TRAÇOS GERAIS
PEDRO RIBEIRO FERREIRA tracosgerais@gmail.com Cartoon: Pedro Ribeiro Ferreira
UMA VIDA INTEIRA! PICASSO É DIFÍCIL FALAR SOBRE O PICASSO EM TÃO POUCAS LINHAS E EM MUITAS AINDA SERIA MAIS DIFÍCIL. NÃO SÓ PELA COMPLEXIDADE DA FIGURA, MAS, PRINCIPALMENTE, PELA ENORMIDADE DA OBRA.
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que dizer sobre o homem que mudou para sempre o curso da história da arte? A arte contemporânea muito deve à herança do Picasso e às portas que ele abriu a muitos artistas (e também a muitos impostores). A partir dele tudo foi permitido, desde fatias de vacas conservadas em formol, a Nossas Senhoras feitas à base de bosta de boi. Tudo exposto nos museus mais conceituados do mundo. Proporcionou emprego a muitos oportunistas. Mas ele não tem culpa de ter esgotado em si não sei quantos movimentos artísticos, únicos e originais. A sua obra dava para ser repartida por vários artistas e continuavam todos a ser independentemente geniais. Mas o seu percurso é uma pedrada na lógica natural da evolução de um artista. Como se tivesse nascido velho e regredisse em direção ao útero da mãe. Muito cedo atingiu um nível técnico inacreditável. Quem me dera pintar aos oitenta anos como ele pintava aos dez! É curioso que na sua fase final, supostamente mais
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madura e sofisticada, esteja, aparentemente, ao nível técnico de uma criança. Por isso, apesar de o considerar o Mozart da pintura, não deixo de sentir uma certa promiscuidade na sua obra. Acho que ele não era um puro como Van Gogh, que pintava com a alma. Tudo o que o Picasso fazia tinha uma fortíssima racionalidade e intencionalidade comercial. Apanhou a era da televisão e da imagem e utilizou-a a seu favor. Acima de tudo era um homem que sabia vender muito bem o seu produto. Um “case study” para os homens do Marketing. Acabo com uma história que supostamente se passou com Picasso e que cito várias vezes como exemplo, sempre que vem a propósito. Então é assim: Um conhecido de Picasso, pediu-lhe para este lhe fazer um desenho num papel qualquer. Ele fez um rabisco e disse: “São 50 mil euros” (ou pesetas na altura). O pseudo amigo indignado retorquiu: “Mas você fez isto em dez segundos!” E Picasso rematou: “Em dez segundos não, numa vida inteira!”