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GAIO – ROSÁRIO: LEITURA DO LUGAR Câmara Municipal da Moita | Frederico Vicente e Ana Filipa Paisano
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A cor é um elemento fundamental na coesão do alçado. Não existe um padrão, mas uma procura de individualidade. As cores são quase sempre em tonalidades terra, salvo raras exceções, mas os detalhes e ornamentos lembram as pinturas naif das embarcações, próprias destas comunidades piscatórias. Recuperando as palavras do geógrafo Álvaro Domingues: “Casas são pequenos mundos, dispositivos que por fora dizem do que somos por dentro e do modo como podemos usar isso para comunicarmos uns com os outros: ser igual ou diferente dos outros, eis a questão. O ornamento não é mais do que uma linguagem à procura de interlocutores.” 7 Embora a vila seja plana, desde a entrada no largo do coreto existe uma ligeira inclinação que vence metro e meio de altura. O coreto é um palanque para a rua e aí as casas são mais altas. Eventualmente antes da pavimentação com asfalto, as ruas teriam uma ambiência mais homogénea, evidenciado pela terra batida e os desníveis menos acentuados, permitindo outra luidez de apropriações – as casas a nascente. 2.2. O PÁTIO O pátio é um elemento notável na arquitetura do Rosário. De forma retangular com habitações modestas, dispostas à volta de um recinto comum. Murado, voltado ao interior, apenas com dois acessos, um junto do largo (largo do Coreto ou largo do Operário) e outro para o rio (largo das Forças Armadas). É um objeto arquitetónico autónomo que replica a sensação das ruas, enquanto logradouro comum ao casario. Nesta estrutura, tal como nas ruas do Rosário, os alçados são o cenário de acontecimentos e a paisagem é apenas o céu – o olhar é direcionado para cima. As fachadas são apropriações domésticas. A aplicação da cor é contida e uniforme. O azul do céu é intenso. A escala, sobretudo a distância entre alçados é estreita, conferindo-se uma perceção de acolhimento. Fala de interior, um ventre materno, em oposição ao exterior. O interior de intimidade. O pátio do Rosário é o lugar por exceção para nos sentirmos em casa: o arco nascente, a porta à rua e ao largo do Coreto; a arcada ao rio é um túnel à paisagem – um dispositivo que nos resguarda do ambiente exterior.
Álvaro Domingues para o projeto “A Casa Deles”, um projecto de Mariana Pestana e Pedro Lino com fotogra ias do Bairro Piscatório de Silvalde, em Espinho, no verão de 2011. Uma edição d“A Vida Portuguesa”.
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