Hoje, muitas lideranças continuam firmes nas trincheiras do combate ao racismo. Os movimentos, sobretudo de mulheres negras, ganham força, e surgem novos coletivos para impedir retrocessos e denunciar a ação dos agentes do Estado no sistemático encarceramento e assassinato da juventude negra nas periferias das cidades. O genocídio ainda continua – porque “a carne mais barata do mercado é a carne negra”, como canta Elza Soares. A desigualdade salarial, de oportunidades, de direitos, sobretudo para as mulheres negras – herança maldita da escravidão que no pós-abolição se moderniza e produz o abandono de milhões de seres humanos à própria sorte –, é o principal motivo que faz o Brasil ser reconhecido como um país antidemocrático, autoritário, conservador, elitista e eurocêntrico. Um país que revive o passado repressor e onde o futuro demora a chegar. Celebrar, por meio deste livro, os quarenta anos do Movimento Negro Unificado (MNU) é um modo de homenagear cada afro-brasileiro, cada negro e cada negra, por resistir e continuar lutando por direitos, cidadania e liberdade até que sejamos todas e todos livres do racismo, da pobreza, do machismo, da LGBTIfobia e de qualquer forma de intolerância. Axé e boa leitura!
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Este livro retrata, por meio de fotos, testemunhos, manifestos e artigos, a história da luta de mulheres e homens negros brasileiros que tiveram no Movimento Negro Unificado (MNU) uma das principais frentes organizadas contra o racismo e a segregação sociorracial. Evocando a força e a bravura de seus antepassados africanos, bem como de figuras históricas que desafiaram o status quo e desmascararam o mito da democracia racial no Brasil, esses atores têm denunciado, ao longo das últimas quatro décadas, a vulnerabilidade da população negra frente ao Estado e no mundo do trabalho, e pautado políticas públicas que buscam reparar as profundas marcas de desigualdade que permanecem após mais de trezentos anos de escravidão. Uma história que ainda está sendo escrita pelas mãos de muitas gerações.
MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO a resistência nas ruas
violência policial, dava continuidade à luta dos nossos antepassados, por isso hoje se junta ao panteão de nossa história: Lélia Gonzalez, Hamilton Cardoso, Lenny Blue, Neuza Maria Pereira, Milton Barbosa, José Adão de Oliveira, Rafael Pinto e tantos outros que povoam as páginas deste livro protagonizaram marchas, encontros, festivais, publicações, conquistas constitucionais e políticas públicas para a população negra.
Em 1871, Luiz Gama diria que a resistência é uma virtude cívica. Pouco mais de cem anos depois, em julho de 1978, iniciava-se um grande movimento civil de mulheres e homens negros contra o racismo. Essa luta contra todo tipo de preconceito e discriminação vem de longe, desde quando nossos antepassados foram sequestrados do continente africano e aqui escravizados para enriquecer os colonizadores das Américas.
MOVIMENTO NEGRO UNIFICADO a resistência nas ruas ENNIO BRAUNS GEVANILDA SANTOS JOSÉ ADÃO DE OLIVEIRA (ORG.)
Apoio cultural:
ISBN 978-85-9493-163-4
Apesar da escravidão, resistimos. Hoje podemos evocar uma linhagem de lideranças que bravamente se insurgiram contra a ignomínia de torturas e castigos do cativeiro. Aquilombaram-se. Defenderam a si e aos seus com armas, palavras e manifestações. Com Zumbi e Dandara nos Palmares e João Cândido e Luiza Mahin nas revoltas populares. Com o abolicionismo de André Rebouças, de José do Patrocínio e do próprio Luiz Gama, que atuavam nas redações de jornais e na defesa intransigente da liberdade. Com a alta literatura de Machado de Assis, Maria Firmina dos Reis e Lima Barreto. Com Aristides Barbosa, Solano Trindade e os 200 mil mulheres e homens da Frente Negra Brasileira (FNB) de 1931 – primeira organização que enfrentou as dicotomias raciais e as teses de eugenia contra negros e mestiços. Os nossos antepassados ilustres foram torturados, assassinados, embranquecidos e apagados do panteão da história oficial. Ao lado de tantos outros anônimos, sobreviveram a um verdadeiro genocídio e nos deixaram um riquíssimo legado social, intelectual, cultural, religioso. Um capital simbólico inestimável. Aquela juventude negra que em 1978, em plena ditadura civil-militar, se insurgiu e saiu em protesto pelas ruas de São Paulo bradando que a democracia racial era um mito, denunciando a farsa da abolição e a
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