HABITAÇÃO SOCIAL EM ÁREAS CENTRAIS, O CASO DE SALVADOR: PATRIMÔNIO, FRAGILIDADES E RESISTÊNCIA POPULAR.
SUMÁRIO
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INTRODUÇÃO P. 2
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ÁREAS CENTRAIS, MOVIMENTOS DE MORADIA E CAPITAL IMOBILIÁRIO: O DIREITO À CENTRALIDADE FRENTE AO PLANEJAMENTO URBANO ESTRATÉGICO DE CARÁTER EMPRESARIAL P. 4
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O CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR: DA ELITE COLONIAL AOS CORTIÇOS E PROJETOS DE TRANSFORMAÇÃO URBANA P. 10
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PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR: A. PANORAMA GERAL P. 16 B. SÉTIMA ETAPA P. 20 I. TIPOLOGIAS DE MORADIA P. 35 II. MOVIMENTOS POPULARES DE MORADIA E AUTOGESTÃO DE LIDERANÇA FEMININA: O CASO DA AMACH P. 41 CONSIDERAÇÕES FINAIS P. 44
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BIBLIOGRAFIA P. 46
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ICONOGRAFIA P. 47
FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO AUP0280 - ORGANIZAÇÃO URBANA E PLANEJAMENTO (2020) ALUNO: MIGUEL DA CRUZ MERMEJO NºUSP: 10751824 ORIENTAÇÃO: KARINA OLIVEIRA LEITÃO
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01- INTRODUÇÃO Esta monografia, em formato de dossiê, busca mobilizar a discussão sobre as áreas centrais, tendo como estudo de caso a sétima etapa do Programa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador (PRCHS). O recorte de análise propõe lançar luz aos processos de intervenção urbana, habitação social e fragilidades que recaem sobre os movimentos populares destas áreas, os quais se interseccionam no campo patrimonial, dotado de disputas. Assim, parte-se da tese de que os agentes envolvidos nesta vasta trama utilizam-se do patrimônio, à sua maneira, para defender seus interesses. Enquanto o Estado, no início do PRCHS, materializava os binômios turismo e patrimônio, por meio da lógica do planejamento urbano estratégico de caráter empresarial, os movimentos populares de moradia lutavam para garantir sua permanência no território, com o qual possuem laços afetivos, redes de sociabilidade, de trabalho e de memória que justamente se projetam enquanto parte constituinte do patrimônio da área. O Estado, portanto, ao fazer uso do patrimônio para promover uma “transformação urbana” e “renovação social”, afasta e até mesmo apaga parte constituinte deste bem. Nesse sentido, a sétima etapa do PRCHS representa uma mudança de postura, apesar de todas suas fragilidades e desafios. Ao não mais adotar a rede de mercado e consumo como protagonista da intervenção, como se viu nas etapas antecessoras, mas sim o direito à centralidade as camadas populares, é vista como certo progresso na luta por habitação social em áreas centrais. Contudo, é importante enfatizar que os interesses que gravitam pelo campo do movimento de moradia, dos movimentos sociais, identitários e culturais, ou pela rede de consumo do mercado segmentado, bem como os consequentes saldos de avanço e retrocesso ao longo deste jogo de disputa, no que tange o direito à centralidade e permanência das classes populares nas áreas centrais, podem se sobrepor e se contradizer mutuamente. Em síntese, o estudo sobre a sétima etapa do PRCHS justifica-se por si só, ao não só evidenciar de forma latente tal rede de disputas, mas também pelo fato de que “(...) pode-se dizer que apenas em Salvador [tratando-se de territórios brasileiros] a habitação social tornou-se o elemento estruturador da reabilitação de um trecho do núcleo histórico, resultado que foi consequência de um forte processo de disputa entre os diferentes atores locais” (Bonduki, 2010, p.319). Assim, em um aspecto geral, com exceção de Salvador, “a questão da habitação social nunca foi, no Brasil, objeto central de projetos de reabilitação de centros históricos. Tradicionalmente, as intervenções têm desconsiderado esse tema, sendo predominante a visão de que o lugar dos pobres é nas periferias e que a recuperação dos núcleos históricos deveria estar voltada prioritariamente para o turismo e as atividades culturais” (ibidem, p. 316-317).
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02 - ÁREAS CENTRAIS, MOVIMENTOS DE MORADIA E CAPITAL IMOBILIÁRIO: O DIREITO À CENTRALIDADE FRENTE AO PLANEJAMENTO URBANO ESTRATÉGICO DE CARÁTER EMPRESARIAL As áreas centrais, enquanto tendência observada globalmente, apresentaram um apogeu enquanto uma região nobre mas que, ao longo das décadas, devido a conformação de novas centralidades pelo mercado de consumo e pelo capital imobiliário, acompanhada pelo deslocamento das classes altas, dinamizou-se a partir da faceta popular, mantendo a pujância por meio dos setores de comércio e serviço populares. Dessa forma, enquanto juízo de valor negativo e estigmatizado, este movimento de popularização das áreas centrais é comumente tido enquanto parte integrante do processo de “degradação” das áreas centrais:
“em decorrência de seu natural envelhecimento, da inadequação das edificações para os usos
modernos e do surgimento de outras centralidades atraentes para os setores privilegiados da sociedade e para o mercado imobiliário, os tecidos urbanos mais antigos das principais cidades sofreram, ao longo do século XX, forte processo de deterioração física” (Bonduki, op. cit., p.319).
Estes territórios foram majoritariamente ocupados por indivíduos de renda média e baixa que possuíam vínculos históricos, relações sociais e facilidades, como acesso a empregos e transportes, não possuindo, assim, interesse ou até mesmo condições de se transferirem para as novas centralidades que se conformavam nas cidades (ibidem). Contudo, já na década de 90, observou um movimento de interesse pelo Estado em fomentar a retomada das áreas centrais pelas classes mais abastadas, enquanto um vetor atrativo para investimentos e consumos atrelados à circulação de capital. Segundo Scifoni (2015), a partir da década de 90 é comumente atribuído à preservação e restauração do patrimônio cultural o papel estratégico de agente protagonista em intervenções nas áreas centrais de grandes cidades, no contexto de desenvolvimento do planejamento urbano estratégico de caráter empresarial (Scifoni, op. cit., p.130). Nessa narrativa, o empresariado, bem como o Estado, compreendem aparelhos culturais e patrimônios restaurados e/ou transformados como um instrumento capaz de mobilizar investimentos e circulação de capital, num processo de competição global, principalmente, no âmbito da rede consumo e lazer ligada ao turismo, ou, ainda, até mesmo como instrumento de um processo de revalorização imobiliária (ibidem). Em consequência, observa-se como resultado dessa prática urbana a expulsão de moradores populares e a transformação do uso do solo e da vivência que se observava outrora:
“com o advento das políticas de proteção às cidades históricas, as formas de tratar esses sítios
lentamente se alteraram, evoluindo da renovação para a reabilitação. Predominou, entretanto, uma visão que continuava a estigmatizar a população moradora, como se o enfrentamento da deterioração física fosse incompatível com a manutenção do tecido social e cultural que se formou nesses núcleos” (Bonduki, op. cit., p. 320-321).
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Contudo, dado o fracasso destes projetos urbanos (Sant’Anna, 2017b, p.149150), na própria década de 90, houve o fortalecimento dos movimentos sociais de luta por moradia que reivindicam a permanência em tais territórios, bem como o desenvolvimento de programas habitacionais de cunho social1. Todavia, essas iniciativas “(...) esbarraram na fragilidade e na inadequação da política e dos instrumentos de financiamento habitacional no Brasil e em entraves diversos de natureza urbana, fundiária, tecnológica e política, o que prejudicou o seu desenvolvimento e resultados, a despeito de focalizarem demandas reais” (Sant’Anna, 2017b, p.150). Apesar do fracasso destes projetos apontado por Sant’Anna, no sentido das áreas centrais manterem seu caráter híbrido de coexistência de classes, usos e dinâmicas diversas, o ritmo do processo de esvaziamento populacional nessas áreas, que observou-se durante as décadas de 80-90, tem diminuído nos últimos anos e até apresentado reversão em alguns municípios (Kohara et al., 2012, p.13). Todavia, “a produção de habitação de interesse social continua seguindo a lógica de produção periférica da cidade” (ibidem). Para Bonduki:
“a questão da habitação social nunca foi, no Brasil, objeto central de projetos de reabilitação de
centros históricos. Tradicionalmente, as intervenções têm desconsiderado esse tema, sendo predominante a visão de que o lugar dos pobres é nas periferias e que a recuperação dos núcleos históricos deveria estar voltada prioritariamente para o turismo e as atividades culturais” (Bonduki, op. cit., p. 316-317).
Mediante as pressões de modificação de usos atrelada a mudanças também de nível social, rejeitando-se os mais pobres, os movimentos de moradia emergem pela defesa do direito à centralidade. Tal direito refere-se não somente a manutenção das classes populares residentes no território, atrelada aos laços ali constituídos, assim como facilidades de maior empregabilidade na região, ao baixo custo de deslocamento e à disponibilidade de serviços públicos, mas também ao direito da população de baixa renda morar dignamente na região central, dado o cenário de concentração de cortiços ou habitações coletivas precárias, acompanhadas pela cobrança abusiva de aluguéis (Kohara, et al, op. cit., p.13). Nessa narrativa, o movimento popular de moradia, seja
“na prática teimosa ou no discurso esclarecido, a defesa da centralidade é uma contrapolítica,
uma ação na contramão (Holston, 2013, p. 62), uma insubordinação diante da política de fronteiras que produz as diferenças entre centro e periferia. Aberta ou silenciosamente, discursos e práticas são contrapolíticas espaciais que desafiam a regra que, no Brasil, dita que ‘o lugar dos trabalhadores pobres e o lugar para os trabalhadores pobres’ é a periferia (Holston, 2013, p. 197)” (Uriarte, 2019, p.396). 1 Para além do próprio Projeto da 7ª Etapa do Programa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador, são exemplos o Programa de Revitalização de Sítios Urbanos (PRSH), 2000, criado pela Caixa Econômica Federal e componentes do Programa de Reabilitação do Centro, 2003, da Prefeitura de São Paulo (Sant’Anna, 2017b, p.150).
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Nessa narrativa, uma série de fatores, a um primeiro momento, podem encarecer essa unidade habitacional em áreas centrais. Segundo o dossiê “Moradia é central - lutas, desafios e estratégias”, o pouco fomento de habitação de interesse social em áreas centrais decorre do fato do mercado da construção civil e imobiliário não alcançarem lucros tão expressivos nesse segmento. Para o mercado da construção civil, é mais lucrativo construir unidades novas em grande escala, onde o custo da terra não seja tão elevado como no centro e ainda em áreas que sejam possível seguir seu projeto adaptado. Além disso, o dossiê indica que “a legislação, em grande parte das cidades, não favorece a reforma” associada ainda a maior burocracia de áreas e unidades protegidas enquanto patrimônio, cujas reformas estão submetidas a aprovação de diversos órgãos governamentais (Kohara, et al., op. cit., p.15). Todavia, a longo prazo, o investimento em habitações de interesse social em tais áreas é mais positiva, uma vez que, segundo o mesmo dossiê, morar em áreas centrais é mais barato para o trabalhador e, em linhas breves, “se morar no centro é mais barato para o trabalhador, também é para o Estado, uma vez que não precisa investir em serviços e infraestrutura já existentes e subutilizados nas regiões centrais” (ibidem). O governo federal tem sido o maior indutor dessas habitações em áreas centrais2. Nesse sentido, destaca-se o Programa Monumenta, criado em 1999, um projeto do Ministério da Cultura3, em nível federal, de linha de crédito voltado para a recuperação de imóveis tombados pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) em centros históricos, sendo implementado em 26 cidades históricas. Em linhas gerais, seus recursos de financiamento podem englobar: recuperação de fachadas e coberturas, demolição de acréscimos descaracterizadores da edificação, estabilização ou consolidação da estrutura do imóvel, embutimento da fiação e adequação das instalações elétricas, projeto e placa de obra, taxas cartoriais para registro do contrato. Apesar do programa se inspirar na experiência de Quito4, em que associou-se a defesa patrimonial à política habitacional, sem expulsar os moradores pobres que ali habitavam, o Monumenta inseriu-se, na realidade, na corrente difundida na déca-
2 Além disso, destaca-se a própria autogestão pelos movimentos de moradia como forma de garantir projetos com melhores qualidades e mais adequados às suas demandas, em que uma maneira de possibilitá-la é por meio do financiamento federal do PMCMV - Entidades (Kohara, et al., 2012, p.18). 3 Em 2006, deixou de ser um programa do Ministério da Cultura e passou a ser da alçada do Iphan (Sant’Anna, 2017b, p.150). 4 Segundo Uriarte (2012, p.51), para além de Quito, o Monumenta baseou-se também na experiência de Olinda, em que o centro histórico manteve a predominância de uso habitacional com seus antigos moradores pobres, uma vez que a Prefeitura assumiu um empréstimo junto ao até então existente BNH (Banco Nacional de Habitação) repassando-o na forma de pequenos empréstimos aos moradores evitando, assim, entraves comuns como a comprovação de renda, documentação e titularidade.
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da de 705 de intervenções nos centros históricos atrelados ao capital e às dinâmicas econômicas ligadas ao turismo e lazer (Uriarte, 2012, p.51-52). Assim, é importante pontuar que o Monumenta não é um programa habitacional, mas sim um projeto de conservação e restauro, de monumentos tombados em nível federal, e de melhorias no espaço público próximo destes (ibidem, p.52), mas que é utilizado em alguns casos voltados para habitação, como na sétima etapa do PRCHS, enquanto um dos diversos instrumentos de recursos para a reabilitação e preservação destes imóveis. Assim, segundo Sant’Anna (2017b), de certo modo, o Monumenta em sua fase inicial buscava atualizar a proposta do PCH6 (Programa de Cidades Históricas), no sentido de atuação descentralizada e aproveitamento turístico do patrimônio urbano (Bonduki, 2010, p.28, apud Sant’Anna, 2017b, p.150). Nessa fase inicial, financiou obras de conservação e adaptação de edificações, aprovadas pelo Iphan e executadas por seus proprietários ou ocupantes (Sant’Anna, 2017b, p.150). Além disso, os empréstimos voltados para essas obras compunham o Fundo Municipal de Preservação, a fim de ser reinvestido na conservação da área de intervenção do programa (ibidem). Com o seu término, o Iphan buscou aplicar a mesma lógica no PAC - Cidades Históricas (PAC-CH), lançado em 2009, mas não obteve sucesso, uma vez que limitou-se a obras de restauro de grandes monumentos e de requalificação de espaços públicos (ibidem). À guisa de panorama geral, “analisando-se as ações do Monumenta em todo o país, pode-se dizer que apenas em Salvador a habitação social tornou-se o elemento estruturador da reabilitação de um trecho do núcleo histórico” (Bonduki, op. cit., p.319). Dessa forma, após uma breve contextualização sobre as apropriações do Centro Histórico de Salvador, que se segue abaixo, será analisado o caso pioneiro da sétima etapa do PRCHS.
5 Apesar de na década de 90 intensificar-se a visão do patrimônio e da atividade cultural como estratégia de intervenções no âmbito do chamado planejamento urbano estratégico de caráter empresarial, já a partir da década de 60, tem-se a atuação das novas diretrizes da Unesco, nos ditames do que corresponde a bem cultural, a partir de uma lógica de cultura mercadológica, enquanto fonte de lucro. Especificamente no Brasil, a Unesco conjuntamente ao Programa de Cidades Históricas (PCH), na década de 70, atribuíram ao turismo cultural a agenda de promotor da preservação e do desenvolvimento das “cidades-patrimônio” (Sant’Anna, 2017b, p.143). 6 Criado em 1973, implementou uma primeira política integrada de preservação do patrimônio urbano no país, sendo um agente modernizador e transformador, cujo um dos principais resultados foi induzir a criação de organismos estaduais de preservação (Sant’Anna, 2017b, p.142).
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Imagem 1 Simone, única mulher entre os artesãos que vivem nos casarões construídos nos arcos de sustentação na ladeira da Montanha. “Herdeiros de ofícios tradicionais de matriz africana”, alguns deles ali estão instalados há gerações (Rocha e Castro, 2019). O projeto de transformação urbana “4º Eixo do Programa Salvador 360º”, que abarca a área, em conjunto com as redes de hotéis de luxo no entorno geram pressão de saída desses moradores. Foto: Matheus Tanajura (reprodução de Rocha e Castro, 2019).
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03 - O CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR: DA ELITE COLONIAL AOS CORTIÇOS E PROJETOS DE TRANSFORMAÇÃO URBANA Durante o século XVIII, a área central de Salvador, eixo conformado a partir do Pelourinho, fora ocupada por senhores de escravos e pela alta administração colonial, em seus casarões (Bonduki, op. cit., p.328). Até o final da década de 1950, o Centro Histórico de Salvador correspondia a “uma das principais áreas da população abastada, sede exclusiva das atividades de controle econômico e administrativo e lócus das atividades de comércio e serviços, inclusive dos voltados para a população de renda alta” (Brandão, 1995, apud. Bonduki, op. cit., p.327). Contudo, a partir das novas tecnologias de transporte, século XIX, e da nova etapa econômica associada à exploração de petróleo e à indústria petroquímica, século XX, teve-se a criação de novos polos de negócios e bairros de elite em áreas mais distantes, que foi acompanhada pela transferência das sedes dos órgãos públicos e da dinâmica imobiliária para a área em expansão urbana. Em síntese, “simbiose entre o setor público e o privado foi visível” (ibidem) neste processo de formação de novas centralidades, o qual estava intrinsecamente ligado às novas formas de mobilidade:
“a Bahia, seus portos e, consequentemente o centro urbano de Salvador passam por novas in-
tervenções, com destaque para mobilidade e transporte, como as vias férreas. Tal impacto acaba gerando uma amplitude urbana e a migração das classes mais abastadas para novos bairros construídos (Graça, Vitória, Barra) (SANTOS, 2008: 43-44). (...) Em 1871, a Companhia Trilhos Centrais liga o “Centro Antigo” aos bairros da Vitória, Graça, Barra, Federação, com planos de expansão até o Rio Vermelho, reflexo, segundo Sampaio, do “evidente” dinamismo urbano fruto da própria emergência capitalista do período (SAMPAIO, 1999: 68). Ainda conforme este autor a expansão em direção ao sul (Campo Grande e Vitoria) significará a “materialização de segregação social dos brancos” e, como parte do mesmo processo, nos bairros ao norte as massas mais pobres vão permanecendo ou adensando o centro tradicional (ibidem)” (Bittencourt, 2011, p.37 - grifos meus).
É importante pontuar que essa mobilidade das classes abastadas no final do século XIX levou ao adensamento do centro pelas classes populares, que ali supriam sua necessidade de moradia (Bittencourt, op. cit., p.37). Observou-se, assim, uma dinâmica de subdivisão dos sobrados a partir de estratos sociais e econômicos:
“inicialmente, [os proprietários] alugaram seus sobrados por andares: os pavimentos inferiores a
preço menor, para os pobres, e os mais elevados, mais caros, para os mais abastados. O subsolo – uma parte que muitos casarões costumavam ter, aproveitando o desnível do solo, característico da área central da cidade, composta por muitas colinas, algumas bastante íngremes – ficava para os mais pobres, dentre os pobres: os libertos e escravos de ganho (que trabalhavam fora da casa dos donos e lhes pagavam uma quantia fixa diária). Assim, o subsolo dos casarões foi a primeira modalidade de moradia da população pobre do centro de Salvador (embora, fora da cidade, espalhavam-se outros tipos, como os casebres e os quilombos)” (Uriarte, 2019, p.385).
Já no início do século XX, as subdivisões expandiram-se para além dos pa-
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vimentos, envolvendo a divisão de seus interiores. Neste período, seus moradores já não eram mais escravos de ganho ou libertos, dada a abolição de 1888, correspondiam a ”operários, carregadores, vendedores ambulantes de comida, pequenos comerciantes, alfaiates, cabeleireiros, sapateiros, quase todos negros e alguns árabes e turcos (Bacelar, 1975)” (ibidem, p.358). Os casarões subdivididos internamente ínfima vezes e marcados pelo alto nível de insalubridade, densidade e pobreza eram conhecidos em Salvador como cortiços, contudo, em outros territórios, receberam o nome de casa de cômodos, estalagens e zungus, este último voltado especificamente para a moradia de negros (Ibidem, p.385-386). Ainda no século XX, a expansão e densidade dos cortiços era tão expressiva em Salvador que, segundo Uriarte, conformou-se uma especialização de zonas de cortiço:
“em meados do século XX, eram muitos os cortiços no CHS que, devido à expansão comercial que
expulsava moradores de prédios até então de uso residencial, foram se adensando cada vez mais. Assim, embora a população residente no centro diminuísse de 7,9% em 1940 para 4,8% em 1950 (Santos, 1959, p.131), os que ficavam passavam a morar em um número menor de ruas que se especializaram como zonas de cortiços” (ibidem, p.386-387).
Nessa narrativa, a área central de Salvador, assim como o movimento histórico vivenciado em múltiplas localidades no país e no globo afora (Bonduki, 2010; Santa’Anna, 2017b), encerrava e ainda encerra em seu patrimônio uma arena de disputa e descaso por seu bem material e imaterial, que sintetizam na escala do habitar as demandas pelo direito à moradia e à memória das classes populares. O descaso dos proprietários e do Estado, agentes que supostamente deveriam salvaguardar e fiscalizar o patrimônio, é evidente ao longo dos anos em números: em 1969, treze edifícios encontravam-se totalmente arruinados na região do Maciel; em 1978, totalizavam-se 41 e, em 1988, 51 prédios (Uriarte, 2019, p.387). Em média, as unidades do cortiço (“quartos”) possuíam 4m2, em que sobrados de até dois quartos eram multiplicados para vinte e quatro unidades (ibidem, p.388). Mesmo com tamanha precariedade, os valores cobrados para os aluguéis eram expressivamente altos. Segundo Uriarte (ibidem), essa dinâmica se dá em conjunto pela demanda de moradia popular no centro, bem como pela exclusão que esses corpos vivenciam a serem relegados em áreas específicas da cidade, com destaque, por exemplo, para as travestis da área (Cardoso, 1991, p.67; Kulick, 2008; apud Uriarte, op. cit., p.388). Em linhas gerais, ao longo do século XX, a população dos cortiços não variou significativamente em níveis sociais e de acesso às suas demandas básicas: Jorge Amado escreveu, na década de 20, tratar-se de “operários, soldados, árabes de fala arrevesada, mascates, ladrões, prostitutas, costureiras, carregadores” (ibidem). Mil-
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ton Santos, já na década de 50, indicou “pequenos empregados ou pessoas sem uma ocupação permanente ou bem definida. Seu local de trabalho era, de preferência, no centro da cidade (Santos, 1959, p. 167)” (ibidem). Neste cenário, as mulheres voltavam-se majoritamente para os meretrícios, casas de prostituição que a sua época eram reconhecidas legalmente. Segundo Uriarte, em 1967, as prostitutas do Pelourinho correspondiam a 42,0% das moradoras da área (ibidem). Enfim, na década de 80, observou-se a permanência do perfil de seus moradores relatados acima: a maioria dos moradores eram vendedores, domésticos e prostitutas, em que 50% deles não alcançava dois salários mínimos de renda (Simões; Moura, 1986, apud Uriarte, op. cit., 388). Tendo em vista o adensamento popular do centro e a subdivisão maciça dos casarões, dando origem aos cortiços, bem como as características embrionárias dessas habitações, como ausência de recuos no terreno, com paredes laterais coladas, compondo agrupamentos de edificações geminadas somadas às condições insalubres dos cortiços, como ausência de ventilação, insolação e metragem adequada, o início do século XX foi marcado pelo paradigma da cidade moderna, que em Salvador traduziu-se em três condições básicas: de higiene, fluidez viária e estética da beleza (Bittencourt, op. cit., p.39). A década de 50 é marcada pela visão de que à área central é possível conferir a vocação relacionada ao seu valor patrimonial, enquanto um vetor de fomento para a indústria do turismo. Desse modo, parte do centro antigo de Salvador é tombado, em 1959, enquanto conjunto urbano pelo Iphan, e declarado Patrimônio da Humanidade, em 1985, pela Unesco, seguindo a lógica mundial de “transformação de centros históricos” (Bittencourt, op. cit., p.42; Bonduki, op. cit., p.326). Tecia-se, portanto, uma tentativa de redefinir o dinamismo do centro antigo, até então marcado por traços populares de apropriação (Bittencourt, op. cit., p.42) cujo rebatimento se deu na abordagem dos planos e das próximas intervenções urbanas sobre este território. Desse modo, nos anos de 1960 e 1990, houve diversos projetos de reabilitação de caráter pontual que buscavam criar um polo de turismo para “os de fora” e um polo de lazer para as classes abastadas de “dentro”, inseridos no discurso de reverter o processo de deterioração física da área (Bonduki, op. cit., p.311). Dado o tombamento pelo Iphan e o reconhecimento pela Unesco, desde os anos 19607 o Pelourinho é alvo de intervenções públicas que levaram mais de vinte projetos em diversas instâncias político-administrativas (Fernandes e Gomes, 1995 e 1996, apud. Bonduki, op. cit., p. 326). Contudo, estudos apontam para a ineficácia de tais intervenções, pois, se7 A visita de Michel Parent em 1967, representante da Unesco, e suas recomendações levaram a formulação de uma política pública para o Centro Histórico de Salvador tendo como uma das consequências a criação do IPAC (Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural), no mesmo ano de 1967. O instituto lançara o primeiro projeto destinado à valorização dessa área por meio da vocação turística e de fomento ao setor terciário, o “Plano de Recuperação da Área do Pelourinho”, em 1969, (Bittencourt, 2011, p.46).
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gundo Bonduki, estruturaram-se de modo localizado e isolado, sem conseguir abarcar e reverter questões como a extrema pobreza da população e a marginalidade que dominavam (Bonduki, op. cit., p.311). Todavia, por outro lado, tais projetos, de certo modo, levaram ao fortalecimento do Pelourinho enquanto “uma espécie de território central numa rede de territórios negros nessa cidade tão negra que é Salvador” (Gomes e Fernandes, 1995, apud. Bonduki, op. cit., p.331). Nos anos 70 e 80, destacam-se inúmeros grupos culturais de traços afro, como Ylê-Ayê, Olodum, Araketu, Unegro e Muzenza, os quais instalaram-se na área do Pelourinho criando uma forte identidade cultural (ibidem). Ao reivindicarem seus valores e externalizarem suas denúncias, ao mesmo tempo, os grupos chamavam a atenção dos órgãos públicos e ganharam sensibilização internacional, o que serviu de atrativo para que turistas e outras classes, que não as populares, estivessem presentes no Centro Histórico, para conferirem os ensaios da banda, principalmente nas “terças da benção”8 (Bittencourt, op. cit., p.50).
“O Grupo Cultural Olodum, criado em 1979, foi um dos protagonistas deste ‘fazer ecoar na cidade’
e, posteriormente, no mundo, as mazelas vividas pelas classes populares no local e seus valores humanos a serem preservados. A atuação do Olodum marca a década de oitenta também como elemento de disputa pelo espaço” (Bittencourt, op. cit., p.50).
Em síntese, no século XX, o Centro Histórico de Salvador caracterizava-se por sua realidade social híbrida - presença dos casarões encortiçados, casas noturnas de alto luxo, igrejas, empresas e hotéis e rede de comércio. Durante a década de 80, tem-se a institucionalização do processo de transformação do Centro Histórico de Salvador, enquanto resultado dos paradigmas da Unesco supracitados, o que “acelerou a expulsão dos seus moradores da área e a redefinição da área em um parque turístico, provida de lojas, bares, hotéis e pousadas (...)” (Bittencourt, op. cit., p.44 e 49). Em 1989, anuncia-se a proposta de reforma e, em 1991, o Governo do Estado da Bahia , sob o mandato de Antônio Carlos Magalhães, elaborou e operacionou o chamado “Programa de Recuperação do Centro Histórico, o qual será abordado abaixo.
8 Às terças-feiras, no Centro Histórico, tem-se a celebração na Igreja Rosário dos Pretos, bem como os ensaios da banda Olodum, sendo dia de maior movimento de pessoas no local (Bittencourt, 2011, p.50).
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Imagens 2, 3, 4, 5, 6 e 7 Moradores, habitações, ruínas e escombros no bairro de Maciel, Salvador, possivelmente na década de 70. Fonte: Acervo do IPAC, Museu Tempostal (reprodução de Uriarte, 2019, p.386-687).
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04 - PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR A. PANORAMA GERAL Em linhas gerais, o Programa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador (PRCHS), concebido pelo IPAC (Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural) e realizado pela CONDER (Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia), buscou investir no turismo de um trecho da área central, visando ao desenvolvimento econômico, por meio da tendência mundial de adotar a cultura como diferencial capaz de agregar mais valor ao “produto Bahia”, elevando, assim, sua competitividade no contexto nacional e internacional. (Mourad, 2011, p.76). Além disso, buscava-se, supostamente, valorizar a identidade cultural e as tradições da Bahia, para além de estabelecer um forte eixo turístico de consumo, a fim de executar uma política de marketing e manutenção do grupo político-econômico ligado ao governador Antônio Carlos Magalhães, eleito em 1991, após anos no poder durante o período da ditadura militar (Mourad, op. cit, p.76; Sant’Anna, 2017a, p.90). A concepção do PRCHS em seu governo buscava justamente difundir as supostas “ideias de desenvolvimento, e eficiência administrativa” da gestão (Sant’Anna, 2017a, p.90). O programa estruturou-se em sete etapas, as quais Sant’Anna (2005, apud Mourad, 2011), a fim de uma melhor compreensão, agrupa em três grandes momentos, seguindo suas respectivas áreas de interesse e objetivos. Dessa forma, adotarei aqui tal agrupamento. PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR
PRIMEIRA ETAPA
LOGRADOUROS
SEGUNDA ETAPA
A - LARGO DO PELOURINHO B - TERREIRO DE JESUS C - PRAÇA DA SÉ D - PRAÇA MUNICIPAL E - RUA CHILE F - PRAÇA CASTRO ALVES G - RUA CHILE H - BAIXA DO SAPATEIRO
TERCEIRA ETAPA QUARTA ETAPA QUINTA ETAPA SEXTA ETAPA SÉTIMA ETAPA
PROJETO REMEMORAR PRINCIPAIS MONUMENTOS TOMBADOS LIMITE DA ÁREA TOMBADA
Imagem 8 Programa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador. Fonte e reprodução de Sant’Anna (2017a).
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ETAPAS DE EXECUÇÃO DO PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR
Etapas Primeira Imóveis em quatro quarteirões localizados na rua Gregório de Matos
Segunda Imóveis em dois quarteirões, situados entre as ruas do Carmo e do Passo. Terceira Imóveis distribuídos em três quarteirões na área do antigo Maciel e da Igreja São Miguel.
Atividades previstas
Situação
Substituição de função dos imóveis: de residencial para usos voltados ao turismo. Execução de três praças internas a quadras direcionadas para atividades culturais, além da construção de um estacionamento com 66 vagas.
Executada
Escola de Artes, Danças, albergues e pousadas, ateliê com moradia de artista, habitação.
Executada
Construção de um estacionamento com 500 vagas, antiguidades, boutiques, lojas, livrarias.
Executada
Joalherias de grifes, um estacionamento com capacidade para abrigar 450 automóveis.
Executada
Habitação, hotéis e pousadas.
Executada
Quarta Restauração de imóveis em oito quarteirões localizados na área do Terreiro de Jesus e Cruzeiro de São Francisco. Quinta Imóveis em dois quarteirões na área da Praça da Sé. Sexta Imóveis dispersos em diversos quarteirões. Rua do Passo, entre Santo Antônio-Carmo e Pelourinho, Dois de Julho, entre outros. Recuperação da fachada do Cinema Excelsior e reforma da Praça da Sé.
Sétima Para além dos imóveis, sete monumentos e um estacionamento circunscritos em 13 quarteirões.
Habitação, serviço e comércio. Foi construído o Quarteirão Cultural englobando: a Praça ACM – Artes, Cultura e Memória –, que articula os acessos ao Espaço do Autor Baiano, ao Cine XIV, ao Theatro XVIII, ao TemPostal e ao Centro de Referência Cultural da Bahia, o qual abriga o cinema 180°. Além disso, foi construída a Praça do Reggae.
Não concluída*
Prevê o uso misto: habitação, comércio e serviço. Em execução desde 2002.
Em execução
* Segundo Sant’Anna (2017a, p.270), o aditivo do lote 1 e do lote 2 da sexta etapa não haviam sido concluídos em 2002, desse modo o valor total dessa etapa não corresponde ao valor pago. PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR - OBRAS CONCLUÍDAS
Etapas
Nº de imóveis
Período
Fonte de recursos
Situação
Valor (R$)
1ª à 4ª etapa
356
1992-1995
Tesouro/BA
Executada
23.703.000,00
5ª etapa
63
1996
Tesouro/BA
Executada
10.767.356,00
6ªetapa - lote 1
30
1997
Tesouro/BA
Não concluída
13.397.591,50
6ªetapa - lote 2
52
1997
Tesouro/BA
Não concluída
78.953.427,13
Fontes: Sant’Anna (2017a) e Mourad (2011).
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Primeira momento: da 1ª à 4ª etapa (1992-1995) Nestas etapas, o projeto buscou efetivar a ideia de monofuncionalidade de um “shopping a céu aberto”, entre o Terreiro de Jesus e o Largo do Pelourinho, a fim de “redinamizar” o centro antigo, transformando o Pelourinho em um centro cultural e turístico, tendo o marketing como estratégia de implementação do projeto (Mourad, op. cit., p.79). Em síntese, “essas intervenções desconsideraram o significado original do patrimônio ambiental urbano, promovendo a banalização da cultura, mediante a construção de autênticos cenários/espetáculos” (ibidem). O governo tinha como pressuposto alterar o perfil sociocultural do centro antigo e para isso adotou uma postura que combinava consumo, lazer e cultura (Ibidem). Segundo Bonduki, o uso da cultura preta inserida nessa lógica comercial e turística, buscou criar um falso histórico, apagando os códigos deixados pelo tempo ao pintar com cores sintéticas as fachadas do casario colonial (Bonduki, op. cit., p.332). Ao se apropriar da cultura negra, concomitantemente, o projeto levou a expulsão da população local fomentadora desse saber, em um contexto que o Iphan se omitiu e a prefeitura se ausentou (ibidem, p.334). Em linhas gerais:
“essa incorporação da questão cultural negra no marketing da operação não significou, entre-
tanto, a permanência da população moradora local, tecido social que dava consistência e autenticidade ao Pelourinho, criando um território denso, embora marcado pela pobreza, marginalidade e deterioração física. A intervenção buscou mostrar a cultura negra e esconder a população que a cria (...)” (Bonduki, op. cit., p. 333).
De cunho higienista e excludente (ibidem, p.333), essas etapas abarcaram a reforma de fachadas, estruturas, telhados e instalações dos edifícios, bem como dos espaços internos, a fim de abrigar novos usos ocorrendo, até mesmo, a demolição de acréscimos nas construções, para criar pequenos espaços semi-públicos e áreas para eventos, descaracterizando, assim, a memória que se tinha da implantação colonial e das modificações atribuídas ao seus moradores (ibidem, p.333-335). Observa-se, desse modo, como a “forte restrição ao uso habitacional foi uma parte essencial da operação”, uma vez que, de todas as edificações interferidas, apenas 9% das unidades resultantes foram destinadas ao uso residencial, e as demais para a rede de comércio e consumo atrelados ao turismo e lazer, como joalherias, restaurantes, hotéis, dentre outros (Bonduki, op. cit., p.335 - grifos meus; Mourad, op. cit, p.100). É importante pontuar que as atividades implantadas foram subsidiadas pelo Estado, no sentido de aluguéis reduzidos e programação cultural gratuita, além do governo assumir para si toda a manutenção do exterior dos imóveis, bem como serviços de limpeza, dentre outros (Mourad, op. cit., p.79); Sant’Anna, 2017a, p.93). Essa
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atitude, deu-se associada à postura dos comerciantes que ali se instalaram mas não demonstravam interesse em participar de uma gestão compartilhada. Dessa forma,
“as pressões de correligionários políticos, a falta de critérios e a atitude paternalista do governo
estadual favoreceram o oportunismo dos que ali se instalaram, muitos dos quais sem a experiência e o nível de capacitação necessários para enfrentar as dificuldades e os ajustes de uma área em processo de renovação funcional (Fernandes, 1998)” (Sant’Anna, 2017a, p.93).
À guisa de saldos, o governo recuperou nessas etapas 365 imóveis e expulsou 1.977 famílias da área, sendo as duas primeiras etapas inauguradas em 1993, e as duas demais em 1994, todas no dia do aniversário da cidade, “culminando em uma grande festa, conferindo visibilidade e autopromoção do governo” (Mourad, op. cit., p.79). Além disso, o diagnóstico demonstrava-se claro: os comércios de alto luxo não conseguiam manter seu público, corroborado com o fluxo de turistas bem abaixo do esperado, levando ao fechamento das lojas (Sant’Anna, 2017a, p.94). Ao contrário do que se esperava, era a própria população da cidade que ali frequentava a fins de lazer e trabalho (ibidem). Nesse sentido, a relação de dependência dos empresários ali instalados em relação ao governo apenas crescera, os quais “passaram a defender uma gestão estatal do ‘empreendimento’ Pelourinho e a recusar qualquer tentativa de gestão compartilhada”, conforme já dito (ibidem, p.95). Segundo Mourad, para manter a frequência na área9, marcada pela monofuncionalidade da rede de comércio e consumo, entre os anos de 1994 e 2000, o governo estadual mobilizou onze milhões e seiscentos mil reais em programas culturais (Mourad, op. cit, p.79).
Segundo momento: da 5ª à 6ª etapa (1996-1999) Neste momento, o programa voltou-se para a realização de estudos e avaliações em busca de alternativas de gestão e de funcionamento, dado os saldos listados acima. Em linhas gerais, o ritmo da intervenção tornou-se mais lento, desenvolvendo-se nessa fase apenas a 5ª etapa, área da Praça da Sé, e parcialmente a 6ª etapa, correspondente ao chamado Quarteirão Cultural, na Rua Gregório de Mato (Sant’Anna, 2017a, p.95). Contou-se com recursos do Programa de Desenvolvimento do Turismo do Governo Federal (PRODETUR) bem como do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), o qual obrigou o governo estadual da Bahia a tecer estudos de viabilidade, impacto econômico e financeiro, além de projetos executivos (ibidem). Entretanto, não observou-se expressivas mudanças, tanto no nível da intervenção, quanto em nível de 9 Criado em 1994, o Programa Pelourinho Dia e Noite correspondeu justamente a uma tentativa de manter a frequência de turistas e novos consumidores ao longo de todo o ano por meio de eventos e shows (Mourad, 2011, p.79).
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gestão: assim como nas etapas anteriores, foram removidas de modo autoritário 174 famílias e observou-se novamente o esgotamento de um modelo monofuncional de consumo, que não consegue se manter sem aporte contínuo de recursos estaduais (Sant’Anna, 2017a, p.95; Mourad, op. cit., p.80). A mudança de paradigmas e de postura somente se observou em 1999-2000, com a implementação da sétima etapa do PRCHS.
Terceiro momento: 7ª etapa (2000-atualmente) As mudanças mais significativas foram introduzidas nesta etapa por meio da reutilização do uso misto e habitacional considerada como um dos elementos âncora do projeto, em detrimento do uso monofuncional que se observou nas etapas antecessoras (Mourad, op. cit., p.79). Além disso, ao mobilizar para além dos recursos estaduais, federais e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), por meio do Programa Monumenta, deixou de ser uma intervenção comandada exclusivamente pelo governo estadual (ibidem). Por se tratar do recorte e foco específico desta monografia, a análise aprofundada desta etapa se dá abaixo.
B. SÉTIMA ETAPA O desenvolvimento da sétima etapa, no bairro de São Dâmaso, é marcado por uma ampla disputa entre o Estado e os movimentos populares de moradia, no que tange a luta pelo fomento de habitação social voltada para a permanência dos moradores populares. Dessa forma, para melhor compreensão, divido a análise desta etapa em dois momentos, tendo como marco as ações judiciais enfrentadas pelos movimentos populares para garantir sua manutenção no território. A priori, será analisado o modelo inicial da sétima etapa, em que teve-se a movimentação do Estado em não garantir a permanência dos residentes tido como indesejáveis, adotando estrategicamente o programa habitacional para funcionários públicos do governo. Posteriormente, será abordada a faceta da sétima etapa que se conhece hoje, resultante da resposta dos movimentos populares mediante tal manobra.
Primeiro momento Conforme já dito acima, diferentemente de suas etapas antecessoras, a sétima etapa do PRCHS manteve a diversidade do uso do solo. Contudo, é necessário pontuar que a mudança de postura não se deu enquanto um questionamento crítico em relação ao que vinha sendo feito. Na realidade, decorreu do desinteresse da
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participação da iniciativa privada no compartilhamento da gestão e a fraca demanda para ocupação de novos estabelecimentos voltados para o consumo externo, leia-se turismo. Assim, teve-se a mudança de ênfase em relação às etapas anteriores para priorizar o uso residencial, contudo, sem prever a manutenção dos antigos moradores (Bonduki, op. cit., p.338). Essa guinada, inclusive, parte do fato de que, seguindo o diagnóstico realizado, 145 imóveis, tanto privados, como públicos e até mesmo monumentos, encontravam-se em estado de conservação regular ou péssimo, sendo evidenciado a necessidade de reparação (ibidem). Nessa narrativa, “o relatório é claro ao destacar que novas diretrizes deveriam orientar a intervenção, priorizando a habitação e prevendo usos não residenciais de modo complementar e compatível com a vocação da área (...)” (ibidem). Segundo Bonduki, o modelo inicial da sétima etapa previa um auxílio a realocação das famílias a serem removidas, bem como um projeto habitacional, cujo financiamento basearia-se no programa de Arrendamento Residencial (PAR), gerido pela Caixa Federal, dada a experiência que o programa Rememorar10 obtivera por meio deste. Contudo, para o autor, a solicitação de uma habitação por meio desse programa para os moradores locais era “impossível em razão de sua renda irregular e 10 Rememorar (1999) corresponde a um projeto piloto de reabilitação de edifícios no Centro Histórico de Salvador que implantou 42 unidades habitacionais na área (Bonduki, 2010, p.325).
BAIXA DO FORTE DE SANTO ANTÔNIO
LADEIRA DA ÁGUA BRANCA
Imagem 9 Poligonal do Centro Histórico de Salvador. Fonte e reprodução: Seminário Internacional de Reabilitação de Edifícios em Áreas Centrais, São Paulo, 20 a 22 de setembro de 2006.
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PILAR
OS SAPATEIROS
insuficiente” (Bonduki, op. cit., 340). Nesse sentido, a remoção dos moradores estava explícita, principalmente, pelo fato do poder estadual orientar a intervenção do Monumenta para que o PAR se destinasse aos funcionários públicos estaduais. Todavia, Bonduki revela que, em geral, o uso do PAR na intervenção de São Dâmaso não se efetivaria, uma vez que além de sua rigidez burocrática, seu formato não atende as especificidades de um centro histórico11. Em linhas gerais, observa-se a diferença de destinação de subsídios que, para as etapas antecessoras de caráter comercial e de consumo foram fartas, e que, ao restringir ao uso habitacional, reduziram-se (ibidem). Assim, para viabilizar o projeto, o governo estadual criou o Programa Habitacional para Funcionários do Estado (Prohabe), e se valeu de recursos do Fundo de Previdência do Estado, bem como de recursos do Monumenta. Além disso, buscou-se criar um Plano de Gestão Ambiental, a fim de controlar os impactos negativos sobre a ocupação da área, reconhecendo seus diversos agentes do campo turístico, cultural e local. Nota-se, portanto, que quem residia ou iria residir no centro o fez utilizando artifícios seletivos, como o PAR, ou pelo simples fato de ser um funcionário público.
Nessa narrativa, para aqueles que não tivessem condições de arcar com o
11 Entretanto, a reabilitação de edifícios nas áreas centrais para habitação, por meio do Rememorar, vingou pois, para além do financiamento do PAR, houve uma séria de recursos adicionais por meio da Lei de Incentivo à cultura vinculada à Caixa (Bonduki, 2010, p.340). SÉTIMA ETAPA DO PRCHS
SÃO BENTO
LIMITE DA ÁREA TOMBADA PELO IPHAN E UNESCO LIMITE DA ÁREA DO PROJETO
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pagamento do financiamento, ou não tinham a “sorte” de ser um funcionário público, a única alternativa dada era a remoção mediante o pagamento do “auxílio-moradia”, chamado pelos movimentos de moradia de “cheque-despejo”, que gravitavam entre 1,5 mil reais e 5 mil reais (Bonduki, op. cit., p.341). Foram cadastrados 1.670 núcleos familiares. Embora os estudos do projeto indicassem a desapropriação e indenização dos moradores populares da área como o último instrumento a ser utilizado, além do fato de que, em levantamento, 80% da população indicou interesse em comprar o imóvel mediante o financiamento acessível, 1674 famílias foram majoritariamente indenizadas ou realocadas para o subúrbio de Coutos, um bairro distante do Centro (Sant’Anna, 2017a, p.101). Grande parte dos moradores não resistiam a sair dos imóveis em decorrência da ausência de organização comunitária, do atrativo das indenizações face a extrema pobreza do grupo, e o fato de não lhes ter sido oferecida possibilidade de aquisição de moradia mediante um financiamento acessível (Uriarte, 2012, p.57). Contudo, houve um grande movimento de resistência por parte de alguns moradores, fortalecendo-se com a atuação da Associação dos Moradores e Amigos do Centro Histórico (Amach). É importante pontuar que este movimento de remoção insere-se em um cenário político diferente daquele vivenciado nas etapas anteriores, em nível estadual e federal. Em 2001, teve-se a criação do Estatuto da Cidade que, em conjunto com outros instrumentos jurídicos (emenda do artigo 6º da Constituição Federal e Medida Provisória 2.220) reconheceu o direito à moradia. A Associação teve, a partir de 2003, com a mudança do governo, um forte aliado para reverter esse processo. Em nível estadual, o governador Antônio Carlos Magalhães renunciou, em 2001, sob risco de cassação (Bonduki, op. cit., p.342). É neste cenário que o Ministério Público intervém, por meio de uma Ação Civil Pública (ACP), em conjunto com a atuação da Amach. Nessa narrativa o governo federal, por meio do Monumenta e do Ministérios das Cidades, “atuou de acordo com sua linha programática”, buscando uma solução que garantisse o direito dos moradores a permanecer na área (ibidem).
Segundo momento O pedido da Associação de Moradores e Amigos do Centro Histórico (Amach) pela intervenção do Ministério Público nas ações de violação do direito à moradia, promovidas pelo governo estadual, marca o segundo momento de desenvolvimento da sétima etapa do PRCHS. Por meio da ACP, o Ministério Público e o governo da Bahia assinaram, em 2005, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) “que previa a permanência das famílias moradoras cadastradas pela associação de moradores, num complexo arranjo de fontes de recursos de diversas origens, capaz de viabilizar um novo desenho social, institucional e financeiro para o projeto” (Bonduki, op. cit., p.343).
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Em linhas gerais, o TAC estabeleceu diretrizes básicas para a continuidade do projeto, como a permanência das 103 famílias cadastradas pela Amach, a obtenção de subsídio do Ministério das Cidades para as famílias, e a adequação das unidades. Além disso, o termo avança ao propor uma gestão e participação democrática, em que a comunidade deveria integrar a discussão para definir o programa da ação, seus equipamentos coletivos e reabilitação das unidades (Bonduki, op. cit., p.346). Além disso, o TAC determinou que cabia ao Governo Federal, para além do Monumenta, garantir o financiamento por meio do Programa de Subsídio Habitacional (PHS) do Ministério das Cidades ou por outro programa habitacional para suprir as demandas da população de baixa renda (ibidem) . Destaca-se ainda medidas como a contratação de parte da população para realização das obras, bem como da promoção de cursos de capacitação e atividades de geração de renda (Bonduki, op. cit., p.347). Por fim, além do projeto atender os moradores, em parte, atendeu a demanda dos funcionários públicos: 200 moradias seriam destinadas aos funcionários por meio do Prohabe (ibidem). Contudo, é importante pontuar que, para além da pressão dos movimentos de moradia, se a guinada de postura monofuncional do modelo inicial da sétima etapa não decorreu de uma reflexão crítica acerca dos saldos e diagnósticos que se observou nas etapas antecessoras, no modelo vigente, observa-se o mesmo cenário. A mudança pra o uso do solo misto com enfoque nas habitações decorreu em função das exigências que acompanham os financiamentos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), estes, no caso, vinculados ao Programa Monumenta (Sant’Anna, 2017a, p.99). Nesse sentido, a sétima etapa contava com os seguintes fundos: (i) Programa Monumenta, a fim de destinar recursos para a restauração dos telhados e fachadas de todos os imóveis da etapa em questão, “garantindo o respeito e a recomposição dos elementos construtivos a serem preservados” (Bonduki, op. cit., p.347); (ii) Governo Estadual, caberia o pagamento das desapropriações dos imóveis que fossem de proprietários privados; (iii) Ministério das Cidades, por meio do Programa de Habitação de Interesse Social (Phis), aportaria subsídio de 17,5 mil reais para cada família dos antigos moradores; (iv) Fundo de Previdência do Estado, financiaria habitações destinadas aos funcionários. Prevê-se que os recursos do Monumenta retornem, em condições especiais, para o Fundo Municipal de Preservação, FUNDOCENTRO12, a fim de que usos, como a manutenção futura dos edifícios, fossem possibilitados aos moradores. Além disso, os 12 Tal medida corresponde a um dos instrumentos obrigatórios a projetos que contam com subsídios do Monumenta (Sant’Anna, 2017a, p.100).
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recursos do Prohabe também retornariam a fim de preservar o Fundo de Previdência do Estado (ibidem). À guisa de saldo geral, no total, a sétima Etapa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador propõe-se a abarcar 76 edifícios, totalizando 338 unidades residenciais e 55 pontos comerciais (Bonduki, op. cit., p.348). Após as obras, as unidades habitacionais, de em média 37 m2, seriam apropriadas com uma prestação média de 154 reais (Sant’Anna, 2017a, p.100). Em linhas gerais, “a intervenção da 7ª etapa deveria, assim, romper com o esquema concentrado de propriedade existente na área recuperada do Pelourinho e com o regime de ocupação predominante via inquilinato” (ibidem). Os novos proprietários passariam a ser responsáveis não só pela administração dos imóveis, mas também por sua manutenção, conjuntamente com recursos do FUNDOCENTRO. Além disso, subsídios não eram mais diretos aos proprietários, como ocorreu nas outras etapas. Na realidade, ele se dava via empréstimo, o qual seria futuramente revertido ao FUNDOCENTRO, a fim de garantir a continuidade do próprio projeto. Todavia, apesar de avanços como os direitos alcançados pela permanência dos moradores, sintetizadas no esforço da Amach, a sétima etapa também é marcada pela permanência de práticas das etapas passadas. No que tange ao caráter prático da intervenção:
“o partido físico da intervenção também pouco diferiu do anterior, no sentido de que uma impor-
tante documentação urbanística, mais uma vez, seria perdida, com a eliminação indiscriminada de anexos (alguns dos quais constituíam ‘avenidas’ de casas cosntruídas para abrir os negros libertos depois da escravidão) e o rompimento de relações de parcelamento, entre cheios e vazios e de ocipação do conjunto. Consoante com a concepção fachadista de patrimônio, que caracterizou as intervenções no centro histórico, os interiores dos imóveis seriam barbaramente retalhados para dar lugar aos pequenos apartamentos que se encaixavam na montagem financeira, apesar dos subsídios públicos que foram mobilizados. Além disso, dificilmente uma família baiana de classe média baixa seria estável a ponto de se adaptar sem promover ampliações ou novas subdivisões, a um espaço habitacional tão exíguo. Assim, tudo indicava que as perdas para o patrimônio seriam grandes e não se limitariam ao que estava previsto nos projetos” (Sant’Anna, 2017a, p.101 - grifos meus).
Além disso, embora a ACP tenha obtido êxito, é preciso evidenciar que outro trâmite legal do processo, que ocorria paralelamente à ACP, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN), obteve uma resposta por parte da Procuradoria Geral da União, em que descaradamente associava a pobreza à ausência de cultura (Uriarte, 2012, p.60). A Procuradoria questionava se de fato havia um modo de viver, de habitar e de saber que constituía essa população popular e que merecia ser reconhecida e preservada (GEB/PGE, 2003, p.14. apud. Uriarte, op. cit., p.60). Nesse sentido, a seu ver, trata-se mais de “condições de pobreza” do que “uma cultura em verdade” (idem): “os moradores não se vestem de forma típica, de baianas ou pais-de-santo. Vestem-se com rou-
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pas que conseguem, a maior parte de andranjos. Tampouco criam dialeto, mas falam simplesmente errado, arremedo de uma língua que desconhecem (...). Existe tão somente um estilo de vida determinado pela pobreza, indigno de ser considerado como expressão da dignidade da pessoa humana (...) apenas denota pobreza e marginalidade (...). Não há, na hipótese, cultura popular a ser protegida” (GEB/PGE, op. cit., p.1617, apud. Uriarte, op. cit., p.61).
Observa-se, portanto, uma ambiguidade por parte da Promotoria ao afirmar que não há cultura a ser protegida, uma vez que, ao mesmo tempo em que se afirma isso, a administração pública apropria-se dela para criar um imaginário coletivo para atração de turistas nacionais e internacionais. Para isso, retoma-se códigos como o traje das baianas, o acarajé, a capoeira, o candomblé, dentre outros, mas ao mesmo tempo, anula-se os corpos majoritariamente pretos e pobres que os evocam, os vivenciam e os produzem (Uriarte, op. cit., p.61). Ou seja, vale-se de códigos culturais dotados de “retorno financeiro”, seguindo de certo modo os paradigmas da Unesco, enquanto, concomitantemente, expulsa-se os moradores, os agentes de tais códigos (ibidem). A partir do exposto, à guisa de análise sobre o processo como um todo, Sant’Anna indica que, num aspecto geral, as intervenções na área central de Salvador, provavelmente devido a suas funções eminentemente promocionais, assim como ao seu desvinculamento de questões sociais e urbanas, não se fundamentaram em planos urbanísticos ou projetos globais, tampouco conformaram dados sistematizados13 que permitissem monitorar seu impacto (Sant’Anna, 2017, p.111). Assim, a autora ilustra:
“mesmo no âmbito dos novos projetos habitacionais, em que pesem as pesquisas de demanda
realizadas, se trabalhou sem plano de conjunto e sem dados essenciais como, por exemplo, número de domicílios residenciais e comerciais vagos por setor. As informações, quando existiam, se encontravam dispersas e dificilmente mapeáveis” (ibidem, p.112).
Bonduki colabora ao debate lançando luz para o fato de que, para além do projeto em si das habitações, é imprescindível o grande esforço dos responsáveis pela intervenção para garantir a manutenção destes moradores no território, assim como das unidades, por meio de processos de qualificação profissional, a fim de permitir sua inserção tanto social, quanto no mercado dito formal, com seus respectivos benefícios, como maior estabilidade. Como não observou-se uma movimentação nesse sentido na sétima etapa do PRCHS, Bonduki indica que há riscos de ocorrer um processo rápido de deterioração dos imóveis, bem como de se reproduzir uma ocupação informal das moradias, com subdivisão dos compartimentos, adensamento populacional, sublocação ou cessão de espaços habitáveis, ou ainda de que as famílias de 13 Este ponto fora um grande desafio desta monografia, uma vez que, até mesmo entre bibliografias sólidas, boa parte dos dados levantados não eram correspondentes entre si.
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baixa renda repassem, informalmente, suas unidades (Bonduki, op. cit., p.361). Como potencial consequência da não manutenção da ambientalidade, bem como da não inserção social desses moradores, tem-se a eventual substituição da população original por uma de renda mais elevada, como observou-se na cidade baixa de Salvador, uma porção do centro histórico que tornou-se alvo do mercado imobiliário (ibidem, p.362). Um gatilho para isso é justamente a instalação de funcionários públicos estaduais, que possuem renda notadamente superior aos moradores locais (ibidem, p.362-363). A partir do panorama exposto, salvo os problemas e fragilidades que apresenta, certamente a sétima etapa do PRCHS possui dimensão e impacto social significativos, adquirindo “relevância extraordinária”: “com essa solução, viabilizou-se um pequeno projeto, mas que já constitui a maior intervenção de interesse social a ser realizada no país em edifícios de valor patrimonial” (Bonduki, op. cit., p.348).
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Imagens 10 e 11 Da esquerda para a direita: ruas São Francisco e Beco do Seminário, respectivamente. Fonte e reprodução: Bonduki (2010).
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Imagem 12 ZEIS e poligonal da sétima etapa do PRCHS. Fonte e reprodução: Sacramento (2018).
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Imagem 13 Uso do solo da poligonal da sétima etapa do PRCHS. Fonte e reprodução: Sacramento (2018).
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Imagem 14 Patrimônio tombado da poligonal da sétima etapa do PRCHS. Fonte e reprodução: Sacramento (2018).
ELABORADO POR: SACRAMENTO (2018)
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I - TIPOLOGIAS DE MORADIA Bonduki e Sant’Anna indicam a expressiva deficiência dos projetos, bem como a baixa qualidade das obras, dado o desafio de transformar casarões unifamiliares em blocos de habitação coletiva. Segundo o primeiro, “o governo do estado não teve o devido cuidado de buscar as equipes mais habilitadas para uma intervenção necessariamente experimental, contratando prestadores de serviço sem exigir especificidade nesse tipo de trabalho” (Bonduki, op. cit., p.349). Nessa narrativa, Sant’Anna revela que “(...) os interiores dos imóveis seriam barbaramente retalhados para dar lugar aos pequenos apartamentos que se encaixavam na montagem financeira (...)” (Sant’Anna, 2017a, p.101). Soma-se ainda a discussão sobre o programa projetual não levar em consideração uma dinâmica real de apropriação, seja na metragem e número de cômodos, seja nas respectivas necessidades sociais, como espaço para o trabalho. Nesse sentido, Bonduki revela o fato de boa parte dos projetos não preverem a possibilidade dos moradores exerceram alguma atividade remunerativa na própria edificação, o que “é resultado não apenas dos projetos, mas, sobretudo, de uma concepção equivocada de financiamento e subsídio, limitados ao habitacional stricto sensu” (Bonduki, op. cit., p.349).
Imagem 15 Casarão nº 18, Ladeira da Praça. Fonte e reprodução: Silva (2018).
EDIFÍCIOS COM TRÊS UNIDADES HABITACIONAIS RUA SÃO FRANCISCO, Nº 17 E 19
TÉRREO
PRIMEIRO PAVIMENTO LEGENDA 1 - SALA 2 - BANHEIRO 3 - COZINHA E ÁREA DE SERVIÇO 4- QUARTO
PAREDES EXISTENTES PAREDES CONSTRUÍDAS PAREDES DEMOLIDAS
EDIFÍCIOS COM COMÉRCIO E DUAS UNIDADES HABITACIONAIS RUA SÃO FRANCISCO, Nº 12 E 14 LEGENDA 1 - SALA 2 - BANHEIRO 3 - COZINHA E ÁREA DE SERVIÇO 4- QUARTO 5 - COMÉRCIO OU SERVIÇO 6 - LAVABO PAREDES EXISTENTES PAREDES CONSTRUÍDAS PAREDES DEMOLIDAS
TÉRREO Fonte e reproduções: Bonduki (2010). Fora de escala.
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Imagem 16 Edifício nº10, rua São Francisco. Fonte e reprodução: Bonduki (2010).
ELEVAÇÃO - RUA SÃO FRANCISCO
EDIFÍCIO COM DUAS UNIDADES HABITACIONAIS RUA SÃO FRANCISCO, Nº 10 LEGENDA 1 - SALA 2 - BANHEIRO 3 - COZINHA E ÁREA DE SERVIÇO 4- QUARTO PAREDES EXISTENTES PAREDES CONSTRUÍDAS PAREDES DEMOLIDAS Fonte e reproduções: Bonduki (2010). Fora de escala.
SUBSOLO
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ELEVAÇÃO - RUA 28 DE SETEMBRO (ANTIGA RUA DO TIJOLO)
ELEVAÇÃO EDIFÍCIO RUA 28 DE SETEMBRO (ANTIGA RUA DO TIJOLO), Nº 10
Fonte: reproduções de Bonduki (2010). Fora de escala.
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EDIFÍCIO COM COMÉRCIO NO TÉRREO E OITO UNIDADES HABITACIONAIS RUA 28 DE SETEMBRO (ANTIGA RUA DO TIJOLO), Nº 10
TÉRREO
PRIMEIRO PAVIMENTO
SEGUNDO PAVIMENTO
TERCEIRO PAVIMENTO LEGENDA 1 - RECEPÇÃO 2 - COMÉRCIO E SERVIÇOS 3 - SALA 4- QUARTO
5 - COZINHA E ÁREA DE SERVIÇO 6 - BANHEIRO 7 - ACESSO AO TELHADO 8 - DEPÓSITO
PAREDES EXISTENTES PAREDES CONSTRUÍDAS PAREDES DEMOLIDAS Fonte e reproduções: Bonduki (2010). Fora de escala.
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II - MOVIMENTOS POPULARES DE MORADIA E AUTOGESTÃO DE LIDERANÇA FEMININA: O CASO DA AMACH Dada a importância da Amach, dentre os diversos movimentos populares de moradia atuantes na área, busca-se aqui aprofundar sua atuação na articulação do movimento de moradia, à luz da forte presença e liderança feminina, força pujante da associação e dos próprios movimentos. É importante indicar que não se pretende estabelecer aqui um aprofundamento do debate sobre os movimentos feministas, de gênero, identitários e sua sobreposição com o debate racial, dado os limites desta monografia, mas sim evidenciar o destaque da atuação das mulheres que compõe majoritariamente os movimentos sociais do território, com destaque notadamente para a Amach. A Amach fora fundada em 2002, por um conjunto de moradoras negras afetadas pelo processo de expulsão dos moradores da área decorrente da sétima etapa do PRCHS. Conforme já debatido acima, em 2005, a Amach estabeleceu uma negociação com a CONDER que resultou no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). O Imagem 17 Jecilda Maria da Cruz Melo, líder comunitária e presidenta da Amach. Fonte e reprodução: Filho (2013).
documento estabeleceu as responsabilidades do governo em atender às necessidades dos moradores ligadas às condições dignas de habitar. Nesse sentido, atualmente, busca efetivar as responsabilidades do governo sobre seus compromissos com a população, lutando contra o descumprimento do TAC, representando 108 famílias que vivem na área (Melo, 2020, p.161). Segundo Bittencourt (2011), a presença majoritária de mulheres não é uma particularidade deste caso, uma vez que diversos estudos indicam como “as mulheres estão em maior número quando se trata de lutas populares por direitos básicos, principalmente no meio urbano: educação, moradia, saúde, saneamento, segurança, geração de emprego e renda, etc (Costa, 1998; Touraine, 2007; CEAS, 2008; Gohn, 2010)” (Bittencourt, op. cit., p.100). Segundo a CONDER no “Diagnóstico socioeconômico e ambiental”, no contexto da sétima etapa do PRCHS, predominavam as mulheres como chefes de família, com 57,3%, destacando-se as faixas etárias de 41 a 60 anos, com 39% (CONDER, 2005, p. 17, apud Bittencourt, op. cit., p.101). A partir dos dados levantados pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) da região metropolitana de Salvador (apud Bittencourt, op. cit., p.101), que cruza dados referente ao trabalho doméstico com variáveis de raça e gênero, 93% dos trabalhos domésticos são realizados por mulheres, sendo neles a presença majoritária (94,8%) de negras e negros no setor, em que 69,1% não possuem carteira assinada e 28,3% moram no domicílio em que trabalham. Comparativamente, enquanto uma babá branca possui rendimento mensal médio de 185 reais, uma babá negra recebe em média R$98,00 (ibidem).
“É esta mulher, com este perfil de maior vulnerabilidade expresso nos números e estatísticas
que compõe a maioria das pessoas representativas na busca pela participação no projeto da 7ª Etapa. São vendedoras ambulantes, cozinheiras, biscateiras, trabalhadoras autônomas, comerciantes, pedintes, desempregadas, mulheres em situação de prostituição, mulheres envolvidas com atividades ilícitas, donas de casa, costureiras, artesãs, mães de santo, que estiveram e continuam em parte presentes em busca do diálogo e requerendo um lugar de participação no projeto da 7ª Etapa. São mulheres com baixo grau de escolaridade em sua quase totalidade desempregadas, mas que cuidam da casa, do bairro, da associação de moradores” (Bittencourt, op. cit., p.101-102).
Nesse sentido, o desafio estava não só em criar as condições para a participação ou conquista de direitos de moradia, mas também de conciliá-lo com as camadas de desigualdade de gênero que se sobrepõem às desigualdades raciais e econômicas. Uriarte lança luz ao debate ao afirmar que
“as ocupações que conseguiram [em Salvador] construir um habitar com dignidade têm em co-
mum a enorme importância das mulheres. (...) Foram elas as que planejaram as ocupações e as que sele-
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cionam seus futuros moradores com o critério de gênero, preferindo as unidades familiares chefiadas por mulheres, amigas ou parentes” (Uriarte, 2019, p.394-395).
Desse modo, Bittencourt reflete que à Amach, Associação dos Moradores e Amigos do Centro Histórico, de modo condizente à sua realidade de conformação, poderia chamar-se Associação das Moradoras e Amigas do Centro Histórico, tamanha a predominância e importantância das mulheres (Bittencourt, op. cit., p.102). Imagens 18 e 19 De cima para baixo: associação Amach, localizada no Pelourinho e encontro com estudantes no escritório da associação. Fonte e reprodução: Melo (2020)
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05 - CONSIDERAÇÕES FINAIS Segundo Bonduki, um dos problemas notáveis referente a promoção de habitação social em áreas centrais decorre de seu alto custo de implantação, uma vez que, a exemplo “um apartamento nessa intervenção [sétima etapa do PRCHS], sem incluir o valor da desapropriação do imóvel, deve custar no mínimo 50% a mais do que uma unidade de habitação social em um empreendimento convencional” (Bonduki, op. cit., p.348). Contudo, conforme já evidenciado por Kohara et al., a longo prazo, o investimento em habitações sociais em áreas centrais é mais positiva, devido ao baixo custo de vida para o morador, no que tange acesso a uma vasta rede de transporte público, expressiva empregabilidade (seja na formalidade ou informalidade), dentres outros fatores, o que acaba sendo vantajoso também para o Estado, pois não precisa investir em serviços e infraestruturas já existentes e subutilizados nestas regiões (op. cit., p.15). Todavia, não basta apenas promover a habitação stricto sensu, é preciso um grande esforço nos projetos para garantir a manutenção destes moradores no território, assim como da integridade física da habitação, por meio de processos como a qualificação profissional, a fim de permitir sua inserção tanto social, quanto no mercado dito formal, com seus respectivos benefícios. Desse modo, programas de habitação de interesse social em áreas centrais são uma importante agenda que podem e devem interseccionar questões sociais e patrimoniais. As sete etapas do Programa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador evidenciam isso: não é efetivo estabelecer uma série de benefícios para a monofuncionalidade de um centro de consumo e lazer ligado ao mercado segmentado do turismo. É preciso garantir a manutenção da diversidade do uso do solo e de seus moradores, majoritariamente populares, os agentes dos códigos que constituem diversos saberes da cultura local; os agentes que os evocam, os vivenciam e os produzem. As intervenções urbanas na década de 90, a partir da lógica do planejamento urbano estratégico de caráter empresarial, buscavam, por meio do patrimônio enquanto cultura mercadológica/fonte de lucro, transformar a dinâmica econômica e social das áreas centrais, atraindo classes mais abastadas, sem garantir ou preocupar-se com a manutenção de seus moradores populares. Dado o fracasso destes projetos de transformação urbana, houve o fortalecimento dos movimentos sociais de luta por moradia que reivindicam seu direito à centralidade, bem como o desenvolvimento de programas habitacionais de cunho social. Todavia, segundo Sant’Anna, essas iniciativas “(...) esbarraram na fragilidade e na inadequação da política e dos instrumentos de financiamento habitacional no Brasil e em entraves diversos de natureza urbana, fundiária, tecnológica e política, o que prejudicou o seu desenvolvimento e resultados, a despeito de focalizarem demandas reais” (2017a, p.150).
Nessa narrativa, a experiência de Salvador, por meio da sétima etapa do PR-
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CHS, destaca-se, uma vez que “malgrado os problemas que apresenta, (...) ela tem dimensão e impacto social significativos” enquanto “apenas em Salvador a habitação social tornou-se o elemento estruturador da reabilitação de um trecho do núcleo histórico, resultado que foi consequência de um forte processo de disputa entre os diferentes atores locais” (Bonduki, op. cit., , p. 348 e 319). A manutenção de uma parcela da população popular no bairro de São Dâmaso junto às unidades habitacionais deu-se justamente pela luta dos movimentos organizados de moradia, tendo a Amach como protagonista, que compartilhava o partido de que, enquanto “o patrimônio, para todos são só os imóveis, para nós são os imóveis e principalmente os moradores. (...) Através da Amach, pessoas começaram a saber que direitos elas tinham, como movimento social de luta de querer o melhor para a comunidade” (Melo, op. cit., p.162 - grifos meus). Observa-se, portanto, como os processos de intervenção urbana, habitação social e fragilidades que recaem sobre os movimentos populares destas áreas interseccionam-se no campo patrimonial, dotado de disputas. Os agentes envolvidos nesta vasta trama utilizam-se do patrimônio, à sua maneira, para defender seus interesses. A experiência de Salvador, a partir do PRCHS, salvo algumas fragilidades, é um caso emblemático ao, a um primeiro momento, investir em intervenções voltadas para o lazer e o consumo atrelados ao turismo para classes média e alta, e, a um segundo momento, buscar a reabilitação e sustentabilidade dos núcleos a partir da manutenção dos segmentos sociais e seus respectivos usos tradicionais, por meio da articulação com políticas públicas, com as camadas de patrimônio e com os movimentos populares de moradia e permanência.
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06 - BIBLIOGRAFIA BITTENCOURT, José Maurício Carneiro Daltro. A participação popular nos projetos públicos de intervenção urbana: o caso da 7ª etapa de Revitalização do Centro Histórico de Salvador. Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais, Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Salvador, 2011. BONDUKI, Nabil. Intervenções urbanas na recuperação de centros históricos. Brasília, DF: Iphan - Programa Monumenta, 2010. DA CRUZ MELO, Jecilda Maria. Associação de Moradores e Amigos do Centro Histórico (AMACH) in WALKER, Julian; CARVALHO, Marcos Bau; DIACONESCU, Ilinca (Ed.). Urban Claims and the Right to the City: Grassroots Perspectives from Salvador da Bahia and London. UCxL Press, 2020. FILHO, João Correia. O avesso do Pelô. Por trás das paredes dos casarões do Centro Histórico de Salvador, patrimônio do mundo, milhares de pessoas travam uma luta diária contra o preconceito, por moradia e um pouco de humanidade. Revista do Brasil. Edição 26, 2013. Disponível em: <https://www.redebrasilatual.com. br/revistas/2013/04/o-avesso-do-pelo/>. KOHARA, Luiz; UEMURA, Margareth Matiko; FERRO, Maria Carolina T. Moradia é central: lutas, desafios e estratégias. 2012. MOURAD, Laila Nazem. O processo de gentrificação do centro antigo de Salvador 2000 a 2010. 2011. Dissertação de Doutorado em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Salvador, 2011. ROCHA, Vitor; CASTRO, Zezão. Em risco no pelourinho. Adeus, artesãos. Olá hotéis de luxo: o plano gourmet do prefeito de Salvador para o centro histórico. The Intercept Brasil, 2019. Disponível em: <https://theintercept.com/2019/04/21/salvador-centro-historico-pelourinho/>. SACRAMENTO, Nayara Suíla Santiago. Habitação para o Centro Histórico de Salvador (CHS), vivo e plural: uma proposta para a ZEIS da 7ª etapa/CHS. Assistência Técnica para Habitação e Direito à Cidade – Residência AU+E. 2018. Disponível em: <http://www.residencia-aue.ufba.br/pt-br/nayara-suila-santiago-sacrament>. SANT’ANNA, Marcia. A cidade-atração: a norma de preservação de áreas centrais no Brasil dos anos 1990. SciELO-EDUFBA, 2017a. SANT’ANNA, Marcia. A cidade-patrimônio no Brasil: lições do passado e desafios contemporâneos. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, v. 35, 2017b. SANT’ANNA, Marcia; NASCIMENTO, Flávia Brito do; SANTORO, Paula Freire. FAU ENCONTROS - Planos e projetos para o Centro Histórico de Salvador. 30 de setembro de 2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=g94xRApz7-c>. SCIFONI, Simone. Cultura e problemática urbana. Crise urbana. São Paulo: Contexto, p. 129-142, 2015; SILVA, Ana Luíza Teixeira. Habitação para o Centro Histórico de Salvador (CHS), vivo e plural: o Casarão n° 18 na Ladeira da Praça. Assistência Técnica para Habitação e Direito à Cidade – Residência AU+E. 2018. Disponível em: <http://www.residencia-aue.ufba.br/pt-br/ana-luiza-teixeira-silva>. URIARTE, Urpi Montoya. Pobreza e cultura. A luta dos pobres para permanecer morando no Centro Histórico de Salvador. Cadernos PPG-AU, Número especial sobre Patrimônio, Salvador: Programa de Pós-Graduação em Arquitetura da UFBA, 2012. URIARTE, Urpi Montoya. HABITAR CASARÕES OCUPADOS NO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR, BAHIA, BRASIL: velhos cortiços e novas experiências e direitos. Caderno CRH, v. 32, n. 86, p. 383-398, 2019.
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07 - ICONOGRAFIA Capa: Foto de Matheus Tanajura. Reprodução de Rocha e Castro (2019). Disponível em: <https://theintercept.com/2019/04/21/salvador-centro-historico-pelourinho/>. Contracapa: Imagem de satélite - Google Earth. Abertura do item 2: Foto de Matheus Tanajura. Reprodução de Rocha e Castro (2019). Disponível em: <https://theintercept.com/2019/04/21/salvador-centro-historico-pelourinho/>. Imagem 1: Foto de Matheus Tanajura. Reprodução de Rocha e Castro (2019). Disponível em: <https://theintercept.com/2019/04/21/salvador-centro-historico-pelourinho/>. Abertura do item 3: Foto de Matheus Tanajura. Reprodução de Rocha e Castro (2019). Disponível em: <https://theintercept.com/2019/04/21/salvador-centro-historico-pelourinho/>. Imagens 2, 3, 4, 5, 6 e 7: Acervo do IPAC, Museu Tempostal. Reprodução de Uriarte (2019). Abertura do item 4: Imagem de Satélite - Google Earth. Imagem 8: Reprodução de Sant’Anna (2017a). Imagem 9: Reprodução de “Seminário Internacional de Reabilitação de Edifícios em Áreas Centrais”, São Paulo, 20 a 22 de setembro de 2006. Imagens 10 e 11: Reprodução de Bonduki (2010). Imagens 12, 13 e 14: Reprodução de Sacramento (2018) Imagem 15 - abertura do subitem I: Produção e reprodução de Silva (2018) Imagem 16: Reprodução de Bonduki (2010). Plantas e elevações: Reprodução de Bonduki (2010). Imagem 17 - abertura do subitem II: Foto de João Correia Filho. Reprodução de Filho (2013). Disponível em: <https://www.redebrasilatual.com.br/revistas/2013/04/o-avesso-do-pelo/>. Imagens 18 e 19: Reprodução de Melo (2020). Capa: Reprodução de Wikimedia Commons. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Vista_a%C3%A9rea_do_Forte_de_S%C3%A3o_Marcelo.jpg>.
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