REVISTA ORIENTE OCIDENTE - IIM MACAU - N. 37 2020

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As iniciativas de diplomacia desportiva na (re)entrada da China no sistema internacional Jorge Tavares da Silva Docente convidado na Universidade de Aveiro/Mestrado em Estudos Chineses e Mestrado em Ciência Política Investigador associado na Unidade de Investigação em Governança, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP)

“Ganhar ou perder é temporário; a amizade é eterna” Ditado chinês moderno

Introdução Muitos autores têm olhado para o desporto como um importante meio para a compreensão entre os povos e mesmo um instrumento de paz. No entanto, não deixam de existir também múltiplos exemplos de eventos desportivos como manifestação de poder das nações, instrumentos de propagação política ao serviço de poderosas ditaduras. Os Jogos Olímpicos de Berlim em 1936 são o exemplo desta realidade. Entre os críticos, encontramos George Orwell, não tendo contemplações ao afirmar a competição desportiva como estando ligada ao “ódio, ciúme, vaidade”, testemunho de violência, uma “guerra sem tiros”1. A verdade é que múltiplos são os exemplos que nos mostram como o desporto pode abrir barreiras políticas entre governos, levando a que povos desavindos interajam pacificamente entre si. Já na antiguidade clássica os eventos desportivos, par-

A visita da equipa de Ténis de Mesa (PinguePongue) americana à Grande muralha, capa da revista Time (26 de abril de 1971, Vol. 97 No. 17).

ticularmente os Jogos Olímpicos, serviram como fator de socialização e “transcenderam” as divisões políticas entre as cidades-estado. Muitas vezes foram usados como instrumentos diplomáticos na tentativa de aproximação de povos. Estamos aqui perante o que se considera de diplomacia informal, não governamental (embora, por vezes, gerido

indiretamente por governos), também designada de track two2, peopleto-people, citizens diplomacy, etc. Dificuldades de conceptualização levaram Louise Diamond e John W. McDonald a alargar as dinâmicas diplomáticas a um sistema multitrack (multinível)3 onde naturalmente se enquadram as dinâmicas desportivas, cujos objetivos vão muito “para além do jogo”4. A desconfiança, a falta de comunicação, a hostilidade das opiniões públicas e as barreiras criadas são muitas vezes quase intransponíveis5. Os governos não conseguem diretamente superar estas dificuldades, recorrendo a formas alternativas (informais) para estabelecer contactos. Neste sentido, a cultura ou o desporto podem dar um importante contributo. Assim aconteceu na República Popular da China (RPC), quando o desporto serviu para abrir diálogos com o mundo do “bloco ocidental”, no contexto da guerra fria. Após a implantação da RPC, em 1949, os Estados Unidos abriram uma frente de não reconhecimento deste país, ficando os seus 800 milhões de habi-

_________________ 1

ORWELL, George (1945), “The Sporting Spirit”, Tribune, 14 de dezembro, p. 10.

2

Expressão inspirada nas primeiras conferências de Citizen Diplomacy (1981-1987), organizadas por James Hickman e Jim Garrison Cf. GARRISON, Jim et al (1989), The New Diplomats – Citizens as Ambassadors for Peace. Devon: Green Books.

3.

Cf. DIAMOND, Louise; MCDONALD, John W. (1996), Multi-Track Diplomacy: A Systems Approach to Peace. West Hartford: Kumarian Press.

4.

MURRAY, Stuart (2018), Sports Diplomacy, p. 1.

5.

BERRIDGE, G. R. (1994), Talking to the Enemy, p. 13.

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