E&M_Edição 44_Dezembro 2021 • Quem salva o turismo?

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NOVA CRISE? COVID-19 VOLTA A AMEAÇAR SERIAMENTE A RETOMA, ALERTAM OS ECONOMISTAS RECUPERAÇÃO GLOBAL COMUNIDADE INTERNACIONAL APELA À MAIOR COORDENAÇÃO ENTRE AS NAÇÕES INOVAÇÕES DAQUI STARTUP AFRICANAS ANGARIARAM QUASE 4 MIL MILHÕES DE DÓLARES EM 2021. COMO?

QUEM SALVA O TURISMO? O sector mais penalizado pelo Covid-19 procurava reerguer-se quando volta a cair numa nova instabilidade

EDIÇÃO DEZEMBRO - JANEIRO 15/12 a 15/01 • Ano 04 • Nº 44 2021 • Preço 250MZN

MOÇAMBIQUE

RENOVÁVEIS ÁFRICA DEVE REGISTAR ACELERAÇÃO DOS INVESTIMENTOS EM 2022


Banca Corporativa e de Investimento

Estar próximo ajuda, mas é preciso ser próximo. Saiba mais em

www.fnb.co.mz

Em parceria com

First National Bank Moçambique, S.A., é uma subsidiária do Grupo FirstRand, maior instituição financeira em África por capitalização de mercado


SUMÁRIO

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OBSERVAÇÃO

Crise no Sudão A imagem de uma crise humanitária que dura há vários anos e que deve se intensificar em 2022

10 OPINIÃO HRA “Acordo de Mobilidade Entre os Países da CPLP”,

65ÓCIO 66 Escape À descoberta das maravilhas de Vilanculos, Inhambane 68 Gourmet Ao sabor da gastronomia zambeziana, no restaurante Cantinho da Cachola 69 Adega Como a arte de escrever sobre vinhos ajuda na degustação 71 Arte Em conversa informal com os seus admiradores, Mia Couto fala da sua (fraca) intimidade com os números 72 Ao Volante Do Concept Seven da Hyundai, sem volante e com uma sala sobre rodas

Tiago A. Mendes e Ana B. Mazuze – HRA Advogados

13 ESPECIAL ENERGIAS RENOVÁVEIS 14 Expansão das renováveis Energy Capital & Power prevê aceleração dos investimentos ao longo de 2022 em África 18 Explicador A Agência Internacional de Energias Renováveis mostra a expansão da energia solar pelo mundo 20 Epsilon Energia Solar Um empreendimento focado no fornecimento de energia limpa às comunidades rurais

24 OPINIÃO “Síndrome da Substituição de Importações”, João Gomes, Partner @ JASON Moçambique

28 NAÇÃO TURISMO 30 Crise Nova instabilidade é iminente e os operadores pedem intervenção mais enérgica para salvar o sector 36 Opinião “Turismo Vai Recuperar. Mas Quando?”, Alberto Pitoro, Director de Tesouraria do Absa Bank 38 Impacto Economistas alertam que crise no Turismo pode prejudicar outras áreas de actividade 42 Turismo Global Analistas avisam que sem coordenação a recuperação não será consistente

www.economiaemercado.co.mz | Julho 2020

46 OPINIÃO “O Sexagenário do Ensino Superior: Avanços, Recuos, Desafios e Oportunidades”, Jorge Ferrão e Patrício Langa

51 ESPECIAL INOVAÇÕES DAQUI 52 Startup Empresas africanas destacam-se por angariar financiamentos de mais de 4 mil milhões de dólares 56 Fidli Uma startup habilitada para facilitar às empresas a captação e fidelização dos seus clientes

60 OPINIÃO “Desempenho e Perspectivas do Mercado de Capitais”, Claudio Pondja, Head Of Wealth Management do BIG

62 BAZARKETING “O Hábito Dos Hábitos”, Thiago Fonseca, sócio e director de criação da Agência GOLO

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EDITORIAL

Celso Chambisso Editor da Economia & Mercado

Nova Vaga, Nova Variante. Um Golpe ao Turismo

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m finais de Junho de 2020, quando finalmente parecia que o Turismo iria se reerguer da profunda crise a que esteve sujeito devido à pandemia, a Organização Internacional do Turismo (OIT) reiterava que tal recuperação seria a chave para superar a crise do trabalho, também causada pela pandemia do novo coronavírus em várias partes do mundo. Todas as esperanças, na altura, eram depositadas no progresso das campanhas de vacinação. Era a condição que os governos impunham (e ainda impõem) para reabrir as fronteiras e facilitar a circulação de pessoas. “A recuperação do turismo depende directamente da extensão da vacinação e da adopção de medidas adequadas de segurança e saúde no trabalho. A reactivação deste sector pode ter um importante efeito multiplicador sobre a economia e o emprego, que pode ser crucial para superar a crise gerada pela pandemia”, escrevia a OIT num artigo que tinha forte cunho no encorajamento das sociedades para a adesão às campanhas. Esta lógica é perceptível e válida. Em Moçambique, muitos operadores foram testemunhando a franca recuperação da actividade e a recontratação de parte dos funcionários que tinham sido despedidos. Porém, a mesma teoria não tardaria em ser questionada. Em plena aceleração das campanhas de vacinação – é verdade que estamos ainda muito longe do ideal – volta a soar o alarme e o Turismo volta a cair na incerteza. Não é

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apenas pelo mediático cancelamento dos voos e das fronteiras por parte da União Europeia, EUA e outros países em relação a certos destinos da África Austral, incluindo Moçambique, mas também pelo reaparecimento da quarta vaga, com uma variante cuja letalidade ainda divide opiniões. A E&M ouviu vários operadores turísticos da cidade de Maputo e de outros destinos com potencial relevante e o ambiente é o mesmo: cancelamento de reservas e desespero! As contas voltam a não bater. E não se sabe para quando o fim deste martírio. Ainda que, no âmbito global, as perspectivas continuem animadoras, com previsões de uma melhor consolidação das viagens já em 2022, o ambiente cá dentro leva os diversos intervenientes a reabrirem o velho e inconclusivo debate dos factores de competitividade de um Turismo que devia estar voltado para a priorização das operações internas. Em relação a este assunto, fica a ideia de que todos sabem o que deve ser feito e, mais do que isso, sabem quem deve fazê-lo. Mas nunca houve qualquer iniciativa digna de realce. Então, de onde virá a medicação para o Turismo? Como será o desempenho do sector enquanto diferentes variantes do Covid-19 se forem sucedendo ininterruptamente? Quem é que assume a dianteira para a materialização das ideias que já existem nos diversos planos de desenvolvimento sectorial existentes? São questões que carecem de resposta urgente para salvar milhares de empregos.

15 DEZEMBRO | 15 JANEIRO 2021 • Nº 44 DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Cativelos pedro.cativelos@media4development.com EDITOR EXECUTIVO Celso Chambisso JORNALISTAS Hermenegildo Langa, Jaime Álvaro, Ricardo David Lopes, Rogério Macambize, Rui Trindade, Yana de Almeida PAGINAÇÃO José Mundundo, Gerson Quive FOTOGRAFIA Mariano Silva REVISÃO Manuela Rodrigues dos Santos ÁREA COMERCIAL Nádia Pene nadia.pene@media4development.com CONSELHO CONSULTIVO Alda Salomão, Andreia Narigão, António Souto; Bernardo Aparício, Denise Branco, Fabrícia de Almeida Henriques, Frederico Silva, Hermano Juvane, Iacumba Ali Aiuba, João Gomes, Narciso Matos, Rogério Samo Gudo, Salim Cripton Valá, Sérgio Nicolini ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO E PUBLICIDADE Media4Development Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311 A — Sommerschield, Maputo – Moçambique; marketing@media4development.com IMPRESSÃO E ACABAMENTO Minerva Print - Maputo - Moçambique TIRAGEM 4 500 exemplares EXPLORAÇÃO EDITORIAL E COMERCIAL EM MOÇAMBIQUE Media4Development NÚMERO DE REGISTO 01/GABINFO-DEPC/2018

www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021



OBSERVAÇÃO

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Sudão, 2022

ONU Alerta Para a Maior Crise Humanitária em Uma Década As Nações Unidas alertaram, num relatório divulgado recentemente, que 30% dos sudaneses vão precisar de ajuda humanitária em 2022, a “taxa mais alta numa década” naquele país, um dos mais pobres do mundo. Segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários, esta cifra totaliza “mais de 800.000 pessoas do que em 2021”. Entre estas pessoas vulneráveis encontram-se 2,9 milhões de deslocados, num país devastado por conflitos sangrentos durante décadas, especialmente na cidade de Darfur, uma vasta região Ocidental, onde a guerra entre os rebeldes e o regime, que começou em 2003, já fez cerca de 300 mil mortos e 2,5 milhões de deslocados, segundo a ONU. Além disso, o Sudão acolhe cerca de 1,2 milhões de refugiados e requerentes de asilo, 68% dos quais vêm do vizinho Sudão do Sul, depois da sua separação em 2011. Após o golpe militar a 25 de Outubro deste ano, o país está mergulhado numa crise política. FOTOGRAFIA D.R.

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RADAR

Produção

Moçambique anuncia intenção de acabar com a fome até 2030 Trata-se, na verdade, do segundo Objectivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), traçado pela Organização das Nações Unidas, e que é assumido pelo Executivo moçambicano a apenas oito anos do prazo. Segundo o Ministério de Agricultura e Desenvolvimento Rural (MADER), esta ambição vai exigir um investimento de cerca de 400 mil milhões de meticais, sendo que as acções de suporte para a materialização do objectivo devem incluir “o reforço do investimento no sector agrário a curto e médio prazo, um esforço adicional ao que já ocorre no terreno, como é o caso do programa SUS-

Crise Humanitária

Mais de 100 mil famílias em risco de fome severa, alerta a FAO A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) precisa de 45 milhões de dólares para dar assistência a 100 mil famílias afectadas pela violência em Cabo Delgado nos próximos três anos. A agência da ONU pretende incluir ainda as comunidades anfitriãs não só de Cabo Delgado, mas também das províncias vizinhas de Nampula e do Niassa, de forma a aliviar a pressão sobre os seus recursos e alimentos. Para esta agência das Nações Unidas, a situação da crise alimentar no norte de Moçambique é cada vez mais crítica devido à falta de recursos financeiros para aquisição de alimentos. Milhares de deslocados internos dependem dessa ajuda na província de Cabo Delgado, assolada por ataques terroristas há quase quatro anos. O representante da FAO em Moçambique, Hernani da Silva, explicou, em entrevista ao portal Diário Económico (DE), que a organização “delineou um plano de intervenção para apoiar no mínimo 100 mil famílias, o que corresponde a cerca de 500 mil pessoas”. A pior dificuldade das famílias, continuou, “é gerar rendimento, portanto, queremos criar condições para que haja cada vez menos dependência das famílias de apoio humanitário.” Hernani da Silva afirma que o apoio serve para garantir que as famílias afectadas produzam os seus próprios alimentos, reduzindo, assim, a sua dependência. Desde 2017, Cabo Delgado já registou mais de 800 mil deslocados internos.

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TENTA”. “Com base nas contribuições que tivemos no segundo Conselho Coordenador, foram definidas as linhas estratégicas que vão orientar a implementação do Plano Nacional de Investimento e o mesmo requer um financiamento de 400 biliões de meticais”, afirmou Yolanda Gonçalves, porta-voz do Conselho de Ministros na sessão que anunciou este objectivo. Assim, “a partir do primeiro trimestre de 2022, serão auscultados os intervenientes da cadeia de valor do sector agrário, no sentido de aferir propostas adequadas ao plano”, sublinhou a representante do Governo.

Energia

Governo busca investidor para desenvolver o projecto Mpanda Nkuwa

O Ministério dos Recursos Minerais e Energia (MIREME), representado pelo Gabinete de Implementação do Projecto Hidroeléctrico de Mpanda Nkuwa (GMNK), lançou, recentemente, o Concurso para a Selecção do Investidor Estratégico para o Desenvolvimento do Projecto Hidroeléctrico de Mpanda Nkuwa. Concebido em 2008 e relançado pelo Presidente Filipe Nyusi dez

anos mais tarde, o Projecto está desde Maio passado em processo de actualização de estudos de viabilidade e, agora, o Executivo pretende encontrar um investidor com capacidade de injectar entre 500 e 600 milhões de dólares para, em conjunto com as empresas Electricidade de Moçambique (EDM) e Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB), desenvolver o projecto até ao fecho financeiro. “Estamos totalmente comprometidos em realizar um processo aberto e transparente, que permita a selecção de investidores mediante critérios baseados na capacidade técnica, robustez financeira e experiência comprovada no desenvolvimento de projectos similares”, afirmou o ministro dos Recursos Minerais e Energia, Max Tonela.

Gás Natural

Tribunal britânico analisa acção que quer bloquear investimento em Moçambique Está a ser ouvida, em Londres, a acção judicial para bloquear o financiamento do Governo britânico a um mega-projecto de exploração de gás natural em Moçambique. A mesma foi lançada pela organização Friends of the Earth, que pediu uma “Revisão Judicial” (Judicial Review) no Tribunal Superior (High Court) à decisão do Governo britânico de providenciar até 1150 mi-

lhões de dólares através da agência de crédito à exportação. O argumento que sustenta a tese do bloqueio ao investimento é o de que a decisão foi tomada sem levar em conta os impactos ambientais do projecto, o qual estima que vai ser responsável pela libertação de até 4500 milhões de toneladas de dióxido de carbono na atmosfera ao longo de vários anos. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


Mineração

Leilão de rubis de Montepuez bate recorde de 88 milhões de dólares A mineradora britânica Gemfields anunciou, recentemente, que tinha angariado um recorde de 88,4 milhões de dólares de uma série de mini leilões de rubis da sua mina no distrito de Montepuez, na província de Cabo Delgado. Os leilões tiveram lugar online entre 08 de Novembro e 09 de Dezembro e os clientes puderam ver as parcelas de rubis de qualidade mista através de visualizações presenciais e privadas em Banguecoque (Taiwan), Dubai (Emirados Árabes Unidos) e Jaipur (Índia). Dos 107 lo-

tes oferecidos, 104 foram vendidos a um preço médio de 132,47 dólares por quilate. De acordo com Adrian Banks, Director de Produto e Vendas da Gemfields, “este foi o leilão de rubis mais forte da história da empresa e estamos muito satisfeitos com a trajectória e o crescimento do sector”. Desde o seu primeiro leilão de rubis, em 2014, a Gemfields, através da Montepuez Ruby Mining já vendeu um total de 13,6 milhões de quilates de rubis em bruto, que geraram 731,5 milhões de dólares.

Segurança

BM e Inspecção-geral de Jogos na luta contra a lavagem de dinheiro

Emprego

EUA lançam iniciativa para aprimorar formação O Governo norte-americano, através da USAID, lançou a Iniciativa de Desenvolvimento de Carreira do Ensino Superior, uma parceria entre a Michigan State University, a Universidade Eduardo Mondlane, o Instituto Superior Politécnico de Manica e a Universidade de Púnguè. A iniciativa visa elevar a empregabilidade de qualidade através do fomento de Centros de Desenvolvimento de Carreira sustentáveis em Moçambique. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

O Banco de Moçambique e a Inspecção-Geral de Jogos assinaram, recentemente, um acordo de união de forças contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, que visa a partilha de informações entre as duas instituições.Segundo o Administrador do Banco de Moçambique, Jamal Omar, o memorando de entendimento permitirá, também, a troca de experiências e a realização de acções conjuntas, bem como a assistência e apoio técnicos. “Estamos confiantes de que o acto que hoje testemunhamos ajudará a reforçar o nosso sistema de detecção e monitoria de operações suspeitas e a responder aos desafios actuais sobre a matéria de segurança contra o branqueamento de capitais”, garantiu Omar.

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OPINIÃO

Acordo de Mobilidade Entre os Países da CPLP

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Ana Berta Mazuze • Tiago Arouca Mendes HRA Advogados

A flexibilização dos sistemas de mobilidade entre os Estados-membros é uma aspiração de décadas, pelo que acreditamos que a aprovação do Acordo seja um passo rumo à concretização dessa aspiração

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pós um longo período de espera foi, finalmente, aprovado o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) na Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP, que teve lugar em Luanda, Angola, a 16 de Julho de 2021. O Acordo é um passo importante no reforço das relações entre os países membros da CPLP, assim como para a concretização da tão ambiciosa Comunidade das Nações ou povos dos Estados Membros, permitindo a implementação das medidas necessárias para a transposição do Acordo para os respectivos ordenamentos jurídicos, o qual exige a adaptação dos quadros legais e institucionais. Nesta senda, tecemos algumas considerações acerca do Acordo e a sua relevância para Moçambique e Cabo-Verde, dois dos países onde a nossa rede internacional, a Morais Leitão Legal Circle, está presente – incluindo Angola e Portugal. Tanto Moçambique como Cabo-Verde impõem como requisito para a entrada de estrangeiros nos respectivos territórios a obtenção de um visto de entrada, que pode destinar-se a turismo, negócios, trabalho, entre outros. No entanto, entre alguns Estados-membros já existem acordos de supressão de vistos e a livre circulação, como são os casos dos acordos bilaterais entre Cabo Verde e Moçambique, Angola, Timor-Leste e o acordo parcial entre Portugal e Cabo Verde, que isenta os cidadãos de nacionalidade portuguesa de requererem visto de entrada para Cabo Verde, sendo que o mesmo tratamento recíproco não se aplica aos cidadãos Cabo-Verdianos.

O Acordo tem como princípios basilares os seguintes: a) princípio da isenção de vistos a favor dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço, para estadas de duração até 90 dias; b) mobilidade das demais partes detentoras de passaporte ordinário, no território das demais partes; c) liberdade das partes na escolha das modalidades de mobilidade e salvaguarda dos compromissos internacionais das partes em matéria de mobilidade decorrentes dos acordos regionais de integração nos quais sejam partes. No entanto, ressalva-se a aplicação de regimes mais favoráveis previstos no direito interno da parte de acolhimento. Este abrange ainda os seguintes tipos de mobilidade: a) Estadas de curta duração CPLP, que dispensa a autorização administrativa prévia, por um curto período de tempo ainda a definir por cada Estado-membro; b) Visto de estada temporária CPLP, dependente de autorização administrativa prévia concedida a cidadãos titulares de passaportes ordinários para estadias até 12 meses, o qual permite múltiplas entradas, podendo ser prorrogado por idênticos períodos, caso o direito interno do país assim o permita; c) Visto de residência CPLP – autorização administrativa para obtenção de autorização de residência CPLP; d) Residência CPLP – duração inicial de um ano, renovável por períodos sucessivos de dois ou mais anos, consoante o direito interno do Estado-membro. A título de enquadramento, o Acordo subdivide ainda os titulares de passaportes ordinários em grupos, em função de actividades que exerçam, nomeadamente: professores, investigadores, empresários, agentes culturais, artistas, desportistas e representantes de órgãos da comuwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


Já estão concretizados os três acordos de que dependia a entrada em vigor da mobilidade ao nível da CPLP

nicação social, escritores, músicos, promotores e organizadores de eventos culturais e desportivos e estudantes. Embora o Acordo vise conferir maior liberdade de circulação aos cidadãos, os Estados-membros poderão restringir a entrada ou permanência dos cidadãos da outra Parte no seu território por razões de salvaguarda da ordem, segurança ou saúde pública ou ainda por fundadas suspeitas sobre a credibilidade e autenticidade dos documentos que atestam a qualidade exigida para a mobilidade. Por outro lado, compete aos Estados-membros regular matérias importantes sobre a mobilidade, o que significa que tem a faculdade de impor requisitos adicionais que possam limitar a livre circulação, excepto para o caso dos titulares dos passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço. Como se pode depreender, a aprovawww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

ção ou entrada em vigor do Acordo não representa a supressão total dos condicionalismos que existem para a mobilidade dos cidadãos dos Estados-membros. Ainda assim, antecipa-se que novas medidas resultem num maior fluxo de pessoas, do comércio, de talentos e, quiçá, um maior intercâmbio sociocultural. Outro benefício para os cidadãos é a eliminação dos custos associados aos procedimentos burocráticos destes processos. A flexibilização dos sistemas de mobilidade entre os Estados-membros é uma aspiração de décadas, pelo que acreditamos que a aprovação do Acordo seja um passo rumo à concretização dessa aspiração. Com isso, há regimes complementares que devem ser aprovados, tais como os que dizem respeito a matérias de tributação, de segurança social (contabilização de contribuições, contabili-

zação de períodos de seguro e exportações das prestações sociais), bem como de reconhecimento dos níveis de ensino e exercício de profissões reguladas, que até então são reguladas pelas normas de direito interno de cada Estado-membro. A entrada em vigor do Acordo de Mobilidade dependia da ratificação de três dos nove países da CPLP, o que já se verificou, uma vez que, até à presente data, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Portugal e Moçambique (o quarto país) já ratificaram o acordo. Seguem agora os próximos passos de transposição para cada uma das ordens internas e vários serão os desafios que os Estados-membros irão enfrentar para garantir a implementação efectiva do Acordo, dada a sua transversalidade a outras tantas matérias (conforme indicado no parágrafo anterior), que são cruciais para o sucesso do mesmo.

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especial energias renováveis 14

OS TRUNFOS DE ÁFRICA PARA 2022

A Energy Capital & Power lança um olhar aos fenómenos e projectos que vão marcar o continente africano no quadro da implementação das energias renováveis.

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EXPLICADOR

Como evoluiu a expansão da energia solar em 2021 no mundo

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EPSILON

Um empreendimento focado na expansão de energia ao meio rural

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PANORAMA

As notícias sobre energias renováveis no País e lá fora


INVESTIMENTO “VERDE”

Os Trunfos de África Para 2022 A Energy Capital & Power, principal plataforma de investimento no sector de energia em África, viajou para o futuro e fez uma fotografia do panorama do continente na adopção das renováveis. De regresso ao presente, exibe a imagem de uma realidade que faz valer a espera por dias melhores TEXTO Luís Ribeiro • FOTOGRAFIA Istock Photo

A

chave para o desenvolvimento do continente africano e a base da sua industrialização e modernização é a energia. Considerando os seus vastos recursos naturais, combinados com o seu potencial incomparável para as energias renováveis, África está prestes a beneficiar-se exponencialmente do sector de energia, que se projecta para promover o desenvolvimento económico por meio da criação de empregos e o surgimento de novas indústrias. As organizações multinacionais e as comunidades internacionais têm colaborado para desenvolver várias agendas – como a “Agenda 2063”, “A África que Queremos” e a “Agenda 2030” – que impulsionam o crescimento sustentável e o desenvolvimento da energia, a fim de facilitar o acesso fácil, confiável e sustentável, e transformar o sector de energia africano para alcançar o acesso universal à electricidade.

renováveis como a água, em vez de combustíveis fósseis, que pode ser usado para fornecer energia à indústria pesada e abastecer veículos de grande porte, como aviões, navios, etc. Para identificar regiões adequadas para o desenvolvimento de tecnologias de hidrogénio verde, o Ministério Federal de Educação e Pesquisa da Alemanha – entidade que financia pesquisas institucionais – está a fornecer 6,6 milhões de dólares para o “H2 Atlas-África”, um mapa com potenciais de geração de hidrogénio verde em África, não apenas para facilitar a identificação de locais para a sua produção, mas também para a realização de testes de produção, transporte e processamento já em 2022. O Ministério, em colaboração com parceiros da África Subsaariana, pretende produzir até 165 000 Terawatt-hora (TWh) de hidrogénio verde anualmente para o continente (1 TWh equivale a um bilião de Watt-hora de energia).

“A próxima década oferece uma perspectiva brilhante, com muitos líderes, organizações e empresas a expressarem a sua dedicação “A próxima década oferece uma perspectiva brilhante para o continente, com muitos líderes, organizações e empresas a expressarem a sua dedicação e compromisso para alcançar um crescimento inclusivo e sustentável”, quem assim o considera é a Energy Capital & Power, entidade que se dedica a trazer investimentos para todos os segmentos da cadeia de valor de energia em África, incluindo a solar e eólica, hidroeléctrica, infra-estrutura de energia, exploração e produção de hidrocarbonetos, refinação de petróleo e gás para energia e nuclear.

Aposta no hidrogénio verde

Uma forma potencial de energia limpa é o hidrogénio verde, derivado de fontes

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De acordo com a Energy Capital & Power, com os custos decrescentes da energia eólica e solar, a oportunidade de produzir hidrogénio verde começou a ganhar impulso à medida que o mundo se tornava mais dependente das energias renováveis, com o hidrogénio a oferecer soluções de energia incomparáveis em transporte e armazenamento. Como tal, o hidrogénio verde tem o potencial de desempenhar um papel significativo na descarbonização da indústria de mineração. Em setembro de 2021, foi anunciado que a concessionária francesa Engie faria parceria com a Release, uma subsidiária da produtora de energia independente norueguesa Scatec, para iniciar a


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produção comercial de hidrogénio verde na mina de platina Mogalakwena na província de Limpopo, África do Sul. A expectativa é que a nova planta de produção de hidrogénio se transforme num modelo de processo de descarbonização do sector de mineração para projectos futuros. Por outro lado, a empresa de energia sul-africana Sasol assinou um memorando de entendimento com a Agência de Desenvolvimento do Cabo do Norte, para que a empresa desempenhe um papel importante no estudo de viabilidade para o desenvolvimento de hidrogénio verde em Boegoebaai. A Sasol tem estado na vanguarda dos compromissos com o Escritório de Infra-estrutura e Investimento da Presidência, numa tentativa de desenvolver uma economia de hidrogénio na África do Sul. A localização e classificação do projecto, que é considerado estratégico e integrado, são os factores-chave para explorar o potencial de Boegiebaai como um centro de hidrogénio verde. Assim, a Sasol fez parceria com a Industrial Development Corporation, que apoiará o financiamento conjunto do estudo de viabilidade, que, em princípio, deve durar aproximadamente 24 meses, sendo que os resultados irão determinar as próximas etapas de desenvolvimento. Por sua vez, um Relatório de Estudo de Viabilidade do Vale do Hidrogénio, lançado a 09 de Outubro de 2021, apresenta o hidrogénio como uma oportunidade significativa para o desenvolvimento económico e a geração de energia renovável na África do Sul. A ambição deste Relatório é delinear oportunidades para transformar o Complexo Bushveld e a região ao redor de Joanesburgo, Mogalakwena e Durban num vale do hidrogénio.

E quanto às renováveis tradicionais?

O ano de 2022 é projectado para ser altamente produtivo e benéfico para o Egipto, que apoia a meta de gerar 20% da sua electricidade a partir de fontes renováveis . Com o Benban Solar Park de 1650 MW – comissionado em 2019 – e o projecto de 37 milhões de dólares para a produção de energia solar actualmente em andamento para abastecer a mina de ouro Sukari, o Egipto demonstrou o seu compromisso de integrar a energia solar como uma solução de energia sustentável para diversificar sua matriz energética. Do lado oposto do continente, o Programa de Aquisição de Produtores Independentes de Energia Renovável da África do Sul (REIPPP) – que visa diversificar a ma-

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triz energética do País por meio de investimentos do sector privado em energia eólica, solar e hídrica – recebeu uma lista de propostas para a Janela de licitação em Agosto de 2021, com o fecho comercial e financeiro para licitantes preferenciais previsto para março de 2022. A quinta ronda do programa viu licitações para mais de 100 programas, dos quais 63 são solares fotovoltaicos e 39 são eólicos. Em Abril deste ano, o Departamento de Recursos Minerais e Energia da África do Sul publicou um pedido de propostas para fornecer 2600 MW adicionais de energia sob o Programa REIPPP. Na mineração, um consórcio entre o desenvolvedor fora da rede, Pele Green Energy, e o produtor independente de energia, EDF Renewables South Africa, vai iniciar a construção de uma central

solar fotovoltaica de 100 MW na mina de Mogalakwena na província de Limpopo, cujas operações devem começar nos finais de 2022. Enquanto isso, o comissionamento da Grande Barragem da Renascença Etíope, adiado para 2022, deverá contribuir com 6,45 Gigawatts (GW) adicionais de capacidade instalada para a rede nacional da Etiópia. Após a conclusão, a barragem tornar-se-á a maior central hidroeléctrica da África e a sétima maior do mundo. De acordo com um relatório da Agência Internacional de Energia de 2020, a redução de custos e o apoio de políticas estruturadas impulsionarão o crescimento das energias renováveis para além de 2022. “Estimamos que, sob condições políticas favoráveis com a energia solar fotovoltaica, a produção anual possa atinwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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De acordo com um relatório da AIE de 2020, a redução de custos e o apoio de políticas estruturadas impulsionarão o crescimento das energias renováveis para além de 2022 gir um nível recorde de 150 GW até 2022 – um aumento de quase 40% em apenas três anos”, disse Maximillian Jarrett, gestor dos programas para África ao nível da Agência Internacional de Energia.

Há promessas também nas fósseis

Na Bacia do MSGBC (Mauritânia, Senegal, Gâmbia, Guiné-Bissau e Guiné-Conacri), a petrolífera francesa BP garanwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

tiu um contrato, com início previsto para o primeiro trimestre de 2022, para operações de perfuração no seu projecto de gás denominado GNL Greater Tortue Ahmeyim offshore, que vai produzir até 2,5 milhões de toneladas de Gás Natural Liquefeito (GNL) por ano. Da mesma forma, o campo petrolífero Sangomar, operado pela empresa australiana de exploração e produção de petróleo, Woodside Energy, deve ser inaugurado em 2023.

Esses dois projectos devem produzir até 10 milhões de toneladas combinadas de GNL por ano. A maior central eléctrica do Zimbabué, central térmica de Hwange, com uma capacidade instalada de 920 MW, está actualmente a actualizar as suas Unidades 7 e 8, cada uma com 300 MegaWatts (MW) de capacidade, com comissionamento comercial previsto para 2022. Em Moçambique, a empresa italiana Eni anunciou que iniciará a produção de GNL no seu campo de gás Coral Sul, na Bacia do Rovuma, província de Cabo Delgado, em 2022, com a instalação da plataforma flutuante de GNL construída na Coreia do Sul e que está a caminho da costa moçambicana. A previsão é de que o projecto produza 3,4 milhões de toneladas de GNL por ano.

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EXPLICADOR

A Energia Solar por País em 2021 O mundo está a adoptar energias renováveis a um ritmo sem precedentes e a energia solar é a fonte de energia que lidera a este respeito. Das Américas à Oceânia, países de praticamente todos os continentes (excepto Antárctida) adicionaram mais solar ao seu mix energético no ano passado. Apesar de uma queda de 4,5% na procura global de energia em 2020, as tecnologias de energia renovável mostraram progressos promissores. Enquanto o crescimento das energias renováveis foi

forte em todos os sectores, a energia solar liderou a partir da frente com 127 gigawatts instalados em 2020, a sua maior expansão anual de sempre da capacidade. A infografia utiliza dados da Agência Internacional de Energias Renováveis (IRENA) para mapear a capacidade de energia solar por país em 2021. Isto inclui tanto a capacidade solar fotovoltaica (PV) como a capacidade de energia solar concentrada. Sem data

Europa

Capacidade instalada em Megawatts

Ásia e Oceânia

Américas

África e Médio Oriente

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O Parque Solar de Bhadla, na Índia, é o maior do mundo com capacidade para 2245 MZ.

A Austrália tem a maior radiação solar por metro quadrado no mundo e lidera na capacidade de geração per capita.

FONTE: NS Energy

FONTE: Geoscience Australia

A capacidade de geração de energia solar da Alemanha é mais do dobro do que a de qualquer outro país europeu.

A capacidade instalada de 49 355 MW da China em 2020 deverá chegar ao intervalo entre as 55 000 e as 65 000 MW nos próximos três anos. FONTE: Bloomberg

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EPSILON

A Arte de Fechar Bons Negócios Iluminando as Comunidades Sendo as renováveis consideradas a grande aposta para o futuro, a Epsilon Energia Solar viu a oportunidade e juntou-se ao movimento que está a acelerar a electrificação das comunidades rurais em Moçambique TEXTO Hermegildo Langa • FOTOGRAFIA Mariano Silva

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caminho para a energia eléctrica chegar a todos moçambicanos é ainda longo, a avaliar pelo número de pessoas que continua sem este recurso. Ainda assim, há uma corrida contra o relógio para, até 2030, assegurar o acesso a todos moçambicanos. Actualmente, existem no País mais de sete empresas que lutam para prover energia eléctrica às comunidades rurais através de fontes renováveis. A Epsilon Energia Solar perfila neste grupo ainda um pouco restrito de empresas. Fundada em Outubro de 2017, a empresa já conta com uma carteira de mais de 8 000 clientes, sendo que, destes, 5 000

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é que estão activos. O director-geral da Epsilon, Paulo Raposeiro, explica que apesar de o empreendimento ser privado, está em estreito alinhamento com as metas do Governo moçambicano, de acelerar o acesso para conseguir que, dentro de nove anos, se consiga abranger todo os que não têm luz. “Estamos a prover energia onde a rede eléctrica tradicional não consegue chegar”. Paulo Raposeiro esclarece ainda que, desde a criação da empresa, o seu foco tem-se resumido, sobretudo, na provisão de energia à base dos sistemas solares em diferentes comunidades rurais, tendo começado a operar na província de Manica. “Vendemos sistemas sola-

res residenciais (Solar Home Systems). E os nossos sistemas são constituídos por um painel solar, uma bateria, três lâmpadas e um carregador USB para telefone, rádio ou lanterna”, conta o gestor, acrescentando que a ideia ganhou forma quando “tentámos trazer alguns exemplos dos outros países de África, como o Quénia e o Ruanda, que conseguiram expandir a rede eléctrica por meio das energias renováveis, sobretudo a solar”. E porque o público alvo são pessoas carenciadas, a Epsilon Energia Solar criou facilidades de aquisição dos kits pelas famílias, permitindo pagamentos faseados, ou seja, a pessoa paga a prestação inicial para aquisição do kit e dewww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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EMPRESA Epsilon Energia Solar ANO DE CRIAÇÃO 2017 DIRECTOR GERAL Paulo Raposeiro COLABORADORES 45 VENDAS 8 000 kits INVESTIMENTO Um milhão de dólares

pois salda a restante dívida num prazo de até 24 meses. “Se um kit for pago de uma só vez, custa 8 000 meticais. E se for pago em prestações, paga-se uma entrada inicial de 700 meticais e depois tem uma prestação mensal de 485 meticais por um período de 24 meses”, explicou o responsável. Ao longo dos quatro anos de presença no mercado, a empresa já investiu mais de um milhão de dólares. E, actualmente, orgulha-se por contar com o apoio de vários parceiros, entre eles o Programa Brilho e o Programa FAZER, da cooperação alemã. Entretanto, apesar de as energias renováveis serem um mercado novo em Moçambique, o gestor, que actualmente www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

conta com cerca de 45 trabalhadores ao nível nacional e 150 pontos focais para vendas, não tem dúvida de que, em 2022, a empresa vai registar um grande salto, quer em termos de vendas, quer no recrutamento de recursos humanos. De referir que investimentos como o da Epsilon acontecem em ambiente favorável de expansão das oportunidades na área das energias renováveis em Moçambique, em que não só o Governo está comprometido com a sua expansão, mas também os parceiros internacionais (o Banco Mundial, por exemplo, prometeu injectar 300 milhões de dólares para a expansão de energia e serviços de banda larga, com foco nas zonas rurais). Ainda recentemente, a Associação Na-

cional de Jovens Empresários (ANJE), anunciou a realização, entre os dias 22 e 24 de Março de 2022, da primeira edição da conferência Mozambique Renewable Energy – “Morenergy”, um evento de nível internacional que se deve realizar anualmente. Sob o lema “Mais Energia Limpa para o Desenvolvimento Sustentável”, a “Morenergy” tem a intenção de se afirmar enquanto oportunidade para os potenciais interessados, entre investidores, financiadores, empreiteiros, fornecedores e fabricantes de tecnologias de energias renováveis. Com o movimento global a orientar-se para a transição energética, a Epsilon e empreendimentos similares devem ganhar especial relevância.

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Expansão

MIREME reitera aposta no desenvolvimento de renováveis A aposta no desenvolvimento de energias renováveis em Moçambique “figura no topo das prioridades do Executivo”. A garantia foi dada pela directora nacional-adjunta de Energia no Ministério dos Recursos Minerais e Energia (MIREME), Marcelina Mataveia, durante a conferência sobre energias renováveis em Moçambique. “O Governo de Moçambique está comprometido com o desenvol-

vimento das energias renováveis”, assinalou Mataveia, para quem a orientação para o auto-consumo constitui uma “mais-valia para o País”, estando já prevista na lei da electricidade em revisão. Com o tema “Energias Renováveis para Auto-Consumo em Moçambique”, a conferência, que decorreu no formato virtual, debruçou-se sobre o potencial do mercado de energia de auto-consumo.

Investimento

Alemanha disponibiliza 55,4 milhões de dólares para a instalação de mini-redes em Moçambique Programa Brilho

Cerca de 300 utilizadores de energias limpas em Moçambique Um total de 300 mil moçambicanos usam energia fora da rede pública, através de sistemas solares domésticos de electrificação promovidos pelo programa Brilho, que lida com energias renováveis em Moçambique. “Desde que começámos, já beneficiámos 300 mil moçambicanos e pretendemos abranger dois milhões até 2024”, disse Javier Ayala, representante do programa Brilho, à margem de uma cerimónia de apresentação de resultados, em Maputo. O programa, com duração de cinco anos, visa acelerar o acesso a energias renováveis fora da rede em Moçambique, através de sistemas solares domésticos, mini redes verdes para electrificação, além de soluções de cozinha melhoradas, com fogareiros que usam menos carvão. Desde que arrancou, em 2020, o programa beneficiou também cerca de 5000 empresas, de um universo de 17 mil a abranger até 2024. O programa Brilho assenta em 15 empresas, sendo financiado pelo Reino Unido, Agência Sueca de Cooperação para o Desenvolvimento e implementado pela Organização Holandesa de Desenvolvimento (SNV). Dados apresentados no local apontam para 180 mil sistemas solares domésticos instalados no País, 50 mil dos quais através do programa Brilho, 60% da meta do Governo.

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Uma nova fundação criada pelo KfW (Banco Alemão de Desenvolvimento) irá disponibilizar um mecanismo de atracção de investimento por forma

a alargar o alcance da rede de abastecimento de energia limpa para mais de 350 mil pessoas em Moçambique. O banco de desenvolvimento estatal alemão criou, para o efeito, a “Fundação Clean Energy and Energy Inclusion for Africa”, que vai adquirir e instalar mini-redes para oferecer incentivos de subvenções a empresas que queiram investir em energias renováveis no continente africano. Com um orçamento inicial de 55,4 milhões de dólares, o fundo de energia limpa concederá subvenções para a instalação de mini-redes e produtos de geração distribuída, como sistemas solares domésticos e luzes solares, arrefecimento, moinhos e bombas. A fundação Clean Energy and Energy Inclusion for Africa pretende apoiar pelo menos 190 mini-redes com uma capacidade total de geração de quase 17 MW.

Transição Energética

Energias renováveis batem recorde mundial mas “ainda persistem desafios”, diz a AIE Um estudo divulgado pela Agência Internacional de Energia (EIA) indica que, apesar do recorde batido este ano, o ritmo ainda é insuficiente para colocar o planeta no caminho da neutralidade de carbono. “O ano de 2021 assistiu a uma implantação sem precedentes de capacidade de electricidade renovável no mundo, mas o ritmo foi muito insuficiente para colocar o planeta no caminho da neutralidade de carbono”, segundo o relatório anual da Agência Internacional de Energia.

A perspectiva é que este ano deverá bater o recorde do ano passado de 290 gigawatts (GW) de nova capacidade instalada, apesar do aumento do custo de alguns componentes e transporte, lê-se no relatório. “No entanto, se os preços dos componentes e materiais se mantiverem tão elevados como estão, até ao final de 2022 o custo do investimento em energia eólica poderá voltar aos níveis anteriores a 2015 e, no solar, três anos de queda dos preços seriam eliminados”, adverte o organismo. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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OPINIÃO

Síndrome da “Substituição de Importações”

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João Gomes • Partner @ JASON Moçambique

Se, aparentemente, a “SI” parece ser uma boa ideia, já a sua implementação foi, até na opinião abalizada de vários economistas que dela foram, inicialmente, seus defensores, absolutamente desastrosa e um rotundo falhanço

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em este artigo a propósito da recente e renovada tendência - (re)iniciada com a Administração Trump, e com ecos em vários países Africanos (v.g. África do Sul1, Uganda, Gana, Moçambique2) - para a adopção de políticas proteccionistas, baseadas na substituição de importações, como meio de: - fazer face à progressiva perda de competitividade das indústrias domésticas (v.g. Como é o caso dos EUA, da China, entre outros); - e/ou proteger as indústrias infantes/ nascentes domésticas (v.g. Como é o caso dos países Africanos), da intensa concorrência internacional. Neste contexto, peço aos leitor@s que comigo analisem as lições de absoluto insucesso (daí ter usado a expressão de síndrome) das políticas de substituição de importações. A - Em que consiste a política de substituição de importações (Adiante “SI”)? Com origem nos anos 19503, a adopção de políticas de “SI” baseia-se, na minha opinião, no seguinte conjunto articulado de nove ideias-chave: 1- Partindo de um contexto de escassez local de moeda forte: por exemplo, as políticas de “SI” surgiram e popularizaram-se logo após o termo da II Guerra Mundial, quando a maior parte dos países se encontrava privada de moeda forte para adquirir bens de consumo e de capital. 2- E com o propósito de criar e/ou reforçar a frágil base industrial doméstica: por exemplo, as indústrias siderúrgica, química, automóvel. 3- Alguns países adoptaram, durante períodos relativamente longos; por exemplo, 10-20 anos4. 4- Medidas restritivas de importação: por exemplo, i) desde a imposição de total proibição de importação; ii) à fixação de elevadíssimas5 tarifas de importação; iii) à definição de reduzidas quotas de importação (Abrangendo principalmente produtos de luxo e de bens não essenciais); iv) à criação e imposição de eleva-

das taxas de impostos, directos e indirectos, sobre o consumo de certos bens (v.g. O equivalente hoje aos impostos especiais sobre o consumo); v) ao muito apertado controlo da utilização de divisas pelos Bancos Centrais. 5- De produtos concorrentes, cuja produção ocorria totalmente no exterior: por exemplo, sem incorporação de i) capital financeiro; ii) capital intelectual (patentes, marcas, etc.) iii) mão-de-obra; iv) e matéria-prima locais. 6- Medidas proteccionistas essas que eram acompanhadas de estímulos ao investimento produtivo nacional: por exemplo, i) incentivos financeiros ao investimento produtivo; ii) isenções fiscais; iii) isenções à segurança social; iv) subsídios à produção; v) investimentos em infra-estruturas (v.g. Parques industriais, zonas económicas especiais); vi) e assistência técnica (v.g. Redes de extensão industrial). 7- Procurando aumentar o nº de empregos nacionais, directos e indirectos. 8- E, bem assim, reforçar a procura de produtos produzidos internamente e criar um mercado doméstico, 9- E, deste modo, atingir a auto-suficiência económica6: Por exemplo, i) procurando equilibrar a balança de pagamentos; ii) aumentar as Reservas Internacionais Líquidas (RIL); iii) e assim diminuir a dependência económica do exterior. Se, aparentemente, a “SI” parece ser uma boa ideia, já a sua implementação foi, até na opinião abalizada de vários economistas que dela foram, inicialmente, seus defensores7, absolutamente desastrosa e um rotundo falhanço8. Que o digam países que experimentaram, na pele, os efeitos muito negativos da “SI” tais como: a Argentina, o Paquistão, as Filipinas, o Chile e a Turquia. B - O Síndrome9 da Substituição de Importações: porque falham as políticas A receita da “SI”, como a melhor estratégia para promover a industrialização acelerada dos países em vias de desenvolvimento, apresenta três contra-indicações insanáveis: 1- Na óptica da estrutura das exportações: os países em vias de desenvolviwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


Entre os requisitos de sucesso na política de substituição de importações, a diversificação da actividade industrial deve ocupar lugar de destaque

mento baseiam as suas exportações em commodities cujos termos de troca, secularmente desvantajosos10, não permitem capturar divisas, agravando os respectivos deficits das balanças de pagamentos. 2- Na óptica dos activos: Em resposta a 1) as políticas de “SI” foram sendo sistematicamente implementadas no sentido de restringir, sem distinção, a importação de todas as classes de activos, i.e., abrangendo quer [produtos agrícolas + quer bens de consumo (e, em particular, artigos de luxo) + quer maquinaria e equipamentos11]. Hoje, sabe-se de ciência certa que alterar o “mix” e discriminar positivamente a “SI”, a classe de maquinaria e equipamentos (cuja produção interna, por falta de tecnologia, era mínima) teria produzido melhores resultados na lógica da aceleração da industrialização da base doméstica. 3- Na óptica da estrutura e da eficiência produtiva: como consequência perversa de 2), a ausência de oferta externa mobilizou a aplicação dos recursos escassos existentes, não na produção de bens de capital (que poderiam ter alavancado as exportações e gerado as necessárias divisas), mas na produção de bens de consumo. Surgiram, deste modo, inúmeras pequenas empresas industriais, redundantes, pouco eficientes, mal organizadas, sem capacidade de gerar economias de escala para fornecerem os respectivos mercados domésticos. E muito menos capazes de concorrer nos mercawww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

dos internacionais. Adicionalmente, e para conter este desvio do investimento em bens de capital, os Governos foram forçados a aplicar altos impostos especiais sobre o consumo interno, agravando a anemia de recursos financeiros disponíveis para i) a poupança doméstica; e ii) para o investimento. Conclusão Com o advento do comércio livre, cujos expoentes na actualidade apresentam formatos diferentes i) Zonas de Comércio Livre (v.g. NAFTA); ii) União Aduaneira (v.g. Mercosul); iii) Mercado Comum; iv) e União Económica e Monetária (v.g. União Europeia), as políticas baseadas na lógica da “Substituição de Importações” deixam de ter qualquer viabilidade, porquanto acolhem práticas anti concorrenciais. Resta aos países em vias de desenvolvimento i) explorarem, “por dentro e de dentro”, as regras, excepções e adaptações previstas nos instrumentos que promovem o livre comércio internacional; ii) estimularem medidas de poupança interna; iii) promoverem a diversificação da base industrial e, bem assim, iv) das exportações de produtos nativos, mas com valor acrescentado. Tudo sem proteccionismos exagerados, até porque “toda a acção gera reacção”: e a ideia da substituição de importações, entretanto dada como “morta e matada”, é como um gato, tem sete vidas e poderá revidar.

África do Sul: recentemente, o Ministro das Finanças Tito Mboweni referia que “…(we) want to set-up manufacturing to make what we need to stop relying on imports from China”. In “Imports Substitution is making an unwelcome comeback”, Peterson Institute for International Economics. 2 Moçambique: intervenção do Primeiro Ministro Carlos do Rosário no seminário “Industrialização integrada: alinhamento estratégico e operacional”. In https://www.mic.gov.mz/por/ noticias/Governo-promove-industrializacao. 3 Na Argentina, pela mão do economista PREBISCH, Raúl. 4 LEWIS, Arthur (1956) “The Theory of Economic Growth”. London: Allen & Unwin. 5 Existem exemplos em que as tarifas de importação chegaram a 500%. 6 Sobre o conceito de auto-suficiência económica ver GOMES, João “(in) Dependência Económica”, publicado na Revista Economia & Mercado, edição de Junho de 2021. 7 Raúl Prebisch; Gunnar Myrdal, W. Arthur Lewis, Albert Hirschman, and Ragnar Nurkse. 8 Bruton, Henry J. 1998. A Reconsideration of Import Substitution. Journal of Economic Literature. 9 Pedi emprestada esta expressão ao economista ALEJANDRO, Carlos Dias “Theory and Experience of Development Economics: Essays in Honor of Sir W. Arthur Lewis”, edição de Mark Gersovitz. 10 Raúl Prebisch “Exports of primary products would experience a secular decline in their terms of trade, forcing them to export more and more for fewer and fewer imports”. 11 Para termos uma ideia de grandezas, em 2018, em Moçambique, o grupo de “máquinas e aparelhos” representou 16,3% (1 331,2 Milhões de USD) das importações. 1

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NÚMEROS EM CONTA

A

O ABC dos CBDCs ou Como os Bancos Centrais Pensam o Dinheiro Digital A Tesla tem reinado supremo entre as empresas de carros eléctricos, desde que lançou o Roadster pela primeira vez em 2008. A empresa sediada na Califórnia, liderada por Elon Musk, terminou o ano de 2020 com 23% do mercado dos veículos eléctricos (VE) e tornou-se, recentemente, no primeiro fabricante de automóveis a atingir uma capitalização de mercado de 1 bilião de dólares.

Acessibilidade

dig

De onde vem o dinheiro? Os CDB devem ser emitidos pelo banco central e apoiados pelos respectivos governos, o que difere das moedas criptográficas que, na sua maioria, não têm filiações governamentais.

ido pelo banc o emit

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Depósitos bancários

Como funciona a moeda? Os CBDCs decompõemse em abordagens baseadas em tokens e em contas. Um CBDC baseado em tokens funciona como as notas, onde a sua informação não é conhecida nem necessária por um caixa ao aceitar o seu pagamento. Um sistema baseado em contas, no entanto, requer autorização para participar na rede, semelhante a pagar com uma carteira ou cartão digital.

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Tecnologia

Forma Físico ou digital? A forma do dinheiro determina a distribuição e o potencial de diluição, e os futuros CBDCs emitidos serão completamente digitais.

É o grande factor para determinar o seu lugar dentro da taxonomia do dinheiro. Por exemplo, o dinheiro e os CBDCs de uso geral são considerados amplamente acessíveis.

m

No entanto, concorrentes como a Volkswagen esperam acelerar os seus próprios esforços de VE para desalojar a empresa de Musk como fabricante dominante de um mercado em ascensão. Este gráfico, baseado em dados de EV Volumes, compara as posições actuais da Tesla e de outros fabricantes de automóveis de topo, e fornece projecções de quotas de mercado para 2025.

Reservas de Bancos Centrais e contas

Contas de Bancos Centrais

Tokens de Bancos Centrais (Retalho

Tokens de Bancos Centrais (Gerais)

Tokens Privados (Retalho)

Os CBDCs a retalho dos Bancos Centrais estão disponíveis para o público em geral enquanto que os CBDCs a retalho têm venda restrita a instituições financeiras.

Um CBDC soma-se à oferta de dinheiro e opera de forma similar com os câmbios do dia.

Tokens digitais privados

Dinheiro

ENQUANTO PARECE QUE AINDA VAI DEMORAR UNS ANOS ANTES DE SE MASSIFICAREM OS CBDC HÁ PROGRESSOS A SEREM FEITOS AUTORIDADES LEGAIS A EMITIREM CBDC Sim

Incerto

Legislação a ser alterada

Percentagem de dependentes (%)

Bancos Centrais que responderam positivamente às autoridades legais sobre a probabilidade de emissão de CBDC aumentaram consideravelmente desde 2017.

*Não havia opção legislação em 2017

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Não

A PROBABILIDADE DA EMISSÃO DE CBDCS CONTINUAR A CRESCER Improvável

Possível

Curto-prazo (1-3 anos)

Provável Médio-prazo (1-6 anos) Mais de 50% dos Bancos Centrais dizem que a emissão de CBDC é possível, ou provável no médio-prazo.

Percentagem de respostas

FONTE: Banco de Liquidações Internacionais

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NAÇÃO | TURISMO

Quem Vai Livrar o Turismo do Covid-19? Há dois anos que assistimos, impotentes, à morte lenta de um sector responsável por dezenas de milhares de postos de trabalho. As várias iniciativas postas em prática para minimizar falências não têm sido plenas e todos os dias os operadores fazem novas contas para conseguirem o milagre de voltar a abrir portas no dia seguinte. A vacina chegou a dar algum ânimo ao sector mas, agora, uma nova crise está de regresso. Afinal, quem vai trazer as “doses” para imunizar o Turismo? Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R

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NAÇÃO | TURISMO

N

os finais do ano passado, todos os dados indicavam que 2021 seria o ano do começo da recuperação da actividade turística e que 2022 era o arranque da sua consolidação. Ao contrário disso, vão chegando más notícias que não só suscitam medidas mais arrojadas com alguma urgência, como reacendem o debate sobre o velho problema do sector: a falta de competitividade explícita no fraco aproveitamento do potencial que o País apresenta. Desta vez, os ânimos foram agitados pela suspensão, no início de Dezembro, dos voos e encerramento de fronteiras por parte dos países da União Europeia (UE), Reino Unido, EUA e não só, para alguns destinos da África Austral, incluindo Moçambique, temendo a rápida propagação da variante Ómicron do Covid-19, supostamente descoberta na África do Sul. Algumas dessas restrições estão agora suspensas, mas tiveram de ser imediatamente contestadas (e ainda são) dentro e fora do País. Os hotéis, restaurantes e a área de eventos estão a registar cancelamentos que contrariam todas as contas que se faziam para este período de férias e festas. É a mesma crise que, acabada de ir embora, agora regressa e bate à porta de operadores ainda muito fragilizados: no ano passado, as perdas chegaram aos 4636 milhões de meticais em volume de negócios, uma média de 95% da produção total do sector, 18 mil trabalhadores foram despedidos e verificou-se uma taxa de crescimento de 32% negativos. Até agora, segundo dados do Instituto Nacional do Turismo (INATUR), o Turismo gerou uma perda de 53% em termos de chegadas de turistas, comparativamente ao ano de 2019 quando se registou um número de pouco mais de dois mil turistas. “Parte dos eventos que haviam sido marcados para Janeiro já foram cancelados e estamos a tentar encontrar formas de aliciar clientes a evitarem os cancelamentos. Mesmo assim, os meses de Dezembro e de Janeiro já estão com as contas comprometidas”, lamenta o director da cadeia de Hotéis VIP, um dos maiores grupos hoteleiros do País, Dado Gulamhussen. O responsável exibia um semblante

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carregado de preocupação e um misto de frustração quando, a dada altura, desabafou: “Precisamos do mundo para termos os hotéis e restaurantes ocupados, já que são os turistas que vêm de fora os principais actores no que diz respeito a conferências internacionais, investimentos, seminários, etc”. Baixar preços para sobreviver A E&M falou também com operadores de Inhambane, uma das províncias mais turísticas do País, a par de Cabo Delgado. O ambiente, por lá, é também mau. Suzana Vidal, fundadora do Hotel Bahia – ao largo do Arquipélago de Bazaruto –, um dos mais frequentados e requisitados por turistas de todo o mundo, começa por lembrar que, no ano passado, “tivemos de tomar medidas drásticas. Despedimos grande parte dos nossos trabalhadores e reduzimos os custos ao mínimo e foi muito difícil fazer a escolha entre fechar a porta e mantê-la aberta, mas conseguimos sobreviver”. Já em 2021, começou a registar-se alguma recuperação que, embora lenta,

já era animadora porque permitiu readmitir parte da mão-de-obra. Nos meses de Setembro e Outubro a situação melhorou ainda mais. “Cheguei a Outubro e disse para mim mesma que o pior já tinha passado, por ter sido um mês tão bom que os turistas vieram da Europa e de outras partes e o Turismo voltou a fluir”, disse. Mas a crise não tardou e “o mês de Dezembro está muito fraco, o que contraria a tendência natural da época festiva, em que, mesmo com Covid-19, temos muitos moçambicanos e sul-africanos a procurarem pelos nossos serviços. Estamos outra vez a sofrer com as restrições. Tínhamos um casamento marcado, com pessoas que vinham de Israel e que traria convidados que vinham ficar por duas semanas, outros até passariam cá o Natal. Mas está tudo cancelado e estamos outra vez nesta agonia e não vemos a hora disto acabar”, desabafou a empresária. Suzana Vidal considera ser muito difícil traçar o cenário futuro e diz que não é preciso que a situação se estenda por muito mais tempo para que, já www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


que, quando houvesse a necessidade de receber turistas, não tivesse grandes dificuldades, sobretudo nas festas de Natal e do fim de ano, quando se regista o pico do turismo. Mas, agora, com esta nova estirpe, regredimos”, lamentou.

“Parte dos eventos que haviam sido marcados para Janeiro já foram cancelados e estamos a tentar encontrar formas de aliciar clientes a evitarem os cancelamentos" em Janeiro de 2020, tenha de voltar a mandar trabalhadores para casa, apesar de todo o pessoal do Hotel Bahia já estar vacinado e a aplicar todas as medidas anti-covid. Ângela Caratelli, gestora do Vilanculos Beach Lodge, estância que só reabriu em Junho depois de ver reduzida a zero a sua taxa de ocupação dois dias após a eclosão da pandemia, diz que o seu empreendimento socorre-se do marketing, promoções e contacto com agentes de viagens e ex-clientes para tentar projectar-se. Também se registam cancelamentos na sequência das restrições mais recentes, o que está a reduzir artificialmente as tarifas para conseguir clientes. A mesma técnica está a ser seguida por muitos outros operadores. “Os nossos preços agora estão pela metade porque estamos à procura de clientes e, se não fizermos isso, não vai dar certo. O Hotel Polana também está a fazer o mesmo. Antes cobrava entre 10 e 20 mil meticais por noite, mas hoje cobra muito menos porque precisa de ter pelo menos o valor de quarto para pagar as suas despesas fixas www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

mensais”, explicou Dado Gulamhussen, Gestor dos Hotéis VIP. Encontrados 'prevenidos' Nem sempre é preciso estar/ser desatento para perder. De acordo com Dado Gulamhussen, isto acontece numa altura em que o sector até já se estava a preparar para evitar um novo recuo provocado, quer por novas variantes, quer pela eclosão da quarta vaga da doença. “Há pouco tempo, surgiu uma campanha promovida pelo Ministério da Saúde e do Turismo, para vacinar todos os intervenientes, colaboradores e actores da indústria do Turismo, incluindo a parte da restauração e de eventos. Esta iniciativa veio juntar-se ao processo que a CTA – a principal organização do sector privado nacional – e o próprio Governo estavam a levar a cabo desde meados deste ano, quando receberam grandes quantidades de doses da vacina”, esclareceu gestor dos Hotéis VIP. O propósito central, prosseguiu, “era criar condições para que o sector transmitisse segurança a quem vem de fora, e estivesse preparado para

Necessidade de apoios “Quero reiterar que o sector do turismo está a precisar de ajuda financeira e de descontos nos custos fixos como electricidade, obrigações fiscais, etc. O próximo ano não vai ser fácil – vamos precisar de apoio”, apela Ângela Caratelli. Aliás, a tónica de discussão é quase sempre a mesma desde que a pandemia começou. “Na crise anterior, houve momentos em que tive de dizer às autoridades que se pagasse salários não poderia pagar impostos e vice-versa. Tendo optado por pagar os salários, acumulei multas em impostos, que só paguei quando a situação recuperou”, desabafou Suzana Vidal. Outra grande estratégia para dar a volta por cima em situações de crise, de acordo com esta empresária, é a aposta no turismo interno. “O que nos salvou no ano passado foi o turismo nacional, porque assim que o Covid-19 atacou, direccionámos imediatamente as nossas energias para captar o turismo nacional: reduzimos consideravelmente os preços e os mantemo-los baixos para moçambicanos e residentes em Moçambique”, explicou. Crise actual vs problemas estruturais Muito crítico em relação ao que o sector do Turismo é hoje e o que acredita que poderia ser se explorado no seu máximo potencial, Quessanias Matsombe, operador turístico com várias estâncias no distrito de Bilene, em Gaza, preferiu tocar em aspectos estruturais a serem corrigidos. Afinal, acredita que se a indústria fosse forte teria construído bases suficientes para resistir à crise do novo coronavírus. “O bilhete electrónico é um meio que poderia facilitar o acesso ao nosso país, já que facilita a obtenção do visto de entrada a quem tem a possibilidade de pagar com o seu cartão de crédito, no lugar de proceder como actualmente, em que é preciso que o turista tenha de enfrentar a burocracia das embaixadas e outras representações diplomáticas”, criticou

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em jeito de sugestão. “Não basta ter praias limpas, mais de 2000 quilómetros de costa, camarão, gastronomia de invejar, povo alegre e hospitaleiro… é preciso um plano estratégico para capitalizar esses recursos todos”, sugeriu. Avançou o exemplo de países, como as Seicheles, que “não têm fauna nem flora, têm praias iguais às de Moçambique e outras até cheias de rochas, mas estão avançados. Até a Eswatini, que é um território reduzido, sem praia e sem qualquer tipo de atracção que não exista em Moçambique, segue à frente nas estatísticas do Fórum Económico Mundial sobre o Turismo. A diferença é que os suazis, mesmo não tendo nada, optaram por vender a sua cultura, o que nós não conseguimos fazer”, argumentou o empresário. E mostrando uma certa indignação com as opções nas políticas de desenvolvimento, foi um pouco mais longe: “No nosso país, as pessoas estão mais preocupadas com o gás, pensa-se que tudo o resto tem de passar pelo gás. Olhe só para a agricultura! Agora que

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“Não basta ter praias limpas, mais de 2000 quilómetros de costa, gastronomia de invejar, povo alegre e hospitaleiro… é preciso um plano estratégicos para capitalizar esses recursos” tem um ministro que pensa fora da caixa está a dar passos. Com cerca de dois anos à frente do sector começa a trazer resultados visíveis ao nível da produtividade”, concluiu. Dado Gulamhussen, gestor dos hotéis VIP, segue na mesma linha: “Para podermos nos reinventar temos de criar pacotes turísticos apetecíveis, promoções, ofertas diversificadas. E as empresas que estão neste ramo como a Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) têm de rever os seus preços para possibilitar a prossecução deste objectivo”. Mas é preciso muito mais: que os diversos intervenientes se juntem pela causa e produzam soluções viáveis para todos. “A agência de via-

gens Cotur, por exemplo, consegue fazer um pacote turístico completo, com um preço final que inclui passagem, hospedagem, alimentação, visita a reservas, museus, manifestações culturais diversas, etc. e a LAM pode fazer o mesmo. Não posso acreditar que, para irmos a Pemba, por exemplo, tenhamos de despender mais de 25 mil meticais só na compra do bilhete de avião”, questionou. Para o responsável, esta é uma das razões por que não se consegue fazer uma aposta focada no turismo doméstico, levando a que as pessoas prefiram juntar as suas poupanças para passarem férias em lugares mais distantes como Portugal, África do Sul, entre outros destinos. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


NAÇÃO | TURISMO

menos rigorosos, o Decreto 108/2014, que estabelece o regime jurídico do cidadão estrangeiro, não prevê este regime simplificado, fazendo com que algumas embaixadas e representações consulares continuem a exigir os requisitos previstos para a obtenção de vistos de trabalho, tais como o contrato de trabalho, certificado de habilitações literárias e quitação. Sobre este assunto, o SENAMI diz que emitiu uma instrução para que os funcionários harmonizem os procedimentos com os requisitos constantes no Decreto nº 37/2016, de 30 de Dezembro. Assim sendo, nos casos de pedido de vistos de trabalho de curta duração, concedido aos especialistas para prestação de serviços urgentes, o SENAMI já não tem solicitado documentos como contrato de trabalho, certificado de habilitações literárias e quitação do INSS.

Vistos de entrada, a secular 'dor de cabeça' A actual crise entra numa altura em que está em cima da mesa uma questão tão antiga quanto preocupante: a questão da dificuldade da emissão de vistos de entrada, tida como uma barreira substancial à entrada de turistas e à competitividade deste sector. A CTA chegou a reunir-se com os Serviços Nacionais de Migração (SENAMI) para abordar e tentar resolver em definitivo esta questão. Entre outros assuntos está a morosidade na concessão de vistos, esclarecimento sobre requisitos para obtenção de vistos de negócio e de trabalho de curta duração, a falta de harmonização dos requisitos neces-

sários para a concessão de vistos nas várias embaixadas de Moçambique (os requisitos exigidos pelas diferentes embaixadas não estão harmonizados), dificuldades na concessão de vistos de residência e dificuldades para obter DIRE na província de Sofala. Mas quais são os problemas em concreto? Vistos de Curta duração De acordo com a CTA, nota-se que, embora o Decreto nº 37/2016, de 30 de Dezembro, que estabelece o regime jurídico de contratação de mão-de-obra estrangeira, tenha estabelecido o regime de trabalho de curta duração, cujos requisitos para a aprovação da comunicação de trabalho sejam

Apesar de o Decreto de 2016 estabelecer um regime de contratação de mão-de-obra estrangeira menos rigorosa, esta regra não tem sido observada nas diferentes embaixadas www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

Residência permanente A CTA apresentou, igualmente, a preocupação dos empresários em obter um visto de residência e dificuldade de DIRE na província de Sofala. Sobre esta questão, o SENAMI esclareceu que este é automaticamente concessionado aos investidores, que pretendem investir no País um valor igual ou superior 500 mil dólares, nos termos do Artigo 17 do Decreto 3/2017, de 24 de Março. Já em relação ao processo de emissão de DIRES na província de Sofala, nega que o mesmo já tenha sido interrompido. Outros dados a ter em conta Uma pesquisa de José Julião da Silva, quadro da Universidade Pedagógica de Maputo, com o título “Turismo em Moçambique: oportunidades, desafios e riscos” faz um overview oportuno sobre o que se passa neste sector e que vale a pena visitar ao abordá-lo a fundo. De acordo com o autor, a localização geográfica de Moçambique é um dos principais factores que contribuem para a vulnerabilidade do país aos eventos extremos, na medida em que alguns dos ciclones tropicais e depressões são formados no Oceano Índico, atravessam o Canal de Moçambique e afectam a zona. Por outro lado, o país apresenta uma extensa linha da costa, sendo

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atravessado pela maior parte dos rios internacionais que desaguam no Oceano Índico, facto que faz com que algumas áreas costeiras estejam sujeitas a cheias e inundações (exemplos são vários e podem ir desde as cheias que, tiveram lugar nos anos 2000 e 2001 no Sul e Centro de Moçambique, aos ciclones Idai e Kenneth, mais recentemente). “Situações como estas, provocadas por desastres naturais, afectam não apenas as actividades directamente associadas ao Turismo, mas toda a cadeia de produção e oferta de bens e serviços, facto que evidencia o grau de inter-relação da indústria do Turismo com outros sectores e revelando, ademais, a sua dependência do funcionamento de infra-estruturas públicas”, constata o autor, no estudo publicado há dois anos. Em termos da vulnerabilidade, prossegue, os dados históricos mostram que as regiões Centro e Sul do País são as mais propensas a riscos de cheias, secas e ciclones tropicais. Um breve olhar sobre os efeitos do covid-19 no sector levam José Julião da Silva a lembrar que desde princípios de 2019, entre os diferentes sectores económicos, o turístico tem sido um dos mais afectados. Ora, considerando que as facilidades turísticas como hotéis e outras formas de alojamento, restaurantes entre outras,

foram criadas essencialmente para servir viajantes internacionais e nacionais, pode-se facilmente com-

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"Considerando que as facilidades turísticas foram criadas para servir viajantes internacionais e nacionais, pode-se facilmente compreender como estão a ser afectados" preender como os mesmos estão a ser afectados. “Esta situação afecta não apenas o sector turístico directamente, mas toda a sua cadeia produtiva”, enfatizou. Em jeito de conclusão, a pesquisa indica que as oportunidades para o desenvolvimento do Turismo em Moçambique são muitas e diversificadas, a maioria das quais resultantes das condições físico-naturais, que se juntaram a aspectos de natureza cultural, que beneficiaram da extensa abertura para o Oceano Índico. Apesar disso, no entanto, os desafios são igualmente significativos, resultando da capacidade limitada deste espaço em responder às necessidades e exigências do turismo. Este facto, segundo o autor, prende-se com o baixo nível de desenvolvimento que o País apresenta, caracterizado por apresentar carências a todos os níveis e em todos os sectores.“Esta reduzida capacidade de resposta local e nacional, conduz ao crescimento do investimento externo, contribuindo para o crescimento da dependência externa”,

constatou. “Além disso, convém referir o seguinte: se a localização geográfica de Moçambique constitui um dos seus elementos mais favoráveis, e que permite ao país ter vantagens comparativas em relação a alguns sectores, constitui também uma das principais condições que contribuem para a vulnerabilidade do País, sobretudo em relação a eventos extremos como, por exemplo, ciclones que afectam as áreas costeiras que são privilegiadas pelo Turismo, aumentando, igualmente, a propensão para a ocorrência de inundações”, repisou. Conclui ainda que “o desenvolvimento do Turismo envolve alguns riscos, alguns dos quais resultantes da própria essência desta actividade, caracterizada por ser alimentada por viajantes, visitantes, ou seja, indivíduos 'estranhos aos destinos turísticos'". Isto é, "não havendo viagens, o turismo pára, o que tem implicações em todas as áreas de actividade com as quais o turismo tem relação”, conclui. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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OPINIÃO

Turismo Vai Recuperar. Mas Quando?

A

Alberto Pitoro • Director de Tesouraria do Absa Bank Moçambique

Neste momento, Moçambique está também perante uma subida exponencial de casos de COVID-19... Neste contexto, que cenário se pode desenhar para o Turismo nacional?

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nível global, o Turismo é dos sectores que mais se tem ressentido das consequências do COVID-19, devido à mobilidade restrita e ao distanciamento social que vem vigorando. Em Abril de 2020, a Organização Mundial do Turismo (OMT) referia que quase todos os destinos globais (96%) tinham implementado restrições ou banido as viagens desde Janeiro do mesmo ano. Em Moçambique, o sector do Turismo também foi bastante afectado. O inquérito sobre o impacto do Covid-19, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística (Abril-Junho de 2020), indica que no sector de Alojamento, Restauração e Similares, de um total de 5669 empresas inquiridas, 97,1% tinham sido afectadas. No segundo trimestre de 2020, o PIB do sector do Turismo caiu em 35% relativamente a igual período de 2019. Em 2020, a economia Moçambicana registou uma recessão de 1,3%, onde o sector do Turismo registou uma queda em 22,54%, devido às limitações internas, impostas pela vigência dos Estados de Emergência e Calamidade Públicas desde Março de 2020, e externas. Com a implementação de programas de vacinação, sobretudo nos países desenvolvidos, as restrições às viagens e à prática de actividades impulsionadoras do turismo foram gradualmente aliviadas em 2021. Em Julho, a OMT indicava que, desde Junho, apenas 29% (64) de todos os destinos do mundo estavam com as fronteiras totalmente fechadas ao turismo internacional. O que de certa forma os dados indicavam uma ligação entre a velocidade da vacinação e a flexibilização das restrições.

Em Moçambique, com o alívio das restrições, à medida que a vacinação avançava e a pandemia se mostrava controlada, mesmo com o surgimento da segunda e terceira vagas (Janeiro e Julho de 2021, respectivamente), o sector do Turismo registou alguma tendência de recuperação conforme dados do Instituto Nacional de Estatística. Após um abrandamento da recessão no primeiro trimestre do ano (15,13%), o sector registou taxas de crescimento positivas no segundo (4,03%) e terceiro (5,09%) trimestres, em relação a períodos homólogos de 2020. Desde Outubro, o País convive com medidas restritivas do Estado de Calamidade Pública de nível 1, e taxas de infecção, internamento e óbitos muito baixas, mantendo-se, entretanto, vedada a frequência às praias, uma das principais impulsionadoras do turismo. Por isso, o sector aguardava, com bastante optimismo, pelo levantamento desta restrição no final do ano, o que poderia conduzir a uma robusta recuperação em 2022. Contudo, a actual escalada global de casos de COVID-19, associados à nova variante Ómicron, coloca em risco essa expectativa. As restrições às viagens mantêm-se. Em alguns países, foram recentemente agravadas, com destaque para o banimento, sobretudo por países europeus e americanos, das ligações aéreas com certos países da África Austral, incluindo Moçambique. Neste momento, Moçambique está também perante uma subida exponencial de casos de COVID-19, tendo passado rapidamente de 20 casos novos, a 30 de Novembro, para 443 casos novos, a 11 de Dezembro. Neste contexto, que cenário se pode desenhar para o Turismo nacional? Em primeiro lugar, a escalada de cawww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


A nova variante da Covid-19 e a escalada global do número de casos voltam a trazer preocupação ao sector do Turismo

sos reduz as possibilidades de alívio adicional das restrições em vigor, sobretudo da proibição de frequência das praias. Em segundo, na eventualidade de uma quarta vaga, com impacto semelhante ou superior ao da terceira vaga, torna-se iminente um agravamento das restrições. Nesse caso, a experiência com as vagas anteriores sugere que medidas mais severas poderão prevalecer, pelo menos, durante todo o primeiro trimestre de 2022. Assim, um relaxamento pós quarta vaga poderá ocorrer no segundo trimestre, o que significa a perda completa de uma temporada de Verão para o Turismo. Em terceiro, o crescimento de 5,10% do sector no terceiro trimestre do 2021, em termos absolutos, corresponde a 73% do nível registado no terceiro trimestre de 2019, ou seja, uma queda de 27%, www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

comparativamente ao período pré-pandemia. A OMT espera que em 2021 o movimento de turistas internacionais permaneça 70% a 75% abaixo dos níveis de 2019, um declínio semelhante ao de 2020. Quase metade dos especialistas inquiridos (45%) espera que o turismo internacional retorne aos níveis de 2019 em 2024 ou mais tarde, enquanto 43% apontam para uma recuperação em 2023. Para África, 50% acredita no retorno em 2023, e 43% em 2024 (7% em 2022). No actual estágio, o sector do Turismo nacional poderá registar, no quarto trimestre de 2021, um tímido crescimento positivo em relação ao quarto trimestre de 2020. Porém, o volume de actividade continuará abaixo do nível registado no período pré-pandemia (2019) em mais de 15%. Para que, em Dezembro de 2022,

o Turismo retorne aos níveis de 2019, deverá crescer trimestralmente a uma taxa anual constante de 12,9%, incluindo o quarto trimestre do corrente ano, o que se mostra pouco provável e traça um quadro sombrio para o sector em 2022. Havendo alguma relação entre as taxas de vacinação e a abertura ao turismo, Moçambique enquadra-se ainda no grupo com taxas de vacinação muito baixas (13,8%, 9 Dez) comparativamente à media global (44,29%), das Américas (57,53%), da Europa (54,14%) e da África do Sul (25,2%), embora superior à média Africana (5,72%). A adesão massiva à vacinação poderá contribuir para a retoma mais rápida do sector do Turismo, assim como da economia em geral, reflectindo o longo caminho por percorrer durante os próximos anos.

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Turismo Ganha Nova Variante de Preocupação: a Incerteza Podem as restrições nas ligações aéreas afectar o comércio e o desempenho macroeconómico de Moçambique, sendo o mar a principal via do comércio internacional? Especialistas dizem que sim e explicam porquê Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R

T

udo começa no Turismo, o sector directamente penalizado, mas pode ir muito mais longe. E a primeira questão seria: como pode ser afectado o comércio das economias cujas ligações aéreas foram suspensas, uma vez que o maior volume de garga do comércio internacional é por via marítima e ferro-portuária e não aérea? A resposta parece óbvia. Mas a cadeia de efeitos oferece um campo muito amplo de análise e pode descortinar potenciais ameaças à retoma da estabilidade. Mais do que discutir a legitimidade ou não da própria suspensão dos voos – como se tem feito desde que a medida foi anunciada no início de Dezembro corrente –, a E&M foi ouvir especialistas sobre o que realmente pode acontecer a partir daqui, e caso a suspensão seja mantida por um, dois, três ou mais meses. É que as contestações emitidas por diversas organizações nacionais, regionais e até internacionais, que se seguiram ao anúncio do isolamento da região, dão a entender que a medida pode trazer efeitos perniciosos, mas que ficam ocultos na ausência de uma análise profunda. Com a ajuda de três economistas, fica nítido o futuro imediato e preocupante, da economia moçambicana (e de todos as economias abrangidas, claro), embora ainda haja, neste momento, poucos dados que conduzam a uma leitura concreta das projecções. As condições vão mudar Em anonimato (por razões de ordem profissional), um economista

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nacional, especialista em estudos de projecções macroeconómicas e que produz relatórios periódicos de conjuntura, começou por criticar: “Isto reflecte algum pânico dos países que restringiram as ligações aéreas com a África Austral. Reflecte alguma falta de conhecimento, mas também alguma falta de sensibilidade”. E depois esclareceu que “terá impacto mais severo sobre o Turismo, mas o comércio também vai ser afectado”. Como? Mesmo assumindo que a maior parte das trocas comerciais externas são feitas por mar, o economista explicou que as rotas aéreas também são utilizadas para transportar certas componentes em equipamentos e realizar determinadas operações. “Há projectos que estão a ser implementados, que requerem a movimentação de técnicos e pessoal qualificado, e que poderão sofrer e ficar prejudicados com esta situação”, sublinhou. A gravidade dos efeitos a este nível pode levar, segundo o economista, a que “provavelmente o PIB do último trimestre possa situar-se um pouco abaixo do que seria caso não tivéssemos restrições, por haver sectores que serão directamente afectados (como o Turismo). Mas, se houver o levantamento das restrições, pode ser que a tendência de recuperação se mantenha no próximo ano”. Insegurança dos investidores Entretanto, mais do que o impacto no comércio, o economista fala de “um conjunto de resultados de que não nos devemos esquecer, e que têm impacto sobre as expectativas”, já que

uma mudança brusca no ambiente de negócios gera alterações imediatas nas decisões dos investidores. “E este fenómeno pode resultar numa menor aceleração da actividade económica, ocasionada por um menor fluxo de investimentos e, em último plano, ter impacto negativo sobre a recuperação da estabilidade económica”. É nas expectativas dos investidores que incide também a visão do economista Roque Magaia, da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA) – a maior organização patronal do País. “As expectativas serão, em grande medida, afectadas por factores de incerteza. A questão da nova variante ainda não é conhecida, nem a sua natureza, nem a sua evolução futura, o que pode acabar por distorcer as projecções macroeconówww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


micas que tinham sido feitas para o curto e médio prazo”, explicou. E prosseguiu: “Essa incerteza faz com que os agentes económicos privilegiem uma postura cautelosa nas suas actividades. Por exemplo, os investidores nas Bolsas de Valores perdem o apetite em segurar os títulos e procuram libertar-se porque os activos financeiros correm o risco de se tornarem voláteis. Este é apenas um exemplo do que vai acontecer com todos os indicadores macroeconómicos, sobretudo a taxa de câmbio, que influencia a inflação e o comércio externo”, explicou Roque Magaia, para quem a gravidade da instabilidade vai depender do tempo que estas restrições vão durar. Aliás, o mesmo entendimento tem Michael Sambo, do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), ao www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

Com muitos turistas a cancelarem as viagens ao País, outros sectores da economia serão afectados, garantem os economistas revelar que “caso estas medidas se prolonguem poderão reflectir-se na economia. Basta olhar para a estrutura do Investimento Directo Estrangeiro (IDE) que vai muito além do Investimento Directo Nacional, e que é realizado maioritariamente por companhias de capital estrangeiro que precisam da circulação de bens de capital como de pessoas com compromissos no exterior”. Efeitos serão em cadeia Ao contrário do economista que falou

à E&M em anonimato, Roque Magaia não vê consequências tão graves ao nível do comércio externo, porque “as restrições têm que ver com a circulação de pessoas e não de carga, uma vez que as fronteiras não foram encerradas nem os Portos foram fechados, significando que o volume de carga continua a obedecer o seu fluxo normal”. Mas reconhece que a medida, que já afecta directamente o sector do Turismo, e que agora experimenta o cancelamento de mais de 70% das

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POSSÍVEIS PERDAS NAS EXPORTAÇÕES… O peso do comércio com os cinco maiores destinos das exportações nacionais, no conjunto dos que restringiram as ligações com Moçambique, ultrapassa os 28%, o que é significativo e pode ser impactante se o comércio tiver de ser afectado por esta medida 10,2 634,7

3

3 104,7

109,6

Espanha Singapura

5,7 206

6,7

Total

238,6

28,6% 1293,6

Holanda

Itália

Reino Unido

… POSSÍVEIS PERDAS NAS IMPORTAÇÕES Aqui, o peso seria relativamente menor, mas não menos penalizador, visto que a economia moçambicana, sendo pouco produtiva, é muito dependente das importações

5,6

1,7 109,8

Itália

1,97 127,5

2,4 154,1

3,5

362,8

Total

230,3

15,17% 984,5

Reino Unido

EUA

Portugal

Singapura FONTE Anuário estatístico de 2020

Peso em % do total

Em milhões USD

reservas, vai impactar indirectamente sobre outros sectores. “Há muitos sectores que, por estarem associados ao Turismo, poderão sofrer quedas de desempenho, como o comércio interno e os Transportes”, esclareceu. Assim, empresas como agências de viagens e área da restauração vão sofrer. E a cadeia de efeitos não pára por aqui: “Os fornecedores de produtos alimentares aos restaurantes, que estão na Agricultura e no Comércio, também serão impactados”, concluiu Roque Magaia. Já o economista Michael Sambo, pesquisador do (IESE), acrescentou que “mesmo sendo verdade que o maior volume de comércio não seja feito por via aérea, esta é a que mais flexibiliza a deslocação de pessoas, que são as principais responsáveis pelos acordos de comércio e que, muitas vezes, têm de fazer visitas para conferir a qualidade dos produtos a encomendar, negociar as transacções presencialmente, para depois

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serem enviados por via marítima ou terrestre, conforme o caso”. Isto é, “o próprio comércio internacional sofre restrições”, segundo o pesquisador. Além disso, no campo das relações com o exterior, no que diz respeito ao turismo de negócios, por exemplo, nem toda a interacção pode ser feita online. Ou seja, há questões relacionadas não só com a verificação dos produtos, e que acabam por se estender para a necessidade de movimentação de expedientes que exigem a presença física de pessoas que garantem os investimentos. “Então, neste caso, poderá haver impacto negativo nos investimentos por via da negociação, assim como poderá reduzir o volume de comércio”, explicou o pesquisador do IESE. Riscos cambiais e de inflação Além das restrições nas ligações aéreas e a cadeia de efeitos daí resultante, a quarta vaga, por si só, que incide mais nos principais parcei-

ros de cooperação de Moçambique, é também um indicador para o qual se deve ficar em alerta. “É que as restrições, podendo ser severas nesses países, vão afectar a capacidade de dar vazão às encomendas que já foram feitas, o que pode atrasar as entregas, levando à subida do preço dos produtos importados. Situação similar já foi verificada nos Estados Unidos, em que produtos de primeira necessidade chegaram a ficar mais caros por causa da demora na entrega devido ao Covid-19. Esse é um risco real para o nosso caso também, mas no curto prazo, lembrando que Moçambique é um país que depende muito de importações para o consumo, comércio e até em matéria-prima para a indústria”, observou Michael Sambo. Covid-19 vs interesses SADC/UE Está em vigor, desde 2016, um acordo entre a União Europeia (UE) e seis países da África Austral, nomeadamente Moçambique, Botsuana, Lesoto, Namíbia, África do Sul e Suazilândia (contempla os cinco abrangidos pelas restrições já referidas). Tal acordo concede às suas exportações um acesso imediato, isento de direitos e sem contingentes, ao mercado da UE. Na altura em que o mesmo entrou em vigor, as trocas comerciais estavam avaliadas em quase 64 mil milhões de euros, com os seis países da região a enviarem à UE principalmente minerais e metais e a comprarem produtos de engenharia, automóveis e químicos. Acreditava-se que o acordo criaria condições para “auxiliar as populações a saírem da situação de pobreza através do apoio ao crescimento económico sustentável e a integração regional na África Austral, já que, hoje em dia, a África é o continente emergente e os Acordos de Parceria Económica poderiam maximizar este dinamismo”. Mas veio o Covid-19 deitar abaixo a intenção (não se sabe em que medida terá sido antes explorada, se tiver sido) e hoje, quase que esquecido, o acordo cede lugar a acusações de desonestidade da SADC relativamente à UE quanto à decisão de suspender voos para os países da África Austral. Há que lembrar, no entanto, que o argumento é o de evitar a propagação do vírus. Sublinhe-se que o Reino Unido já anunciou o levantamento das medidas restritivas. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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Turismo Global Vai Recuperar. Quando? Ninguém Sabe Não é apenas a África Austral que poderá debater-se com a crise no turismo que já vem de 2020, mas todo o mundo, não obstante os avanços na vacinação. E fica cada vez mais claro que a pandemia veio levantar o véu a outras fragilidades que o sector já tinha antes Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R

D

ois artigos recentes mostram o quanto o Turismo Mundial, se o observarmos de uma perspectiva mais macro, é fraco, desestruturado e incapaz de instaurar regras coordenadas ao nível global, principalmente em ambiente de pandemia, em que as economias se impõem pela qualidade do investimento feito no sector e pela sua competitividade no panorama global. A primeira preocupação que veio à tona no início deste mês foi o facto de a própria Organização Mundial do Turismo (OMT) – criada em 1925 e que tem, entre outras, a responsabilidade de promover políticas e instrumentos de apoio ao turismo bem como disseminar o Código de Ética Mundial para o Turismo – não conseguir desempenhar cabalmente o seu papel. Esta questão foi levantada quando a Arábia Saudita – que, juntamente com Espanha, vai liderar um grupo de trabalho da OMT – defendeu que esta organização “é fraca” e precisa de um plano para ser mais forte, resiliente e sustentável. De acordo com o ministro saudita do Turismo, Ahmed Al Khateeb, a OMT “não é forte como a Unesco, por exemplo, que também é órgão das Nações Unidas”. “Se quisermos que o seja, sem um plano claro, não vamos conseguir”, defendeu. O responsável referia-se ao facto de o transporte aéreo e a hotelaria, do sector do Turismo, terem sido, em todo o mundo, os mais afectados pela pandemia do covid-19, mas, infelizmente, não haver uma organização forte para liderar uma recuperação, papel que devia competir à OMT. Fortalecer a organização vai exigir, segundo o responsável, “uma grande coordenação e cooperação internacional que esteve ausente du-

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rante grande parte dos últimos dois anos, e tornar mais eficientes e transparentes os métodos de trabalho para garantir benefícios reais e mensuráveis aos Estados membros”. Terá sido justamente esta iniciativa saudita, de traçar um plano de fortalecimento da organização, que os levou Estados membros a solicitarem a transferência da sua sede de Madrid para Riad, capital da Arábia Saudita, e que se se reuniu nos últimos nove meses com os homólogos de mais de 100 países. Um apelo à solidariedade Não dispondo de instrumentos para induzir a tomada de medidas equilibradas na luta contra a pandemia, a OMT optou por pedir “unidade e solidariedade” diante das novas variantes, depois de vários países estabeleceram restrições que ameaçam a recuperação do sector do Turismo. “A solidariedade entre países tem caracterizado a nossa resposta comum à crise de saúde”, declarou o secretário-geral da OMT, Zurab Pololikashvili, antes de destacar que tal gesto “é mais importante hoje do que nunca, pois os nossos colegas em África enfrentam os desafios de uma nova variante”. Este posicionamento é mais uma prova de que o sector, globalmente, não é feito de regras que estimulem um crescimento abrangente, já que decisões de uns podem determinar que os outros sucumbam perante a crise, ou que, na hipótese menos grave, haja uma recuperação assimétrica entre as economias. Regras à parte, muitas organizações também já emitiram relatórios a fazerem previsões sobre o comportamento do Turismo em 2022. A maior parte está optimista, afinal, o progresso da vacinação contra o covid-19 em

todo mundo vai subindo de ritmo, o que será determinante no recuo das restrições. Turismo deve crescer 32% em 2022 O Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC na sigla em inglês), também defende que a recuperação do sector tem sido prejudicada pela falta de coordenação internacional, restrições de viagens e taxas de vacinação mais lentas em certos países. Mas, mesmo assim, faz boas projecções para 2022. Começa por lembrar que, em 2019, o sector de Viagens e Turismo gerou quase 9,2 triliões de dólares para a economia global. No entanto, em 2020, a pandemia quase que parou completamente o sector, o que resultou numa queda de 49,1% (4,5 triliões de dólares). Embora a economia global deva constatar um aumento de 30,7% de turismo em 2021, isso representará apenas 1,4 trilião de dólares e será impulsionado, principalmenwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


RECEITAS VOLTAM A CRESCER… Muitos factores jogam a favor da produção de maior fluxo de receitas, mas a vacina desempenha um papel-chave Em biliões de dólares

2019 2020 2021

9,2 4,7 6,1

2022

8

… POSTOS DE TRABALHO TAMBÉM Á medida que a retoma se efectiva, o Turismo vai trazendo de volta toda a mão-de-obra que perdeu, podendo até reestabilizar-se já em 2022 Em milhões

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2019 2020 2021 2022

268 287 338

FONTE Conselho Mundial de Viagens e Turismo

te, pelos gastos domésticos com as viagens. Outra pesquisa conduzida pela Oxford Economics em nome do WTTC calculou um cenário com base na implementação de vacinação global actual, confiança do consumidor e restrições de viagens em algumas regiões do mundo e revelou que, com a taxa actual de recuperação, a contribuição do sector de Turismo para a economia global poderia ver um aumento semelhante de 31,7% em 2022. Recuperação dos postos de trabalho em 18% No ano passado, o WTTC revelou a perda de 62 milhões de empregos em viagens e turismo em todo o mundo, mas, com o ritmo actual de recuperação, os empregos devem aumentar apenas 0,7% este ano. Da mesma forma, a pesquisa mostra um potencial mais promissor de empregos em todo o sector em 2022, em 18%. “A nossa pesquisa mostra, clarawww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

mente, que embora o sector global de viagens e turismo comece recuperar da devastação do Covid-19, ainda existem muitas restrições em vigor, uma distribuição desigual de vacinas, resultando numa recuperação mais lenta do que a esperada, de pouco menos de um terço este ano”, revelou a CEO do WTTC Julia Simpson. Condições para o sucesso Ainda de acordo com a WTTC, a contribuição do sector para o PIB global e o aumento do emprego podem ser ainda melhores se se atenderem a medidas como a permissão para viajantes totalmente vacinados moverem-se livremente, independentemente da sua origem ou destino final; a implementação de soluções digitais que permitam a todos os viajantes comprovar facilmente a sua situação em relação ao covid-19; o reconhecimento de todas as vacinas autorizadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS); um acordo de

todas as autoridades de que as viagens são seguras, com protocolos aprimorados de saúde e segurança. A pesquisa mostra que, se essas quatro regras fossem seguidas antes do final de 2021, o impacto na economia global e nos empregos poderia ser significativo, levando a contribuição do sector para a economia global a aumentar 37,5% – atingindo 6,4 triliões de dólares em 2021, contra os 4,7 triliões em 2020. Viagens internacionais ficarão mais fáceis, diz a EIU Analistas britânicos da Economista Intelligence Unit (EIU) publicaram, recentemente, um relatório em que revelam que depois do pico das restrições, em 2020, o sistema se ajustou. “Mas um problema que não foi atenuado é o das viagens internacionais. Os aviões ainda estão frequentemente pela metade, na melhor das hipóteses, e muitos dos aeroportos do mundo permanecem escassamente povoados”,

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TOP 10 PRINCIPAIS DESTINOS PARA 2022 A Lonely Planet, a maior editora de guias de viagem do mundo, divulgou uma lista dos destinos de eleição. Conheça-os

ILHAS COOK

O melhor destino é um grupo de 15 ilhas no Pacífico Sul, com vistas de tirar o fôlego.

A Noruega está consistentemente incluída nas listas dos países mais felizes do mundo.

NORUEGA

MAURÍCIAS

É mundialmente conhecida como uma atracção incontornável.

Para explorar as ruínas maias, nadar em águas cristalinas e ver a vida selvagem, Belize tem tudo.

BELIZE

ESLOVÉNIA

Tem grandes atractivos: um castelo de 900 anos e o rio Sava que atravessa três países.

É um território britânico ultramarino com 33 praias, temperaturas altas e boa comida.

OMAN

ANGUILA

É das grandes atracções do Médio Oriente, com um lindo litoral e montanhas de

Apesar de persistir o surgimento de novas variantes do novo coronavírus, muitas pesquisas acreditam que o rumo de 2022 será de recuperação do turismo global, seguramente por causa dos avanços na vacinação

até 2000 metros.

É o país da cordilheira onde se situa o Everest, o monte mais alto do mundo.

NEPAL

MALÁUI

Com o nono maior lago do mundo – o Lago Niassa – o país tem safaris de perder o

fôlego.

O Egipto é o lar das Pirâmides de Gizé, uma das sete maravilhas do mundo.

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EGIPTO

destaca. Refere também que as chegadas internacionais caíram quase 75% em 2020, com 1 bilião a menos de pessoas a viajarem para o exterior. Assim, segundo a EIU, “os números para 2021 não devem ser muito melhores. Mas as perspectivas para 2022 parecem menos sombrias”. A EIU acredita que, em 2022, “mais pessoas redescobrirão o prazer de entrar num avião para visitar cidades, assistir a um casamento de família há muito planeado ou tirar as férias dos sonhos”. Projecta ainda que, “embora os executivos continuem a passar muito tempo sentados e em chamadas

de vídeo, mais tempo também se reclinarão nas poltronas das classe executivas dos aviões”. Também recorda que, nas décadas anteriores à pandemia, as viagens internacionais cresceram rapidamente, com o número de visitantes a países estrangeiros a triplicar entre 1990 e 2019. Companhias aéreas de baixo custo, prosperidade crescente e mais tempo de lazer sustentaram esse crescimento. “Essas forças acabarão por se reafirmar”, projecta a EIU. Assim, enquanto Moçambique não tem boas perspectivas, ao nível global a situação parece contrária. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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OPINIÃO

O Sexagenário do Ensino Superior: Avanços, Recuos, Desafios e Oportunidades

E Jorge Ferrão • Reitor da Universidade Pedagógica de Maputo Patrício Langa • Sociólogo, Faculdade de Educação da UEM

“Os desafios do ensino superior incluem um sistema que procura definir o seu carácter, com IES com maior pendor para o magistério em detrimento da pesquisa...”

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Em 2022, o ensino superior em Moçambique completa 60 anos. Com efeito, foi através do decreto-lei 44530, de 21 de Agosto de 1962, que foram criados os Estudos Gerais Universitários em Moçambique e de Angola. Surgiam assim as primeiras instituições do ensino superior (IES) nos países africanos de língua oficial portuguesa. Seis décadas passadas podem representar um tempo histórico significativo para um país fundado em 1975, mas incipiente para o ensino superior como instituição milenar competindo apenas com a igreja em termos de antiguidade. O termo ‘ensino superior’, aqui, é tomado como se referindo a todas as formas de educação terciária, pós-secundária, incluindo a do tipo universitária e politécnico. De facto, se nos atermos a História do ensino superior antigo, África pode até reclamar-se como o berço deste tipo de educação antes mesmo de Cristo, com a Academia de Alexandria no Egipto fundada em 331 AC. As famosas Universidades de Timbuktu, no actual Mali, fundada em 1100, a Universidade do Cabo, na África do Sul, fundada em 1829, mas também as universidades de Cartum, no Sudão (1902), Makerere no Uganda (1921), Ibadan (1948) na Nigéria e Nairobi (1956) no Quénia são a evidência de que o ensino superior nos países de expressão portuguesa fora de Portugal (PALOP) ainda está no seu despontar. Com a excepção do Brasil, cuja história indica que a primeira instituição de ensino superior foi a Escola de Cirurgia da Bahia, criada em 1808 e as posteriores faculdades de Direito de São Paulo e de Olinda, em 1827, os PALOP tiveram que esperar até ao início da década de 1960 pelo ensino superior.

Nos casos de Moçambique e Angola, o percurso inicia-se com um processo respaldado na mudança da política colonial em relação às colónias, a crescente demanda dos colonos e assimilados, associada à pressão inestimável das Nações Unidas que apelava à criação de mais condições de ensino nas então colónias portuguesas do ultramar. Ainda assim, o ensino superior nestes países nasce com o pecado original da exclusão dos nativos. Pecado este cujo legado, seis décadas depois, ainda se procura redimir. Assim, celebrar seis décadas de ensino superior constitui em si um acto de regozijo, particularmente quando se faz num contexto de independência política do jogo colonial relativamente consolidado. Não obstante, os avanços e os desafios são reflexo de um subsistema da educação ainda emergente, num país que ainda busca o seu rumo no concerto das nações. Em 60 anos, em média, criámos seis novas universidades a cada década. Os desafios que temos em seis décadas olvidam, muitas vezes, que se equiparam as mesmas aspirações de sistemas nos quais cada década nossa equivale a um centenário. Aliás, no Hemisfério Norte, onde nos inspiramos e herdamos a ideia moderna do ensino do superior, as IES são até milenares. Sem ser cáusticos, precisamos ser condescendentes em qualquer que seja a avaliação das seis décadas. Até porque, mais do que a própria avaliação, é dos critérios que mais precisamos nos ocupar para análises concernentes à projecção das próximas décadas. Os desafios do ensino superior incluem um sistema que procura definir o seu carácter, com IES com maior pendor para o magistério em detrimento da pesquisa, corpo docente em processo formação, necessidade de estudos específicos sobre o desenvolvimento do subsistema e melhoria dos processos de forwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


O ensino superior comemora 60 anos, uma oportunidade única para repensar o seu papel na construção de uma sociedade de conhecimento

mulação de políticas públicas mais assertivas, entre outros. Tal como Angola, não admira, pois, que tenhamos percorrido a mesma trajectória, experimentando desafios muito semelhantes e, fundamentalmente, que o processo de consolidação se mostre, ainda, muito distante do seu final. Sendo que o ensino superior se caracteriza não só pelo ensino, mas também pela pesquisa, extensão e inovação para a produção de conhecimento com impacto na sociedade, a comemoração dos 60 anos deste subsistema em Moçambique é uma oportunidade ímpar para se repensar o subsistema, as instituições e o seu papel na transformação da sociedade. Nesse repensar, cabe um debate profundo sobre as políticas do ensino superior, o lugar da pesquisa e extensão na formação dos estudantes, a formação de docentes, que, conjugados, e num contexto de inovação, concorrem para a qualidade almejada neste subsistema. Entre avanços e retrocessos, desafios e oportunidades, o ensino superior passou por diferentes processos de continuiwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

dade e rupturas. O esforço e empenho de jovens académicos, com todas as limitações, esteve sempre presente e tem sido o garante das mudanças, aprimoramentos e, paradoxalmente, dos problemas correntes. Não existem dúvidas nem reservas que as IES nacionais foram as grandes responsáveis pela formação da maior parte do capital humano em Moçambique, que providencia e garante serviços essenciais ao Estado, sector privado, familiar e noutras esferas económicas, culturais e até na manutenção dos serviços dos ecossistemas. Todavia, prevalecem questões estruturais, de governação e coordenação do sistema, atitudes autocráticas e de poder discricionário dos gestores, tanto nas IES públicas como nas privadas. Os investimentos em infra-estruturas, planos temáticos e curriculares são fundamentalmente desenquadrados, o tempo de formação questionável, esquemas de corrupção, e, coincidentemente, a ascendência e precedência da política sobre a academia ou, por outras palavras, a politização da academia que desvirtua o sen-

tido da autonomia “real” (e não apenas no papel) das IES que, noutros contextos, paradoxalmente, tende a ser protegida pelo Estado. Apesar dos avanços em termos de acesso ao ensino superior, com a expansão numérica e geográfica de IES um pouco por todo o País, fruto da visão de política pública dos diferentes Governos, a base de conhecimento que sustenta os processos decisórios sobre o ensino superior assenta em convicções fortes, com princípios normativos – do dever ser – em contraste com a fraca evidência produzida através de estudos de base. Os quadros normativos e reguladores do sistema revelam um problema fundamental de um sistema político descentralizador apenas na retórica, mimético (do Copy & Paste) de modelos exógenos mal re-contextualizados, mas também com tendências centralizadoras e autocráticas na prática. Com efeito, trata-se de um sistema que emula a sua insciência na medida em que se desenvolve num círculo vicioso de relatórios técnicos comissionados e produzidos por agências de con-

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OPINIÃO

sultoria generalistas e profissionalizadas, que subcontratam, a preço rendeiro, académicos cuja autoridade e legitimidade radica no simples facto de advirem das IES e conectados aos circuitos do lóbi da consultoria. Assim, documentos estruturantes da Governação do sistema são produzidos através de esquemas em cima do joelho, com um teatro das auscultações no Norte, Centro e Sul, dos parceiros, apenas para legitimação política do processo, e com o beneplácito de agências de financiamento que justificam a sua existência através da reprodução da nossa mediocridade enquanto nos endividam. Sim, é do algoz Banco Mundial e entidades congéneres que concorrem para a reprodução da incapacidade interna de produção de política pública das próprias instituições do Estado através dos seus projectos de desenvolvimento de capacidade e assistência técnica. É um sacrilégio para o ensino superior que, em pleno ano de 2021, os Planos Estratégicos e outros documentos directores sejam produzidos em esquemas de consultoria, que promovem a exploração de académicos moçambicanos por empresas parasitárias que dominam os espaços do lóbi das consultorias, relegando as próprias IES ao mero papel de entidades auscultadas. O ensino superior vive, portanto, copiosas encruzilhadas. Por um lado, a pressão das demandas de uma sociedade cada vez mais ciente e crente dos benefícios do retorno do investimento no ensino superior, apesar de uma apreciação e avaliação baseadasno bom senso, enformadas por uma visão redutora e instrumentalista do ensino superior como trampolim da mobilidade social através do emprego formal, no Estado e nas Organizações não Governamentais (ONGs), mercado preferencial para a transaçcão da reputação dos títulos e credenciais académicas. Por outro lado, a saturação prematura dos lugares de emprego, particularmente no aparelho do Estado, mas também nas ONGs com maior proeminência, que prematuramente desfazem a ilusão da empregabilidade dos graduados, num sistema cuja taxa de participação entre jovens dos 18 aos 24 anos não atingiu sequer 10% em 100 mil habitantes, reforça o estado de crise do sistema. Este paradoxo gera a ilusão da escassez, mobiliza empreendedores educacionais a criarem novas IES, por razões adversas à educação como bem público, mas funcionam na propalada lógica neoliberal da mercantilização e co-modificação da

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educação, abordada por um de nós (PL), noutros escritos. As IES e, em particular a universidade, no conceito mais genérico, sempre tiveram um sentido de utopia e de um espaço de encontro de tradições e quebra de horizontes do conhecimento humano. A universidade é, igualmente, um espaço onde se cultivam a sociabilidade com a diferença de pensamento, com o pluralismo democrático e, igualmente, a esperança da humanidade. Esperança porque a sociedade deposita confiança nos processos deliberativos associados ao pensamento crítico, em princípio, que radica da formação superior. Assim, as universidades seriam, também, ao longo destes 60 anos, parte do projecto de consolidação da nação com representatividade dos diferentes grupos sociolinguísticos, suas tradições e utopias. As IES constituem espaços convencionais onde a expectativa seria a criação do designado ‘bildung’, quer dizer, a preparação da pessoa humana visando produzir cidadãos responsáveis, maduros, autónomos e capazes de reflectirem sobre os seus próprios problemas e da sua sociedade. Este exercício constitui o lançamento de um repto, que se aproxima da efeméride do sexagenário que nos oferece para repensar o reptos do ensino su-

perior no País. Lançamos o repto neste mês de Novembro, demasiado simbólico e representativo para o ensino superior, quando celebramos o Dia Mundial da Ciência e o Dia dos Estudantes, que enfrentam as vicissitudes de um sistema de ensino superior emergente. O impacto da pandemia que escancarou, em 2020, as fissuras e fragilidades do sistema diante das restrições, incapacidade e outras aporias que provaram o quão longo será o caminho a percorrer na edificação de um ensino superior robusto. No entanto, mais do que lamentar a ausência do óbvio, que a pandemia apenas veio desnudar, este tempo oferece-nos a possibilidade, entre outras, da reinvenção. Sim, falta tudo para muitos, e há tudo para poucos, mas há também a oportunidade da ausência do padrão, da tradição, pois tudo se tornou experimental e não há espertos (experts) em matéria de sobrevivência melhor que nós. Portanto, se a inclusão digital parece ser um problema de fundo, não poderemos negligenciar o potencial da reinvenção social. Se existe algo para o qual poderíamos prestar atenção só celebrar o sexagenário é a capacidade recreativa, inventiva, dos Moçambicanos, mesmo em condições adversas. Ao celebrar os 60 anos do ensino superior teremos de pensar que tipo de www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


ensino superior queremos para que tipo de sociedade. Celebrar estes 60 anos tem de assumir um papel bem mais profundo e incisivo. Redefinir o papel e a função do ensino superior num contexto de múltiplas necessidades sociais e humanas, para que as IES continuem a impor-se e respondendo aos desafios da sociedade com recurso ao pensamento crítico tão caro à sociedade. Não poderemos continuar dissociados dos adventos que movimentam o mundo da quarta Revolução Industrial, do advento da ciência artificial, da robótica e nem a redefinição da grelha de cursos mais condicentes com as novas profissões. Não podemos ser apenas vítimas de mudanças climáticas, sem que saibamos debater as suas origens e consequências diferenciadas. Estes tempos apontam para cenários verdadeiramente desafiadores, que obrigarão Moçambique a repensar a direcção do seu ensino superior de forma geoestratégica e mais estruturada. Nos próximos anos, os desafios serão acrescidos. Os impactos das sociedades de conhecimento colocam competências tecnológicas e digitais como activos ultra importantes. Seguir as novas tecnologias e os efeitos da revolução científica e tecnológica evitará que sejamos marginalizados e esquecidos pelo tempo. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

OP



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especial inovações daqui 52

STARTUPS AFRICANAS

O protagonismo do continente na angariação de financimentos atingiu níveis jamais vistos em 2021

56 FIDLI

Uma startup habilitada para facilitar às empresas a captação e fidelização dos seus clientes

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PANORAMA

As notícias da inovação em Moçambique, África e no Mundo


STARTUP

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Startup Africanas Angariaram Quase 4 Mil Milhões em 2021. Como? Nigéria, África do Sul, Egipto e Quénia garantem a parte de leão do investimento, assegurando quase 80% do volume de fundos angariados. Nos últimos meses, há negócios superiores a um milhão de dólares anunciados diariamente num ecossistema em que as fintech dominam, os homens predominam e as mulheres começam a dar cartas TEXTO Pedro Cativelos • FOTOGRAFIA Istock Photo , D.R

S

e estivermos atentos às notícias, percebemos que há cada vez mais financiamento a ser canalizado para muitas startup africanas, mas os dados são apresentados na base de dados de startups “Africa: The Big Deal”, que decompôs o financiamento total angariado por startups em África para negócios no valor de 100 mil dólares, ou mais, vem confirmar a tendência: 2021 é “O” ano das startups africanas em termos de financiamento. Olhando para os quatro grandes mercados de angariação de investimento em startups, Nigéria, África do Sul, Egipto e Quénia foram responsá-

de dólares) e a Tanzânia (96 milhões de dólares), com uma diferença muito grande em comparação com os Quatro Grandes. Em ambos os casos, um único negócio representa mais de 90% do total angariado este ano (Wave e Zola Electric).

Histórias de sucesso

Uma das maiores histórias do ano foi a Chipper Cash que angariou um total de 250 milhões de dólares este ano. Ainda em Novembro, esta fintech africana angariou 30 milhões de dólares na série B ,liderada pela Ribbit Capital, com a participação da Bezos Expeditions o fundo de capital de risco pessoal do

Uma das maiores histórias do ano foi a Chipper Cash, fundada por dois ugandeses, e que angariou 250 milhões de dólares em 2021 veis por 80% do total angariado no continente este ano, com 35% do capital angariado apenas na Nigéria. A maior economia do continente angariou 1,37 mil milhões de dólares em 2021, seguida de 838 milhões de dólares na África do Sul, 588 milhões de dólares no Egipto e 375 milhões de dólares no Quénia. Se acrescentarmos o Gana e a Tunísia aos quatro anteriores, então os seis primeiros países representaram 84,6% das empresas financiadas em fase de arranque e 92,6% do investimento total. Seguem-se, em termos de montante total angariado, o Senegal (222 milhões www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

CEO da Amazon, Jeff Bezos. Fundada em São Francisco, em 2018, pelos ugandeses Ham Serunjogi e Ghanaian Maijid Moujaled, a empresa oferece serviços de pagamento P2P em sete países, sem taxas, com base em telemóvel: Gana, Uganda, Nigéria, Tanzânia, Ruanda, África do Sul e Quénia. Paralelamente à sua aplicação P2P, a empresa também executa Chipper Checkout - um produto de pagamento baseado em taxas e centrado no comércio que gera as receitas para apoiar o negócio de dinheiro móvel gratuito da Chipper Cash. A empresa aumentou para três milhões o número de utilizadores

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na sua plataforma e processa uma média de 80 000 transacções diárias. Agora, a empresa planeia expandir os seus produtos e o seu âmbito geográfico, com soluções de pagamento empresarial, opções de negociação de moeda criptográfica e serviços de investimento. “Seremos sempre uma plataforma de transferência financeira, mas temos tido procura dos utilizadores para oferecer outros serviços de valor, como a compra de activos em moeda criptográfica e a realização de investimentos em acções”, disse Serunjogi numa entrevista à TechCrunch.

Fintech dominam, cleantechs crescem

O Relatório de Investimento Africano concluiu que, apesar do crescimento constante do investimento ao longo da última década, o panorama do financiamento continua fortemente inclinado para um número limitado de sectores, que representam mais de 75% dos beneficiários do financiamento. O boom das fintech em África continua a ser impulsionado pelo aumento da literacia digital e fintech, acesso a smartphones, redução dos custos da Internet e um empurrão para aumentar a inclusão financeira e os pagamentos sem dinheiro. “Estamos a experimentar uma enorme desintermediação da maioria dos serviços bancários por parte destas startups fintech”, diz Ndubuisi Ekekwe, empresário e membro do corpo docente do Instituto Tekedia, centrado na inovação. “Com rapidez, segurança e preços justos, oferecidos por esta nova geração de produtos financeiros, os melhores produtos estão a ganhar”. Devido a estes factores, o número de investimentos no sector está a aumentar em África, apesar de, em comparação com outras regiões, ainda ser baixo e de as lacunas de financiamento ainda persistirem, revelou um relatório recente da empresa de investigação Briter Bridges e do Fundo Catalisador Global de Aceleradores Tecnológicos. A Fintechs representam mais de nove décimos do volume total de fusões e aquisições, algumas de grande visibilidade, como a Paystack, DPO Group e a Wave, e mais de um terço de todos os fundos de não-aquisição utilizados. Enquanto as empresas de tecnologia financeira mantêm a maior parte do financiamento total (31%), as cleantechs (22%) estão, cada vez mais, a atrair capital de investidores locais e internacionais, incluindo um número crescente

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de empresas interessadas em acelerar a sua transição para as energias renováveis. Seguem-se as Healthtech (9%), dados e pesquisas (7%), agritech (7%) e e-Commerce (5%).

África do Sul cresce como nunca

Com mais de 758 milhões de dólares angariados em 2021, até ao momento, a África do Sul está no bom caminho para um ano recorde, especialmente tendo em conta os grandes anúncios da Jumo e da MFS Africa nas últimas semanas. O número de negócios de um milhão de dólares tem crescido constantemente nos últimos três anos, o que alavancou o montante global angariado através de 81 milhões, que se registavam em 2019, para quase 300 milhões no ano passado, com os 758 milhões deste ano. Com este forte desempenho, o país vizinho passou da quarta posição, em 2019, para a segunda, este ano, apenas ultrapassada pela Nigéria. Analisando em detalhe os números, a maior parte deste financiamento

O FINANCIAMENTO ANGARIADO PELAS STARTUPS AFRICANAS EM 2021 Algéria Tunísia

Marrocos

Egipto

Camarões Gana

Nigéria RDC

Quénia Ruanda Tanzânia

Financiamento total obtido pelas empresas em fase de arranque no país através de negócios de 100 mil dólares e mais

África do Sul

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segue a tendência do continente e vai para a fintech, um segmento cuja importância cresceu de cerca de 40%, em 2019, para mais de 68%, em 2021 até agora, especialmente devido à ronda de 120 milhões de dólares de Jumo e à série C de 100 milhões de dólares da MFS Africa. Depois, a África do Sul é um caso único também na medida em que a grande maioria dos CEOs das suas startup, que angariaram mais de um milhão de dólares, são formados no país. A esse respeito a Universidade de Cape Town lidera, já que quase um terço dos founders e CEOs que fecharam rondas de financiamento se formaram precisamente nesta instituição.

Um milhão por dia nos últimos seis meses. Pelo menos...

Financiamento total obtido através de negócios $100k = negócios

Nigéria

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África do Sul

Egipto

Quénia

Desde Julho de 2021, um negócio de mais de um milhão de dólares é anunciado, em média, todos os dias por uma startup africana. Daí que até comece a tornar-se um pouco difícil seguir as notícias. E a aceleração é clara: em 2019, foi anunciado um negócio de um milhão de dólares em média a cada três dias, média que desceu para um a cada dois dias, em 2020, e que caiu ainda mais este ano, com um negócio de um milhão a cada 1,6 dias na primeira metade de 2021. De Julho para cá, o investimento ganhou novo ímpeto visível em todos os sectores. Por exemplo, em 2019, havia apenas um negócio de mais de 1 milhão anunciado fora dos “Quatro Grandes” (Nigéria, África do Sul, Quénia, Egipto) em média quinzenalmente. Em 2021, até agora, o mesmo está a acontecer todas as semanas. No mesmo período, o ecossistema passou de um negócio de 1 milhão em fintech, anunciado de dez em dez dias, para dois negócios deste tipo divulgados por semana. E até na disparidade de género, que continua a ser evidente, há sinais de mudança. Em 2019, era necessário esperar, em média, seis semanas (!) entre dois negócios de mais de um milhão de dólares anunciados por uma startup liderada por uma mulher. Já em 2021 temos assistido a um desses negócios a cada dez dias, um aumento impressionante que não deve esconder, ainda assim, o grande fosso que resta entre as startups lideradas por homens e por mulheres que é, hoje, de um para sete.

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empresas STARTUP

fidli

Um Íman Para Atrair e Fidelizar Clientes Ao atribuir um simples cartão a um cliente, a empresa emite uma espécie de chip para controlar a sua ligação com esse mesmo cliente através do volume de produtos ou serviços que este solicita. Se perceber que o perdeu, pode accionar mecanismos para o recuperar TEXTO Yana de Almeida • FOTOGRAFIA Mariano Silva

A

crise gerada pela pandemia do Covid-19 exigiu, e ainda exige, das empresas uma boa dose de resiliência e inovação. O termo “reinventar-se” passou a ser usado em todos os sectores, não apenas em busca da sobrevivência, mas também para garantia da continuidade das empresas no pós-crise. A ideia de “reinvenção” tem estimulado o desenvolvimento de soluções tecnológicas, capazes de impulsionar as empresas, evitando a sua extinção num mercado cada vez mais desafiador.

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O Fidli é uma dessas respostas inovadoras. Criado pela VOID, uma empresa de tecnologia e comunicação sediada em Maputo, este novo sistema de fidelização de clientes já começa a conquistar a simpatia dos moçambicanos. “O Fidli é um sistema inovador de fidelização de clientes, que promete aos negócios locais aumentar o número de visitas dos seus clientes e as suas vendas. É uma solução ´chave na mão´, simples e de baixo custo, que permite a qualquer negócio oferecer cartões personalizados aos clientes, realizar campanhas promocionais,

atribuir ofertas e enviar SMS automáticas”, afirma Alexandre Coelho, director geral da VOID Tecnologia e Comunicação, empresa que desenvolveu o Fidli. “Ao subscrever a solução, as empresas têm ao seu dispor um kit composto por 500 cartões personalizados com tecnologia contactless, um dispositivo para efectuar a leitura do cartão a cada compra do cliente e um painel de gestão para gerir as suas campanhas promocionais, ver dados estatísticos dos seus clientes e muito mais”, acrescentou o responsável. Outra grande vantagem é que “o nosso programa conwww.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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EMPRESA VOID Tecnologia e Comunicação FUNDAÇÃO 2019 FUNDADOR Alexandre Coelho SISTEMA Fidli

siste na fidelização à base de pontos. Cada vez que o cliente faz a compra no estabelecimento, e ao introduzir o seu cartão no dispositivo, vai acumulando pontos. Mais tarde, o estabelecimento pode definir um conjunto de ofertas em troca desses pontos”. É, na verdade, uma espécie de gratificação aos clientes fiéis. Lançado no passado mês de Novembro, o sistema surgiu da necessidade de impulsionar os negócios severamente afectados pela pandemia através do marketing de fidelização, uma estratégia que impulsiona empresas do mundo inteiro. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

Desenhado para ser simples e de baixo custo, o Fidli alberga um conjunto de soluções adaptadas ao contexto moçambicano, destinadas tanto a pequenas como grandes empresas. Apesar de ser recente a sua penetração no mercado, a receptividade do público anima a VOID que já faz planos para o futuro. “Neste momento, estamos muito focados em Maputo e Matola, por questões operacionais e logísticas. Queremos, até o próximo ano, ter cerca de 100 clientes, expandirmo-nos, obviamente, para outras províncias e, mais tarde, levar este produto

para outros mercados da região da África Subsaariana”, projecta Alexandre Coelho. O conjunto de vantagens de se ter um programa de fidelização de clientes faz acreditar no sucesso futuro. “Um programa de fidelização ajuda a aumentar a taxa de contenção de clientes, ou seja, clientes fiéis voltam mais vezes porque se sentem recompensados. Os clientes desenvolvem amor pela marca e é, no fundo, o que as grandes marcas no mundo fazem como estratégia: criar essa relação com o cliente que, por sua vez, promove e recomenda mais a sua marca”, concluiu.

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PANORAMA

Astronomia

Moçambique quer lançar primeiro satélite a partir dos Açores, em Portugal Moçambique quer ser “o primeiro” dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) a lançar satélites a partir dos Açores, arquipélago de Portugal, revelou o presidente do Conselho de Administração do Instituto Nacional de Comunicações de Moçambique (INCM). Em declarações a jornalistas em Ponta Delgada, nos Açores, no âmbito da Conferência Internacional sobre a Estratégia dos Açores para o Espaço, Tuaha Mote explicou que Moçambique quer “ter o privilégio”, no âmbito do seu pro-

jecto de sistema de satélites, de “ser o primeiro país dos PALOP a usar o pólo de lançamento de satélites da ilha de Santa Maria”. O responsável da autoridade reguladora de comunicações em Moçambique, que tem protocolos com a Autoridade Nacional de Comunicações portuguesa (Anacom), explicou que é também “coordenador nacional da comissão criada para desenvolver o conhecimento e a capacidade técnica para lançar o primeiro satélite moçambicano”.

Segurança Healtechs

INCM Reafirma Compromisso de Combate ao Cibercrime em Moçambique

Moçambicana distinguida “heroína mundial” em saúde ocular 2021 A Agência Internacional de prevenção da Cegueira (IAPB), um organismo com sede no Reino Unido, nomeou a docente da Universidade Lúrio, Isaura Ilorena d’Alva Brito dos Santos, heroína mundial em saúde ocular, edição 2021. No total foram nomeadas 81 personalidades entre clínicos e não clínicos, que trabalham em prol da prevenção da cegueira em vários países do mundo. Isaura Brito dos Santos é docente e directora do curso de optometria na Faculdade de Ciências de Saúde. A optometria é uma profissão relativamente nova em Moçambique, resultado de diferentes iniciativas colaborativas internacionais. O curso começou no País pela primeira vez através da Universidade de Lúrio, em 2009. Isaura Brito concluiu a licenciatura em Optometria, em 2014, com a distinção de melhor aluna e fez parte do terceiro lote de optometristas formados em Moçambique. No final da missão dos professores internacionais de optometria, havia a necessidade de contratação de optometristas treinados localmente para dar continuidade à formação dos alunos daquela especialidade. Face a isto, tornou-se professora júnior na Universidade de Lúrio, em Nampula, função que aceitou e que desempenha actualmente.

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O presidente do Conselho de Administração (PCA) do Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique (INCM), Tuaha Mote, disse no posto administrativo de Matibane, distrito de Mossuril, na província de Nampula, que o problema dos crimes cibernéticos está a merecer a atenção de todos os sectores sociais.

Falando na abertura da XV Reunião Anual de Balanço e Planificação do INCM, Mote destacou, entre os crimes cibernéticos mais frequentes no País, a burla, fraude financeira, lavagem de dinheiro e branqueamento de capitais. “Não estamos no estado óptimo, mas ao nível institucional já temos capacidades básicas para colaborar e mitigar o impacto destes crimes cibernéticos. Falo de todo o tipo de crimes que possa ocorrer com recurso às redes de telecomunicações, de plataforma de tecnologias de informação e comunicação. Estamos em condições de produzir informação pericial com vista ao esclarecimento dos crimes”, explicou. Outro desafio do INCM apontado pelo PCA é a necessidade de modernização e expansão de infra-estruturas digitais para que o serviço prestado seja abrangente e tenha qualidade. A segurança cibernética é um tema que vem ganhando a atenção das autoridades, sobretudo na área financeira.

Ambiente

Itália Financia Projectos de Investigação em Sustentabilidade da UEM A Itália anunciou um financiamento de três milhões de euros para projectos de investigação relacionados com ecossistemas e biodiversidade da Universidade Eduardo Mondlane (UEM). O valor será aplicado no reflorestamento de mangais, na estação de biomarinha da ilha de Inhaca, e para o fortalecimento das redes de laboratórios de investigação da UEM.

É mais uma acção dos dois países com vista ao cumprimento das decisões mundiais sobre a preservação do meio ambiente e combate às mudanças climáticas. A Itália é, por excelência, parceiro da Universidade Eduardo Mondlane, que tem em carteira mais de 20 projectos na área de cooperação. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


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OPINIÃO

Desempenho e Perspectivas do Mercado de Capitais

N Claudio Pondja • Head Of Wealth Management do Banco BIG

Como reflexo desta estabilidade económica, assistimos a um aumento do apetite por activos de maior risco, que se repercutiu num aumento das transacções na Bolsa de Valores de Moçambique

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os últimos anos tem-se verificado um crescimento do mercado de capitais em Moçambique, tanto no mercado primário, onde inicialmente são colocados à disposição os títulos financeiros, como no mercado secundário, onde estes transaccionam entre os agentes do mercado, após a admissão à cotação. Essa evolução tem sido evidente quer no crescimento sustentado no volume, quer no número de transacções. A pandemia do COVID-19 tem influenciado significativamente o comportamento dos mercados financeiros mundiais e o nosso mercado não foi excepção. Os constantes sinais de riscos e incertezas associadas ao combate à pandemia têm trazido volatilidade, quer na propensão ao risco por parte dos investidores, quer nas medidas paliativas por parte dos bancos centrais e governos. As medidas de contenção da propagação do vírus, nomeadamente os lockdowns, criaram disrupções significativas nas cadeias de logística globais com implicações muito materiais no normal funcionamento do comércio internacional. Estas disrupções criaram escassez nas matérias-primas e motivaram, consequentemente, o aumento dos preços e da inflação um pouco por todo o globo. Por cá, o prolongamento dos conflitos militares nas zonas centro e norte do País, aliados às preocupações em torno da evolução da pandemia e vacinação contra a COVID-19, e a probabilidade de ocorrência de desastres naturais, dominaram as preocupações dos agentes económicos e autoridades monetárias, que optaram por manter uma política monetária restritiva ao longo do ano. Esta política monetária adoptada pelo Banco Central permitiu conter uma subida descontrolada da inflação e alcançar um controlo cambial, atenuando desta forma as incertezas dos agentes económicos, contribuindo para um ambiente favorável à poupança e ao in-

vestimento em activos financeiros. Como reflexo desta estabilidade económica, assistimos a um aumento do apetite por activos de maior risco, que se repercutiu num aumento das transacções na Bolsa de Valores de Moçambique. Conforme demonstra o gráfico abaixo, o volume transaccionado em mercado secundário foi de 5100 milhões de MT em 2019 e 5572 milhões de MT em 2020. Em 2021, este volume, em Novembro, já ascendia a 8620 milhões de MT. Este crescimento do volume transacionado esteve assente num conjunto de factores: • Maior apetência por partes dos bancos comerciais a exposição a títulos vs. crescimento das carteiras de crédito; • Necessidades de financiamento do Estado que têm vindo a ser supridas através de um crescimento do endividamento interno, sobretudo com a emissão de OTs e BTs, aumentando o stock de instrumentos disponíveis para os investidores; • Uma quantidade superior de títulos com maturidades curtas (1 a 3 anos) que venceram em 2021, criando condições para renovações dos investimentos e aplicações dos juros libertos, fazendo com que os investidores optassem por aumentar a exposição a este tipo de instrumentos; • Melhoria do ambiente económico na segunda metade do ano, influenciando positivamente o sentimento dos investidores; Perspectivas Para 2022 Para 2022, as perspectivas continuam animadoras e consideramos existirem condições para continuarmos a observar um desenvolvimento cada vez mais inclusivo do mercado de capitais no nosso País. Considerando que, do volume intermediado em transacções de títulos no mercado de capitais, a maior porção corresponde a transacções de Obrigações do Tesouro, que entre Janeiro e Novembro de 2021 representaram 97% do www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


volume total transacionado, e tendo em consideração o volume de emissão de dívida interno aprovado em Orçamento de Estado para 2022, prevê-se que esta rubrica deverá aumentar de 40 957,5 milhões de meticais em 2021 para 53 081,4 milhões de meticais em 2022. Neste sentido, estima-se um crescimento do volume em mercado primário, e potencialmente em mercado secundário, no próximo ano. Consideramos ainda que com a conjugação dos seguintes factores, poderão estar criadas condições para o crescimento contínuo do nosso mercado de capitais:

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• Com o equilíbrio a nível de procura e oferta de moeda estrangeira, estimamos que a estabilidade da taxa de câmbio deverá manter-se em 2022, o que poderá atrair mais investidores internacionais para o investimento em Dívida Pública em Meticais, que se revelou como um dos melhores investimentos de Obrigações a nível global em 2021; • A materialização das projecções de inflação média anual de 5,3% para 2022 (segundo as estimativas do Governo), continuará a criar condições favoráveis ao desenvolvimento económico e ao aumento do investimento no País, o que ajudará a clarificar as estimativas

dos investidores da evolução das taxas de juro durante o ano; • A retoma das operações dos grandes projectos em Cabo Delgado poderão trazer, de novo, alento ao tecido empresarial nacional e fomentar o também o investimento em activos financeiros. • O aumento da taxa de vacinação em Moçambique irá criar resiliência no combate à COVID-19, permitindo uma economia mais aberta e com maiores relações com os parceiros comerciais, com as consequentes melhorias no comércio internacional e no desenvolvimento da economia nacional. As previsões de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), por parte do Governo (+2,9%) e de outras entidades como o FMI e Banco Mundial, apontam para uma aceleração da economia face às previsões que se tinha no início de 2021. Em jeito de conclusão, esperamos que 2021 fique na História como o início do tão desejado progresso económico que o País anseia há alguns anos, e que 2022 seja um ano de crescimento sustentando, quer dos diferentes sectores da economia nacional, quer do mercado de capitais, e que deixemos para trás as preocupações, distanciamentos e dificuldades com que os últimos anos nos brindaram. Votos de um BiG 2022!

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BAZARKETING

O Hábito Dos Hábitos

O Thiago Fonseca • Sócio e Director de Criação da Agência GOLO PCA Grupo LOCAL de Comunicação SGPS, Lda.

Em outros lugares mais remotos de Moçambique ainda se lavam os dentes com restos da cinza do carvão, enquanto na Europa se revelam descobertas incríveis, como a pasta de carvão que promete deixar os dentes mais brancos

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Maurício Alicate nunca saiu da zona Centro de Moçambique. Nasceu e sempre viveu na foz do rio Sangussi. É um pescador humilde que vive com a sua família numa pequena vila costeira muito afastada das cidades. Ele é dono de um barco de pesca e dono de um sorriso que rivaliza as melhores clínicas de branqueamento e estética dentária do chamado primeiro mundo. Dentes perfeitos e saudáveis sem nunca ter ido a um dentista sequer. Isto deve-se sobretudo graças aos seus hábitos. Ele usa a mulala. Um método tradicional para lavar os dentes. A mulala é um pequeno ramo de uma planta que, depois de desfiada na ponta, se esfrega nos dentes. Esse é um dos hábitos do Maurício e da família Alicate que nunca teve de arrancar um dente na vida. Em outros lugares mais remotos de Moçambique, ainda se lavam os dentes com restos da cinza do carvão da fogueira misturadas com água e usando o próprio dedo para esfregar a boca. Restos de carvão no fundo. Enquanto na Europa se revelam recentemente descobertas incríveis e “inovadoras”, como a pasta de carvão que promete deixar os dentes mais brancos. Mas lavar os dentes com carvão são hábitos que datam de há milhares de anos. Nos séculos anteriores, os Europeus lavavam os dentes com pedaços de pano, trapos ou esponjas, enroladas em sal com água ou conhaque. Há cerca de 3000 anos, mastigava-se uma planta de cor roxa para combater as cáries, o mau hálito e promover a higiene oral. Os hábitos são a essência do marketing. Poucas pessoas sabem que foi apenas há cerca de um século que se criou o hábito de lavar os dentes tal como o conhecemos. Com uma pasta dentífrica e uma escova. Esse hábito foi criado por uma marca: A Pepsodent. Não foi um produto novo que foi lançado. Foi um novo hábito que foi criado. Uma ideia lançada pelo publicitário Claude Hopkins. A campanha tinha o título The Pepsodent Smile. O sorri-

so Pepsodent que é conhecida até hoje no mundo do marketing. Nos cartazes apareciam pessoas bonitas e com dentes perfeitos e brilhantes e a sugestão de lavar os dentes todos os dias. A ignição emocional foi a vaidade. Uma marca que prometia um sorriso mais bonito. O que foi criado foi mais do que um produto. Foi criada uma ansiedade pela beleza e higiene oral que não existia antes. Por volta de 1920, metade da população dos Estados Unidos já tinha esse hábito na sua rotina diária. Depois foi só fazer a globalização do hábito. Logo a seguir, a Pepsodent já era vendida no Brasil, na Europa e, em 1930, até na China. A pasta não chegava só a todos os cantos da boca. Chegou a todos os cantos do mundo. O ponto aqui é que não foi criado um produto. Foi criado um hábito. E é essa a essência do marketing. Criar hábitos. Mais do que criar produtos ou ideias. Pense bem e vai ver como todos os produtos de sucesso que escolhemos, compramos e consumimos passam a ser mais do que uma necessidade. São um hábito a que nos acostumamos. Passam a ser parte da nossa vida. A forma como nos comunicamos hoje. Pelo celular. As apps que usamos. A forma como pagamos as nossas contas, que antes era com dinheiro físico. Agora já nos habituámos a transferir dinheiro de uma forma digital pelo mobile. Nós não consumimos produtos. Consumimos hábitos. Quando um produto ou serviço se tornam um hábito ele passa a ser parte da nossa vida. Agora faça uma reflexão. Os hábitos habitam o nosso dia-a-dia. Alguns são mais saudáveis e outros menos. Depois de a Pepsodent ter criado a pasta de dentes, outras empresas criaram marcas que todos conhecemos e disputaram a fatia de mercado. No fundo, deram dentadas no mercado criado pela Pepsodent. Mas isso é uma guerra diferente. É a das marcas. Os líderes no marketing sempre serão www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021


as empresas e marcas que forem pioneiras. As que ousarem. As que conseguem ser inovadoras ao ponto de criar um novo hábito. As outras marcas, as seguidoras, habituam-se a seguir e lutar por ter uma fatia de mercado de um hábito que foi criado pela marca líder. Quando se cria um produto, estamos a tentar que esse produto se transforme num hábito. É só pensar na nossa rotina diária para vermos que tudo o que fazemos é por força de hábitos que criamos ao longo da vida. E enquanto muitos historiadores questionam a real necessidade de existirem muitos produtos como a pasta dentífrica, outros justificam a sua necessidade pelo crescimento exponencial da humanidade, e o consumo de alimentos menos saudáveis, comidas processadas, as fast-foods com demasiado açúcar. Tudo o que não existia nos séculos anteriores. A exportação dos hábitos www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

A essência da globalização foi e é a exportação de hábitos. A criação de necessidades que antes não existiam. Para um hábito se disseminar, precisa de um portador. Como no caso de um vírus. No caso dos hábitos de consumo, o host é a media. Os filmes, por exemplo. Por volta de 1950, a indústria de Hollywood exportava o hábito de fumar através das suas maiores estrelas do cinema que apareciam sempre com um cigarro na tela. Todos aspiravam esse hábito e queriam ser assim. E, por isso, a essência do hábito é a ansiedade. O gatilho racional ou emocional que nos leva a querer fazer, ter ou consumir qualquer coisa. Hábitos tornam-se rotinas. Os hábitos duram muito mais tempo que os próprios produtos ou marcas. É díficil mudar um hábito. As pessoas que tentam abandonar o cigarro não abandonam o hábito. Compram um vaporizador. Mudam de pro-

duto, mas continuam com o hábito. Nós próprios habituamo-nos aos nossos hábitos e tornamo-nos um hábito de nós mesmos. Hoje com a pandemia Covid-19 já a caminho do seu terceiro ano, com novas variantes a surgir, o mundo continua de máscara a tapar a boca e os dentes. Mas o hábito da máscara continua. Quanto tempo esse hábito vai permanecer ninguém pode estimar. Porque hábitos são também decisões que tomamos. Na verdade, com o teletrabalho o mundo está a criar novos hábitos e tem mais tempo para os hábitos mais antigos. Lava-se mais vezes os dentes estando em casa porque temos mais tempo. Por isso quando comprar e estiver a consumir um produto, lembre-se que está a consumir um hábito e, dependendo de qual for, esse hábito irá consumi-lo a si também. Então escolha os melhores hábitos. E habitue-se a essa ideia. Porque essa é a maior essência do marketing.

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ócio

(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio

66 Vilanculos: mais um passeio pelo lugar que quem um dia conhece deixa sempre a promessa de voltar

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e 68 Nesta edição, conheça o cantinho que aglutina o melhor da gastronomia zambeziana

69 Afinal, uma boa degustação não depende apenas do rigor no fabrico do vinho. A propaganda também conta!


Vilanculos

A Memória do SoL INHAMBANE

Uma aventura por uma das mais belas paisagens do País

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à saída do mar, estão homens e mulheres apoiados em pequenos pedaços horizontais de paus entrelaçados numa corda como se traçassem uma fronteira que os separasse. Todos de costas para a margem e de frente para o mar a puxar as redes da faina de uma noite menos longa do que as dos dias mais frios, mas que a luz alva da lua continua a servir como este farol a mostrar o caminho da manhã aos noctívagos. Puxam as redes como se também arrastassem parte do mar para trazê-lo à margem, amaciando assim a areia em brasa e talvez voltassem a dar a vida navegadora a um grande barco atracado em terra firme, feito de madeira, pintado a azul e vermelho, a lembrar o dos dilúvios bíblicos e de recomeço de vidas que já pensávamos perdidas. Quantos dilúvios hoje seriam necessários para curar as feridas da humanidade? Os corredores onde o mar é mais azul do que o céu, sugerem a

rota de corais em que, distante da azáfama imposta pelo roncar dos motores das embarcações, podemos ver o enlaçamento de coloridos peixes para salvar uma humanidade que vai morrendo um pouco a cada dia de pesca, um aquário de resistência a céu aberto. Um casal risca com o dedo indicador um coração na areia húmida, cada um faz a sua metade e os dedos de ambos embatem-se na ponta inferior, um desenho conjunto a que rapidamente uma leve onda se sobrepõe, mas que quando regressa deixa um curso de água em coração que continua a reflectir o sol como pequenos pedaços de vidro... o amor ainda pode ser brilhante. Um pequeno grupo de mulheres aguarda ansioso pelo regresso da rede “empeixada” do mar. Estão sentadas em baldes que dali a mais um pouco estariam pejados de peixes. Cantam músicas como se acelerassem os passos dos pescadores assim meio moonwalk,

este movimento que Michael Jackson eternizou e nos colocou a pensar que a vida não é apenas sobre dar passos para frente e que há alguma dignidade e graça em dar passos para trás, ainda que seja apenas para criar balanço ou, como agora vemos, para trazer parte do mar à margem. Sopra uma leve brisa que coloca nos lábios o salgado que sabe a mar. O sol já se agigantou, como se cuspido por um mar que se move sereno como os braços de uma mãe que quer embalar o sono do filho. O chão em chamas leva-nos às ruas não tão estreitas, mas também não tão abertas, que permitem que cada rosto com que nos cruzamos se torne, imediatamente, um novo conhecido, longe da impessoalidade das grandes cidades que fazem de cada pessoa apenas um vulto. Os corpos não suportam mais as vestes que roçam os calcanhares ou que se estendem para fechar o pulso. Não são mais tempos de insinuações, são da mostra de silhuetas em todo o seu esplendor,

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ainda mais numa cidade abraçada pelo Índico das chegadas e partidas e de início de toda uma vida até então desconhecida. Mas a alma das cidades acaba estando sempre escondida entre as bancas de mercados informais, em que vozes se sobrepõem para chamar atenção de quem passa, de um freguês forasteiro que tem ali a oportunidade de conhecer os sabores de Vilanculos ainda em “estado bruto”, porque as viagens também se fazem pela boca. É estranha a sensação de novidade, é como se a descoberta – para nós – de um mundo novo fosse ao mesmo tempo um acto de criação desse mundo, como se existisse um Vilanculos antes da nossa chegada, o das praias turísticas e dos rankings que o colocam como um dos melhores destinos de África; e outro, depois, que começa a ganhar a vida humana, vegetal, sabores e cores que permite que o toquemos a cada passo dado. Não muito distante, visitaríamos o Mozambique Horse Safari, esta imagem cinematográfica que são os cavalos a galope sobre as águas e que, com alguma coragem, nós mesmos nos colocaríamos ali por cima. Os cavalos dão sempre esta grande lição sobre servir o outro sem deixar que a nossa graciosidade se perca. E pensar que a história destes cavalos vem de tão longe, do Zimbabué do antigo e carismático Presidente Robert Mugabe, cada vez que pisam o mar é como se quisessem arrefecer os pés abrasados por um longo percurso. Mas quando a noite cai e o mar se torna num território movediço, onde só os pescadores têm coragem de se mover, as ruas de Vilanculos ganham uma nova vida, com bares feitos discotecas em músicas altas, os corpos colados em suor e tudo o que a noite pode sugerir. É como se a cidade, de repente, se tornasse o centro de todas as pessoas do mundo. TEXTO Cristiana Pereira FOTOGRAFIA D.R. www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

Um pequeno grupo de mulheres aguarda ansioso pelo regresso da rede empeixada” do mar, sentadas em baldes que dali a mais um pouco estariam pejados de peixes ROTEIRO COMO IR Há voos directos da LAM de Maputo para Vilanculos, além de ligações regionais. O QUE FAZER Sentar para ver as vidas que se desenrolam no mar e a partir do mar é sempre tentador. O pôr-do-sol é sempre inesquecível, mas o nascer dá muita energia para o dia. Com tempo, pode sempre visitar o Mozambique Horse Safari e andar em cavalos como nos filmes do velho faroeste, com a sorte de os ter no mar. ONDE COMER As viagens são também feitas pelos sabores que marcam um determinado lugar. A Casa Babi, que já tem cartão de visita de ser um dos melhores bed and breakfast de África, é um desses lugares que sabe a Vilanculos. Mas pode sempre experimentar a infinidade de casas de restauração.

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CACHOLA

O restaurante que serve os sabores de uma terra cujo mundo conhece pela riqueza gastronómica

g foi em 2014 que, movida pelo desejo de divulgar a comida moçambicana, Maria de Fátima Ruas Gagnaux abriu “O Cantinho da Cachola”. Mais conhecida por Cachola, a empresária do ramo da restauração é uma entusiasta da gastronomia local, que tem no seu restaurante não apenas um local para comer, mas um sítio para criar ou estreitar laços de amizade, conforme ela mesma afirma: “O contacto com os clientes é o melhor, para mim. Eu sou uma pessoa social e aquele lugar é mesmo ‘O Cantinho da Cachola’. Os meus amigos passam, vêem o meu carro estacionado e param para conversar”. Natural de Quelimane, capital da Zambézia, é à sua província que Cachola vai buscar

O Cantinho da Cachola, inspiração para os seus menus, apesar de também servir alguns pratos portugueses e não só. Afinal, há que agradar a diferentes paladares. “O Cantinho da Cachola” é, actualmente, um ponto de encontro para moçambicanos que procuram os verdadeiros sabores da Zambézia, em especial a mucapata, confeccionada a partir de feijão soroco. Mas quem vem atrás do tão famoso prato? Cachola responde: “Tenho uma clientela variada, mas a maior parte das pessoas que me procuram são os curiosos e pessoas de outras províncias, que já conhecem a mucapata. São pessoas que

O Cantinho da Cachola é uma amostra completa daquilo que a gastronomia zambeziana tem para dar ao mundo

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Ponto de Encontro da Gastronomia Zambeziana ficam satisfeitas por saber que existe um local onde podem comer a mucapata”. O Cantinho da Cachola é uma amostra quase completa daquilo que a famosa gastronomia zambeziana tem de bom para dar ao mundo. Entre os pratos mais apreciados, além do famoso (e até internacionalizado) frango à zambeziana e da mucapata, há uma extensa lista de outras atracções, entre pratos principais e aperitivos, que incluem o camarão, o quiabo, o mucuane, sanava e patanicua. Todos estes fazem da cozinha zambeziana um património nacional. O segredo? Tudo preparado com muito leite de coco,

feito na hora, ralando coco com água quente. Pela sua popularidade e prestígio, na grande Maputo, há uma data de casas especializadas na comida zambeziana. Dos diversos restaurantes e ‘take-aways’ que servem pratos típicos daquela zona, alguns ostentam o nome da província, mas confeccionam o prato mais famoso da gastronomia do também chamado ‘Pequeno Brasil’ (província da Zambézia), com o frango brasileiro e, em moldes não tradicionais, o frango à zambeziana. TEXTO Magda Arvelos FOTOGRAFIA Ricardo Franco

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Ao mesmo tempo que os produtores precisam de vozes independentes para falarem sobre os seus vinhos, têm orçamentos de marketing para pagar pela sua promoção

O Vinho Faz-se de Uvas, jamie goode, um reconhecido ‘wine writer’, cronista do The Sunday Express e co-chair do International Wine Challenge acredita que a indústria do vinho é tão abrangente e diversificada que precisa de comunicação, componente que vai assumindo modelos diferentes e transformadores ao longo do tempo. Goode narra a sua experiência na comunicação sobre vinhos, ao mesmo tempo que desvenda a importância de uma componente, até aqui pouco explorada, no discurso directo: “Creio que foi Hugh Johnson que primeiro o disse: ‘O vinho precisa de palavras’. Embora seja improvável que leiamos colunas sobre queijo ou tenhamos alguma vez dado preferência aos que escrevem sobre trigo, ou mesmo escolhido carnes, maçãs ou damascos com base nos conselhos de especialistas, parece que, com o vinho, é algo diferente. É uma categoria de produto tão fragmentada e altamente diversificada que alberga a profissão de ‘wine writer’, ou ‘escritor de vinhos’, bem como uma agenda de viagens e eventos para imprensa, onde esta raça especial de comunicadores se reúne à custa de outras pessoas para gerar palavras sobre o vinho. Comecei a escrever sobre vinhos relativamente tarde. Lancei um portal, chamado wineanorak, em 1999. Durante nove anos, escrevi sobre vinhos numa linha paralela ao meu trabalho diário, como editor de ciências. Foi muito divertido. Mas, quando cheguei ao sector, a paisagem da escrita sobre vinho já estava a mudar significativamente. Quando comecei, nos dias iniciais da internet, os media impressos e televisivos ainda não conheciam os efeitos desse novo meio de comunicação. Os jornais ainda contratavam comentadores especializados em vinhos com salários profissionais a tempo integral para publicarem uma coluna por semana, geralmente ao sá-

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Mas Também de… Palavras bado ou domingo. Os livros sobre vinhos também vendiam muito bem. Quem fosse um dos sortudos que tivesse uma coluna como essa estava num lugar feliz. E um contrato decente para um livro poderia oferecer a alguém um trabalho como escritor a tempo inteiro. Isso, hoje em dia é, claro, inimaginável. A forma como tudo mudou nos últimos 20 anos é impressionante. Houve uma revolução nos media. A internet e, mais recentemente, o surgimento das redes sociais, mudaram o panorama. Em particular, o Facebook e o Google varreram a maior fatia das receitas de publicidade que anteriormente apoiavam o conteúdo gerado profissionalmente em jornais e revistas. Agora que o dinheiro segue o conteúdo gerado pelo utilizador das redes sociais, a necessidade de conteúdo profissional diminuiu significativamente. Já não está disponível o mesmo montante para pagar escritores. Quando consegui uma coluna de jornal em 2005 (ainda a faço hoje, 16 anos depois), o pagamento era pouco mais de um décimo do que teria sido alguns anos antes. Em 2007 aderi ao Facebook, em 2009 ao Twitter e em 2013 ao Instagram. Estes canais abriram novas oportunidades, enormes, para os criadores de conteúdos a diferença é que a maior parte dessa actividade não é remunerada. Agora, ainda há palavras para o vinho – e muitas. Muito mais pessoas desenvolveram uma voz e audiência, graças à internet e às redes sociais. Alguns escritores estabelecidos – como eu – adoptaram os media sociais e usaram-nos extensivamente como outra ferramenta de comunicação. Em geral, isso tem sido muito positivo, e algumas vozes novas emergiram. Do meu ponto de vista, não estaria a fazer o que faço hoje sem a Internet abrir as portas. No entanto, levantam-se problemas com este novo cenário mediático. Em primeiro lugar, existe agora um oceano de conteúdos e o que realmente conta corre o risco de ser abafado pelo ruído. Em segundo, como muito poucas publicações pagam adequadamente pelo conteúdo, o número de jornalistas que escreve profissionalmente, ou seja, que dedicam o seu tempo na íntegra a obter a experiência e o conhecimento necessários para fazer bem o trabalho, é muito reduzido. E aqueles que estão a ganhar a vida com isso não podem justificar muito tempo de pesquisa se não estiverem a ser pagos adequadamente pelas peças que escrevem. No entanto, ao mesmo tempo, os produtores precisam de vozes independentes para falar sobre os seus vinhos, têm orçamentos de marketing para pagar pela promoção. O comércio de vinhos precisa que as pessoas escrevam sobre vinhos porque este é um mundo muito complicado e dinâmico – afinal, as coisas mudam a cada colheita”.

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LITERATURA

O conto “um gentil ladrão” chegou à publicação norteamericana The New York Times e inaugura o livro

“Ler” o Dinheiro Somando ”não faço contas, não sei fazer contas. Prefiro trabalhar com as letras”. Mia Couto apropriava-se, assim, das palavras, introduzindo-se ao público reunido no Business Lounge do Nedbank, em Maputo, para uma conversa informal e intimista. Talvez aquela ocasião fosse apenas um pretexto para um encontro mais “humano” com Mia ou até mesmo para um desfile de vivências em que a arte se cobria das suas melhores vestes e se comunicava com alguns dos seus apreciadores. Dois temas foram colocados como principais para esta celebração artística: “a outra forma de ver o dinheiro” e uma apreciação sobre a mais recente obra do escritor – “O Caçador de Elefantes Invisíveis”. A assinatura do Nedbank Moçambique – “outra forma de ver o dinheiro” – dominou as primeiras conversas do dia, onde o autor confessou de antemão ter uma “relação difícil com o dinheiro” ao mesmo que lamentou a actual

Ganhos “Valiosos” Para a Cultura sobrevalorização do dinheiro. “Hoje em dia, o dinheiro parece que vale por si mesmo. Deixámos de perceber que o dinheiro é um valor de troca. Ele próprio, em si mesmo, passa a ser um objecto de idolatria, de adoração. De repente, parece que ele tem em si mesmo o valor”, disse. Mia Couto também usou das palavras, seu maior trunfo, para mostrar que apesar de os números não serem o seu forte, encontra-se quase sempre em transacções literárias. “A literatura faz trocas. Eu só escrevo quando sou outro. Quando eu percebo que essa outra pessoa de quem estou a contar a história existe dentro de mim. É uma espécie de reserva bancária no meu interior. Eu posso transaccionar em qualquer parte do mundo”. A ocasião serviu ainda de espaço para uma conversa entre os intervenientes sobre o mais recente livro de Mia Couto, lançado no passado mês de

Na obra “O Caçador de Elefantes Invisíveis”, Mia Couto mantém uma “visão mítica e poética” da existência humana... www.economiaemercado.co.mz | Dezembro 2021

Outubro. Escrito durante mais de dois anos, na sua colaboração regular com a revista portuguesa “Visão”, das crónicas publicadas, o autor fez uma selecção e reescreveu-as na forma de contos que deram vida à obra “O Caçador de Elefantes Invisíveis”. O autor aproveitou a ocasião para ressaltar o seu amor pela escrita de contos. “Para mim o conto é o que me dá mais prazer fazer, em termos de escrita “, acresceu. Já para o anfitrião, Joel Rodrigues, Presidente da Comissão Executiva do Nedbank Moçambique, a cultura moçambicana é também foco daquela instituição bancária. “Receber no nosso Business Lounge um dos escritores mais consagrados de Moçambique é, para nós, um motivo de enorme orgulho, sendo esta conversa intimista mais um exemplo daquilo que queremos que este espaço seja: uma nova forma de aproximação à sociedade moçambicana, tornando-se num pólo dinamizador da cultura e de novas tendências”. TEXTO Yana De Almeida FOTOGRAFIA D.R

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CONCEPT SEVEN

No seu interior, conta ainda com vários espaços de arrumação, como gavetas, ou um espaço específico para arrumar os sapatos e um mini-frigorífico

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Sem Volante e Com Uma Sala A Hyundai apresentou um SUV eléctrico – o Concept Seven – que classifica como um “espaço inovador sobre rodas” para um futuro pós-direcção. Tal como os outros modelos anteriormente apresentados, também o Concept Seven é 100% eléctrico, assentando sobre a mesma plataforma dedicada para veículos eléctricos do Hyundai Motor Group, a E-GMP. O design do novo veículo destaca-se pelas linhas optimizadas aerodinamicamente. Sendo um concept, o Seven “joga” com a forma como os utilizadores acedem ao habitáculo: do lado do condutor existe apenas uma porta, enquanto do lado do passageiro há duas portas, com a traseira a ter uma abertura invertida. Já o interior aponta para um futuro mais distante no tempo. O novo veículo enquadra-se num futuro onde a condução autónoma será uma reali-

Sobre Rodas: o Futuro da Hyundai dade, dando mais liberdade à configuração do habitáculo, e apresentando uma sensação de segurança tão elevada onde a presença de cintos é evitável. Por outro lado, ao apostar na condução autónoma não existem comandos tradicionais de controlo do veículo, como um volante ou pedais, com o banco ou poltrona do condutor a esconder um manípulo retráctil similar a um joystick para quando for necessário conduzir. O novo modelo também se destaca pela iluminação ambiente, seja pelo tecto, onde também reside um ecrã OLED gigante, uma espécie de tecto panorâmico virtual, ou ainda pelas portas laterais. No seu interior, conta também com vários espaços de arrumação, como gavetas ou um espaço específico para arrumar os sa-

O Concept Seven é 100% eléctrico, assentando sobre a mesma plataforma dedicada para veículos eléctricos do Hyundai Motor Group, a E-GMP

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patos e um mini-frigorífico. Por fim, lembrando o impacto que a pandemia do covid-19 continua a ter no mundo, este Hyundai vem equipado com sistemas de higienização, como o Hygiene Airflow System e o UVC Sterilization, inspirado no fluxo de gestão de ar de aviões de passageiros, e que consegue reduzir a contaminação cruzada entre os passageiros e isolar o fluxo de ar entre os ocupantes dianteiros e traseiros. Para já, a realidade deste modelo ainda não passa de um conceito, mas mostra a visão da marca sul-coreana para o futuro automóvel. “O Seven ousa romper com o caminho tradicional. Abre o caminho do que um SUV precisa de se tornar na era EV, com uma forma aerodinâmica pura e única, que não compromete a sua personalidade robusta”, referiu SangYup Lee, Vice-Presidente Sénior e Chefe do Hyundai Global Design, citado pelo site Razão Automóvel.

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