XXII
Gab
D
urante oito anos Gab124 e eu convivemos numa grande intimidade, como duas irmãs. Gab é muito mais jovem do que eu e nutre um profundo afeto por mim. Muitas vezes olho para ela com curiosidade. Ela parece ler o meu olhar e responde à minha interrogação muda: - Você não pode me entender! Você é saxã e eu sou latina. Quando a observo, chego à mesma conclusão que ela, e me pergunto se existe um “modo de compreensão” que nós, anglo-saxões, não possuímos. Gab é profundamente séria. Ela tem grandes olhos negros que parecem adormecidos. Quando caminha, apesar de sua pouca idade, é com passos longos e pausados, que dão a impressão de que ela é uma pessoa de natureza grave e reflexiva. Quando a conheci, ela morava em um apartamento escuro, decorado em estilo indiano, e, vestida com seu traje de veludo preto, ela lembrava uma princesa bizantina. O poeta Jean Aicard125 certa vez disse que a voz dela é de veludo, a pele e cabelos são de veludo, seus olhos são de veludo, e que seu nome deveria ser Veludo. Se pudéssemos compará-la a um animal, ela seria uma jiboia, pois seus movimentos são os de uma
124 125
Gabrielle Bloch (1878?-?), chamada Gab Sorrère. Companheira de Loïe Fuller. Jean Aicard (1848-1921). Poeta e romancista francês.