102
ENTRE EPIDEMIA E IMIGRAÇÃO: um viés de investigação da história da população no Grão-Pará (1748-1778)
capitania do Grão-Pará. E o fazia por não conceber o desenvolvimento econômico e a sobrevivência dos colonos apartada da escravidão indígena. No reinado de D. José I, Francisco Gurjão iria ser substituído por alguém muito mais próximo da política de Lisboa: Francisco Xavier de Mendonça Furtado, meio-irmão do futuro Marquês de Pombal. Um gesto que significou a intensificação da ofensiva contra a escravidão indígena e a possibilidade de incremento do uso de braços africanos.
III.IV Resistência à solução africana Os anos de epidemia foram seguidos pela nomeação e posse de Mendonça Furtado como governador do Estado do Maranhão, pela publicação da Lei de Liberdade Geral do Índio, pelo Diretório e pela criação da Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão. Um período marcado por confrontos acerca da inserção e utilização do trabalho escravo africano na Amazônia. Diante da mortalidade indígena resultante da epidemia, os africanos surgiam mais uma vez como alternativa de trabalho.305 Passaremos a analisar alguns documentos que partiram de Belém para Lisboa e que tinham a intenção de desqualificar a utilização desses trabalhadores. Iniciamos com uma carta anônima produzida logo após Mendonça Furtado fazer sua primeira audiência na Câmara de Belém (1751-1752). O objetivo do documento, ao qual também chamaremos de manifesto, era “dar com mais acerto Resposta a Proposta, q o Sr. General da parte de sua Magestade, que Deos guarde propôs ao Senado da Camara sobre a Introdução de pretos neste Estado [grifo nosso]”.306 O autor (o documento foi escrito na primeira pessoa do singular) deixava claro que o novo governador era um intermediário das reais decisões e estas mereciam mais acurada análise. Para tanto, se fazia necessário “averiguar hua matéria de tanta ponderação, de que com muita razão se queixa o pouco, e ainda os mesmos, q assignarão...”.307 O manifesto avançava de maneira intensa e de imediato adjetivava a decisão do rei: “me parece se devia primeiro discotir a cauza de hua tam inopinada 305 Não devemos negligenciar que desde o século XVII existia uma presença africana na região e que alguns moradores utilizavam esse cativo. Cf. CHAMBOULEYRON, 2004. 306 ANTT, Ministério do Reino, mç. 597, doc. 03. 307 Ibidem.