Com efeito, o sindicalismo de massas não soube incorporá-las - e nem aos ativistas mais destacados - ao seu funcionamento cotidiano. A diretoria segue sendo a única instância permanente de decisão, sendo dificilmente encontráveis os conselhos de representantes, comissões de mobilização ou organismos semelhantes. Quando os encontramos, normalmente são apenas figurativos ou passageiros. Por outro lado, e em contradição com o crescente
número de grevistas por empresa, as. comissões de fábrica não se multiplicaram - pelo contrário, grande número de comissões surgidas em momentos de lutas acabaram por ser reprimidas - e mesmo os grupos informais ou clandestinos de fábrica, recurso tão importante para trabalhar num clima repressivo como o existente na fábrica bras i Ieira, não são estimulados a partir do trabalho das direções sindicais.
As causas das debilidades Certamente, o problema que ora apontamos tem causas de ordem conjuntural , relacionadas com o relativo refluxo do movimento (apesar das greves) e dos seus próprios impasses pol rticos. Própria desta conjuntura - talvez em vias de ser superada - é, por exemplo. esta descrença generalizada da massa na pol rtica e na sua capacidade de influir na mesma, fruto de uma sucessão de decepções, como a derrota das Diretas, o Plano Cruzado, etc., e do relativo fracasso e ausência de resultados de suas mobilizações, como as greves gerais e mesmo as lutas salariais. Devemos considerar também a própria juventude deste novo sindicalismo, que no seu construir-se enfrenta dificuldades normais a um processo de crescimento. Mas, não podemos conformar'nos com o sábio julgamento do tipo "quem sabe, isso tudo são pequenos acidentes próprios da rota escolhida". Pelo contrário, para quem realmente aposta num sindicalismo democrático e de massas e para quem tem uma preocupação educativa de formação de uma classe operária organizada e conscie]lte, compreender as causas deste problema é um pré-requisito para sua superação.
Relação patronal Assim, alinhavamos alguns fatos e circunstâncias que têm influ Ido na não organização dos trabalhadores na fábrica e na sua não participação na vida sindical. 11 Uma primeira questão a ressaltar é a reação patronal que ocorreu como resposta à volta das manifestações trabalhistas. A surpresa inicial, em que o empresariado pouco mais fazia que apelar para a intervenção do Estado (via Ministério do Trabalho, Justiça do Trabalho ou, simplesmente, Polrcia), foi rapidamente superada e a inação substitu rda por uma série de iniciativas que tiveram como resultado a obtenção de um maior preparo para o enfrentamento dos problemas trabalhistas. O investimento crescente em recursos humanos,
combinando repressão seletiva com tentativas de cooptação, uma melhor preparação para as negocia· ções, a negativa de negociar sob pressão, tudo isso demonstra um maior preparo dos empresários, QUe, ao natural, já tem a seu favor a maior facilidade para a ação coletiva, uma vez que para isso basta articular as empresas, enquanto os sindicatos de· pendem do convencimento e disposição voluntária dos indivfduos que compõem as categorias. Se a isto somarmos a tradição autoritária, quase obscurantista, desse empresariado, que corresponde, por sinal, à permanência de uma cultura e de estruturas pol rticas autoritárias na sociedade brasileira, o que o torna ~vesso a qualquer tentativa de organização dos trabalhadores, e, por outro lado, a influência • inibitória que o alto n rvel estrutural de desemprego presente na sociedade brasileira exerce sobre a capacidade de luta dos trabalhadores, teremos um quadro em que a ação sindical fica bastante dificul· ta da.
Infiuência da estrutura sindical Também se fala muito no efeito negativo da manutenção da estrutura sindical corporativa sobre um sindicalismo que tenta se construir em outros moldes. Este é um ponto sempre presente no discurso dos sindicalistas combativos e dos analistas do movimento sindical, que, muitas vezes, vêem a estrutura sindical como a causa de todos os males do sindicalismo brasileiro. Com efeito, a influência negativa dessa estrutura é inegável. Porém, cabe situar melhor esta explicação. Por um lado, muitas das iniciativas do movimento sindical não têm encontrado obstáculos nesta estrutura: foram criadas centra is sindicais, são feitas greves proibidas, a grande maioria dos conflitos têm sido resolvidos pela negociação direta, os sindicatos não têm sido objeto de intervenção ou de controle de contas pelo Ministério do Trabalho, etc. Na verdade, em· bora o arcabouço jurfdico que dá forma a esta estrutura ofereça ameaças, ele não está sendo apli·
11 Não é nosso objetivo entrarmos aqui no estudo sobre as caracterfsticas desta classe operária : fixamo-nos nos sindicatos, suas caracterfsticas, seus dirigentes e suas relações institucionais. Isso, contudo, não significa que consideremos desnecessária a preocupação voltada também para este nfvel.
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