Limites da Correria - Mainline

Page 8

Prefácio à tradução Inglesa

Este relatório de pesquisa nasce em meio a um tempo em que as práticas de Redução de Danos e toda a ciência nacional têm sido contestadas pelo Poder Executivo da República Federativa do Brasil, quinto maior país do mundo, considerando seu território, e a sexta maior população mundial. Os tempos obscuros de anti-intelectualismo e o ataque contra a ciência em sua essência como perspectiva norteadora de ações de Estado para o bem-estar populacional são características que acompanharam o nascimento deste trabalho de tradução e divulgação de práticas éticas e cientificamente comprovadas para a intervenção sobre pessoas que usam drogas estimulantes. A questão brasileira sobre drogas sempre foi de imensa disputa conceitual, entre a arcaica e higienista visão de mundo livre das drogas, e a realista e arqueológica constatação de que se vive um mundo em que pessoas fazem uso de substâncias diversas, e que estas merecem o acesso a práticas de cuidado amparadas por princípios humanistas, pelos direitos humanos e respeito pelas suas escolhas de vida. Decerto que a compreensão sobre o uso de drogas, enquanto uma questão cultural dos homens em sociedade, da qual compartilhamos, não implica em ignorar os prejuízos que os consumos abusivos e dependentes podem causar à sociedade e às próprias pessoas, individualmente. O anseio genuíno pelo cuidado a essas pessoas é um dos motivos desta publicação.

O debate brasileiro das políticas sobre drogas tem se dado em oposição entre as perspectivas jurídica-moral-biomédica versus a biopsicossocial-sociocultural, assim, o uso de drogas tem sido compreendido por parte da sociedade civil organizada, e até por órgãos governamentais, na forma de um reducionismo que dá extrema relevância ao papel neuroquímico das drogas e de mecanismos punitivos como forma de atenção ao tema, e pouca importância aos contextos culturais e socioeconômicos subjacentes às culturas de uso, ou ainda aos aspectos pessoais, isto é, às expectativas individuais, os níveis de conhecimento das pessoas sobre seus consumos, os posicionamentos e compromissos políticos dos governantes e legisladores, as vulnerabilidades das pessoas e dos territórios, etc. Este impasse tem provocado o sofrimento das pessoas, segregação e exclusão social, e pouco tem contribuído com a discussão madura e responsável sobre o problema das drogas. O Brasil, segundo as estatísticas mundiais, é o oitavo maior consumidor de cocaína entre dezenove países americanos (considerando o uso na vida), atrás de países como Estados Unidos, Canadá, Uruguai e Chile. Em comparação com vinte e cinco países europeus está atrás de dez países, tais como Espanha, Reino Unido e Irlanda (BRASIL, 2015). Os dados nacionais públicos atuais sobre consumo de drogas estimulantes como a cocaína, o crack e anfetaminas encontram-se no III Levantamento Nacional Sobre o Uso de Drogas pela População Brasileira (LNUD) (BASTOS et al., 2018), realizado

7


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.