Como seria possível “Nós lá do morro/ Vamos vivendo de amor”, diante de tantos conflitos existentes entre a periferia, interna e externamente? Utopia. Ironia. Inversão. Os últimos versos da música, “Estudando com carinho/ O que nos passa o professor”, celebram a carnavalização da linguagem, uma vez que, naqueles anos de 1930, a maior parcela da população brasileira não tinha acesso à educação. De qualquer modo, há de se questionar que, mesmo aqueles poucos moradores dos morros, que conseguiram estudar, naquela época de desigualdades tão acentuadas, tiveram condições de “aprender com carinho” o mero “passar” de conteúdos dos professores, num tempo em que o método tradicional de ensino vigorava no país. Portanto, esse Teste ao samba merece especial leitura não somente pela coesão entre o texto escrito, o enredo, e a representação artística na Praça Onze. Destaca-se pela linguagem das alternâncias, renovações e denúncias, apropriando-se da ironia para apresentar-nos um relato histórico acerca da exclusão no acesso ao ensino em nosso país. Nessa direção, oportunas são as considerações de Roberto DaMatta a respeito dos sambas e das Escolas de Samba, em que observa os objetos deslocados. A própria escola, situada geralmente em um morro ou subúrbio, não ensina a ninguém uma profissão ou a “ganhar a vida” ensina, sim, a “própria vida”. Conforme atestam esses escritos, no Carnaval, os marginais anônimos que formam esse segmento social do subúrbio, do morro e da “escola de samba”, transformam-se em “professores” e “doutores” de samba e ritmo. (DAMATTA, 1981, p. 134)
1.4 – CONSIDERAÇÕES SOBRE ESTE CAPÍTULO Neste primeiro capítulo, observamos que algumas teorias demonstram que as origens do Carnaval estão nos cultos agrários da Antiguidade e apontam a prática desse evento entre várias culturas e povos distintos, egípcios, hebreus, romanos, persas, armênios, fenícios, cretenses e babilônicos. Há de se ressaltar que outras linhas investigativas definiram a origem dessa festa popular nos eventos da Idade Média. Na verdade, o Carnaval é encontrado de maneiras diversas nos mais diferentes lugares e tempos, sempre com músicas barulhentas, danças, máscaras e mesmo com licenciosidade. Provavelmente, veio do paganismo e a Igreja Católica o tolerou e o regularizou, quando o Papa Gregório I o inseriu no Calendário Eclesiástico, em 590, conforme destacou Eneida de Moraes. 68