XX
Uma Experiência
E
ra fevereiro de 1902. Estava em Viena com a minha companhia japonesa, Sada Yacco à frente. Conosco havia uma artista, uma dançarina117, a quem eu gostaria muito de ajudar. Em Paris, a minha grande amiga Nevada, a célebre cantora norte-americana, havia me apresentado a ela, e a dançarina deu-me imediatamente uma amostra de suas habilidades. Dançou com uma graça sublime, o corpo apenas coberto por um levíssimo traje grego e, detalhe singular, com os pés descalços. Ela prometia tornar-se alguém; e cumpriu essa promessa. Através dela vi renascer as antigas danças das tragédias. Vi ressurgir os ritmos egípcios, hindus e gregos. Disse para a dançarina de que modo, na minha concepção, ela teria êxito: com estudo e trabalho. Pouco depois fui para Berlim, onde ela foi se juntar a mim. Durante a nossa estadia, ela estava quase o tempo todo doente e mal conseguia trabalhar. De volta a Viena, começamos a ensaiar com afinco, e decidi organizar apresentações para colocá-la diante de um público capaz de apreciá-la e compreendê-la.
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Isadora Duncan (1878-1927). Precursora de uma coreografia baseada na pesquisa dos movimentos naturais do corpo, a dançarina norte-americana foi manchete ao dançar descalça e vestida com uma túnica bem leve. “Em nossa época, só ela percebeu como andavam, como corriam, como usavam grinaldas e ânforas as moças da Grécia Antiga, e é isso que, com mil outras graças, ela ressuscita ao som das músicas do nosso tempo”, escreve o jornalista e escritor-viajante Jules Huret (1863-1915), no En Allemagne. Berlim (1909).