JornalCana 337 (Maio 2022)

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MERCADO

Maio 2022

Usinas irão substituir a petroquímica para reduzir custos de transporte? Sim. Assim, produziria fertilizante nitrogenado para o mercado e para a usina, pois a quantidade de hidrogênio seria suficiente para isso e com muito excedente. E tudo com matéria−pri− ma com pegada negativa de carbono.

Confira a entrevista com Thiago Lopes, professor da Poli−USP e que está à frente do Laboratório de Célu− las a Combustível do Centro de Pes− quisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI). Em linhas gerais, quando surg iu a proposta e qual é seu cronog rama? Thiago Lopes − Começamos em agosto de 2021 e a proposta é chegar− mos a uma prova de conceito. Ela se− rá a prova de que a tecnologia funcio− na já para aplicações práticas. A previ− são é de ter isso em seis anos. E d a í a t e c n o l og i a e n t r a r á e m testes? Sim. Eu vejo a solução chegando ao mercado em aproximadamente se− te anos [2028]. C o m o s e d á a c o n c en t ra ç ã o d a vi nha ça v ia re at or el et ro lít ic o? Ou ela é em preg ada para produzir fer ti− li zan t e, v ia hid rog ê ni o, o u co mo c o m b u s tã o p a r a g e r a r e l e tr i c i d a d e via oxig ênio? Todos são possíveis, e podemos ir muito além. Cite um exemplo. A usina hoje vende energia elétri− ca para a rede. Na média são 50 kilo− watts−hora (kWh) por tonelada de cana. Com a tecnologia em desenvol− vimento, usa−se estes 50 kWh para fazer a concentração da vinhaça. E, no final, você tem vinhaça concentrada e, de só evaporar e jogar fora a água, tem−se a quebra desta água e a con− sequente geração de hidrogênio e oxigênio. Além disso, com a mesma tonelada de cana consegue−se produ− zir mais energia elétrica.

Qual é a economia de despesas que se pode obter com a vinhaça concen− trada ante a vinhaça tradicional? Apenas com estes 50 kWh, a vi− nhaça concentrada gera uma econo− mia de custos em transporte e distri− buição de 20%. Dependendo do caso, essa economia já pagaria o Capex do investimento necessário para a tecno− logia, com uma safra apenas. A vinhaça concentrada é fruto do trabalho do Laboratór io que o senhor coordena. Quando estiver disponível, como uma usina produzirá essa ver são concentrada? De uma forma simplista e apenas ilustrativa, será um canal. De um lado sai hidrogênio, de outro sai oxigênio e, no meio, sai a vinhaça concentrada. Lembrando que o processo é alimen− tado por bioeletricidade, onde se o hidrogênio for empregado para pro− duzir fertilizante nitrogenado, será um produto de baixas emissões de carbo− no, ao contrário do fertilizante com hidrogênio feito de gás natural, gera− dor de emissões. Com a vinhaça concentrada, o in− dicado ser ia ter fábr icas de fertilizantes nitrogenados ao lado ou junto às usinas

Como é a ar mazenagem da vi− nhaça concentrada? Em princípio ela segue os mesmos caminhos da vinhaça tradicional, po− rém com bem menos impactos am− bientais. E com volume menor. Que mais se poderá ter com a tecnolog ia em desenvolvimento? Pode−se produzir amônia com o hidrogênio, além de metanol verde e etc! Ou seja: a usina terá um círculo virtuoso tão grande que terá condi− ções de idealmente substituir os pro− dutos da petroquímica. E o oxigênio liberado pela tecno− log ia? Thiago Lopes − Pode−se em− pregá−lo em oxicombustão (subs− tituição do comburente para oxi− gênio puro), por exemplo, com o bagaço atual. Com isso, se produzi− rá mais energia elétrica para venda à rede ou para concentrar ainda mais a vinhaça. E mais: ao se queimar, será gerado CO2 puro (após condensação da água). E, assim, todos os produtos da usina começam a ter uma pegada ne− gativa de carbono. Quando o sr. diz geração de CO2 puro, se ele for ‘ar mazenado’ poderá ajudar a zerar a pegada de carbono do País e ser vendido? Sim.

Sobre a tecnolog ia em desenvol− vimento na Unicamp de célula com− bustível a etanol (que emprega o bio− combustível para gerar hidrogênio e, assim, produzir eletr icidade para o motor híbr ido), o hidrogênio da vi− nhaça também poderá ser usado? O conceito de célula trabalhado [na Unicamp] usa o etanol direto. Aqui, produzimos hidrogênio e ele, sim, pode ser utilizado na célula. Mas em minha avaliação, se você precisa de hidrogênio descentralizado, deve usar o gerado pelo etanol. Ele já está dis− tribuído pelo território nacional. E no caso do hidrogênio da vi− nhaça? Ele é centralizado, com foco em escala industrial em plantas junto às usinas. É para gerar vários produtos da alcoolquímica que, com valor agrega− do, serão transportados. Em resumo: a cana irá virar o novo petróleo. Para finalizar, hoje já temos hidro− gênio verde. Qual sua avaliação? Ele é feito a partir da eletrólise (quebra de moléculas) da água pelo consumo de eletricidade. Fala−se muito sobre esse hidrogênio. Mas não se fala sobre de onde virá a água. Já vivemos situação de estres− se com a água. Ninguém irá pegar uma tubulação do pré−sal para ex− trair água do aquífero Guarani. Tem a dessalinização da água do mar, mas aí se adiciona uma etapa [consumo de energia elétrica e custos] ao pro− cesso global. Por isso, no caso do hidrogênio da vinhaça, ela habilita à usina um cír− culo virtuoso: habilita novos produ− tos a partir da cana, habilita novos mercados.


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