A biotecnologia aplicada na cana-de-açúcar - OpAA17

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Opiniões jul-set 08

Marcadores Moleculares

Walter Maccheroni

Gerente de Biotecnologia da CanaVialis

Walter Maccheroni

Desenvolvimento de uma nova planta, a cana-fibra, com biotecnologia de ponta O etanol tornou-se a bola da vez no mercado mundial de energias renováveis e evidenciou a cultura da cana-de-açúcar como a melhor opção para este fim. Entretanto, para se atingir as metas mundiais de redução de 50% das emissões de gases do efeito estufa até 2050, tendo como uma das estratégias principais a substituição dos combustíveis fósseis pelo bioetanol, serão necessárias não só tecnologias inovadoras, como a hidrólise enzimática, para converter biomassa em etanol, mas também de matériaprima adequada e suficiente. Para isso, o melhoramento genético e as novas ferramentas de biotecnologia que o acompanham serão fundamentais para criar, em tempo hábil, um portfólio de variedades de cana, com alta produção de biomassa e que sejam ricas em fibra, o que denominamos aqui de cana-fibra, e que se adaptem aos mais diversos ambientes de produção no Brasil e no mundo. As variedades atuais de cana-deaçúcar são resultado de mais de um século de melhoramento genético. Desde o início, os programas ao redor do mundo visaram ao aumento do ATR - Açúcar Total Recuperável, e, para isso, cruzaram uma cana doce (Saccharum officinarum) com uma cana rústica (Saccharum spontaneum) e obtiveram uma cultura híbrida muito produtiva e com alto teor de sacarose. Estima-se que, nos últimos 30 anos, a produtividade agrícola da cana-de-açúcar cresceu, em média, 2% ao ano, sendo que metade deste ganho deve-se, exclusivamente, ao melhoramento genético, e a outra metade, à evolução do manejo da cultura. Entretanto, todo o centenário melhoramento genético foi direcionado para criar variedades ricas em sacarose e que mantivessem a fibra em um nível mínimo necessário no processo. Na nova perspectiva de cana-fibra, a composição seria justamente o inverso, ou seja, a prioridade seria o máximo de fibra. Para criar esta nova linha de variedades, orientadas à produção de fibra, a CanaVialis está voltando no tempo e iniciando um programa audacioso, que dará aproveitamento a plantas de outras espécies e gêneros, que se especializaram em produzir fibra e não sacarose. Assim, a empresa vem

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importando milhares de espécies selvagens de plantas ricas em fibra e que não foram utilizadas no melhoramento convencional da cana-de-açúcar, como é o caso de representantes do gênero Erianthus, Miscanthus, dentre outros, além de novas formas de S. spontaneum. Quanto mais amplo o número e tipos de espécies disponíveis, o que denominamos de banco de germoplasma, maiores serão as chances de sucesso do melhoramento da cana-fibra. Outro ponto crítico, que determinará o sucesso do melhoramento da cana-fibra, é a redução do tempo de desenvolvimento destas novas variedades. Um ciclo de melhoramento, que envolve o cruzamento entre duas canas e a seleção das melhores filhas, leva, em média, de 12 a 15 anos. Para se criar variedades com um perfil tão distinto das atuais, serão necessários vários ciclos de recorrência, o que demandará tempo. Para a redução deste tempo de desenvolvimento, a CanaVialis vem adaptando para a cana uma tecnologia de ponta, denominada marcadores moleculares, que tem tido grande sucesso na medicina humana e no melhoramento genético de plantas, como milho e soja. Marcadores moleculares são diferenças que existem entre os genomas dos organismos vivos e que podem sinalizar características específicas de um determinado indivíduo, como a maior propensão ao câncer em humanos ou resistência a estresses em plantas. Uma vez descobertos, estes marcadores são utilizados por médicos e melhoristas de plantas para a detecção antecipada dessas características. No melhoramento de plantas, estes marcadores podem predizer se uma planta terá, por exemplo, alto teor de fibras, sem a necessidade de ensaios de campo longos e custosos. Resultados iniciais desta tecnologia em milho e soja mostram ganhos dobrados de produtividade, que vêm garantindo a liderança de mercado, para certas multinacionais produtoras de sementes. Já em humanos, as perspectivas são revolucionárias, não apenas na detecção e prevenção, mas principalmente na definição do modo de se tratar certas doenças, como a AIDS e o câncer.

O processo de utilização de marcadores moleculares no melhoramento genético começa com a sua descoberta. Para isso, a forma mais adequada é o seqüenciamento dos genomas das plantas envolvidas nos cruzamentos. As seqüências de DNA produzidas são então analisadas por softwares de bioinformática, que identificam as diferenças existentes entre os genomas. Apenas por curiosidade, o Brasil, nos últimos 10 anos, tornouse um dos líderes mundiais desta tecnologia, tendo analisado, dentre outros, os genomas da cana-de-açúcar, do eucalipto e do café. As diferenças ou marcadores são então correlacionados com as características agronômicas importantes de cada planta, como, por exemplo, alto teor de fibra e resistência a doenças. Uma vez que estas correlações estejam estabelecidas, estes marcadores podem ser utilizados, na forma de um teste bioquímico, feito em laboratório, para identificar no banco de germoplasma plantas com características que se complementam (melhoramento assistido por marcadores), por exemplo, uma planta com alto teor de fibra e outra resistente a doenças. Estas plantas são então cruzadas e os marcadores são novamente utilizados para identificar, entre as filhas, aquelas que possuem a combinação ideal de características (seleção assistida por marcadores). Esta tecnologia permitirá reduzir drasticamente os custos e o tempo dedicado ao melhoramento genético da cana-de-açúcar de uma maneira geral, garantindo ganhos ainda maiores de sacarose e elevando as probabilidades de sucesso de se obter um portfólio de variedades de cana-fibra, adaptadas aos mais diversos ambientes de produção.


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