUA. 5) Yoani Sanches (1975). É jornalista e luta pela liberdade de expressão em Cuba, cuja política é centralizada no Partido Comunista Cubano. Ela tornou-se voz importante na reaproximação entre Cuba e EUA. 6) Madre Tereza de Calcutá (1910-1997). Dedicou sua vida a cuidar dos mais pobres. Recebeu o Nobel da Paz em 1979. É fundadora da Congregação Missionárias da Caridade, atualmente presente em 139 Países. Foi canonizada em 2016 pelo Papa Francisco. 7) Valentina Tereshkova (1937). Foi a primeira mulher a ir ao espaço. A Rússia concedeu-lhe duas Condecorações Nacionais – a Ordem de Lenin e Herói da União Soviética.

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medicina com especialização em pediatria. Era irmã do Arcebispo de São Paulo Dom Evaristo Arns. Destacou-se por sua ferrenha oposição à Ditadura Militar. 18) Cora Coralina. Seu verdadeiro nome era Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas. Usava o pseudônimo de Cora Coralina. É reconhecida como uma das poetisas mais importantes da literatura nacional. Seu livro foi publicado, pela primeira vez, quando a mesma tinha 76 anos. 19) Irmã Dulce. Dedicou toda sua vida a ajudar os mais necessitados, sendo grande ativista humanitária. Seu verdadeiro nome era Maria Rita de Sousa Brito Lopes. Fundadora de diversas instituições filantrópicas, foi indicada ao Nobel da Paz em 1988. Beatificada pelo Vaticano, tornou-se a primeira Santa nascida no Brasil. 20) Gladys West. Conhecida como a “Mãe do GPS”, trabalhou como babá para custear seus estudos. Apesar de sua inegável contribuição para a humanidade, seus méritos só foram reconhecidos no final de sua vida. Gladys foi incluída no Hall da Fama dos Pioneiros do Espaço e Mísseis da Força Aérea dos EUA. 21) Thais Matarazzo. É escritora, tendo lançado recentemente

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enquanto escondidos dos Nazistas. Sua obra, mundialmente conhecida é intitulada como “O Diário de Anne Frank”. 13) Nadia Comaneci. Foi a primeira mulher a conseguir nota 10 em Ginástica Olímpica, durante os Jogos Olímpicos, pelo reconhecimento da perfeição de seus movimentos. Tornou-se uma lenda no esporte. 14) Princesa Isabel (1846-1921). A Princesa Imperial do Brasil era filha do Imperador Dom Pedro II. Em 1888 trava incessante luta política e assina a “Lei Áurea”, acabando com o trabalho escravo no Brasil. 15) Tarsila do Amaral foi pintora e integrante do Movimento Modernismo no Brasil. Sua obra mais conhecida e mais cara, de um artista brasileiro, é “Abapurú”, dedicado a seu namorado Oswald de Andrade em 1928. 16) Enedida Alves Marques (1913-1981). Foi a primeira mulher negra brasileira a formar-se em Engenharia na década de 40. Também foi a única mulher a compor a equipe de engenheiros responsáveis pela construção da Usina Hidrelétrica Capivarí, no Paraná. 17) Zilda Arns (1934-2010). Conhecida como Fundadora da Pastoral da Criança, formou-se em

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É Advogada, Especialista em Direito Médico, Pós Graduada em Perícia Criminal e Ciências Forenses, Capacitação em Psicopatologia Forense, Mediadora Judicial e Privada cadastrada no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Palestrante, Colunista, Mestranda em Psicologia Criminal / Especialização Psicologia Forense (Universidad Europeia Del Atlântico - Espanha).

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Dra. Gisele Luccas

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sua belíssima obra “Alegria e Gratidão: Palavras de um coração”. Narra o seu drama vivido e a forma valente e otimista quanto a seu enfrentamento. Mais do que isso, a autora nos ensina que o Dom da Vida é profundamente belo, como o por do sol visto do alto de uma colina e rodeado por uma plantação de lírios. 22) Maria Luiza Ferreira do Nascimento. Conhecida como “Dona Luiza”, é catadora de lixo e mãe de Alcides Nascimento Lins, de 22 anos. Seu filho Alcides cursava Biomedicina na Universidade Federal de Pernambuco e jamais frequentou escola particular. Dona Luiza recolhia o lixo para ajudar seu filho nos estudos e compra de livros, que para orgulho da mãe, era considerado um aluno exemplar. Meses antes de formar-se na Universidade, Alcides foi assassinado, com tiros na cabeça, ao ser confundido com um traficante. E assim, Dona Luiza escutou o som do “adeus”. Como dizia o filho de Lucinha Araújo, mais conhecido como “Cazuza”: SÓ AS MÃES SÃO FELIZES, POIS SÓ ELAS PODEM DAR A VIDA ). Parabéns a todas nós Mulheres!!!!

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Prestamos

uma homenagem às nossas

colunistas : mulheres guerreiras , escritoras , poetas , artistas , mães , profissionais competentes e compromissadas !


Instagram: @eunicecoppi Facebook: @eunicecoppi

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A artista plásica é nascida em Sabará, Minas Gerais. Atualmente reside em São José dos Campos, interior paulista. Os bonecos de Eunice são conhecidos em todo o Brasil. Causam fascínio à primeira vista! Sua arte traduz fragmentos vivenciados e observados em sua infância e adolescência mineira. Sua veia popular e artesã é um desdobramento da ancestralidade das mulheres fortes de sua família. Eunice nos conta que durante este um ano de pandemia produziu diversas séries. Seu foco de produção são sempre as exposições em equipamentos de cultura. Sua casa é um encanto! Por todos os lados reina sua arte: são máscaras, pinturas, bonecos de papel e gesso, entre outras peça. Gosta muito de plantas e flores, que também emolduram o ambiente. Seu material de trabalho são papel, goma de polvilho azedo, tinta látex e verniz. Utiliza a técnica do empapelamento. Prepara a goma com polvilho azedo e embebeda diversos tipos de papéis com técnica de rolete, amassados ou colados. Modela as peças de acordo com seus personagens desejados e pinta com tinta e verniz. Contatos (12) 997376157

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Foto: Geraldo Coppi

Eunice C oppi

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Contatos

sandraamoura5@gmail.com Instagram @ sandrareginaalvessamba

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Cantora, intérprete, compositora, poetisa e coralista. Iniciou a carreira musical há mais de vinte anos cantando em corais. Cantora de Samba e MPB, participou de festivais, shows, eventos, gravações em estúdio de CD’s, como corista - Integrante do Coletivo Damas no Samba Compositora e Poetisa Membro do Clube Caiubi de Compositores - onde muitos poemas foram musicados em parcerias - Dentro do cenário do samba paulistano, possui importantes parcerias - Amante de concursos literários, possui alguns poemas lançados em antologias - Utiliza as redes sociais para publicar e divulgar sua arte. - Atualmente é colaboradora da Revista Escritores Brasileiros Contemporâneos. Perguntamos à Sandra como a suacontribuição artística reflete na vida das pessoas? “Nesse período difícil, que ainda vivemos, a única alternativa foram as Lives. Abusei da sensibilidade e interpretação. Levei um pouco de leveza, esperança, alegria, para a alma e coração das pessoas, que se deixaram ser tocadas pela minha arte. Recebi em troca, amor, e muita leveza também, para poder prosseguir com a minha missão, que é tocar corações, com a minha música e poesia. Só gratidão. A arte salva!”, nos conta.

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S andra R egina A lves

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sobre algo que lhe chamou atenção em um livro. Ao longo da minha jornada profissional e pessoal, vivenciei inúmeras situações que me confirmaram a riqueza que é trabalhar com a socialização leitora. Só para ilustrar, desejo compartilhar um episódio que vivi em uma viagem de metrô, aqui em São Paulo: estava sentada, compenetrada na leitura do Romance do Cárcere, de Nikolai Bukharin, quando um passageiro interrompeu a minha leitura para dizer o quanto havia gostado do livro. Ele falou dos trechos iniciais da obra e

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Sou Ana Lúcia Lopes Meira, mulher negra, nascida em São Paulo, habitante deste mundo desde 1967. Sou a segunda filha de uma família de nove irmãos e mãe de uma linda jovem. Trabalho em bibliotecas há quase 30 anos e me sinto feliz em compartilhar narrativas e trocar experiências. Acredito na leitura como uma força transformadora que propicia o desenvolvimento do ser humano. Penso que a beleza do texto literário está em despertar no leitor o desejo de convidar alguém para conversar

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Ana Lúcia Lopes Meira

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criado em março de 2020 no Youtube pelos bibliotecários que atuam nos CEUs. O objetivo era adaptar nossas atividades cotidianas para o ambiente digital. Aos poucos, também se promoveram encontros virtuais para formação com os professores das Unidades Educacionais, como as rodas de conversa sobre os livros Gabriela: semeadora de encantos poéticos, de Thaís Matarazzo, e Balado da estrela e outros poemas de Gabriela Mistral, tradução de Léo Cunha. O motivo deste encontro foi prepará -los para outro desafio cultural digital, a Festa Literária da Penha - FliPenha 2020. Em sua terceira edição, os eventos seriam realizados virtualmente e teria Gabriela Mistral como uma das homenageadas. As rodas de conversa com os professores nos permitiram dialogar sobre literatura, território, exclusão. Possibilitou também falarmos sobre nossos sentimentos frente ao distanciamento social e da saudade dos alunos. A interação com os professores foi muito importante para compartilhar fontes literárias. Por meio do Whatsapp foi distribuído o livro Gabriela: Semeadora de encantos poéticos (formato digital gratuito) e o vídeo de Leituras Divertidas, com poesias da Gabriela Mistral. O material paradidático foi direcionado aos alunos e suas famílias. Conversei sobre exemplos de solidariedade

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por duas vezes, feliz, disse: “Nossa, você está lendo Bukharin”! Na hora pensei na biblioteca onde eu trabalhava e como lá era comum os frequentadores conversarem sobre suas leituras. Infelizmente, as conversas sobre livros e leituras, situação solidificada na relação entre bibliotecários e frequentadores naquele ambiente, tornou-se inviável a partir de março de 2020. Os espaços tiveram que ser fisicamente fechados por causa do coronavírus. Nessa hora, passou um filme na minha mente de todos os anos trabalhados em bibliotecas e me deparei numa situação adversa, como todo o mundo. Comecei a formular diversas questões sobre a biblioteca “Dr. Dirceu De Paula Brasil” do Centro Educacional Unificado - CEU Tiquatira. Como continuar o trabalho de mediação de leitura por meio das plataformas digitais? Como o conteúdo chegaria às crianças da comunidade que frequentavam a biblioteca? Precisei, portanto, elaborar um plano de trabalho para iniciar as atividades remotas. Uma das propostas foi a criação da página da biblioteca no Facebook. Ela deveria ser alimentada com o conteúdo previsto no Plano de Ação da Biblioteca 2020. A Exposição Temática, antes realizada presencialmente, passou a ser publicada nas redes sociais. Outra iniciativa, foi o Canal BiblioCEU,

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acolheram a minha pessoa no campo da literatura, então não poderia deixar de citá-los: Thaís Matarazzo (escritora e jornalista), Sandra Trabucco Valenzuela (pesquisadora, escritora, professora) e Victor Barrionuevo (escritor, professor, editor e livreiro), a frase “Uma mesa com Gigantes” escrita no comentário por um dos internautas no momento da transmissão, sintetiza toda a minha emoção em estar fazendo a mediação da mesa. Penso que a FliPenha de 2020 foi uma linha mestra na travessia frente a crise pandêmica, se não fosse a relação entre pessoas e a paixão pela literatura, talvez não teria acontecido. Em situação de adversidade as características próprias de cada pessoa norteiam os seus passos para fazer a travessia. Acreditar no desenvolvimento humano por meio da literatura foi a mola motivadora que levou as pessoas participarem do evento. Carrego sempre comigo o sentimento de gratidão a minha família, aos amigos, colegas, professores das unidades escolares, parceiros da biblioteca, a coordenação dos núcleos e a gestão do CEU Tiquatira durante a travessia pandêmica 2020. Estou em processo de mudanças internas, sinto que iniciará um novo ciclo em que a literatura estará sempre presente alimentando minha alma e me levando em outras direções.

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e parceria, como a escritora Thaís Matarazzo que disponibilizou acesso gratuito aos livros em formado digital, autorizou a utilização do conteúdo para produção de vídeos. Foi um ano de emoções à flor da pele. Uma moradora do território, Naiara Baum, após ler o livro Gabriela: Semeadora de encantos poéticos, afirmou: “Morei anos na comunidade próxima à Avenida Gabriela Mistral, mas não conhecia a poetisa; eu me identifico com a história dela”. Assim como a própria escritora Thaís Matarazzo, ela se encantou pelo poema “Hino a Árvore”. Uma ponte que ainda não havia sido estabelecida pelos meios físicos foi possível pelo virtual. Continuei representando o CEU Tiquatira nas reuniões com organizadores da FliPenha. Embora no início da pandemia pairassem no ar as incertezas, felizmente a feira foi realizada em plataforma virtual, e as homenageadas Gabriela Mistral e Ruth Guimarães foram ovacionadas pelo público. Entre um turbilhões de emoções vivenciadas ao mesmo tempo na semana da FliPenha cito a mesa A escritora chilena Gabriela Mistral por participar da live como mediadora. Foi uma satisfação imensa estar com pessoas que admiro pela dedicação a pesquisa e a difusão do conhecimento, mas acima de tudo pela generosidade e afetividade que

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Silvia Rodrigues e Germano Gonçalvez

nº.23 Escritores brasileiros contemporâneos

É com muita honra e gratidão que recebi o convite da escritora Thais Matarazzo para relatar na revista EBC sobre a minha experiência na participação do Sarau Urbanista Concreto, que acontece na Zona Leste de São Paulo, do qual fui integrante por dois anos. Registro aqui minha eterna gratidão e respeito ao idealizador, Germano Gonçalvez Arrudas. Assim que recebi o convite do próprio urbanista para conhecer o Sarau, me encantei ao me deparar com tamanha junção de talentos, onde seus versos e contos bailavam literalmente naquele palco. Logo no primeiro momento tive a percepção que poderia colaborar, fui bem acolhida pelos convidados e participantes, sendo eles poetas, poetisas, escritores e sonhadores. Para mim o que realmente interessava era encontrar a melhor forma de tornar aquele belíssimo trabalho literário (sarau) em um ambiente agradável, onde recepcionava a todos que ali chegaram com muito respeito e diplomacia, procurando dar o melhor de mim. Sem personagem, sendo eu própria. E assim o ambiente se tornava agradável, e os talentos que

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S ilvia R odrigues

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Amanhã,

talvez ...

Pode ser tarde demais, ou apenas um recomeço. Recomeçar poderá ser doloroso outras vezes... Amanhã, talvez...

O sonho termine... mas também pode ser que se realize, quase sempre depende de nós outras... Amanhã, talvez... Olhe para trás e pergunte: Nossa... O tempo passou e nem percebi! Cadê eu?

Amanhã, talvez a cordialidade, o saudoso aperto de mãos, o “estou aqui... Pode contar comigo!” O aconchegante abraço! Volte... Amanhã, talvez... A praga desapareça, a vida nos restaure, fazendo com que o amor cresça. Amanhã, talvez...

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A quarentena termine, a saudade também. O muito lamento, não terá mais espaço. A dor ficará apenas na memória.

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Amanhã, talvez...

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ali estavam trocavam experiência entre si após suas belíssimas apresentações. É muito gratificante saber que de alguma forma eu também era responsável por aquele aprazível momento. Onde não havia estrelas... Mas uma verdadeira constelação de talentos, muitas vezes ocultos pela falta de oportunidades! Essa foi minha bonita passagem pelo Sarau Urbanista Concreto. Ali esperava só doar e todos me surpreenderam com tamanha reciprocidade, tão espontânea e verdadeira. Posso ressaltar que encerrei minha participação imensamente grata por tudooo... Todos me devolveram carinho e respeito, muito mais do que doei. Sempre estarei nos eventos literários, não só para recebê-los, mas com muita alegria em REVÊ-LOS. Sou Silvia Regina Rodrigues. Deixo para todos de presente um poema:

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Março/2021 nº.23

A ideia para este projeto de crônicas surgiu após o lançamento do meu livro Alegria e Gratidão: palavras de um coração, lançado em janeiro de 2021. Na obra narro como se deu a descoberta de um câncer de mama metastático aos 38 anos, da aceitação do diagnóstico, do início do tratamento oncológico e como venho superando essa nova etapa da minha vida. Desde então recebo centenas de mensagens de solidariedade, carinho, apoio e também de mulheres que passam por situações semelhantes e me questionam como consigo levar a vida com leveza, alegria, bom humor e confiança em D’us. Não estava conseguindo responder a demanda das mensagens. Refleti por algum tempo e considerei a possibilidade de conversar abertamente com o público através do meu site, assim todos poderão ser contemplados. Vou compartilhar um pouquinho do meu cotidiano e atender sugestões de pautas (na medida do possível) sobre o tema a partir da minha experiência. Sei que para boa parte das pessoas é muito complexo e dolorido falar sobre o câncer. Durante os primeiros quatro

meses do meu tratamento oncológico para mim também foi difícil, mas depois que escrevi o meu livro, me libertei desse sentimento, parece que uma luz clareou meus olhos e hoje não tenho nenhum problema em tocar no assunto, pelo contrário, se eu puder ajudar o próximo com uma palavra amiga, uma consolação ou uma inspiração, estou pronta! Não é minha intenção romantizar o câncer, longe disso. Simplesmente vejo a situação pelo lado positivo. Como todas as pessoas que possuem essa doença e estão em tratamento, também sofro com os efeitos colaterais da teurapêutica a que sou submetida. Entretanto, procuro não me concentrar nos problemas e sim nas coisas que gosto e me dão prazer. Contemplo e agradeço a todo momento tudo o que D’us me abençoa. E foco nos meus objetivos. Alegria e Gratidão: palavras de um coração é um marco na minha vida pessoal e na minha carreira literária. Como nada se faz sozinho, agradeço imensamente a todos que colaboraram com essa obra: meus pais, o prefácio de Andrea Matarazzo, as ilustrações de Camila Giudice, as fotografias de Marcia Costa e Nana Tavares, e a assessoria de Carlota Caifero. Obrigada a todos pelo apoio!

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Apresentação

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O primeiro mês do meu tratamento oncológico foi o mais árduo, começou em setembro de 2020, durante a pandemia do Covid-19. O tratamento paliativo consiste em quimioterapia oral, hormonioterapia e imunoterapia. No final do dia parecia que havia sido atropelada por um caminhão. Os efeitos colaterais foram intensos, sentia tonturas, náuseas, fatiga, insônia, boca seca, dores nos ossos, mal-estar, fiquei um pouco esquecida e com alternância de humor. Não era para menos, com tantos remédios! Mas não pense o leitor que estou me queixando, pelo contrário, são somente constatações daqueles primeiros 30 dias. Meu físico estava extenuado pela terapêutica, mas a fé, a coragem, o

Março/2021

“Sucesso é conseguir o que você quer, e felicidade é gostar do que você conseguiu.” Dale Carnegie

nº.23

(10/3/2021)

ânimo, as energias e as ideias continuam em alta. Em nenhum instante pensei em desistir, pois sempre acreditei na luz do final do túnel. Não sou de chorar e nem me vitimizar, entretanto, vez ou outra me vinham pensamentos duvidosos referentes ao futuro: será que o protocolo de tratamento daria certo? Será que nunca mais sairia na rua? Será que poderia continuar meu amado trabalho? Será que nunca mais poderia viajar? Será que nunca mais encontraria meus amigos? Será que nunca mais não-sei-mais-o-quê... Acredito que qualquer mudança na vida de uma pessoa cause preocupações, seja de que ordem for. 2020 começou de maneira promissora para o Coletivo São Paulo de Literatura, do qual faço parte. Nós tínhamos assinado contratos para realização de projetos fantásticos com as secretarias de Cultura municipal e estadual de São Paulo. Chegamos a fazer as primeiras apresentações e saraus, mas em março as atividades foram paralisadas, assim como para todo o Brasil.

Escritores brasileiros contemporâneos

Sapatos azuis

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Março/2021 nº.23

da foi um par de sapatos Anabela azuis, muito usado nos anos 1920. Não houve jeito de encontrar. Paciência! Regressando ao início do meu tratamento oncológico, minha melhor terapia emocional tem sido a escrita e a leitura. Não deixei de ler e produzir textos em nenhum dia, assim me distrair e ocupava o tempo. Escrevi vários livros e criei uma Biblioteca Virtual aqui no site com todas essas produções, a maior parte infantojuvenil. Tudo para download gratuito. E imagina se a Yolanda e o Tenório também não ganharam as páginas de várias obras? Meus pais sempre repetem que não devo ficar aflita, “quando a pandemia passar, com certeza, você estará novamente com seus amigos para novas empreitadas literárias”, diz minha mãezinha. Fui animando à medida que o tratamento foi alcançando o resultado desejado, e os efeitos colaterais se tornando mais brandos. Certa manhã estava navegando pela internet e vi um anúncio da venda de um vestido (azul, branco e cinza) usado e um chapéu de feltro estilo anos 1920, pertencia à uma atriz que estava se “desapegando” do seu guarda-roupa. Entrei na página e a descrição do vestido caiu como uma luva pra mim. Adquiri a peça. Entendi aquilo como um

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Desde o final de 2018 começamos a incluir nas nossas atividades literárias recursos do teatro, compondo personagens para encenação de pequenas histórias e esquetes divertidos a fim de divulgarmos nossos livros e poemas, e levarmos informação e alegria para o público. Para tanto, a Ana Jalloul e o Ricardo Cardoso arranjaram figurinos e acessórios da década de 1920. Era o tema que exploraríamos em nossos projetos focalizando a Semana de Arte Moderna de 1922, pedido nos editais e chamamentos dos equipamentos de cultura. Gostei tanto da ideia dos meus amigos que fui a uma costureira, encomendei um vestido azul daquele período, ficou uma graça! Comprei luvas de renda, chapéu de feltro, leque, bolsinha de pano, colar de pérola (postiço), assim nasceu a personagem Yolanda. Uma tarde, descendo a Rua d. Veridiana, na volta de um evento no Museu da Santa Casa de São Paulo, entrei em uma loja em que sempre comprava algum acessório novo para essas apresentações. Achei um tucano de pelúcia. Minha ave favorita desde a infância. Comprei o bichinho e o batizei com o nome de Tenório. Ele se tornou o companheiro e mascote da Yolanda. O público amou. O único item que não consegui adquirir para o modelo da Yolan-

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Meu segredo?

nº.23

Fazemos tantas coisas na vida escolhi e tive sorte de realizar muitos sonhos almejados. Não foi fácil, custou-me muito trabalho, sacrifícios e escolhas. Não posso reclamar do resultado sempre me contentei com o que recebi. Não me arrependo de nada não. Fiz tudo com muito amor, se preciso, novamente realizaria, pois o que nos move na vida é o Amor! O Amor sincero pelo que desejamos... Sempre o Amor! Nada consegui sozinha, D’us abriu as passagens para que eu pudesse caminhar concedeu-me energia e graça e consegui tudo praticar. Ao Eterno sou gratíssima pelos momentos de alegria, trabalho, prazer e satisfação. Lembranças, só boas recordações, Flutuo nos mares da poesia e da música. Pensamentos, para hoje e o futuro: otimismo, objetivos, superação e sonhos! Vale a pena lutar pela Vida: esse é o meu segredo!

Março/2021

Poema de Thais Matarazzo

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espelho da esperança. Acho que em outros tempos a compra do vestido não me causaria tanta emoção e alegria como naquele instante. Só faltava agora o par de sapatos azuis. Parece piada, mas uma “mãozinha” me indicou uma loja de sapatos no Rio Grande do Sul. Ahhhhh, finalmente consegui encontrar o calçado desejado. O vestido e o chapéu chegaram primeiro, não tirei de dentro da caixa. Esperei pelos sapatos. Uns dias mais tarde, o funcionário dos Correios tocou a campainha, ai, meu coração! Eram os sapatos Anabela! Não perdi tempo e num zás-trás me vesti de Yolanda. O figurino ficou ótimo, posso dizer que entrei no túnel do tempo. Quanta felicidade tomou conta do meu coração! Naquele momento tive a certeza que sim, no futuro estarei novamente com meus amigos do Coletivo São Paulo de Literatura. Entendi assim como é importante valorizar de todo coração uma oportunidade, seja ela pequena, média ou grande. São acontecimentos deste gênero, singelos aparentemente, acontecidos no cotidiano, que fazem a nossa verdadeira alegria! Continuo aqui cheinha de fé, confiança em D’us e agradecendo ao Eterno por todas as bênçãos que ele me envia!

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