Adventist World Portuguese - February 2019

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D I R E I T O D E F A L T A R /// A T E C N O L O G I A E A S C R I A N Ç A S /// 1 0 0 M I L A C A M P A N T E S /// M Ã E D E 2 1 Ó R F Ã O S

FEVEREIRO 2019

Rubens da Silva Lessa

Exemplar avulso: R$ 2,96 | Assinatura: R$ 35,50

(1937-2019)

ÍCONE EDITORIAL A TRAJETÓRIA DE UM PASTOR, JORNALISTA, ESCRITOR E INTELECTUAL QUE FEZ HISTÓRIA NA IGREJA ADVENTISTA


EDITORIAL

OS MELHORES EDITORES CRISTÃOS SÃO GUARDIÕES DA MENSAGEM PROFÉTICA MARCOS DE BENEDICTO

Fui alfabetizado com os profetas, lendo a Bíblia, que é o principal produto da atividade desses homens de Deus, e logo cedo percebi a grandeza da revelação divina. Por isso, entre outras coisas, tenho um imenso respeito pela mensagem dos profetas. Gostaria que minha vida tivesse sido ainda mais moldada por eles, pois sua mensagem representa direção, sabedoria, correção moral, amplitude intelectual, profundidade espiritual e sucesso pessoal. Profetas são pessoas comuns e extraordinárias ao mesmo tempo. São figuras que transitam pelo espaço entre o Céu e a Terra, o divino e o humano, o presente e o futuro. O profeta transcende sua geografia e sua particularidade. Ele fala para sua comunidade, seu povo e também para nações estrangeiras. É uma voz do passado para nosso tempo. Seus oráculos são condicionais e incondicionais. Às vezes exagerado, hiperbólico, angustiado, o profeta anuncia o caos, mas acima de tudo a esperança. Anunciador e símbolo do maior de todos os profetas (Cristo), o profeta é a personificação da voz de Deus no meio de uma confusão de vozes competindo por atenção. Ele revela a verdade e não apresenta fake news. Questionador da cultura, crítico da sociedade, defensor dos desvalidos, o profeta tem um elevado senso de justiça social. No meio da competição de falsos deuses, ele sempre nos leva de volta ao Deus verdadeiro. Falando para o presente, ilumina o futuro e proclama o novo. O profeta vê uma dimensão mais profunda da

POETA COM O ESPÍRITO DOS PROFETAS, RUBENS LESSA CUMPRIU A MISSÃO DE PROCLAMAR O “ASSIM DIZ O SENHOR”

realidade, pois seus olhos detectam o que não podemos ver. Ele vê o mundo da perspectiva de Deus. A mensagem dos profetas é sempre relevante, mas nem todos tinham o dom literário e poético de um Moisés, Davi ou Isaías. Por isso, alguns contaram com o talento de um redator para codificar seus oráculos. Ademais, os profetas receberam a ajuda dos escribas para preservar sua mensagem. Assim, como “escribas” modernos, os editores adventistas se sentem privilegiados em ajudar a interpretar, transmitir e proteger o legado profético. Na Igreja Adventista, encontramos uma longa lista de grandes editores, especialmente no início do movimento, que têm procurado valorizar a mensagem profética. Escritores, e às vezes poetas, artistas das palavras que tentam captar o incaptável, definir o indefinível e descrever o indescritível, eles se apropriam também do espírito dos profetas. Procurando unir passado, presente e futuro, falam para todas as gerações. Sabem que, se não anunciarem a verdade de Deus, correm o risco de se tornarem porta-vozes das mentiras do inimigo, como ocorre com tantos influenciadores hoje. Ao destacar aqui o papel profético em conexão com o trabalho editorial/ literário, o objetivo é acrescentar outro ângulo ao merecido tributo oferecido ao querido pastor Rubens Lessa na matéria de capa, o qual ocupou este espaço por muitos anos e descansou no dia 12 de janeiro. Afinal, escritor e poeta, ele se via como um defensor da mensagem profética. Por isso, no seu último editorial da Revista Adventista, em maio de 2014, frisou: “Reafirmo minha crença na Palavra de Deus e no dom profético.” Poeta imbuído com o espírito dos profetas, ele cumpriu a missão de proclamar, com beleza, o “assim diz o Senhor”. ] MARCOS DE BENEDICTO é editor da Revista Adventista

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R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

Foto: Adobe Stock

O POETA E O PROFETA


Fev. 2019

No 1342

Fevereiro 2019

Ano 114

www.revistaadventista.com.br

Pu­bli­ca­ção Men­sal – ISSN 1981-1462 Órgão Ge­ral da Igre­ja Ad­ven­tis­ta do Sé­ti­mo Dia no Bra­sil “Aqui está a pa­ciên­cia dos san­tos: Aqui es­tão os que guar­dam os man­da­men­tos de Deus e a fé de Je­sus.” Apocalipse 14:12 E­di­tor: Marcos De Benedicto E­di­to­res As­so­cia­dos: Márcio Tonetti e Wendel Lima Conselho Consultivo: Ted Wilson, Erton Köhler, Edward Heidinger Zevallos, Marlon Lopes, Alijofran Brandão, Domingos José de Souza, Gilmar Zahn, Leonino Santiago, Marlinton Lopes, Maurício Lima, Moisés Moacir da Silva e Stanley Arco

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Texto final

Ensina a criança

O último paralítico de Jerusalém

A repercussão da morte e o legado da vida e ministério de Rubens Lessa

Projeto Gráfico: Eduardo Olszewski Foto da Capa: William de Moraes

SUMÁRIO

O desafio de orientar nossos filhos e alunos a navegar pelo mundo digital

Uma reflexão para quem se sente esquecido pelo Céu Adventist World é uma publicação internacional produzida pela sede mundial da Igreja Adventista do Sétimo Dia e impressa mensalmente na África do Sul, Alemanha, Argentina, Austrália, Áustria, Brasil, Coreia do Sul, Estados Unidos e México v. 15, no 2 Editor: Bill Knott Editores associados: Lael Caesar, Gerald Klingbeil, Greg Scott Editores-assistentes: Sandra Blackmer, Stephen Chavez, Costin Jordache, Wilona Karimabadi (Silver Spirng, EUA); Pyung Duk Chun, Jae Man Park, Hyo-Jun Kim (Seul, Coreia do Sul) Tradutora: Sonete Costa Arte e Design: Types & Symbols Gerente Financeiro: Kimberly Brown Gerente Internacional de Publicação: Pyung Duk Chun Gerente de Operações: Merle Poirier Conselheiros: Mark A. Finley, John M. Fowler, E. Edward Zinke Comissão Administrativa: Si Young Kim, Bill Knott, Pyung Duk Chun, Karnik Doukmetzian, Suk Hee Han, Yutaka Inada, German Lust, Ray Wahlen, Juan Prestol-Puesán, G. T. Ng, Ted N. C. Wilson

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Sua biografia importa

O funeral de Dona Azaleia

Não se esconda de Deus

A história de cada filho de Deus testemunha da providência divina

A piedosa cristã que não teve filhos, mas adotou 21 órfãos

A oração só é significativa quando há entrega do coração

CA­SA PU­BLI­C A­DO­R A BRA­SI­LEI­R A Edi­to­ra da Igreja Adventista do Sétimo Dia

Ro­do­via Es­ta­dual SP 127 – km 106 Cai­xa Pos­tal 34; CEP 18270-970 – Ta­tuí, SP Fone (15) 3205-8800 – Fax (15) 3205-8900

2 EDITORIAL

32 VIDA ADVENTISTA

46 MEMÓRIA

4 CANAL ABERTO

36 BEM-ESTAR

47 EM FAMÍLIA

5 BÚSSOLA

37 NOVA GERAÇÃO

48 INSTITUCIONAL

6 ENTREVISTA

38 PRIMEIROS PASSOS

49 ESTANTE

8 PAINEL

39 CIÊNCIA

50 IDEIAS

O poeta e o profeta

SERVIÇO DE ATENDIMENTO AO CLIENTE LIGUE GRÁTIS: 0800 9790606 Segunda a quinta, das 8h às 20h Sexta, das 8h às 15h45 / Domingo, das 8h30 às 14h

A opinião de quem lê

Diretor-Ge­ral: José Carlos de Lima

Entrega sem limites

Diretor Financeiro: Uilson Garcia Re­da­tor-Che­fe: Marcos De Benedicto Ge­ren­te de Produção: Reisner Martins

Direito reconhecido

Ge­ren­te de Ven­das: João Vicente Pereyra Chefe de Arte: Marcelo de Souza Não se devolvem originais, mesmo não publicados. As versões bíblicas usadas são a Nova Almeida Atualizada e a Nova Versão Internacional, salvo outra indicação. E­xem­plar avul­so: R$ 2,96 | Assinatura: R$ 35,50

Datas, números, fatos, gente, internacional

23 PERSPECTIVA

Pastores também sofrem

Nú­me­ros atra­sa­dos: Pre­ço da úl­ti­ma edi­ção.

Tiragem: ???.???

5838/39576

Domine a tela

Testemunho no bar

O passarinho famoso

Ajuda que vem do espaço

A dor da transição O WhatsApp e a missão

No tom certo Leitura que transforma

De carona nas ondas do rádio

41 ENTENDA

29 BOA PERGUNTA

42 JUVENTUDE

Morte antes da queda

Dormiram no Senhor

40 COMUNICAÇÃO

24 VISÃO GLOBAL

Continue avançando

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio, sem prévia autorização escrita do autor e da Editora.

Aula no museu

O tamanho do campori Aventura inesquecível

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CANAL ABERTO PURO, BONDOSO E LEAL Felicito as autoras da reportagem de capa de janeiro. Tive o privilégio de liderar o Ministério dos Desbravadores em nível mundial e de ter trabalhado com o pastor John Hancock. Ele foi um líder excepcional e talentoso. Desenhou e pintou boa parte das especialidades dos desbravadores. Fiquei abismado com o número de participantes do 5º Campori Sul-Americano: 100 mil pessoas. Deus seja louvado por isso! Agora estou trabalhando para estabelecer um museu e um centro de treinamento na vila histórica dos adventistas em Battle Creek, Michigan (EUA), para preservar a história dos desbravadores e do ministério jovem da igreja. Léo Ranzolin / Estero, Flórida (EUA)

LEGADO INDELÉVEL Conheci o pastor Rubens Lessa quando ele cantava primeiro- tenor em quartetos. Desenvolvemos uma identificação muito forte, por apreciarmos o estilo de escrever um do outro. Claro que isso para mim foi um privilégio e uma inspiração. Ele me indicou para compor o grupo de redatores da editora; porém, esse chamado nunca chegou às minhas mãos, porque na mesma época fui para o quarteto Arautos do Rei. Ao longo desses anos, ele publicou dois artigos meus na Revista Adventista. Com relativa frequência, trocávamos “figurinhas” a respeito de discordâncias acadêmicas e teológicas. Como bom jornalista, e respeitando o contraditório, ele chegou a publicar algumas cartas minhas contestando alguns dos seus célebres editoriais. Tudo isso sempre num bom espírito. Ele foi um grande homem e pastor. Seu legado permanecerá indelével para a posteridade. Francisco Gonçalves / Volta Redonda (RJ)

PASTOR COM “CHEIRO DE OVELHA” Foi com extremo pesar que recebi a notícia do falecimento do nosso querido pastor Rubens Lessa. Estive presente à cerimônia fúnebre e fui tocada pela solenidade e cuidado com que todos os 4

detalhes foram pensados e a nobreza com que foi conduzida. O casal Lessa faz parte da minha história. Durante 22 anos ajudei no Grupo de Novos Amigos (GNA), ministério de voluntários adventistas da cidade de São Paulo que presta apoio espiritual, emocional e social aos solteiros, viúvos e divorciados da igreja. Hoje esse ministério foi incorporado ao departamento de Lar e Família da Associação Paulistana. Durante muitos anos, o casal Lessa atuou na capelania de nosso ministério. Fizeram muito para um grupo simples, voluntário, sem renome, sem destaque. Como disseram no velório dele, o pastor Lessa tinha “cheiro de ovelha”. Ele se deixou usar no serviço do Senhor com competência, sabedoria, humildade, acolhimento, amor, carinho, gentileza e sorriso amplo, porque para ele o importante “eram as pessoas”. Quero abraçá-lo na manhã da ressurreição. Lettyce Mohriak / São Paulo (SP)

encontrado paz, quando Deus lhe revelou que ele não deveria mais se preocupar, pois Ele cuidaria da filha na sua ausência. Espero logo reencontrá-lo, por ocasião da breve (Lessa escreveria iminente) volta de Jesus. No Céu, escreveremos histórias, com a perfeição que lhe era peculiar, por toda a eternidade! Márcio Basso Gomes / Jacareí (SP)

ESFORÇO INCANSÁVEL “Ele fará muita falta. Minha amizade com o pastor Lessa e sua família se desenvolveu em função de relacionamento dentro e fora do ambiente de trabalho. O que eu mais admirava no ministério dele era o esforço incansável em favor da causa. Ele realmente acreditava no que pregava. Seu entusiasmo era contagiante. Considero igualmente importante sua postura conservadora frente às influências negativas do pós-modernismo. Nos momentos de descontração, ele gostava de falar das coisas simples da vida no campo, de contar sobre as peraltices dos tempos de criança e as histórias mirabolantes de seu irmão Wilson e de seu pai.” Aparecido Santana / Tatuí (SP)

DOCES LEMBRANÇAS A morte usurpou a festa de Bodas de Ouro do casal Lessa, dando à família um bolo amargo e difícil de ingerir. A Igreja Central de Taguatinga (DF) deve ter sido uma das últimas igrejas a usufruir da poderosa pregação e do sorriso contagiante do pastor Lessa. Lembro-me de nossa juventude em Minas Gerais e depois no antigo Colégio Adventista Brasileiro, em São Paulo. Doces lembranças de alguém que muito me ajudou a crescer. Carmo Patrocínio Pinto / Taguatinga (DF)

DESCANSAR EM DEUS Confiança em Deus, essa foi uma das lições mais importantes que aprendi com o pastor Lessa. Certo dia, ele contoume que uma de suas grandes preocupações era sua filha Kathia, 34, que é especial. Revelou-me que perdia o sono ao pensar em quem cuidaria da filha após sua morte. Contudo, disse haver

Expresse sua opinião. Escreva para ra@cpb.com.br. ou envie sua carta para Revista Adventista, caixa postal 34, CEP 18270-970, Tatuí, SP.

Os comentários publicados não representam necessariamente o pensamento da revista e podem ser editados por questão de clareza ou espaço.

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BÚSSOLA

ENTREGA SEM LIMITES RUBENS LESSA ACREDITAVA FORTEMENTE NA CAUSA DE DEUS E NO DEUS A QUEM SERVIA EM TEMPO INTEGRAL ERTON KÖHLER

altam palavras para expressar a dor pela perda de um colega como Rubens Lessa. Muitas vezes tive a oportunidade de conversar com esse servo de Deus e reconhecer a contribuição dele para a causa do Senhor. Mas em 2014, ano de sua aposentadoria, expressei minha gratidão publicando as seguintes palavras: “Ele mostrou compromisso institucional e pessoal com as iniciativas da igreja. Sua vida é uma inspiração, sua busca foi pela excelência e sua dedicação, sem limites. Há líderes que dão uma contribuição e outros que deixam um legado. Ele usou as palavras para edificar a igreja e ajudou a torná-la mais espiritual, comprometida, sólida e unida.” A CPB foi sua “casa” por 41 anos. Tempo em que sua identidade se misturou com a da Revista Adventista, com seus editoriais e artigos sempre sábios e muito apreciados. Hábil com as palavras, era capaz de usá-las para mexer com a sensibilidade do coração ou para convencer as mentes mais exigentes. Intelectual e poeta, preferiu colocar tudo a serviço de um ministério. Por isso, nada mais justo do que usar este espaço da Revista Adventista, que ele tanto amava, para registrar esta última homenagem. Seu legado ficou marcado na vida da Igreja Adventista no Brasil, onde era visto como um apaixonado pelo movimento missionário,

Foto: William de Moraes

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ELE SE EMPOLGAVA COM AS LETRAS, MAS TAMBÉM SE EMOCIONAVA COM AS PESSOAS, ESPECIALMENTE AO VER VIDAS SENDO ENTREGUES A JESUS cuidadoso com os princípios bíblicos, interessado na vida da congregação local e dono de um coração generoso. Durante 12 anos, até sua aposentadoria, participamos juntos de diferentes reuniões, comissões e concílios. Ele sempre tinha um conselho equilibrado para dar em público ou em particular, mas também vibrava com nossas grandes conquistas, assim como demonstrava interesse pelas menores decisões. No final, transmitia com brilhantismo a visão da igreja aos leitores.

Levo em minha vida as marcas de sua vida e de seu ministério. Depois de publicar meu primeiro artigo na Revista Adventista, em 1990, ele acreditou que eu poderia contribuir com a igreja escrevendo. Por isso, recebi meu primeiro chamado, já no ministério, para ser redator da CPB, transferência que acabou não se efetivando. Depois, como colunista deste periódico, ele foi meu editor e orientador por mais de uma década. Se escrevo textos para as revistas da igreja, devo isso aos primeiros conselhos e à motivação que ele me deu. Nosso último encontro foi no dia 6 de setembro do ano passado (foto), no lançamento do devocional Nossa Esperança, na CPB. Conversamos, tiramos uma foto juntos e tive a oportunidade de agradecer-lhe o apoio fundamental para chegar até aquele momento. É uma despedida difícil. Ele vai fazer muita falta para todos nós. Porém, o mesmo Deus que dirigiu sua vida e seu ministério também entendeu que a hora do descanso chegou. Não temos todas as explicações, mas somos sustentados pela certeza de que sua vida foi bem vivida e pela esperança de que em breve estaremos juntos novamente (1Ts 4:16). Afinal, quem andou nas mãos de Deus pode agora descansar em Seus braços. ] ERTON KÖHLER é presidente da Igreja Adventista para a América do Sul

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ENTREVISTA

WENDEL LIMA

Helio Carnassale

Desde a Emenda Constitucional nº 16, publicada em 4 de junho de 1997, que fixou a data das eleições gerais no primeiro e último domingos de outubro, os adventistas não ouviam falar de uma mudança legislativa que os beneficiasse tanto quanto a Lei 13.796/19, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, no dia 3 de janeiro. Nesta entrevista, o pastor Helio Carnassale, líder do departamento de Assuntos Públicos e Liberdade Religiosa da sede sul-americana da Igreja Adventista, explica o processo de aprovação dessa lei e sua importância para a proteção de LÍDER DA IGREJA EXPLICA COMO UMA LEI SANCIONADA EM direitos fundamentais no Brasil.

DIREITO RECONHECIDO JANEIRO VAI FACILITAR A PRESTAÇÃO ALTERNATIVA POR MOTIVOS RELIGIOSOS NAS ESCOLAS

O projeto de lei vem tramitando desde 2003. Por que demorou tanto para ser aprovado? É importante destacar que, antes de essa lei ser proposta pelo deputado federal Rubens Otoni, em 2003, vários outros parlamentares haviam tentado, sem sucesso, algo semelhante, inclusive o doutor 6

Qual foi o papel da posição apartidária da igreja nesse processo? Como nunca antes, eu agora percebi o grande valor de nossa igreja ser apartidária. Foi essa posição

que nos ajudou a dialogar com parlamentares de posições e partidos antagônicos. Daqui para frente, qual deve ser a postura de quem precisa solicitar a prestação alternativa? A lei passará a valer 60 dias depois de sua publicação no diário oficial (4 de janeiro), e os estabelecimentos de ensino terão até dois anos para se adaptarem a essa emenda da LDB. A nova lei será aplicada em escolas públicas e privadas (exceto colégios militares), e para todos os níveis de ensino. Portanto, pais e alunos precisam estar certos de que seu direito está garantido, mas que o bom testemunho e o diálogo devem ser mantidos ao negociar isso. Os alunos precisam ser responsáveis em seus deveres e solicitar por escrito e com antecedência a prestação alternativa. Como igreja, vamos elaborar uma campanha informativa e nossas sedes administrativas continuarão a prestar assessoria jurídica aos membros. Em quais áreas precisamos avançar na liberdade religiosa? Na prestação alternativa para o ensino e a carreira militar, nos concursos públicos e exames e no setor trabalhista. A mudança do dia de realização do Enem, por exemplo, foi uma decisão do poder executivo, e não se trata de uma lei. Portanto, pode ser alterada. ] R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

Foto: Wilson Azevedo

Qual é a importância da aprovação dessa lei? É um feito singular e uma grande conquista para a liberdade religiosa! Não conheço outra lei semelhante ao redor do mundo. O que essa nova lei traz agora é explicitar como o direito da prestação alternativa, previsto na Constituição de 1988, deverá ser aplicado no contexto educacional. Ela protege os grupos minoritários que têm objeção de consciência para cumprir deveres acadêmicos e estudantis em dias de guarda religiosa.

Marcus Vinícius de Campos, que é adventista e foi deputado federal suplente (1997-1998). Não sabemos a razão da demora, mas o fato é que o próprio deputado Rubens Otoni retomou o projeto a cada legislatura dele, a fim de que o processo não “morresse”. Depois, esse projeto foi para o Senado e ficou de “molho” por uns seis anos. Ali, o senador Pedro Chaves foi vital para que ocorresse a aprovação e o projeto ganhasse força, ao tornar-se um substitutivo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Em 2018, o projeto voltou para a Câmara, onde tivemos a contribuição fundamental da deputada Maria do Rosário, e o projeto foi aprovado no dia 27 de novembro. Curiosamente, nós como igreja só começamos a agir em relação a esse projeto de 2017 para cá, quando tomamos conhecimento dele. Se antes havia conhecimento dessa matéria, não houve ação. Nessa reta final também tivemos o grande apoio da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos) e do deputado Leonardo Quintão. Portanto, só podemos concluir que Deus conduziu esse processo e impressionou corações, mesmo sem a intervenção da igreja.


adventistas.org

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adventistasbrasil

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PAINEL F AT O S

GENTE

Todos os anos, a ONG Portas Abertas divulga a lista dos 50 países mais hostis aos cristãos. Desde 2002, o ranking é liderado pela Coreia do Norte (1º). As tristes novidades são que a Índia (10º) está entre os países mais intolerantes do mundo e, depois de anos, a Rússia (41º) voltou a aparecer na lista. Três tendências foram apresentadas pelo relatório: (1) mais países estão criando leis para controlar a religião; (2) cresce o número de governos ultranacionalistas; e (3) a ala radical do islamismo continua a avançar no Oriente Médio e na África subsaariana.

CONCURSO PARA ADOLESCENTES A cada quatro anos, é iniciado um novo ciclo de estudos na Lição da Escola Sabatina dos Adolescentes. E o quadriênio 2019 a 2022 terá uma novidade. Será realizado um quiz semanal sobre o conteúdo da lição e dos cinco livros da série Conflito, de Ellen White, que servem de complemento ao guia de estudo. A ideia é incentivar o estudo por meio de prêmios mensais e trimestrais. Para facilitar o registro dos dados do concurso, a igreja está desenvolvendo neste ano uma plataforma digital. Mais informações no link https://bit.ly/2B0CiwP.

A produção musical adventista parece estar ultrapassando barreiras linguísticas, e o Oceano Atlântico. Isso porque o repertório de alguns CDs do Ministério Jovem daqui foram regravados na Sérvia. Quem interpreta essas músicas é o Link (horlink.com), grupo formado por estudantes secundaristas e universitários de várias partes do país. Depois de um ano de atividades e de apresentações em igrejas e eventos de ajuda humanitária, o grupo lançou o primeiro CD em novembro, em Belgrado.

30 anos

de existência celebrou o seminário adventista da Rússia, no início de dezembro. O primeiro seminário protestante pós-regime comunista cresceu e se tornou a Universidade Adventista de Zaoksky.

IGREJA ITINERANTE No ano passado, o trabalho evangelístico realizado a bordo da lancha do projeto A Igreja que Navega passou por dez comunidades ribeirinhas, plantou cinco igrejas, ofereceu 2 mil atendimentos na área de saúde e levou mais de 200 pessoas ao batismo na região norte e centro-oeste do Amazonas. O pastor Reno Guerra e sua esposa, Natália, casal que comanda a embarcação, contou com o apoio da ADRA Brasil e dos 24 jovens voluntários do programa Um Ano em Missão.

Fotos: IAD News / ULB

MAPA DA INTOLERÂNCIA

MÚSICA BRASILEIRA NA SÉRVIA

12 mil juvenis

foram batizados ao fim de um programa anual de discipulado da Divisão Interamericana da Igreja Adventista. 8

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GENTE

BODAS DE OURO (50 ANOS)

NOMEAÇÃO

“Em todas as regiões do mundo pelas quais passei, há uma energia maravilhosa entre os desbravadores. Mas a América do Sul é única. Há muito crescimento,

De Raulino Martins Brás e Margarida Maria de Carvalho Braz, em setembro, na Igreja Central de Jacareí (SP). A cerimônia foi dirigida pelo pastor Jeferson Santana. O casal tem três filhas, seis netos e duas bisnetas.

fogo e paixão aqui. É como uma cultura. É divertido pertencer a

De Nivaldo Ferreira Campos e Regina Pereira Ferreira, em dezembro, também na Igreja Central de Jacareí (SP). Com o consentimento do pastor local, Marco Lamarques, a cerimônia foi dirigida pelos anciãos da igreja. O casal tem três filhas.

Do pastor Almir Augusto de Oliveira, de 54 anos, para diretor associado da Rede Educacional Adventista na América do Sul. Ele assumiu a função no lugar do pastor Ivan Góes, que liderará a rede no Estado de São Paulo. Ele é graduado em Teologia e Pedagogia e tem mestrado em Teologia e Liderança. Casado com a professora Léia, tem dois filhos.

14 mil toneladas de açúcar

um clube.”

Andrés Peralta, líder do Ministério de Desbravadores na sede mundial da igreja, sobre o campori em Barretos, em entrevista ao Portal Adventista (acesse: https://bit.ly/2HpGkV5)

é o que o Ministério da Saúde pretende reduzir nos alimentos e bebidas industrializados no Brasil. Atualmente, o brasileiro consome o dobro da quantidade indicada pela OMS.

CENTENÁRIA E PIONEIRA Fotos: ?????

Elizabeth Moses celebrou seu 100º aniversário em 5 de janeiro. Betty, como é conhecida, aos 80 anos decidiu trabalhar em tempo integral como recepcionista da sede administrativa da Igreja Adventista no país. E ela fez isso até 2008. Betty é neta dos primeiros adventistas batizados em Bahamas, como fruto do trabalho de colportores. No seu aniversário ela foi homenageada

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105 mil dólares em doações para a construção de poços de água no Quênia foram levantados pelo ministério Maranatha International em novembro, numa campanha digital.

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INTERNACIONAL

NÍVEL EDUCACIONAL DOS ADVENTISTAS AO REDOR DO MUNDO

“O governo não pode suprir sozinho as necessidades

25% ensino superior

de sua população.

20% ensino médio

Portanto, é

15% ensino básico

necessário

14% ensino superior incompleto 13% ensino médio incompleto

ajudar nossas

12% ensino profissionalizante

autoridades.”

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Fonte: Adventist Global Church Member Survey (2013)

1.000 moçambicanos poderão retirar 20 litros de água potável por dia de um quiosque construído pela ADRA em Mocuba. Há muitos anos o abastecimento é inadequado na região.

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empresários e empreendedores do Sul da África participaram do primeiro encontro da ASi (equivalente à Federação dos Empreendedores no Brasil) da sua região, em junho. No evento, foi coletada uma oferta de 40 mil dólares para projetos missionários.

10 clubes de desbravadores devem ser estabelecidos em escolas públicas com o apoio do Ministério da Educação da Jamaica.

“A cultura adventista de não se misturar com a sociedade deve mudar. Nós somos o sal da Terra. Sal que se recusa a sair do saleiro é inútil; nunca vai beneficiar ninguém. Temos a última mensagem do amor de Deus para ser levada ao mundo que perece. Fotos: Adventist Record

Ser sal da Terra não é opcional para os seguidores de Cristo”.

Elie Weick – Dido (foto), presidente da Divisão Centro-Oeste Africana da Igreja Adventista, justificando a doação de 300 bancos escolares realizada por líderes e funcionários do escritório administrativo da denominação em Abidjan, Costa do Marfim.

Solomon Maphosa, presidente da Divisão SulAfricana e Oceano Índico da Igreja Adventista.

Colaboradores: Adventist Review, Aleksandra Jovanovic, Alex Simões, Felipe Lemos, Lóren Vidal, Mauren Fernandes, Penny Brink,

Priscila Baracho, Rosmery Sánchez Calleja

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RETRATOS

Flashes do campori: a vibração na abertura, o ritmo da fanfarra, a emoção da investidura, a alegria no batismo, o legado num relógio e o apelo para a multidão. Fotografias: DSA

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CAPA

TEXTO FINAL

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A VIDA DE RUBENS LESSA CHEGOU AO FIM, MAS AS OBRAS QUE CARACTERIZAM SEU LONGO E ABENÇOADO MINISTÉRIO CONTINUAM, POIS, QUANDO O POETA SE CALA, A POESIA AINDA FALA Marcos De Benedic to

serão celebradas junto com as bodas do Cordeiro (Ap 19:9), no Céu. “O ser humano realmente não conhece o dia de amanhã”, dizia um trecho da mensagem do diretor-geral da CPB, pastor José Carlos de Lima, que estava no exterior e não pode comparecer. “Quem poderia imaginar que eu estaria escrevendo estas linhas para dar um ‘até breve’ a um velho amigo de mais de 40 anos de convivência, companheirismo e trabalho? Na verdade, eu estava escrevendo uma mensagem que seria lida na cerimônia das bodas de ouro. Tive que mudar o texto. A alegria foi substituída pela tristeza. O texto que seria de felicitações converteu-se em condolências.” R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

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vida é cheia de mistérios, contradições e surpresas. Mas algumas vezes o capricho dos fatos desafia a lei das probabilidades e mostra que o imponderável acontece. Imagine uma reunião de família para celebrar as bodas de 50 anos de um casal, um feito que não ocorre a toda hora. Os parentes começam a chegar. Tudo está preparado. Percebe-se a alegria no ar. Dentro de horas, a festa terá início. Mas, de repente, o “noivo” se sente mal. Esforço excessivo? Tensão do momento? Emoção por receber um novo “sim” da amada? Descuido em procurar ajuda médica antes? Ainda sem clareza da gravidade da situação, ele é levado ao hospital. Ali tem um enfarto. Depois uma parada cardiorrespiratória. A alegria se transforma em tristeza, o riso em choro, a festa em luto. As bodas são substituídas por uma cerimônia fúnebre. Esse roteiro ocorreu com um dos ícones do adventismo no Brasil: Rubens da Silva Lessa (1937-2019). Pastor e jornalista, ele iria celebrar os 50 anos de casamento com Charlotte Fermum Lessa no domingo 13 de janeiro, mas morreu no sábado à tarde, aos 81 anos, com o coração apaixonado. No domingo de manhã, seu corpo foi velado no auditório da Casa Publicadora Brasileira (CPB), instituição à qual serviu intensamente por mais de 41 anos como editor e redator-chefe. A cerimônia, muito bonita, solene e significativa, teve início às 14h e durou cerca de duas horas. Parte dela contou com os mesmos oficiantes programados para as bodas. Cerca de 500 pessoas estiveram presentes. Na sequência, o corpo seguiu para o Cemitério São João Batista em Tatuí, onde o dedicado servo do Senhor descansa. No fim da tarde, quando os últimos raios do sol coloriam de alaranjado o céu no horizonte e a noite se aproximava coberta de luto, um poeta poderia dizer que cada crepúsculo encerra em si a promessa de um novo amanhecer. Por algum motivo misterioso que somente o Onisciente conhece, as bodas de casamento foram adiadas e, como alguém observou,


Dentro da minha fala, o pastor André Oliveira Santos, editor da Lição da Escola Sabatina, apresentou um lindo poema composto pelo pastor Assad Bechara em homenagem ao amigo Rubens, e concluiu com um texto de sua própria autoria: “Quando o poeta se cala, a poesia fala. Quando a vida termina, o texto está pronto. O texto que permanece é o texto final. O texto final é um testemunho que fica nos corações. O pastor Lessa descansou, mas o texto escrito com sua vida continuará ativo, inspirando pessoas, editando histórias que precisam ser reescritas pela palavra do evangelho e transformado rascunhos em textos de vidas semelhantes a Cristo.” No sermão, tomando por base Apocalipse 14:13 (“Bem-aventurados os mortos que, desde agora, morrem no Senhor”), Wellington Barbosa, que foi pastor distrital de Lessa e o último editor a ser chamado por ele, destacou que “todos nós vivenciamos pelo menos três esferas da vida, e nelas damos evidências de nossas obras”: (1) a esfera pública, o espaço em que somos conhecidos pelas pessoas em geral; (2) a esfera familiar, o círculo íntimo em que “demonstramos quem de fato somos, sem máscaras ou retoques”; e (3) a esfera relacional, o ambiente de interação com aqueles que vivem mais estreitamente ligados a nós, num vínculo de amizade. Para Barbosa, Lessa revelou seu caráter e seu valor nas três esferas. O HOMEM Filho de José da Silva Lessa (1914-1987) e de Elvira Porto Lessa (1918-2013), Rubens nasceu em Anápolis (GO), em 24 de maio de 1937. Primogênito, ele tinha quatro irmãos (Wilson, Marianita, Paulo e Juanita). A família Lessa (isto é, os avós de Rubens), oriunda da Bahia e radicada em Goiás, havia aceitado a mensagem adventista três anos antes (em 1934) por influência de dois livros da CPB. A partir de então, a área de publicações passou a fazer parte da história dos Lessas. Pouco antes de o pai falecer, Rubens escreveu um editorial intitulado “Simplesmente José”, no qual falou sobre o trabalho do pai na colportagem e concluiu: “José agora está velho. R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

Abatido. Cansado. Doente. Proibido de trabalhar. Mas de uma coisa ele está certo: sua obra continua, embora sem aquele mesmo brilho. Um de seus filhos empunhou a tocha. E não a largará, com a graça de Deus” (Revista Adventista, agosto de 1987, p. 3). O pai, um colportor que iniciou suas atividades de venda de literatura em 1939, em Goiás, a convite do célebre colportor Longino Niz, e foi ordenado ao ministério pastoral em 1963, em Manaus (AM), era um de seus heróis. Por isso, quando ficou doente e faleceu, ou mesmo mais tarde, Rubens dedicou ao pai textos na Revista Adventista, como “E agora, José?” (novembro de 1987) e “A tocha de José” (março de 2002). No “Poema a José” (fevereiro de 1988), comparando o pai a um “veleiro traquejado” que ensina o menino “despreparado” a “enfrentar as ondas sem receio”, ele sonha alcançar o pai na “praia de além-mar”. Nos últimos versos, a gratidão: “E lá te direi: Muito obrigado, José, por me haveres ensinado a velejar!” Rubens iniciou sua carreira ministerial no norte do país, atuando como pastor distrital na cidade de Belém (PA). “Em seguida, exerceu a mesma atividade no Amapá. Como líder regional, atuou nos departamentos de Jovens, Educação, Saúde e Liberdade Religiosa, na antiga Missão Baixo-Amazonas”, informou o site da Revista Adventista na nota de falecimento. “Em 1973, recebeu chamado para trabalhar na CPB, ainda em Santo André (SP), dando início às suas atividades editoriais. Por 36 anos foi redator-chefe da CPB e editor da Revista Adventista, aposentando-se em maio de 2014, aos 77 anos. Rubens 13


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contrário do pai (falecido aos 73, de enfarto) e do irmão Paulo (falecido aos 60 anos, vítima de aneurisma da aorta). Em especial, achava que o pai tinha vivido pouco. Ironicamente, o pai chegou a comemorar as bodas de ouro, em 18 de janeiro de 1987, embora tenha morrido no mesmo ano. Rubens viveu até os 81, porém sem celebrar o mesmo feito. Alguns o viam quase como indestrutível. No entanto, como diz o autor bíblico, “toda a carne é como a erva, e toda a sua glória como a flor da erva” (1Pe 1:24). Um dia, mesmo os mais hábeis, inteligentes e energizados voltam ao pó. Até a aroeira, árvore cuja

madeira é muito densa (a mais resistente do Brasil) e à qual Lessa se comparava, desaparece. Fomos feitos para a eternidade, mas vivemos num mundo marcado pelo pecado e a fragilidade. Sociável, falante, contador de histórias, o pastor Lessa dizia que uma das coisas de que mais iria sentir saudade era o convívio com os colegas da CPB e da igreja. Ao completar 81 anos, ele recebeu um telefonema coletivo de um grupo de amigos da Redação. Ficou muito feliz e depois escreveu para sua ex-secretária, Andréa Cordeiro, que o assessorou por 26 anos: “É muito bom envelhecer rodeado de amigos como vocês. Posso até morrer um dia, mas vou morrer contrariado, porque não quero ficar longe dos meus amigos.” R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

Foto: Arquivo pessoal

é autor de alguns livros publicados pela editora, entre eles: Diagnóstico e Remédio (1982), Livre Para Viver (1990), Casa Publicadora Brasileira – 100 Anos e as meditações diárias A Esperança do Terceiro Milênio (2000), além de Alimento Para o Coração (2007).” “Graduado em Teologia pelo então Instituto Adventista de Ensino (IAE), atual Unasp, campus São Paulo, e Jornalismo pela tradicional Faculdade Cásper Líbero, ele concluiu o mestrado em Divindade pela Universidade Andrews (EUA). Era membro da Igreja do Inocoop, em Tatuí (SP), na qual exercia as funções de ancião e líder do Ministério da Família.” Além da esposa, Charlotte, e outros familiares, deixa três filhas (Cláudia, Márcia e Kathia) e dois netos. “Definir um caráter singular e único como o do homem com quem convivi e a quem amei por 50 anos, não é uma tarefa difícil”, afirma Charlotte, a esposa amada que enternecia o coração do escritor. “Rubens era transparente. Sem máscaras. Coerente. Assertivo. As férias em família eram sua maior alegria. Viajar com a família representava o momento mais parecido com o ambiente do Céu. Sua família era sua prioridade. Não havia doutorado que o convencesse a deixar a família em segundo plano. Ao olhar para seu ministério, vejo-o um pastor dedicado, incansável e amante das almas. Vejo um escritor preocupado em mostrar o amor de Deus e a beleza do evangelho. Um ser humano afinado com outros seres humanos. Conectarse com as pessoas, relacionar-se com elas, chorar com elas, rir com elas, era seu deleite. Penso ser este o legado que deixou. No decorrer de 50 anos, nosso amor nasceu, cresceu, floresceu, amadureceu e persistiu até o fim. Mais forte, mais inspirado, mais abençoado. Pastor Lessa com a esposa, Na convivência com as filhas era afetuCharlotte, e as filhas, Cláudia, oso, amoroso, acolhedor e compreenKathia e Márcia (esq. p/ dir.): sivo. Havia respeito mútuo.” compromisso com o trabalho Para Cláudia, os momentos em famíe dedicação à família lia, especialmente as longas viagens de carro para Campo Grande (MS), eram oportunidades únicas de um convívio gostoso e agora objetos de lembranças e saudade. “De sorriso fácil e contagiante, papai era exigente mas amoroso, firme mas brincalhão. Apesar das muitas viagens, foi sempre presente em minha vida e na vida de meus filhos nos momentos de alegria e tristeza. Culto e letrado, disse certa vez que sua maior professora foi minha irmã Kathia, com quem aprendeu importantes lições de vida. Significou tanto para muitos, mas para mim foi meu pai, o símbolo terreno do Pai celestial.” Márcia, a filha do meio, completa: “Papai tinha algumas qualidades admiráveis: a busca por tempo com a família, o que o caracterizou como um pai presente em todas as circunstâncias; diligência no trabalho, na vida espiritual, intelectual e no serviço ao semelhante. Sua vida se resumiu ao cumprimento da missão.” Lessa gostava de viver e acreditava que alcançaria uma idade bem avançada, a exemplo da mãe (falecida aos 95 anos) e ao


Silva), patriarca (Josiéli da Nóbrega), solidário (Danieli O MITO Machado), zelozo (Flaverlei Silva e Nerivan Silva). Já na década de 1950, o nome de Rubens Lessa começou a aparecer em Embora a palavra resiliência não tenha sido citada, ela artigos e relatos da Revista Adventista. No texto “Obrigado, ENA!”, publicado em março de 1965, ele descreveu como havia tomado a decisão de é uma das melhores para resumi-lo. Pois Lessa soube estudar Teologia. Até então, sonhava se tornar um escritor de ficção, um superar adversidades, vencer desafios, se reinventar e parar somente aos 77 anos, quando quis. Para muitos mestre no manejo da língua. Personalizando o colégio do coração, afirda Redação, além de pastor, chefe e líder, ele foi tammou: “Nem sabes que, para fruir a sombra amena de teu teto hospitaleiro, bém uma figura paterna. muito sofri num humilde quarto de hotel, no interior de Goiás, ao passar Os adjetivos e os comentários poderiam encher por um terrível conflito de alma!” As “paredes frias e sujas” do hotel preum livro. E não são apenas descrições abstratas, mas senciaram sua “angústia no labirinto da indecisão”. Entretanto, foi “venexpressões concretas de uma vida. “A integridade dele cido para vencer” e comemorou a decisão com alguns versos. Então terpodia ser vista no uso do dinheiro da organização, na minou com um agradecimento: “ENA amigo, é com saudade que parto responsabilidade para com seu ministério e na posde tuas paragens, de tuas colinas verdejantes e acolhedoras! Continua tura de simplicidade que evitava fazendo por outros o que fizeste por mim, e eles te os aplausos”, descreve Wendel. dirão no futuro o que te digo hoje, comovido: OBRI“O pastor Lessa foi um incentivador GADO, ENA!” “Não me tornei o de talentos”, avalia Christiane. “Às Nesse texto, já era possível entrever o estilo do escritor que fantasiei vezes, temos um dom ali, bem guarfuturo escritor: uma linguagem poética, com rico na minha juventude. dadinho em cada um. Ele foi uma vocabulário, mas com um requinte ainda algo pomdessas pessoas que veem em você poso. Seja como for, ele tentou registrar e despertar Não escrevi obras emoções por meio de palavras escolhidas com cuio que o mundo custa a enxergar.” de ficção para De acordo com Lucas, que desdado. Mais significativamente, ele assinalou seu entretenimento do tacou a diligência, para descrever o compromisso de ir aonde Deus designasse. Mais antigo chefe caberiam vários verbos tarde, a fama de grande escritor e pastor dedicado povo. Não pertenço a de ação que expressem “sua dedicomeçou a se formar. A caracterização de personaacademias literárias, cação ao realizar seu trabalho em gens fictícios, como “Zé Formal”, “Chico das Obras” qualquer dia, horário ou circunse “adventistas adventícios”, era um recurso para tormas conheço a tância; constante cuidado e atenção nar o ensino mais claro e memorável. Os primeiros alegria de ver almas ao administrar as diferentes persotextos têm um teor mais comportamental, cheios de convertidas a Cristo, nalidades e talentos de sua equipe; zelo (quase legalistas, diriam alguns), mas o tempo e também o incansável zelo e inteadicionou um toque inconfundível de graça e juspessoas transformadas resse para com todos”. tificação pela fé. Lessa descobriu progressivamente pelo poder do Espírito Diogo ressalta: “Dentre seus muiuma dimensão mais amorosa de Deus. Intransigente Santo, através da tos dons e qualidades, o pastor Lessa com os erros, o rigor comportamental continuou até foi uma pessoa completamente dedio fim, mas com abertura para aceitar ou entender os leitura de livros e cada àquilo que fazia. Punha o corafracassos dos outros. revistas de conteúdo ção e o intelecto em seus textos, na Convidado com frequência para falar em concílios sadio, construtivo” editoração e nos relacionamentos. e eventos da igreja, ele passou a relatar tais particiDiria que era quase que uma paixão pações na revista. Não raro, os editoriais eram deli(Revista Adventista, que ele tinha por Deus, sua família, ciosos fragmentos e recortes de encontros e diálogos setembro de 2001, p. 2) a igreja e sua amada ‘Publicadora’. com amigos e outros personagens, com a finalidade Era o que ele admirava nos pioneide tirar lições espirituais. Admoestação era uma ros e o que pregava para nós aqui de suas palavras preferidas. Esse mosaico, aliado a seus dons de bom orador com voz de barítono e a fama de defensor dos em longas conversas.” valores da igreja, foi ajudando a formar sua persona pública. Com o tempo, “O que me marcou foi que ele se preocupava nasceu o ícone, depois o mito. com as pessoas sem se importar com o status delas”, revela Adriana Seratto. “Conseguia conquistar crianNo mundo real, como definir as qualidades de Rubens Lessa? Em ças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Enérgico, uma rápida enquete na Redação, onde ele exerceu a quase totalidade de mas justo. Tinha humildade para reconhecer os próseu ministério, pedimos para alguns colegas defini-lo em uma palavra. prios erros. Era poeta e profeta. No meu primeiro dia O resultado indica qualidades altamente positivas: acolhedor (Anne Lizie de trabalho, ele entrou em minha sala, olhou para a Hirle), amigo (Andréa Cordeiro), atencioso (Ariane Oliveira), comprojanela e disse: ‘É... você não tem uma vista bonita para metimento (Bruna Cornieri), consagração (Adriana Seratto), dedicação o jardim como os seus colegas do outro lado do corre(Diogo Cavalcanti), denominacional (Márcio Nastrini), diligência (Lucas dor, mas, quando essas palmeiras crescerem, os pasLemos), equilíbrio (Vinícius Mendes), incansável (Eduardo Rueda), incensarinhos virão cantar para você.’ Um dia, quando eu tivador (Cristhiane Chagas), integridade (André Vasconcelos, Michelestava muito triste, depois da oração das 9h, ouvi um son Borges e Wendel Lima), intenso (Sueli Oliveira), paixão (Guilherme R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

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passarinho cantando. Olhei e o vi na beira da janela, olhando para mim vem, ano vai e as esperanças / Se dissipam, quais e cantando, o que encheu meu coração de esperança. Lembrei da profeondas junto à praia / Da existência, deixando crucia do pastor Lessa. Chorei de alegria.” éis lembranças / De um drama ante o qual o ser Na Redação, a filosofia administrativa lessana tornou-se lendádesmaia.” ria. Alguns a resumiam em meia dúzia de ditos que eram repetidos Criador de marcantes frases de efeito, ele concluiu, em forma de brincadeira, mas que encerram lições úteis. Um deles: por exemplo, o famoso editorial “Rios e Regatos”, “Cavalo comilão, corda curta.” Princípio: controle de perto os apropublicado na Revista Adventista em fevereiro de veitadores. Outro: “Não deixe a tocha apagar.” Princí1978 e republicado em maio de 2014, pio: comprometa-se totalmente com a missão. Ainda com uma bela metáfora: “Na hidrografia um terceiro: “Aprenda a administrar suas frustrações.” da Obra do Senhor, o que importa não O pastor Lessa Princípio: aceite com resignação os limites impostos é a posição que ocupamos no mapa. pela vida/igreja. Mas que ninguém considere esses O que interessa não é a quantidade de pertence à bordões a expressão de uma filosofia simplista, pois talentos que possuímos, mas o judibiblioteca do Lessa era complexo e sofisticado em sua inteligência cioso uso que deles fazemos. Afinal, Céu e, na volta administrativa. rios e regatos correm para o oceano. E o oceano é Deus.” Conforme frisou o pastor Wilson Sarli em 2014, por de Cristo, será ocasião da aposentadoria do redator-chefe mais longevo um livro aberto da história da CPB (36 anos), que ultrapassou o recorde O LEGADO acerca do poder de Luiz Waldvogel, o Tio Luiz (31 anos), Lessa teve uma “Algumas pessoas recebem um legado carreira abençoada, mas não foi perfeito, como ninguém e o empobrecem; outras o recebem e o da graça de é. Errou em alguns chamados de editores, que criaram enobrecem. O pastor Lessa pertence à Deus problemas. Embora cuidadoso, publicou matérias que segunda categoria”, eu disse durante a geraram controvérsias. Também pecou em não incenticerimônia. Sim, nosso biografado deixou var a formação acadêmica de seu grupo (talvez temesse um legado com muitas facetas. Neste conos vícios do academicismo) e via com certa resistência as mudanças tectexto, legado é aquilo que a pessoa herda ou conquista nológicas e comunicacionais. Em algumas ocasiões, era mais enérgico do e deixa como dom precioso para as futuras gerações. que alguns (e talvez ele mesmo) gostariam. No entanto, sua assertividade, Mais do que um bem material ou intelectual, o autênalém da influência do DNA, nascia de sua forte convicção e da urgêntico legado, que resulta de uma vida criativa e altruísta, cia de sua fé. Essa avaliação não é para criticá-lo, mas para evitar a pura é a dádiva singular de si mesmo para a sociedade; e, hagiografia e valorizar a dimensão humana, como faz a Bíblia em relamais do que sucesso, é a marca da transcendência que ção a seus heróis. Ele foi uma grande figura, apesar de ter sido tão humano confere significado e “imortalidade” ao que você faz como qualquer um. mesmo depois que se vai. Embora alguns estudiosos Lessa também ganhou fama como poeta. Escreveu várias poesias, sugiram que o desejo de deixar um legado esteja enraiespecialmente para celebrar eventos e instituições, o que não significa zado em nós, numa espécie de mistura entre abnegapoesia burocrática. Ele tinha sensibilidade. Em dezembro de 1969, ção e narcisismo, o melhor legado é o que vem sem por exemplo, a Revista Adventista pretensão de grandeza. (p. 3) publicou “A Marcha dos Entre os legados do pastor Lessa, podemos destacar Equipe da Redação da CPB, Anos”, em que ele poetizava: “Ano seu compromisso com a mensagem profética e uma por ocasião da aposentadoria

Fotos: Daniel Oliveira

do pastor Lessa, em maio de 2014. Grupo que ajudou a formar e inspirar

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lealdade incondicional a Deus e à igreja; a disposição de seguir o ritmo da igreja (ou caminhar pari passu com a organização, como ele diria), sem cortejar o tradicionalismo nem buscar o estrelismo da vanguarda; sua dedicação incansável à causa do evangelho, resultando em zelo ímpar e trabalho quase excessivo; sua integridade inquestionável no uso dos recursos da igreja; a formação da uma equipe sólida, que compartilha dos mesmos ideais e segue a cultura centenária da editora; a visão de que é importante dar espaço para cada editor exercer seu papel de maneira criativa e responsável; e a relevante produção intelectual, que continuará falando a leitores antigos e novos. No artigo “Nossa Vida é um Livro Aberto”, na Revista Adventista de junho de 1969 (p. 12), ele comparou a existência a uma obra literária que toda pessoa escreve e cuja criação não exige “conhecimentos gramaticais e literários”. Como termina essa obra? “Cada dia é uma nova página que acrescentamos. O último parágrafo desse livro não termina enquanto nossa vida continua. Somente quando

REPERCUSSÃO

a morte se aproxima, é que se escreve a última frase. Às vezes, essa frase é um incontido arrependimento ou uma reconciliação que muito era necessária. O conteúdo dessa última frase atrai ou repele a aprovação de Deus.” E arrematou aconselhando o leitor a se arrepender e mostrar bons frutos: “Assim procedendo, serás recolhido, na volta de Cristo, para a biblioteca das mansões celestes! E o universo todo lerá a história da redenção em tua experiência.” Notou a metáfora “biblioteca das mansões celestes”? Lessa pertence a essa biblioteca e, na volta de Cristo, será um livro aberto a respeito do poder da graça de Deus. ] MARCOS DE BENEDICTO, pastor e jornalista, é doutor em Ministério pela Universidade Andrews (EUA)

“O que eu mais apreciava no pastor Lessa era seu bom senso, seu equilíbrio, o uso sábio

Essa é uma perda irreparável. Rubens da

das palavras, que traduziam uma profunda

Silva Lessa ocupou o palco da escrita

sabedoria, daquele tipo que inequivo-

como pastor e jornalista por quase 50

camente só poderia advir de uma vida

anos. Ele abençoou milhares de pessoas

impregnada pelo Espírito Santo. Penso

com milhões de páginas que circula-

que, juntamente com o exemplo de vida

ram e continuam circulando mundo afora.

e os milhares de páginas que escreveu, seu

Com a caneta na mão, máquina de es-

maior legado foi uma influência contundente

crever e teclado do computador, Lessa

na formação dos editores que o sucederam. Foi um grande ser

fazia o texto fluir como um rio para falar ao coração de leito-

humano, cuja humildade tinha a proporção de sua grandeza.”

res sedentos da Palavra de Deus. Ele foi um mestre das letras, e seu legado editorial é de valor inigualável para a CPB e a Igreja Adventista.”

Dorival Duarte Diretor clínico do Hospital Adventista de São Paulo

José Carlos de Lima Diretor-geral da CPB

“Meu irmão era meu melhor amigo. Fomos cria-

Fotos: Daniel Oliveira

dos muito próximos um do outro. Talvez Volto no tempo e espaço e me encontro em

ele tenha me ensinado a falar, pois este

1973, em Santo André (SP), precisamente

foi o seu dom desde muito cedo. Desde

na na CPB, quinze anos já percorridos em

tenra idade ele gostava muito de ler e

minha trajetória na editora. Ouço entāo

escrever, tendo sido orador de turma em

que um novo redator tinha sido chamado.

todos os níveis de sua formação. Desen-

O pastor Lessa e sua família foram con-

volvemos gostos muito semelhantes, como

vidados para um almoço em minha casa,

apreciar a natureza e a vida simples do campo. A

com direito a passeio em um dos parques de

personalidade dele era marcada por determinação, coragem e valentia

São Bernardo do Campo. Esse passeio foi o início

frente aos obstáculos da vida. Tinha fome pelo saber e buscava cons-

da amizade entre nossas filhas, que perdurou até a adolescência,

tantemente entender a vontade de Deus para sua vida. A dedicação

quando cada uma delas tomou seu próprio rumo. Também foi o

ao trabalho aprendemos em casa. Na pré-adolescência, quando

início da carreira de um servo do Senhor que labutou fervorosa-

jogávamos futebol na rua e nosso pai viajava para a colportagem,

mente para transmitir por meio da página impressa os conselhos

ele decidiu que estudaríamos à noite e durante o dia trabalharíamos

da Palavra de Deus. Dos 35 anos que trabalhei com ele, ao longo

numa fábrica de saltos de sapatos, sem ganhar um vintém. Era apenas

de 30 ele foi meu chefe. Lessa valorizava seus colaboradores e os

uma forma de termos ocupação e responsabilidade. Glorifico a Deus

incentivava a crescer na profissão e fé. Se ele pudesse ouvir, eu

pela vida do meu querido irmão.”

lhe agradeceria por ter trabalhado ao seu lado.”

Wilson Lessa

Abigail R. Liedke

Médico aposentado, irmão do pastor Lessa,

Ex-editora, trabalhou por 50 anos na Redação da CPB

reside em Campo Grande (MS)

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TECNOLOGIA

ENSINA A CRIANÇA ADVENTISTAS AO REDOR DO MUNDO ENFRENTAM O MESMO DESAFIO: ORIENTAR OS FILHOS A NAVEGAR BEM PELA VIDA DIGITAL

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mbora eu seja responsável pelo laboratório de mídia da Adventist Review e esteja profundamente envolvido com tecnologia de ponta, como filho de missionários que cresceu no leste da África e na ilha de Madagáscar, não fui exposto à alta tecnologia até os 17 anos de idade. Divertia-me construindo brinquedos com sucata. Não trocaria minha infância por nada, pois desenvolveuse em mim a habilidade de pensar criativamente, “fora da caixa”, para encontrar soluções diferentes. No Vale do Silício, na Califórnia (EUA), os altos executivos estão concluindo que a exposição a muita tecnologia é potencialmente nociva para as crianças, gerando dependência de jogos e mídias sociais. Funcionários de empresas gigantes nesse mercado, como Google, Apple e Yahoo, estão enviando seus filhos para escolas em que os professores utilizam uma abordagem mais prática e experimental, menos dependente de dispositivos eletrônicos e que incentive a imaginação. Os recursos digitais fazem parte da nossa vida hoje. Porém, é preciso ensinar nossos filhos a navegar com sabedoria. Leia os próximos depoimentos de pais, educadores e profissionais adventistas que estão buscando usar a tecnologia de modo a colaborar e não comprometer o desenvolvimento integral das crianças.

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DARYL GUNGADOO, engenheiro de tecnologia e software da Radio Adventista Mundial e produtor de vídeo da Adventist Review. Ele vive na Inglaterra

Foto: GettyImages

EXEMPLO DOS PAIS Sou mãe de duas crianças de seis e quatro anos de idade. O acesso que elas têm a qualquer tela é bem limitado. Quando viajamos de avião, permitimos que usem o tablet ou, quando estão doentes em casa, elas podem assistir a uns dois episódios do seu programa preferido. Além disso, só podem assistir ocasionalmente a um episódio de algum desenho ou à história da Lição da Escola Sabatina infantil. Como pais, compreendemos que a tecnologia está e permanecerá presente na vida deles, mas também acreditamos que há tempo e lugar para o consumo de tecnologia. Nesta fase em que estão, precisam brincar ao ar livre, sujar-se e descobrir o mundo com os cinco sentidos. Conforme forem amadurecendo, aí eles saberão que uso farão da tecnologia digital. As telas são altamente viciantes, para crianças e adultos. É fácil cruzar com pessoas que estão olhando para seus celulares, com expressão vazia nos olhos e imersos numa observação sem fim. Muitos deles são pais, com seus filhos pequenos ao lado, desejosos de sua atenção. A pergunta é: se somos viciados, como podemos esperar postura diferente de nossos filhos? É verdade que os dispositivos eletrônicos são “babás” acessíveis e econômicas. As telas fisgam de imediato a atenção de nossas crianças e oferecem alto índice de estímulo, R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

NOSSOS FILHOS NÃO PODEM PERDER A VIDA DIANTE DA TELA NEM DEVEMOS DEIXAR DE AGIR PORQUE NÃO SABEMOS AINDA COMO LIDAR COM ESSA NOVA REALIDADE minando a capacidade criativa delas. Precisamos resgatar algumas práticas de gerações anteriores, em que as crianças exploravam mais o mundo fora de casa, com brincadeiras, pessoas e interatividade reais. Escondidos atrás das telas, estamos perdendo a habilidade de nos relacionar com outros seres humanos; de estar “presentes” numa conversa sem participar de outras 20 interações simultâneas e virtuais. Além de nós, devemos pensar em nossos filhos. Eles não devem ser privados de ter uma infância significativa, com tempo de qualidade com os pais, com quem eles possam brincar, rir, ler, criar, conversar e se sentirem amados. Nosso lar precisa ser um ambiente em que o fruto do Espírito seja desenvolvido (Gl 5:22, 23): amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio. E o consumo sem critérios de tecnologia não é a melhor escolha para o desenvolvimento dessas virtudes. Ao contrário, observamos crianças carentes de habilidades sociais e de linguagem, impacientes, agressivas, com o desenvolvimento emocional atrasado e com problemas de atenção e saúde física. Nossos filhos não podem perder a vida diante da tela e não podemos deixar de agir, mesmo quando não sabemos ainda direito como lidar com essa nova realidade. ASUN OLIVAN, fotógrafa, casada, tem um casal de filhos. Vive na Espanha

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Como diretora de escola, não posso negar que os computadores se tornaram parte integral da educação contemporânea. Na escola fundamental do campus do Newbold College, eles são usados para vários objetivos de aprendizado. Nossos professores planejam suas aulas neles e nosso sistema administrativo também é gerenciado on-line. Na sala de aula, notebooks também estão disponíveis para que as crianças explorem o conhecimento. Porém, sabemos que esses recursos não são usados apenas para o aprendizado. Eles trazem consigo também os inconvenientes do tempo perdido em entretenimento e mídias sociais. Além disso, podem comprometer a segurança e a habilidade social dos alunos. É verdade que esse novo universo digital também abriu a possibilidade de se conectar com pessoas que estão longe e com quem nos relacionamos no passado. Serve também para namorar, ouvir música, assistir filmes e fazer compras. De fato, grande parte da cultura juvenil de hoje é moldada pelos jogos eletrônicos e redes de interação on-line. A tecnologia digital trouxe à vida um novo ritmo. A possibilidade de clicar em inúmeros sites ao mesmo tempo pode nos tornar mais impacientes quanto à interação na vida real. O volume de informação a que estamos expostos também tem impactado o consumo de comunicação e

a própria linguagem, especialmente a escrita. Por exemplo, os emojis costumam substituir palavras inteiras. Nesse contexto, crianças precisam ser ensinadas na escola a diferenciar a linguagem formal da informal que usam nas mídias sociais. Outro tarefa das escolas é orientar os alunos quanto ao aliciamento para fins de exploração sexual e consumo de drogas. Felizmente, no Reino Unido, o aliciamento on-line de crianças tornou-se crime, e a polícia pode prender imediatamente o aliciador com base em mensagens sexuais inapropriadas. Os pais também devem fazer a lição de casa, tendo o controle do que os filhos acessam. Afinal, ninguém gostaria de ter a presença de alguém estranho em casa, ainda que seja apenas virtualmente. Embora o uso das novas tecnologias represente ameaças, elas vieram para ficar. E se forem bem utilizadas, podem ser extremamente valiosas para criar e aprender coisas incríveis. O problema não são os dispositivos nem a web, mas a maneira de nos apropriarmos disso. Controlar e não ser controlado é a escolha mais importante a ser feita nesse contexto. Devemos ensinar nossos filhos sobre a importância de gerenciar seu tempo, além de boas maneiras digitais e como se manter seguro neste novo mundo disponível a um clique. JAKI CRISSY, diretora da escola fundamental do campus do Newbold College, no Reino Unido

JOGOS NEM SEMPRE SÃO BRINCADEIRA Como pai e empreendedor que lançou uma animação sobre Moisés para crianças, a melhor coisa que posso fazer é garantir que seja saudável o que criei e o que permito meus filhos consumirem. Embora o uso dos dispositivos eletrônicos já traga em si riscos para a saúde física, como o impacto no desenvolvimento dos olhos e danos ao tecido biológico por causa da radiação, o conteúdo que neles consumimos ainda é mais perigoso, pois tem que ver com direcionamento moral.

O INTERNATO QUE CONFISCA CELULARES Gerald Klingbeil, editor associado da Adventist World, conversou recentemente com Delwin García, diretor do Colégio Adventista dos Grandes Lagos, em Michigan (EUA). O regulamento desse internato limita o acesso dos alunos aos dispositivos móveis no campus. Saiba por quê. 20

O que motivou a diretoria da escola a tomar essa decisão? Os smartphones são supercomputadores que levamos no bolso. Eu mesmo tenho um e faço muitas coisas com ele. Porém, esses aparelhos podem ser destrutivos e uma grande distração para nossos jovens, sendo que muitos deles chegam viciados em pornografia, mídias sociais e games. É uma maneira de ajudá-los a evitar a tentação de ter uma tela o tempo todo diante dos olhos.

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Foto: GettyImages

TECNOLOGIA: AMIGA OU INIMIGA?


Quando pensamos em mídias para crianças, devemos atentar para duas questões básicas: tipo de produção e enredo. Deve-se evitar os conteúdos que têm muitas luzes piscando, música muito acelerada e complexa, e cenas muito rápidas (com menos de 20 segundos), porque podem provocar déficit de atenção em crianças pequenas. Tecnologias como a realidade virtual, por sua vez, podem oferecer um consumo mais natural, tendo em vista que os espectadores controlam o enquadramento e o dispositivo funciona como um portal de observação do mundo real. Quanto ao enredo, os perigos são mais sutis. Os pais devem analisar se a ênfase da produção está mais no entretenimento vazio ou na moral e no valor educativo da história. Podem observar também se os protagonistas são retratados de maneira atrativa e positiva, mesmo quando assumem uma postura de rebeldia. Precisamos ensinar nossos filhos a rejeitar o que é errado e escolher o que é correto. Isso é importante porque pesquisas têm apontado que, quando nos envolvemos numa história, nossos filtros morais são suspensos e a mensagem vai diretamente para nosso cérebro. Na prática, temos dificuldade de diferenciar o correto do errado, o fato da ficção. De certa maneira, consumir mídias audiovisuais e digitais é como sonhar, só que totalmente acordado. A ação que vemos na tela é traduzida pelo nosso subconsciente como algo que estamos fazendo. Isso inclui as cenas de violência dos games, por exemplo, nas quais o jogador comete “crimes” que não faria no mundo real. É verdade que muitos pesquisadores não reconhecem esses perigos, mas como cristãos temos responsabilidade a respeito do que contemplamos. KARL DA SILVA, designer e produtor de vídeo. Vive na Escócia

A MÍDIA DIGITAL PODE MUDAR A CULTURA Fui criado numa época em que os livros da biblioteca tinham cartões em que a data de devolução da obra era controlada por um carimbo. De um tempo em que a maior autoridade

E como vocês aplicam essa regra? Os pais concordam com nosso regulamento e muitos deles demonstram alívio e gratidão. Os funcionários também nos apoiam. O maior desafio é fazer os estudantes entenderem que podem viver 25 dias do mês sem celular. Até hoje, nenhum aluno morreu por causa disso. A realidade é que, após algumas semanas ou meses, vários estudantes nos procuram dizendo que, sem o celular, conseguiram construir amizades mais significativas.

sobre cultura geral era a Enciclopédia Britânica. Hoje, os estudantes pesquisam no Google, YouTube, Wikipédia e mídias sociais. Nas ilhas do Sul do Pacífico, a revolução digital causou um impacto sobre toda a sociedade, afetando a própria cultura nativa. Muitas diferenças triviais ou questões familia res que eram resolvidas face a face, agora ganham visibilidade pública na web. Falo a partir da minha experiência como um nativo fijiano sobre um fenômeno global que deve ser compreendido e que pode ser analisado a partir de vários ângulos. O consumo da mídia digital aqui nas ilhas do Sul do Pacífico criou uma geração de consumidores insaciáveis. Eles estão sendo bombardeados por propagandas sobre tecnologia, roupas, alimentos, veículos e atividades culturais. Muitos podem pensar que a vida por aqui seja mais lenta, tranquila e simples. Isso pode ser verdade em alguns lugares mais isolados, mas para os que moram nos centros urbanos dessa região e têm um plano de internet no seu celular o mundo está acessível nas mãos. As crianças e jovens das ilhas eram vistas, mas não ouvidas. Com o acesso às plataformas digitais, porém, elas tiveram sua voz amplificada, ainda que não saibam lidar direito com isso, como a maioria dos jovens ao redor do planeta. Por um

Você acredita que dessa maneira os alunos são mais bem preparados para viver numa cultura saturada de tecnologia e comunicação? Não negamos que estamos no século 21; por isso, aqui eles têm acesso aos computadores nos laboratórios, às ligações gratuitas no telefone fixo dos dormitórios e podem conversar com os familiares via Skype. Os alunos do último ano do ensino médio têm computador no quarto, de onde podem acessar mídias sociais e e-mail. A diferença é que os computadores são de responsabilidade da escola, logo filtramos o que eles podem acessar.

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Quando você conversa com ex-alunos, percebe que eles desenvolveram resiliência? Percebemos que o mês inicial dos alunos serve para “desintoxicação” digital. O nível de distração deles abaixa e aumenta o de concentração. E é disso que precisamos para desenvolver o caráter deles. Somos uma escola adventista, nossa preocupação não pode ser apenas acadêmica. 21


lado, essas novas tecnologias ajudaram a “nivelar”, para o bem e o mal, os jovens das ilhas com os de outras partes do mundo. Os adolescentes daqui são menos dependentes em jogos do que os australianos e neozelandeses, mas caminham para a mesma direção. A tecnologia digital também tem mudado algumas práticas culturais, como o anúncio de um noivado, o nascimento de um bebê e a morte de alguém. Na cultura tradicional, existem alguns protocolos para isso. Contudo, nas mídias sociais a dinâmica é um pouco diferente. A questão é que a tecnologia digital veio para ficar e os pais dessa região do mundo, que foram criados numa cultura tradicional, agora precisam aprender a lidar com os filhos que experimentam essa nova realidade. Vejo, por exemplo, que muitos jovens da igreja têm usado esses recursos para atrair amigos para os caminhos de Deus. Por isso, os pais e os educadores que trabalham com crianças e adolescentes devem se interessar em compreender o que seus filhos e alunos estão fazendo com esses recursos, a fim de instruí-­los no caminho em que devem andar. ]

ADORAÇÃO DESCONECTADA Tenho ido ali para orar por mais de meio século. Para mim, aquele lugar é meu lar espiritual, mais do que qualquer outro templo que frequentei ou no qual preguei. Porém, ali não há outro sistema de som a não ser o vento sussurrando pelos pinheiros gigantes que cercam o “santuário”. E não há um pregador ao microfone, embora eu possa ouvir as palavras do próprio Espírito Santo, dizendo-me que devo me aquietar e me lembrar de quem é Deus (Sl 46:10). Ali não há sistema de ar condicionado para aliviar o calor das manhãs de verão nem lareira a gás para oferecer ar quente com controle de umidade sob a neblina gelada do inverno. A iluminação é antiga: foi providenciada pelo Criador milênios atrás, quando ele pendurou os luzeiros no Céu (Gn 1:16). Não há também tela de alta definição no saguão, anunciando o horário do almoço na igreja e das atividades do ministério dos homens, nem placas com letreiros piscando na rua, comunicando qual será o sermão da semana seguinte. Ali, na encosta que olha para o poente, acima das paisagens de verde luxuriante da terra que amo, tenho ido adorar o Senhor desde que meus pais me levaram lá pela primeira vez, quando eu tinha nove anos de idade. Atraído pela simplicidade e tranquilidade do lugar, tenho voltado ali dezenas de vezes para orar, geralmente sozinho, nas várias estações do ano. Esse lugar de adoração ao ar livre – “Catedral de Pinheiros” como é chamado – tem sido o lugar em que tenho ido buscar o Senhor, Aquele que existe antes de toda nossa tecnologia e que sobreviverá depois dela. Pois, na verdade, o melhor que podem fazer nossos templos com luzes, microfones, carpetes e ar condicionado é obscurecer a grande e indomável realidade de Deus. Se não somos confrontados com nossa real estatura no Universo de Deus, corremos o risco de fazer um deus à nossa própria imagem, tão reduzido

LITIANA TURNER, diretora associada do

que caiba convenientemente na tela de nosso celular ou tablet.

Ministério de Discipulado da Divisão do Sul do Pacífico da Igreja Adventista. Ela vive na

BILL KNOTT, editor da revista Adventist World

Austrália

O QUE VOCÊ PODE FAZER? 1. Avalie que tipo de mídia e conteúdo pode atrair e instruir melhor seu filho. 2. Dê o exemplo no uso da tecnologia.

tempo de qualidade às crianças. 4. Seja seletivo e intencional. Existem coisas boas no mundo digital. 5. O tédio faz parte da vida das crianças. A criatividade também é cultivada quando elas têm que descobrir maneiras de se divertir. 22

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Foto: GettyImages; Cortesia do autor

3. Não use as telas como “babás” digitais. Dedique


PERSPECTIVA

NA MAIOR PARTE DO TEMPO, OS PASTORES VIVEM NO “MODO LIGADO”, MAS, NO FUNDO, SE SENTEM SOLITÁRIOS E PRESSIONADOS

PASTORES TAMBÉM SOFREM PRECISAMOS FALAR SOBRE ESGOTAMENTO, DEPRESSÃO E SUICÍDIO NO MINISTÉRIO ADVENTISTA. SAIBA COMO OS MEMBROS PODEM APOIAR A FAMÍLIA PASTORAL GERALDO A. KLINGBEIL

á alguns meses, deparei-me com uma notícia trágica. “Igreja na Califórnia fica chocada após pastor cometer suicídio”, criticou a manchete. Por um momento, meu coração bateu mais rapidamente. Andrew Stoecklein, pastor da Igreja Inland Hills, em Chino, Califórnia (EUA), faleceu após tentativa de suicídio no dia anterior. O site da igreja mostrou um pastor jovem e dinâmico com uma esposa maravilhosa e três filhos pequenos. Que tipo de pressão, dor e mágoa deve ter levado esse jovem homem de Deus a entrar no vazio irreversível do suicídio? Não gostamos de falar sobre esgotamento, depressão ou suicídio quando se trata do ministério pastoral adventista. No entanto, todos esses problemas e doenças emocionais também são uma realidade entre nossos ministros. Líderes espirituais, pastores dinâmicos, pregadores apaixonados, exímios evangelistas — todos eles enfrentam também os desafios contemporâneos.

Foto: GettyImages

H

Pastorear é difícil e, às vezes, pode ser muito solitário. Na maior parte do tempo, os pastores vivem no modo “ligado”. Eles precisam ser pastores que cuidam constantemente de um rebanho diverso e muitas vezes ferido. De um rebanho que também tem altas expectativas em relação a ele. Esperamos que sejam bons gestores, que administrem a estrutura e a manutenção do prédio da igreja; que sejam missionários ousados no contato com a comunidade, alcançando os perdidos; e que dominem bem as técnicas de comunicação nas mídias sociais, a fim de expandir sua pregação para o mundo digital. Sou pastor ordenado e, apesar de não estar agora liderando uma igreja em tempo integral, muitas vezes sinto-me esmagado pelas necessidades que vejo ao redor: na minha congregação local e na igreja como um todo. Portanto, o que nós, membros de uma congregação, podemos fazer para ir além do diagnóstico? A seguir estão quatro sugestões práticas.

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1. Manifeste sua apreciação pelo pastor. Diga com frequência aos pastores que influenciam sua vida quanto eles são apreciados. Sei que a grande maioria dos membros ama e aprecia seus líderes, mas estamos dizendo isso a eles? Quase sempre o pastor ouve os membros quando eles estão insatisfeitos ou em conflito, mas o feedback positivo é importante para quem experimenta pressões constantes. Isso não significa deixar de discordar dele, mas manter um relacionamento fraternal. 2. Acolha a família pastoral. Receba-a no seu coração e, se possível, em seu lar. Quando foi a última vez que você convidou a família pastoral para uma refeição fora da agenda? 3. Ore diariamente por ele. Acontecem coisas maravilhosas quando oramos intercessoriamente. Deus nos transforma a ponto de criticarmos menos os outros. 4. Apoie o ministério dele. Segure os braços do pastor quando for necessário. Ele não é super-herói; comete erros e tem suas fragilidades. Às vezes, apoiá-lo signifique se oferecer para cuidar dos três filhos dele, a fim de que ele e a esposa tenham uma noite a dois. Os membros da igreja são a “maioria silenciosa” que pode se levantar em apoio ao seu pastor, que pode estar se sentindo pressionado, solitário e depressivo. Vá e faça isso antes que a gente leia outra manchete dolorosa. ] GERALD KLINGBEIL é editor associado das revistas Adventist Review e Adventist World

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VISÃO GLOBAL

Continue avançando

A VERDADEIRA MEDIDA DO SUCESSO DA IGREJA É ENCONTRADA EM SUA DEVOÇÃO INABALÁVEL A CRISTO E NO SEU COMPROMISSO CORAJOSO COM A MISSÃO TED WILSON

omo povo remanescente de Deus nestes últimos dias da história da Terra, nunca foi tão importante trabalharmos juntos. Quando vemos os sinais da vinda de Cristo se intensificarem, torna-se cada vez mais evidente a necessidade de unidade entre nós. Nunca devemos desistir de caminhar com Cristo, pois a Bíblia mostra que abandonar a Deus e Sua Palavra pode resultar em consequências desastrosas. Quando Eva se desviou da Palavra de Deus, tornou-se vulnerável aos enganos da serpente. Quando a esposa de Ló voltou-se para trás, uma única vez, para se despedir de seu antigo lar, ela perdeu a vida. Quando os filhos de Israel se recusaram a

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Foto: Brad Barmore

entrar na terra prometida e voltar para o Egito, acabaram sendo enterrados no deserto. Em contrapartida, devemos fazer como Paulo, que, esquecendo-se das coisas que para trás ficaram, avançou para as que diante dele estavam: “o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Fp 3:13, 14). Essa foi também a direção escolhida por Abel, Enoque, Noé, Abraão e Sara, que morreram na fé, ainda que não tivessem obtido as promessas. Eles caminharam olhando para a frente e o alto, “confessando que eram estrangeiros e peregrinos sobre a terra” (Hb 11:13). Deus queria que Seu povo escolhido tivesse um compromisso inabalável com Ele e com a compreensão sincera de Sua Palavra (Dt 5:33). Enquanto Seus filhos foram irredutíveis na devoção ao Senhor e à Sua Palavra, o sucesso deles foi garantido. No entanto, repetidamente eles foram paralisados pelo medo, deixando de avançar pela fé (Nm 14:3, 4). SÃ DOUTRINA OU DESEJOS PRÓPRIOS? Séculos depois, Paulo orientou Timóteo a pregar a sã doutrina em vez de fábulas (2Tm 4:3, 4). É importante notar que tanto no Israel antigo como na história da igreja cristã o povo de Deus nunca teve problema em se submeter a uma liderança que cedesse à tentação de desobedecer aos mandamentos do Senhor e voltar para o mundo do qual fora liberto. Mas não pode ser assim. Nunca devemos nos desviar da direção para a qual o Senhor nos conduz. À medida que a corrente moderna se apressa na direção da destruição, é preciso permanecer firme sobre a rocha sólida das Escrituras. Isso dará a percepção de que estamos nos afastando da sociedade. Porém, nossa prioridade deve sempre ser buscar a aprovação de Deus. A fidelidade constante a Cristo e Sua Palavra só é possível por meio do poder do Espírito Santo. O nível de vitalidade espiritual que somos chamados a experimentar não é algo que possa ser alcançado pelos esforços humanos. É a submissão ao Espírito que nos guiará “até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo” (Ef 4:13). Aquele que nos chama individualmente é o mesmo Deus que estabeleceu a Igreja Adventista do Sétimo Dia como Seu povo remanescente com a missão de proclamar as três mensagens angélicas (Ap 14:6-12). Segundo Ellen White, pioneira da igreja, esse objetivo abrangente e aparentemente intransponível deve ser R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

O PRIMEIRO PASSO PARA A CONCLUSÃO DA MISSÃO É, NA REALIDADE, SAIR E TRABALHAR realizado de maneira organizada, com a cooperação dos servidores da denominação e dos membros voluntários. Sem esse esforço integrado, a missão de Deus na Terra não será concluída (Serviço Cristão, p. 68). HORA DE TRABALHAR Se queremos ver Jesus voltando em nossa geração, devemos conciliar os grandes ideais pelos quais ansiamos e os deveres práticos à nossa frente. Devemos concluir que o primeiro passo na terminação da missão é, na realidade, sair e trabalhar. Como também alertou Ellen White, Deus não tem preguiçosos entre Seus servos. Por isso, cada um deve reconhecer que sua atitude individual afeta a caminhada da igreja como um todo (Serviço Cristão, p. 10). Dessa maneira, falando de modo prático, você deve inspirar a Escola Sabatina de sua igreja comparecendo pontualmente à reunião, com sua Bíblia e guia de estudos preenchido, a fim de dialogar com seus irmãos sobre a Palavra de

Deus. Que os membros mais antigos vejam os jovens nos cultos de oração intercedendo por outros diante do trono da graça de Deus. Sirvam aos menos privilegiados sendo voluntários no ministério de assistência social da igreja. Distribua literatura evangelística por onde quer que você vá. Peça que a direção de sua escola adventista destine ao treinamento para o evangelismo na comunidade o tempo, a energia e o dinheiro gastos por um ano com as competições esportivas. Tenha voz ativa na direção de sua igreja, compareça às comissões e, quando nomeado para alguma função, aceite-a com responsabilidade, seja a tarefa grande ou pequena. Se a Igreja Adventista do Sétimo Dia está perseguindo o ideal do Senhor de ser Seu remanescente no tempo do fim, não apenas “nós” como denominação, mas você e eu, individualmente, devemos trabalhar para Cristo, servindo ao próximo. Isso ocorerrá se permitirmos que o Espírito nos transforme à semelhança de Jesus e, assim, o caráter de Cristo será visto no que fazemos, e não meramente no que não fazemos. De acordo com Ellen White, Cristo voltará quando Seu caráter for perfeitamente reproduzido em Seu povo. Quando os que professam o nome do Senhor produzirem frutos que O glorifiquem, o mundo será rapidamente semeado com o evangelho (Parábolas de Jesus, p. 69). A chuva serôdia cairá em breve e capacitará aqueles que se submeterem completamente a Ele. Cristo em breve virá. Ele está chamando cada um de nós para que avancemos em fé e para que façamos o sacrifício pessoal que nos compete como igreja missionária que devemos ser. ] TED WILSON é presidente mundial da Igreja Adventista. Você pode acompanhar o líder por meio das redes sociais: Twitter (@ pastortedwilson) e Facebook (fb.com.br/ pastortedwilson)

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DEVOCIONAL

O ÚLTIMO PARALÍTICO DE JERUSALÉM

QUAL ERA A LIGAÇÃO DELE COM OUTROS DOENTES A QUEM JESUS CUROU? DANIEL BOSQUED

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Foto: Kasper Rasmussen

lguma vez você já perdeu uma grande oportunidade? Teve a impressão de que várias coisas boas estavam acontecendo com as pessoas ao seu redor, menos com você? Já sentiu que Deus abençoou a todos, mas Se esqueceu de você? Há uma história na Bíblia que pode nos ajudar a lidar com esses sentimentos. Sabemos que o homem paralítico de Atos 3 nasceu nessa condição e tinha mais de 40 anos de idade quando foi curado por Pedro e João, discípulos de Jesus (At 4:22). Sabemos também que todos os dias ele mendigava à porta Formosa do templo de Jerusalém. Ele pode ter sido uma das poucas pessoas na cidade que não foram alcançadas pelo toque curador de Jesus. UMA POSSÍVEL CONEXÃO Antes de revisarmos essa história, gostaria de relacioná-la com outros relatos sobre o ministério de Cristo registrados nos evangelhos. O homem curado por Jesus no tanque de Betesda, por exemplo, estava doente havia 38 anos quando se encontrou com o Mestre (Jo 5:2-9). Jesus Se aproximou dele e o curou após um breve diálogo. A cura veio com uma simples ordem do Mestre: “Levanta-te, toma o teu leito e anda” (v. 8). Um detalhe importante dessa história é que foi Jesus quem abordou o enfermo. Normalmente, os que estavam doentes eram levados até Cristo ou alguém intercedia por eles junto ao Mestre. No entanto, nessa ocasião, de tantas pessoas doentes esperando encontrar a cura no tanque de Betesda (v. 3), Jesus o escolheu. Fico impressionado com os possíveis elos que existem entre o relato de João 5 e Atos 3. Primeiramente, o tanque de Betesda estava em Jerusalém, e o paralítico que ali foi curado estava doente havia 38 anos. Talvez ele tivesse a mesma idade do paralítico de Atos 3, pois é dito que a idade dele era de 40 anos pouco tempo depois da morte de Jesus (At 4:22). Talvez também o paralítico curado por Pedro e João houvesse estado em Betesda, entre a multidão de “enfermos, cegos, coxos e paralíticos" (Jo 5:3). Quando Jesus andou por Betesda, antes de chegar ao paralítico que Ele curou, passou por outros doentes, certamente por outros paralíticos também. Ele andou ao lado das camas dessas pessoas, ouviu o clamor delas, mas não as curou. Por quê? Ellen White, pioneira e profetisa adventista, comenta que naquele dia Jesus queria curar mais pessoas. Na verdade, Ele queria ter curado todos, mas, pelo fato de ser sábado, Cristo entendeu que tamanha demonstração de poder iria gerar preconceito e oposição dos judeus, a ponto de interromperem Seu ministério (O Desejado de Todas as Nações, p. 201 e 202). Sabemos que as ações de Cristo não eram impensadas e que Ele não colocaria em risco o andamento de Seu ministério. Porém, por que Ele escolheu curar aquele paralítico R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

e não outro? Novamente o quadro mais amplo apresentado por Ellen White pode nos ajudar. Ela comenta que o caso daquele pobre homem era desesperador, porque as contínuas frustrações dele em relação à cura “estavam-lhe consumindo rapidamente as restantes energias” (p. 202). Jesus conhecia todos os casos que escolhia. Fico imaginando se os dois paralíticos em questão não se conheciam. Se eles tivessem se encontrado, posso imaginar a conversa. O paralítico de Atos 3 teria se surpreendido com a cura do homem de João 5 e desejado também a mesma bênção. Talvez tenha começado a perguntar por Jesus e procurado por Ele. Ao que parece, ele nunca se deparou com o Mestre. Os evangelhos registram pelo menos duas circunstâncias em que Cristo curou várias pessoas de uma vez em Jerusalém. Ambas as curas ocorreram no templo: uma no início e outra no fim do Seu ministério (Jo 2 e Mt 21). Ellen White escreveu sobre a primeira ocasião. Depois de purificar o templo, Jesus atendeu todos que foram a Ele, e cada pessoa que O procurou foi curada, não importava sua doença (p. 163). A escritora acrescenta que aqueles que voltaram ao pátio do templo naquele dia “ficaram paralisados diante da maravilhosa cena. Viram os enfermos curados, os cegos restaurados à vista, os surdos ouvindo e os coxos saltando de prazer” (p. 592). Dessa vez, também, parece que o paralítico de Atos 3 não estava presente novamente. Talvez ele tivesse razões para pensar que nunca estava no lugar certo e na hora certa. OUTRA CHANCE Em algumas ocasiões, Jesus tomou a iniciativa de ir ao encontro de quem 27


necessitava Dele, como a mulher samaritana (Jo 4:4), a cananeia (Mt 15:21) e o endemoninhado de Gadara (Mc 5:1). Contudo, o paralítico de Atos 3 não se encaixa em nenhum dos grupos que foram curados por Jesus: (1) as pessoas que Ele procurou, (2) as que foram até Ele, e (3) as que precisaram da intercessão e ajuda de alguém para chegar próximo ao Mestre (Mc 2). Com o auxílio de Ellen White, temos informações adicionais sobre esse personagem bíblico. “Esse infeliz havia durante muito tempo desejado ver Jesus para ser curado, mas encontrava-se quase ao desamparo, e estava muito afastado do cenário dos labores do grande Médico” (Atos dos Apóstolos, p. 57). O caso dele era desesperador. Jesus não o havia procurado, ele não havia encontrado Jesus e ninguém o tinha levado até o Mestre. De acordo com Ellen White, o último esforço dele para encontrar o Mestre foi implorar aos seus amigos que o levassem à porta do templo. Porém, quando ali chegou, soube que Jesus havia sido morto cruelmente (p. 57 e 58). Imagine como ele se sentiu. Posso imaginá-lo gritando: “Por que, Senhor? Todos foram curados, menos eu!” Quarenta anos sem poder andar. Quarenta anos de sonhos quebrados. Quarenta anos tentando ser curado. Ele sempre esteve no lugar errado. E, quando finalmente achou que poderia chegar perto de Jesus, descobriu que sua chance de voltar a andar havia sido crucificada junto com o Nazareno. Depois de lamentar por um bom tempo, talvez tenha aceitado com resignação que nunca seria curado. Enxugando as lágrimas, talvez tenha decidido não ser um fardo para ninguém. Viveria se mantendo de esmolas para o resto da vida. “Por favor, levem-me ao templo”, provavelmente tenha pedido aos amigos. Quando lemos a história dessa maneira, tudo faz sentido. O homem era levado todos os dias à porta do templo e, por isso, quando ele viu Pedro e João, pediu-lhes esmolas (At 3:3). Veja, ele não pediu um milagre, apenas esmolas. Ele queria sobreviver.

E ele prestou atenção, esperando receber alguma coisa deles. Então Pedro disse que não tinha prata nem ouro (v. 5 e 6). Aquilo deve ter sido a “gota d’água”, uma piada de mau gosto para o paralítico. Porém, gosto de imaginar que Pedro também tenha dito: “Não tenho nada do que você está esperando, porque sou um viajante do tempo. Estou aqui para lembrá-lo do seu sonho. Vim para lhe dar o que sempre procurou. Trouxe algo de Jesus de Nazaré para você.” Ellen White acrescentou que o semblante do coxo descaiu ao ouvir a primeira parte da resposta de Pedro, mas logo seu rosto tornou-se radiante quando Pedro ordenou que, em nome de Jesus, ele se levantasse e andasse (Atos dos Apóstolos, p. 58). O quê? Em nome de Jesus? Cristo estava vivo? “E de um salto pôs-se em pé e começou a andar. Depois entrou com eles no pátio do templo, andando, saltando e louvando a Deus” (At 3:7-9). Que história maravilhosa!

O PARALÍTICO NÃO PEDIU UM MILAGRE, APENAS ESMOLAS. ELE QUERIA SOBREVIVER

ALGO MELHOR No entanto, quando os discípulos se aproximaram, Pedro disse ao homem: “Olhe para nós”. 28

CURA PARA TODOS Não sei como nem quanto você se identifica com essa história. Talvez tenha sido curado imediatamente há muito tempo em Betesda. Ou quem sabe alguém o levou até Jesus ou ainda seus verdadeiros amigos pediram a Ele que o curasse. Talvez você esteja como o paralítico de Atos 3, sentado à porta do templo, com seus sonhos desmoronados e o sentimento inegável de que Deus passou você por alto. Se você se sente como o último paralítico de Jerusalém, sua história ainda não terminou. Os caminhos de Deus são inescrutáveis, inatingíveis e incompreensíveis. Pois, quando menos esperarmos, um mensageiro de Deus pode cruzar nosso caminho e falar conosco em nome de Jesus de Nazaré. Por outro lado, nós também passamos diariamente por pessoas que se sentem como aquele paralítico. Pessoas que já não pedem mais um milagre, porque se sentem esquecidas por Deus. Nossa missão, como a de Pedro e João, é lembrá-los, em nome de Jesus, da promessa de que um dia todos poderão caminhar, pular e louvar a Deus. ] DANIEL BOSQUED, PhD, é professor de Novo Testamento na Universidade Adventista del Plata, na Argentina

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BOA PERGUNTA

MORTE ANTES DA QUEDA A VIDA SÓ PASSOU A TER UM FIM DEPOIS DAQUELA ESCOLHA ERRADA NO ÉDEN? ÁNGEL MANUEL RODRÍGUEZ

Foto: Adobe Stock

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ssa pergunta parece ter uma resposta óbvia. Contudo, ela é um pouco mais complexa se pensarmos que não existe unanimidade para a definição de morte. Além disso, aparentemente a Bíblia não considera a vegetação como sendo formada por seres vivos. Portanto, ela não morre, mas simplesmente desaparece. Meu objetivo neste texto não é definir a morte, e sim investigar se a Bíblia indica que havia morte antes da queda moral da humanidade. 1. Pecado e morte. A Bíblia estabelece uma correlação direta entre pecado, morte natural e eterna. Adão e Eva passaram pela morte como resultado de sua rebelião contra o Criador (Gn 2:17). Por causa da escolha deles, o pecado e a morte têm atingido toda a humanidade (Rm 5:12; 6:23). A principal relação entre pecado e morte é a eterna separação de Deus, por ocasião do juízo final (Ap 20:10, 14, 15). Para os pecadores arrependidos, porém, a morte natural é reversível, pois é um “sono” até o dia da ressurreição (Jo 11:11; 1Ts 4:13-18), quando o corpo dos crentes será redimido do poder da sepultura (Rm 8:23; 1Co 15:53-56). 2. Criação e morte. Deus, que é a própria vida, é a única e exclusiva origem de toda a existência. Ele não criou um Universo com vida própria, mas um espaço que teve início e, teoricamente, poderá ter um fim. O Universo não emanou de Deus, não é uma extensão Dele. É Deus que, por meio da Sua presença e poder, sustenta Sua criação. Por isso, a imortalidade não é algo inerente a nenhuma criatura, senão ao Criador (1Tm 6:16) que concede esse dom a quem Lhe convém. Contudo, a intenção de Deus não foi criar seres que tivessem um fim, mas sim seres que fossem eternamente sustentados por Ele. Consequentemente, não havia morte antes da queda moral de Adão e Eva.

3. Vida e morte. Ao chegar a essa conclusão, eu sugeriria que, antes da queda no Éden, a morte era conhecida apenas em nível conceitual, e não em nível experimental. Faz sentido pensar assim se, como sugeri, a criação não for autoexistente. Creio que Deus deve ter oferecido algum tipo de conscientização sobre a natureza das Suas criaturas. Isso pode soar especulação, mas não é. O conceito da morte foi introduzido por Deus antes da queda, quando Ele disse a Adão que ele morreria caso comesse do fruto proibido (Gn 2:17). Além disso, quando mentiu para Eva, a serpente (Satanás) não negou o conceito da morte, mas sim que a mulher efetivamente morreria. Essa é umas das mentiras mais radicais já pronunciadas por uma criatura na tentativa de equiparar um ser criado ao Seu Criador. A verdade é que a morte é o resultado do pecado, mas a vida é o resultado da morte de Cristo por todo aquele que Nele crê (Rm 5:17). ] ÁNGEL MANUEL RODRÍGUEZ, pastor, professor e teólogo aposentado, foi diretor do Instituto de Pesquisa Bíblica

ANTES DA QUEDA NO ÉDEN, A MORTE ERA CONHECIDA APENAS EM NÍVEL CONCEITUAL, E NÃO EM NÍVEL EXPERIMENTAL

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HISTÓRIA

Sua biografia importa O CENTRO DA MEMÓRIA ADVENTISTA NA ARGENTINA SERVIRÁ PARA PRESERVAR A BIOGRAFIA DOS PIONEIROS E DOS QUE CONTINUAM A ESCREVER NOSSA HISTÓRIA

A

sede da Ig reja Advent ist a na Argentina inaugurou seu centro histórico na Universidad Adventista del Plata, em outubro do ano passado. Quem visita esse espaço pode aprender a respeito da história da denominação no país e na América do Sul por meio de relatos e fotos de biografias verdadeiras dos primeiros missionários que migraram para nosso subcontinente no fim do século 19. A razão para contar a história deles, além de resgatar a memória da denominação em terras sul-americanas, é identificar como Deus atuou por meio deles, inspirando assim a geração atual e os futuros adventistas. Esta breve reflexão tem o objetivo de nos lembrar que resgatar a história de um movimento religioso e das pessoas que se sacrificaram por ele pode nos oferecer pelo menos quatro benefícios. AS NARRATIVAS UNEM AS PESSOAS As histórias criam comunidades. Georg Riffel, por exemplo, aceitou a mensagem adventista no Kansas (EUA). Sua convicção na missão adventista era tão forte que ele fez parte do primeiro grupo de missionários a viajar para a Argentina. Quando esses homens e mulheres chegaram ao 30

nosso subcontinente e compartilharam seu testemunho a respeito de sua fé em Jesus e a esperança no breve retorno Dele à Terra, eles escreveram novas histórias. Eles procuraram pessoas com interesses em comum e fizeram amizade com elas. Esses missionários desejavam criar vínculos com aqueles que ansiavam conhecer toda a verdade bíblica e cujo coração ardeu quando ouviram o evangelho. Assim, em cada cidade e grupo étnico com o qual entraram em contato, histórias foram conectadas por aquilo que viveram e compartilharam. AS NARRATIVAS NOS DEFINEM Os primeiros missionários se identificaram como cristãos adventistas do sétimo dia. A biografia deles indica que, de fato, para eles era importante acreditar na inquestionável esperança do retorno iminente de Jesus. Isso definiu como eles enfrentaram os desafios e o legado que deixaram. Quando os primeiros missionários chegaram a Crespo, na província de Entre Ríos, Argentina, onde foi estabelecida a primeira igreja adventista da América do Sul, eles compartilharam seu testemunho com a comunidade. O ousado empreendimento de vir desbravar essas terras abaixo da linha do Equador fez com que portas fossem abertas e que mais missionários

fossem solicitados na época para a sede mundial da igreja. Das histórias desses pioneiros, hoje podemos aprender sobre seus acertos, sucessos, fracassos e erros. Ao analisar a biografia deles, é possível desmistificar a ideia de que foram santos ou superheróis. Podemos enxergá-los em sua humanidade, e ver que, ainda sim, se mantiveram fiéis ao seu chamado. Com a inauguração do centro histórico em nossa universidade na Argentina, vamos procurar ouvir e documentar também outras histórias, oferecendo assim uma oportunidade para entender como os adventistas se enxergam e como são vistos. AS NARRATIVAS DÃO SENTIDO Quando a sede mundial da igreja soube dos desafios diversos que envolviam

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Fotos: Cortesia da autora

SILVIA C. SCHOLTUS


Georg Riffel (à esq.) foi um dos primeiros missionários adventistas na Argentina. Albert Stauffer (dir.), por sua vez, foi um dos primeiros colportores a trabalhar na América do Sul. Ele chegou aqui em 1891

O centro da memória adventista foi inaugurado em 21 de outubro de 2018 na Universidad Adventista del Plata (Argentina). Ao lado, líderes da igreja e colportores por ocasião da inauguração do espaço

alcançar diferentes grupos e países no vasto território da América do Sul, enviou mais missionários. Foram as histórias contadas e vivenciadas pelos primeiros que inspiraram os demais a vir também. Em 1891, os primeiros três colportores a chegar à América do Sul foram Clair Nowlen, Edwin Snyder e Albert Stauffer. Richard Craig teria chegado em 1893. Ele teria sido o responsável por manter uma livraria e liderar os colportores. Craig e sua família se estabeleceram em Buenos Aires, capital argentina, e fundaram uma escola na sua casa. Foi a maneira que eles encontraram para que a vida deles abençoasse a dos alunos. E tal qual uma parede que é erguida tijolo a tijolo, assim foi o começo da igreja na América do Sul. Lucy Post é outro exemplo. Ela foi a primeira mulher solteira a vir para a América do Sul como voluntária. Tinha quase 50 anos de idade quando decidiu ser missionária. Sua decisão foi inspirada pelas histórias que ela ouviu dos missionários. Post chegou em julho de 1895, no meio do inverno no hemisfério sul. Ela passou um tempo com a família do seu irmão, que morava em Nueva Palmira, Uruguai, e, cinco semanas mais tarde, no dia 31 de agosto, iniciou a primeira Escola Sabatina do país, com 20 pessoas que ela vinha visitando desde sua chegada. R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

CADA HISTÓRIA É IMPORTANTE E SINGULAR. SE NÃO FOR CONTADA, UM TESTEMUNHO SERÁ SILENCIADO E SUA MEMÓRIA FICARÁ NO ESQUECIMENTO As histórias que ouvimos e lemos sobre outros nos ajudam a lembrar que não estamos sozinhos. Elas ampliam nossa visão de como Deus pode trabalhar com diferentes pessoas e de variadas maneiras. Aprender com a história alheia é sabedoria e conhecer outra biografia ajuda também a conhecer a nós mesmos. AS NARRATIVAS NOS ENSINAM TEOLOGIA As histórias nos contam como a Palavra Se tornou carne. Ensinam sobre a presença de Deus nas tragédias e nas celebrações da vida. Como adventistas, entendemos que nossas biografias individuais fazem parte da grande narrativa do conflito cósmico entre o bem e o mal: a história da redenção.

Apesar de o plano de Deus ter um alcance universal, nossa história não é insignificante nesse grande quadro. Todos nós desempenhamos uma parte nisso, assim como os missionários no passado. Isso traz mais sentido para nossa existência, esperança em meio à dor e coragem para avançar. Nunca duas histórias são exatamente iguais. É por isso que cada história é tão importante e singular. Se você não contar, ninguém poderá fazer isso. Sua biografia permanecerá no esquecimento. Uma história de vida é um tesouro sagrado, um presente que rejuvenesce todos que leem ou ouvem sobre ela. Nesse sentido, qualquer história, momento ou situação é transcendente. Portanto, as histórias interessantes não ficaram apenas no passado. Certamente em sua igreja local e na região em que mora deve ter muita coisa para ser contada e registrada. A história não termina com o que aconteceu no passado; ela se estende até nosso presente e avança para o futuro. ] SILVIA C. SCHOLTUS, PhD, é diretora do centro histórico da Universidad Adventista del Plata, na Argentina

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VIDA ADVENTISTA

O PASTOR QUE DEU ESTUDOS BÍBLICOS NO MUSEU BRITÂNICO AO SERVIR COMO GUIA TURÍSTICO VOLUNTÁRIO DUSTIN SERNS

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lá, estou liderando um tour gratuito pelas sete principais atrações do Museu Britânico. Vamos visitar 4 mil anos em 45 minutos. Estaremos começando em cinco minutos. Não aceitamos gorjetas.” Foi assim que fiquei em pé na escadaria de entrada de um dos museus mais importantes do mundo recrutando visitantes. “O que você está querendo com isso?”, todos me perguntavam. “Estou terminando meu mestrado e acabei de passar dois meses na Grécia e Turquia fazendo pesquisas arqueológicas. Como vou ficar uma semana aqui em Londres, antes de voltar para os Estados Unidos para terminar meus estudos, pensei que poderia compartilhar com vocês um pouco das minhas descobertas.” O que eles não imaginavam é que eu estava em uma viagem missionária, acompanhado por minha família e um amigo. Durante as manhãs, nossa pequena equipe distribuía milhares de folhetos sobre a Bíblia nas áreas turísticas da capital britânica. Em parceria com uma igreja 32

local, à noite ministrávamos alguns estudos bíblicos na comunidade e, durante as tardes, eu liderava visitas guiadas pelo museu. Meu irmão era meu “assistente”, minha esposa atuava como fotógrafa e meu pai e um amigo “faziam o papel” de participantes da tour. Orávamos para que Deus usasse aquelas visitações para abrir o coração das pessoas à Sua Palavra. O INTERESSE DOS TURISTAS Nossos grupos variavam de oito a 45 pessoas. Por isso, em 12 visitas naquela semana, conduzimos mais de 400 pessoas por artefatos que os ajudaram a entender melhor sete civilizações que têm conexão com a profecia bíblica: (1) Egito, (2) Assíria, (3) Babilônia, (4) Pérsia, (5) Grécia, (6) Roma e (7) Europa. Meu objetivo era usar a história e a arqueologia

para gradualmente validar a confiabilidade do texto bíblico (veja trechos do tour em youtube.com/ user/top7tours). Para o Egito e Assíria, estabeleci conexões entre José e Ezequias. Nos artefatos da Babilônia, apresentei a grande estátua de Daniel 2. Durante todo o restante da visitação, vimos o texto bíblico se cumprindo artefato por artefato. No fim, eu mostrava como a profecia bíblica continua até o futuro, incentivando aqueles turistas a conferir a narrativa de Daniel 2 na Bíblia. Para um estudo mais aprofundado, também oferecemos cursos bíblicos gratuitos do ministério Amazing Facts. Falamos para pessoas de muitos países, culturas e tradições religiosas diferentes. Alguns dos participantes vinham de países em que é ilegal falar abertamente sobre os assuntos que eu apresentava. Foi maravilhoso ver Deus abrindo a mente das pessoas e desafiando sua visão de mundo. LIÇÕES DE EZEQUIAS Quando meu grupo chegou aos relevos de Laquis, contei a história de como o rei assírio Senaqueribe avançou sobre 46 cidades de Judá

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Fotos: Cortesia do autor

Aula no museu


ALGUNS FICARAM CHOCADOS AO SEREM CONFRONTADOS DE MODO INTELIGENTE COM A HISTORICIDADE DO TEXTO BÍBLICO

e conquistou Laquis antes de chegar à capital Jerusalém. Os relevos mostram que Laquis foi devastada pelos assírios. Então, não faltavam mais obstáculos para que os 185 mil soldados de Senaqueribe cercassem e dominassem Jerusalém. Eles enviaram cartas terríveis ameaçando os israelitas, sugerindo que se entregassem em vez de confiar em Deus (2Cr 32:1-23). O rei Ezequias ficou angustiado quando recebeu a carta. Ele a levou para o templo, abriu-a diante do Senhor e orou para que Deus protegesse a nação que Ele mesmo havia escolhido (2Rs 19).

Depois de resgatar a narrativa bíblica, eu mostrava aos participantes do tour o Prisma Taylor ou Prisma de Senaqueribe, pequeno monumento de argila que narra a versão de Senaqueribe dessa história. A inscrição descreve que ele conquistou 46 cidades de Israel e que prendeu o rei Ezequias em Jerusalém “como um pássaro na gaiola”. A pergunta que fica, porém, é: Por que ele parou e foi embora para Nínive? Na manhã seguinte à oração de Ezequias, todos os 185 mil soldados de Senaqueribe foram encontrados mortos (2Rs 19:35). “Vocês podem decidir como eles morreram, mas posso afirmar que não foram mortos pelos soldados israelitas”, eu dizia aos turistas. Alguns ficaram chocados ao serem confrontados de modo inteligente com a historicidade do texto bíblico. Certa senhora inglesa chegou a me perguntar se eu realmente acreditava que a Bíblia é a Palavra de Deus. “Bem, é isso que a Bíblia afirma sobre si mesma”, eu disse. “Essa é uma afirmação ousada e singular, que pode ser uma grande mentira ou verdade. Porém, com base em todas as evidências que estudei, penso que é verdade.” Os artefatos diante dela a instigavam a pensar, quem sabe pela primeira vez, que poderia existir um Deus que Se comunica conosco de maneira clara e confiável. ENFRENTANDO RESISTÊNCIA Deus estava agindo por meio das visitações. No entanto, não demorou para que enfrentássemos resistência. Os funcionários do museu começaram a se incomodar com nossa presença. O próprio museu oferece tours gratuitos, com não mais de seis pessoas. Porém, os nossos grupos eram bem maiores do que isso e eu compartilhava abertamente com eles algumas ideias sobre a Bíblia que não são muito populares.

Dustin Serns (à dir.) serviu por uma semana como guia turístico voluntário no Museu Britânico, em Londres. Seu tour passava por sete artefatos que relacionam civilizações antigas ao texto bíblico R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

A tensão aumentou e no meio da semana houve uma confrontação. Eu e mais 40 pessoas estávamos na frente da estátua de Afrodite, a deusa grega da sexualidade. Ali eu estava explicando que o templo dela em Corinto costumava abrigar de 300 a 1.000 prostitutas cultuais. Falava a eles também sobre um recém-chegado à cidade, chamado Paulo, que apresentou aos coríntios uma visão diferente e surpreendente sobre sexualidade. Quando comecei a ler 1 Coríntios 6, um funcionário do museu, visivilmente desconfortável, pediu que eu parasse minha fala, pois estava obstruindo o caminho dos visitantes. Compreendi o que estava acontecendo. Ele não tinha outro argumento para impedir minha pregação, a não ser que estávamos bloqueando o caminho. Nosso grupo realmente era muito grande para aquele espaço pequeno. Respondi que já estavámos saindo e convidei o grupo para ver a Pedra de Roseta. Certa tarde, dois funcionários do museu participaram do nosso tour disfarçados de visitantes. Percebi que eles tinham rádios escondidos sob o paletó. No fim da apresentação, contudo, um dos guardas foi quem mais aplaudia nossa explicação, dizendo que aquela tinha sido uma das melhores apresentações que ele havia acompanhado sobre Bíblia e arqueologia. Alguns dias depois, dei a ele o livro missionário A Grande Esperança, de Ellen White. Não tivemos mais nenhum problema no museu até o fim daquela semana. Deus garantiu que Sua Palavra fosse ouvida. Na verdade, Ele fala principalmente de pessoas, até mesmo por meio de um guia turístico voluntário, com aparência de adolescente como eu. Deus garantirá que Sua Palavra seja ouvida. Você permitirá que Ele fale por seu intermédio? ] DUSTIN SERNS é pastor da Igreja de Port Orchard, em Washington (EUA)

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MINHA HISTÓRIA

A HISTÓRIA DA MULHER QUE NÃO TEVE FILHOS, MAS QUE ADOTOU 21 ÓRFÃOS PARA DEMONSTRAR A ELES O AMOR DO PAI CELESTIAL DICK DUERKSEN 34

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ona Azaleia era solteira e nunca se casou. Morava em cômodos minúsculos, mas cheios de amor, acima da sua lojinha. Seu estabelecimento comercial estocava coisas simples que as pessoas podiam querer comprar sem ter que andar longas distâncias até as grandes lojas. Sua casa era conhecida como um lugar seguro, e sempre repleta de uma atmosfera transformadora de acolhimento. No dia do seu funeral, o pastor observava as pessoas chegando. Degraus de pedra levavam da rua às largas portas de madeira do templo; degraus antigos, lascados e gastos pelas décadas de uso. Duas diaconisas, com luvas brancas e macias, as únicas peças claras do uniforme de culto preto delas, levavam os R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

Foto: Dylan Nolte

O FUNERAL DE DONA AZALEIA


membros da igreja e convidados aos assentos vazios. Em pouco tempo, os bancos ficaram repletos de pessoas que foram amadas por dona Azaleia. MÃE DE 21 FILHOS A fileira da frente permanecia vazia, reservada para um grupo muito especial que foi conduzido aos seus lugares assim que a música começou a ser tocada. Alguns chegaram sozinhos, outros com amigos, muitos com crianças pequenas, cada um preenchendo um lugar de honra, o mais próximo possível do corpo sem vida de dona Azaleia. Um coral talentoso cantou alguns hinos, os mesmos que Azaleia havia cantado em muitos cultos. A congregação se uniu ao coral, com vibratos elevados que traduziam a dor pela perda de uma boa amiga. O som da música se avolumou a uma altura que as paredes pareciam se expandir e o teto levantar de um modo que todo o Céu podia ouvir. Após muito cântico, longas orações e mais músicas, o pastor, com sua beca especial, caminhou lentamente até o púlpito de madeira. Naquele momento, o templo estava em silêncio, como que preparado para ouvir uma notícia má. “Ela se foi”, começou o pastor. “Um câncer maligno finalmente a tirou de nós. No entanto, mesmo com a saúde física definhando, a luz do amor da dona Azaleia continuava brilhando. Todos vamos sentir saudades dela.” “Todos nós conhecíamos muito bem a dona Azaleia”, continuou o pastor. “E cada um de nós a amava tanto quanto ela nos amava.” Na igreja ecoavam os “améns”, “aleluias” e gritos altos de “obrigado, Jesus.” “Como todos sabemos, dona Azaleia sempre quis ter filhos, mas nunca realizou seu sonho.” A congregação mais uma vez irrompeu em afirmações e expressões de tristeza. Então o pastor levantou os braços para silenciar seu rebanho. “No entanto”, ele sorriu, “a dona Azaleia não enterrou seu dom da maternidade, mas escolheu 21 de nós, 21 filhos sem mãe e pai, 21 filhos que moravam nos guetos de nossa cidade; 21 filhos que necessitavam de amor e que aprenderam que eram filhos de Deus, por que foram adotados como filhos da dona Azaleia.” O pastor se dirigiu para a primeira fileira e cumprimentou os convidados especiais. Só depois de muito tempo a congregação se aquietou, após louvar a Deus, homenagear a dona Azaleia e cumprimentar todos os 21 filhos dela e uns aos outros. Quando finalmente reinou o silêncio, o pastor continuou. R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

DURANTE TODO O TEMPO, ELA CANTAVA E NOS TRATAVA COM AMOR, COMO SE FÔSSEMOS GENTE DE VERDADE RESGATADA DO LIXO “Hoje, como parte mais importante deste culto de amor e adoração, todos os 21 filhos de dona Azaleia vieram para nos contar sobre sua mãe.” Cada um deles foi à frente para contar histórias que todos já conheciam. Nada de novo, pois dona Azaleia havia criado aqueles filhos na segurança daquela congregação. Quando 20 dos filhos haviam testemunhado, o pastor deu sinal para o coral começar a cantar outra vez. Com becas douradas, os coristas cantaram como se o anjo Gabriel tivesse trazido uma legião de outros anjos para cantar com eles. Quando a música terminou, Cindy se levantou. A caçula da dona Azaleia não tinha vindo sozinha. Ao seu lado estava uma garotinha, segurando firmemente a mão da mãe. “Meu nome é Cindy, e sou a 21ª filha da dona Azaleia”, começou ela. “Dona Azaléia me encontrou à noite, atrás de uma caçamba de lixo. Eu estava encolhida em uma caixa de papelão grande, e fazia frio. Muito frio. Eu tinha acabado de dar à luz a uma menininha, sozinha, dentro daquela caixa de papelão. Estava apavorada, pois não sabia o que fazer em seguida. Eu precisava de um pouco de heroína e também de uns trapos limpos, água e fraldas, mas não tinha dinheiro. Eu estava juntando coragem para sair naquele frio e encontrar algum homem que talvez me pagasse o suficiente para comprar algumas fraldas.” A igreja estava em absoluto silêncio, numa pausa estarrecedora como a que antecede uma grande

tempestade que se aproxima de nossa casa. “A dona Azaleia me encontrou ali, bem ali. Ela devia saber, pois chegou com um cobertor limpo e um pouco de água quente.” “Ela me chamou de filha e disse que eu devia ir com ela. Levou a mim e meu bebê pela rua e degraus acima até sua casa. Estava tudo limpo. Era a casa mais linda que eu já tinha visto. Ela encheu a banheira com água quente, deu banho em mim e no meu bebê, nos vestiu e nos deu o que comer. Durante todo o tempo ela cantava e nos tratava com tanto amor como se fôssemos gente de verdade, merecedoras de alguma coisa.” Quase todos na igreja estavam chorando enquanto Cindy falava. Todos lembrando da sua própria história quando sentiram o amor intencional da dona Azaleia. “Levou bastante tempo”, Cindy finalmente continuou. “Dona Azaleia me ajudou a finalmente me libertar das drogas e trabalhou todos os dias comigo para que meu bebê crescesse e se tornasse uma garotinha feliz e saudável.” “Ela me ajudou a estudar e cuidou da minha filha enquanto eu estava na escola. Ela conseguiu um emprego decente para mim aqui na cidade. E todos os dias ela me ensinou sobre Jesus, fazendo também com que eu me sentisse parte da família desta igreja.” “Não, dona Azaleia não teve nenhum filho. Mas eu, a número 21, sou sua filha mais sortuda, pois, por meio do amor dela, conheci o de Jesus.” A igreja irrompeu em alegria. Todos levantaram as mãos em adoração, gritaram “aleluia” e cantaram “Graça Excelsa” (HASD, 208) tão alto como nunca tinham cantado antes. “Dona Azaleia nunca teve filhos”, disse o pastor. “Porém, sua mansão celestial estará repleta dos filhos que ela adotou!” “AMÉÉÉÉÉÉÉÉM!” ] DICK DUERKSEN é pastor e mora em Portland, Oregon, nos Estados Unidos

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BEM-ESTAR

PARA INFLUENCIAR OS FILHOS NO USO CORRETO DAS MÍDIAS SOCIAIS, OS PAIS PRECISAM DAR O EXEMPLO, OTIMIZANDO O TEMPO E ESTABELECENDO HORÁRIOS PARA O USO DA TELA

PARA SEU BEM-ESTAR E DE SEUS FILHOS, É PRECISO TER UMA RELAÇÃO SAUDÁVEL COM A TECNOLOGIA PETER N. LANDLESS

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stamos vivendo na era mais conectada de todos os tempos. E muitos pais, especialmente de adolescentes, se perguntam se não estão perdendo a “batalha” de ensinar os filhos a ter uma relação saudável com as telas. Nós insistimos com eles: não desistam. Precisamos ensinar as novas gerações a se relacionarem com mais profundidade. Recentemente vimos uma família entrar no saguão do aeroporto — mãe, pai e quatro filhos com idades que variavam de 4 a 16 anos. Enquanto circulavam pelo saguão procurando assentos, o garotinho mais novo, balançando irritado seu smartphone, gritava repetidamente: “Preciso de Wi-Fi!” Os filhos mais velhos não se importaram, pois já tinham colocado seus fones de 36

ouvido e se “desconectado” do mundo ao redor. As mídias sociais são úteis para manter os amigos e a família que estão longe atualizados sobre nossa vida. Servem também para facilitar o acesso às notícias e informações; porém, esses recursos precisam ser usados com critério. Para toda vantagem que a web oferece, também existem desvantagens e perigo. O mau uso dessas tecnologias pode levar à depressão, dependência da tela e expor o usuário ao bullying cibernético e à pornografia. Por isso, cremos que alguns pontos precisam ser considerados. Primeiro, não vá para a cama consultando o celular. Isso pode atrapalhar seu sono, pois os sinais de alertas de mensagem podem lhe dar a sensação de que está “perdendo” o que está acontecendo. E uma noite mal dormida significa

PETER LANDLESS é cardiologista e diretor do Ministério da Saúde da sede mundial adventista em Silver Spring, Maryland (EUA)

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Foto: GettyImages

DOMINE A TELA

cansaço no dia seguinte. Por sua vez, o acúmulo de noites mal dormidas aumenta a ansiedade, afeta a autoestima e nos expõe à depressão. Um segundo ponto a ser considerado é que a família precisa ter um tempo regular para conviver sem esses dispositivos. As refeições conjuntas e o culto familiar são boas oportunidades para isso. E, para influenciar os filhos no uso correto das mídias sociais, os pais precisam dar o exemplo, otimizando o tempo e estabelecendo horários para o uso da tela. Lembre-se de que seus filhos podem estar esperando que você olhe para eles. Recomendamos a leitura da edição de 27 de outubro de 2011 da Adventist Review (disponível em adventistreview. org). Esse número é informativo, equilibrado e mais relevante hoje do que quando foi publicado. A orientação bíblica é de que devemos ensinar nossos filhos com persistência, dialogando com eles e exemplificando a fé andando pelo caminho, ao deitar e levantar (Dt 6:7). Vamos continuar a conversar com os jovens, procurando amá-los e compreendêlos. Eles são a igreja de hoje e, acima de tudo, merecem isso.]


NOVA GERAÇÃO

ocê realmente vai lá para se encontrar com seu pastor? Aquele lugar não é nada menos que um bar!” Perplexo, o segurança me encarou sem poder acreditar. Eu sorri e admiti. Sim, era difícil acreditar que alguém entraria no campus universitário afirmando que encontraria seu pastor no “A Junta”. Aquele bar, cujo nome na gíria significa cigarro de maconha, era uma área recreativa ao ar livre com mesas redondas. Idealizado para ser um restaurante, o local ficou conhecido pela imoralidade e o uso livre de álcool e drogas. Enquanto dirigia por aquele campus em que estudam 70 mil alunos do Quênia e de outros países, orei para que Deus fosse glorificado por nosso intermédio. Queríamos genuinamente testemunhar sobre o amor de Deus. Nosso grupo de estudo da Bíblia era formado por dois pastores, um missionário expatriado, meu melhor amigo e eu. Havíamos concordado em nos reunirmos no “A Junta” para nosso estudo semanal. Estávamos estudando uma série sobre discipulado e decidimos que era hora de sair da nossa zona de conforto para responder ao chamado de Deus a fim de ir e discipular (Mt 28:19). Obedecer à Grande Comissão envolve se aventurar em territórios desconhecidos e ir aonde as pessoas estão, inclusive em Samaria e até os confins da Terra (At 1:8). Sabíamos

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Foto: Arquivo pessoal

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CRISTO MANTEVE CONTATO COM “MÁS” COMPANHIAS, AINDA QUE ISSO ESCANDALIZASSE OS LÍDERES RELIGIOSOS DE SUA ÉPOCA. SEU OBJETIVO ERA SALVAR TODOS R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

TESTEMUNHO NO BAR A EXPERIÊNCIA MISSIONÁRIA DE JOVENS DO QUÊNIA QUE DECIDIRAM DEMONSTRAR O AMOR DE DEUS NUM LUGAR IMPROVÁVEL FREDERICK KIMANI

exatamente onde era nossa Samaria. Assentamo-nos em torno de uma mesa e observamos os universitários se socializando. Havia música ambiente, o chão estava coberto de garrafas quebradas de cerveja e eu sentia cheiro de maconha. Que lugar! Oramos pedindo que Deus abrisse portas para testemunho naquela comunidade que não O conhecia. Então Chad e Brian sentaram-se conosco e começamos a falar sobre a vida universitária. Chad era um jovem bem arrumado, eloquente, franco, e logo se envolveu em nossa conversa. Brian, coberto por tatuagens e com trancinhas rastafáris penduradas sobre seus olhos injetados de sangue, parecia não estar interessado e pouco depois foi embora. Logo começamos a falar sobre assuntos espirituais com Chad. Para nossa surpresa, ele disse que vinha de um lar adventista. No entanto, deixou de frequentar a igreja havia muitos anos. Seus olhos brilhavam enquanto falávamos do amor de Deus. Ele absorvia cada palavra. Ao fim de nossa conversa, prometeu compartilhar com seus amigos aquilo que havia aprendido conosco e voltar com eles na semana seguinte para mais um estudo. Deus estava agindo no meio daquela comunidade universitária secular. Naquele dia, ao voltar para casa, sentindo a alegria de ter ministrado para alguém no lugar mais improvável, reconheci que a Grande Comissão era bem aquilo: um chamado a me aventurar fora da minha zona de conforto “eclesiástica” e ir aonde as pessoas estão. O próprio Jesus fez amizade com coletores de impostos, prostitutas e marginalizados, com o único propósito de salvá-los. Por que Ele manteria essas “más” companhias, escandalizando os líderes religiosos de Seu tempo? Ele amava transformar em Seus discípulos aqueles que eram vistos como perdidos. Foi exatamente por isso que Ele deixou Sua zona de conforto celestial para encarnar e viver entre nós. É para essa tarefa que Ele nos chama também. ] FREDERICK KIMANI é médico, nascido em Nairóbi, no Quênia

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O PASSARINHO FAMOSO

A HISTÓRIA DE UMA CACATUA QUE FEZ SUCESSO NO YOUTUBE NOS LEMBRA QUE O VALOR DE CADA UM NÃO ESTÁ NA SUA POPULARIDADE KRISTINA DALEY

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polo era uma cacatua macho que amava receber atenção. Já no primeiro dia em que Cristina o levou para casa, ele a seguiu pela cozinha inteira, enquanto ela fazia o jantar. Apolo só tinha seis meses de idade, ainda não conseguia voar e por isso usava seus pezinhos com rapidez para alcançá-la. Logo ele aprendeu a voar e sempre que alguém entrava na sala, ele pousava no ombro do visitante e começava a assobiar suas canções preferidas. As canções ele aprendeu com Cristina, que as cantarolava todos os dias. Com ela, Apolo aprendeu também a brincar de esconde-esconde. E foi um vídeo dessa brincadeira com seu periquito que fez muito sucesso na internet. Em 2014, Cristina postou o vídeo no YouTube apenas para mostrar para seus pais como seu bichinho era talentoso (acesse em bit.ly/2qM6Ltg). Porém, ela ficou surpresa quando pessoas do mundo todo começaram a comentar seu vídeo. Em pouco tempo, 100 mil pessoas já o haviam visualizado. Um dia, Cristina recebeu um e-mail. Era uma empresa que queria pagar 250 dólares para usar o vídeo de Apolo na TV. Com o dinheiro, ela comprou brinquedos e um prato novo dourado para o passarinho.

“Pois o que adianta o homem ganhar o mundo inteiro, e perder-se ou destruir a si mesmo”? (Lc 9:25, NVI)

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Ao pesquisar sobre o nome de Apolo na internet, ela também descobriu que muitas pessoas estavam escrevendo blogs sobre seu bichinho, e até inventando histórias de como ele vivia. Outros decidiram imitar Apolo publicando vídeos com seus próprios bichinhos. Tudo isso para ficarem famosos também. O que aconteceu com Apolo não ocorre apenas com animaizinhos de estimação fofinhos, mas também com pessoas. Alguma vez você já postou algo nas mídias sociais e ficou esperando para ver quantas pessoas curtiam ou visualizavam sua mensagem? Você já olhou as postagens de um amigo e ficou com inveja por causa da atenção que ele recebeu? Devemos cuidar para não usar nossos talentos a fim de receber mais atenção ou imitarmos outras pessoas apenas para sermos legais e populares. Nosso va lor não depende somente do que as pessoas pensam de nós. Se assim fosse, poderíamos ficar tristes e nos sentirmos solitários. Contudo, Jesus é aquele Amigo verdadeiro que nos considera importantes, independentemente do que aconteça. Prova disso é que Ele morreu na cruz para mostrar nosso valor e nos salvar. Quando Cristo esteve na Terra, Ele fez uma pergunta muito importante aos Seus discípulos: o que adiantaria ganhar o mundo, inclusive fama e popularidade, e perder a vida eterna com Ele? Assim, em vez de imitar outras pessoas, apenas para ser popular, que tal imitar Jesus? Quando fazemos isso, nos tornamos melhores para nós e para os outros. A atenção que recebemos na mídia social é muito pequena perto da amizade que Cristo nos oferece. ] KRISTINA DALEY é editora de vídeo da Adventist Review

R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

Ilustração: Xuan Le

PRIMEIROS PASSOS


CIÊNCIA O foguete Antares decolou com a nave Cygnus da base da NASA, na Virgínia (EUA)

AJUDA QUE VEM DO ESPAÇO

Pesquisa do Hospital Adventista na Flórida envia células para estação espacial a fim de testar o efeito da microgravidade na musculatura humana EQUIPE DA ADVENTIST REVIEW

élulas musculares dos participantes de um estudo do Instituto de Pesquisa Translacional para Metabolismo e Diabetes (TRI, em inglês) do Hospital Flórida foram enviadas à Estação Espacial Internacional em meados de novembro último. A experiência procura examinar o efeito de um ambiente sem peso (microgravidade) na saúde muscular. “Sabemos que a microgravidade tem efeitos bastante prejudiciais para o músculo esquelético. Após longa permanência no espaço, os astronautas costumam voltar para a Terra bastante debilitados, ficando muitas vezes limitados a uma cadeira de rodas até que seus músculos se recuperem”, explica Paul Coen, pesquisador no TRI.

Foto: NASA/Joel Kowsky

C

O TRI é parte da rede de institutos clínicos do Hospital Flórida, que procura aproximar ainda mais as pesquisas dos laboratórios das necessidades dos pacientes. Para tanto, pesquisadores e profissionais da saúde trabalham juntos em testes clínicos, a fim de combater problemas comuns, como obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares. As descobertas desse experimento no espaço podem ajudar a tratar a perda muscular por causa da idade (sarcopenia). As amostras das células foram colhidas de oito participantes de um estudo recente

A EQUIPE ESTUDARÁ AS MUDANÇAS DE EXPRESSÃO GENÉTICAS DAS CÉLULAS ENVIADAS AO ESPAÇO QUE SERÃO COMPARADAS COM CÉLULAS QUE PERMANECERAM NA TERRA

R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

sobre envelhecimento e perda muscular, patrocinado pelo Instituto Nacional de Envelhecimento dos Estados Unidos. As amostras foram enviadas a bordo da nave Cygnus, a partir da base da NASA na Virgínia, no foguete Antares, produzido pela Northrop Grumman. As células entraram em órbita em um “chip laboratório” desenvolvido em parte por Siobhan Malany, cientista do Instituto de Descoberta Médica Sanford Burnham Prebys e presidente do Micro-gRx. Visto que as células têm vida curta, os pesquisadores tiveram apenas um pequeno espaço de tempo para estudar os efeitos da ausência de peso. “Por isso, depois de serem expostas por sete dias à microgravidade, as amostras foram congeladas e guardadas até serem trazidas de volta para a Terra na cápsula SpaceX Dragon, que cairá no meio do oceano”, disse Siobhan Malany. A equipe estudará as mudanças de expressão genéticas das células enviadas ao espaço que serão comparadas com células que permaneceram na Terra. Cada chip é um pouco menor do que um cartão de visitas. Restrito a uma caixa de 30 x 10 cm, o pequeno laboratório inclui placas, eletrônicos, bombas, fluidos e um microscópio pequeno, que está sendo utilizado para registrar imagens ao longo de toda a expedição. Inaugurado em 1908, o Hospital Flórida é uma instituição de saúde com base religiosa, cujo objetivo é oferecer cuidados pessoais abrangentes. É um dos maiores hospitais sem fins lucrativos dos Estados Unidos, que atende 2 milhões de pessoas por ano. O Hospital Flórida integra uma rede de 50 hospitais e centenas de clínicas espalhados por onze estados norte-americanos: o sistema de saúde da Igreja Adventista, que mudou a marca para AdventHealth em 2019. ] Equipes das revistas Adventist Record e Adventist Review

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COMUNICAÇÃO

DE CARONA NAS ONDAS DO RÁDIO

Centro de evangelismo digital nas Filipinas vai ajudar a discipular ouvintes da Rádio Mundial Adventista EDWARD RODRIGUEZ

á alguns anos, líderes da Igreja Adventista vêm discutindo como usar da melhor maneira as possibilidades das mídias sociais no contato com os ouvintes da Rádio Mundial Adventista (AWR, em inglês). No passado, esse ministério usou serviços como os cursos por correspondência que fizeram muito sucesso no Brasil quando o pastor Roberto Rabello apresentava o programa radiofônico A Voz da Profecia e, mais recentemente, com o grande alcance da TV Novo Tempo. A lógica é a mesma: estabelecer relacionamento com os ouvintes da rádio de modo que eles conheçam mais amplamente a mensagem adventista, sejam integrados e batizados numa igreja local. O que muda é como esses cursos chegam até as pessoas e como elas interagem com eles.

H

A IDEIA É ESTABELECER NOVOS CENTROS, ESPECIALMENTE NAS REGIÕES EM QUE A AUDIÊNCIA DA AWR TEM AUMENTADO, COMO NA ÁFRICA E NO SUL E LESTE DA ÁSIA 40

Nessa direção, a igreja tem procurado estabelecer Centros para Evangelismo Digital ao redor do mundo. Em outubro, um deles foi inaugurado em Silang, Cavite, nas Filipinas. Por questões estratégicas, esses centros têm sido alocados nas sedes continentais da denominação. Por ocasião da inauguração desse espaço que irá atender as Filipinas, a Índia e parte do sul da Ásia, estiveram presentes líderes da AWR e de vários níveis administrativos da igreja. Considerando o número significativo de telefonemas e mensagens de texto recebidos diariamente pela equipe da AWR, espera-se que o reforço desses Centros de Evangelismo Digital signifique um melhor atendimento aos ouvintes que se interessam pela mensagem adventista. O objetivo é não deixar que esses interessados “escapem pela janela”, mas iniciem uma jornada de discipulado com Cristo e o apoio da igreja. “Há milhares de pessoas em todo o mundo que ouvem intencionalmente nossos programas. Porém, na maioria das vezes, o contato deles conosco termina aí”, explica Kyle Allen, vice-presidente da AWR. “Precisamos encontrar uma forma de nos comunicarmos com eles, fazer amizade de modo que se sintam cuidados. É aí que entra a atuação do centro digital”, justifica. A AWR tem tido sucesso com sua programação nas Filipinas, Japão e na África. Por isso, o número de ouvintes e contatos nessas regiões tem aumentado. “A primeira fase desse Centro para Evangelismo Digital está concentrando a atenção na Índia e nas Filipinas. Inicialmente, um grupo de quatro a oito missionários digitais passarão um ano como missionários voluntários nas Filipinas”, disse Karen Glassford, diretora do Centro para Evangelismo Digital da AWR. “Eles serão treinados para facilitar o evangelismo por telefone, esforçando-se para que cada ligação resulte em contatos posteriores. Ouvir um programa de rádio pode levar a um pedido de oração ou estudo da Bíblia”, explica. Karen Glassford, que trabalhava para o Instituto de Missão Mundial da igreja, foi chamada pela AWR para cuidar especificamente dos Centros para Evangelismo Digital.] EDWARD RODRIGUEZ trabalha para a Divisão do Pacífico Sul-Asiático da Igreja Adventista

R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

Foto: Southern Asia Pacific Division News

Líderes da Igreja Adventista e da AWR diante do Centro para Evangelismo Digital das Filipinas


ENTENDA

O TAMANHO DO CAMPORI SUL-AMERICANO OS NÚMEROS DO MAIOR ACAMPAMENTO ADVENTISTA JÁ REALIZADO NA AMÉRICA DO SUL MATEUS TEIXEIRA E JEFFERSON PARADELLO

V

ocê pode imaginar a complexidade que é montar uma cidade de lona que, ao longo de duas semanas, deve abrigar 100 mil pessoas? Além de quatro anos de planejamento e preparação, a organização do 5º Campori Sul-Americano dedicou quatro meses para a montagem do acampamento e um para desmontar tudo e deixar limpo o Parque do Peão em Barretos (SP). Um evento dessa proporção apresenta grandes desafios de transporte e logística, fornecimento de água, conservação de alimentos, geração de energia e segurança. O consumo e o descarte também são preocupações. E nesses aspectos, os desbravadores fizeram a lição de casa: o lixo reciclável foi destinado para uma empresa especializada e o gasto diário de água por pessoa ficou abaixo da média nacional (200 litros). Tudo parece ter corrido bem e valido a pena. Durante os dias 8 a 20 de janeiro, 3.300 clubes de desbravadores de 19 países compartilharam uma experiência inesquecível de fé, união e serviço. Veja alguns números dessa grande aventura. ] VOLUNTÁRIOS

2,5 mil

nas cozinhas

2 mil

INFRAESTRUTURA

1 farmácia 1 supermercado

1 hospital 12 postos de saúde

50 lojas

500

cozinhas

1.820

chuveiros

10 geradores

25 mil barracas

de energia

CONSUMO DIÁRIO

MISSÃO

75 toneladas

100 mil

de alimentos

livros missionários distribuídos

pastores

3,8 mil Ilustrações: ?????

apoio e segurança

120

120 litros

de água por pessoa

1,5 mil

profissionais de saúde

100

equipe de comunicação R e v i s t a A d ve n t i s t a // A d ve n t i s t Wo r l d // Fevereiro 2019

20 toneladas de lixo

819

batismos

pessoas atendidas em seis feiras de saúde comunitárias 41


JUVENTUDE

COM DUAS EDIÇÕES E 100 MIL ACAMPANTES, 5º CAMPORI SUL-AMERICANO ENTRA PARA A HISTÓRIA DA IGREJA E REFORÇA O MINISTÉRIO QUE MAIS ENGAJA ADOLESCENTES MATEUS TEIXEIRA

E

m questão de minutos, quase 50 mil acampantes estavam lotando a arena do Parque do Peão, em Barretos (SP), a 370 km de São Paulo. Bandeiras de clubes tremulavam entre a multidão, sob o céu limpo de uma noite quente de verão. Logo depois, os desbravadores de oito países sul-americanos, com seu uniforme de gala, recitaram seus ideais e cantaram juntos a respeito de sua esperança. Mais uma vez, o local nacionalmente conhecido por seus rodeios, seria palco de um mega-acampamento da igreja. Dessa vez, porém, a ousadia foi maior: realizar duas edições, que totalizaram cerca de 100 mil participantes, entre desbravadores e equipe de apoio. E para as duas noites memoráveis de abertura do evento, não faltaram emoção, alta tecnologia 42

audiovisual, fogos de artifício, louvor contagiante, batismos e o senso de que Deus estava conduzindo o programa e havia protegido os acampantes até ali. Na abertura da primeira edição, autoridades marcaram presença. João Doria Júnior, governador de São Paulo, saudou a multidão e elogiou a iniciativa, enquanto que o presidente da República, Jair Bolsonaro, enviou uma carta de boas-vindas, que foi lida para os acampantes. A MELHOR AVENTURA Participar do clube e estar num campori é sempre uma aventura para os

desbravadores. Mas isso é potencializado quando se trata do 5º Campori Sul-Americano. Cinco anos depois do último evento, os desbravadores voltaram ao Parque do Peão na cidade de Barretos, a 370 km de São Paulo. Dessa vez, uma novidade: O acampamento foi realizado em duas etapas: Alpha (8 a 13 de janeiro) e Ômega (15 a 20 de janeiro), reunindo assim 65 mil desbravadores a mais do que em 2014. A decisão inédita se justifica pelo crescimento significativo desse ministério: o número de desbravadores quase dobrou desde o último campori sul-americano. “Creio que ficou bem claro na mente deles que ‘a melhor aventura’ é ser desbravador, o que significa se entregar a Jesus, ainda que os pais não apoiem ou eles enfrentem adversidades. Ficou claro para eles também que ‘a melhor aventura’ é ser um missionário. Eles ouviram histórias de missionários enviados pela igreja R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

Foto: ?????

Aventura inesquecível


para fundar clubes no Egito, Iraque e Mongólia. Espero que seja isso que eles desejem: viver as melhores aventuras com Jesus”, resumiu o pastor Udolcy Zukowski, líder do Ministério de Desbravadores e Aventureiros para a América do Sul. DECISÕES Todo o evento foi pensado para que os adolescentes tomassem decisões importantes. A cada devocional matutino ou noturno, dezenas de adolescentes eram batizados. As mensagens bíblicas foram dirigidas pelos líderes do Ministério Jovem e de Desbravadores de algumas Uniões brasileiras e pelos pastores Gary Blanchard e Andrés Peralta (representantes da sede mundial da igreja). A chilena Isidora Uvalentina, de 15 anos, saiu de Concepción, no Sul do Chile, decidida a ser batizada no evento. “Estou no clube há cinco anos e ele me ajudou muito, pois quando eu era criança não ia com regularidade à igreja, porque me entediava facilmente. Se eu não tivesse ingressado no clube, talvez nunca teria voltado a frequentar a igreja”, enfatizou. Sua irmã gêmea, Constaza Paulettela, também não se esquecerá do que vivenciou no campori. “O que me chamou a atenção foi que, embora todos fôssemos de países diferentes, estávamos unidos, uns ajudando os outros. Além disso, conheci pessoas que têm se colocado nas mãos de Deus e têm sido abençoadas por causa dessa decisão”, destacou. Teve quem também aproveitou o campori para desenvolver novos hábitos. “Eu não costumava ler a Bíblia, mas ali eu fui incentivado a ler. Fiz isso à noite, quando meus colegas estavam dormindo. Ouvindo as pregações, me deu vontade de ser pastor”, contou Éliton Júnior, de 12 anos, que mora em Maringá (PR). O nível de vibração e engajamento que esses adolescentes demonstram pelos símbolos e ideais do clube tem chamado a atenção e merece ser estudado. “O clube de desbravadores é uma das ferramentas mais eficientes que temos para apaixonar os garotos por Deus, pela igreja e pela liderança”, avaliou o pastor Erton Köhler, líder dos adventistas sul-americanos, e que já dirigiu esse ministério em vários níveis administrativos da denominação. Ele acredita que a nomeação de líderes para cuidarem exclusivamente dos Ministérios de Desbravadores e Aventureiros nas Associações e Uniões da igreja seja uma tendência positiva, que deve reforçar o pastoreio das novas gerações. “O clube pode ajudar a preservar nossa igreja, mantendo-a viva e no foco, quando nós não mais estivermos aqui.” Segundo Erton, o clube de desbravadores pode ser visto como uma “extensão” da rede educacional adventista, servindo como uma frente R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

evangelística mais acessível onde é difícil estabelecer escolas da igreja. CRIACIONISMO SUSTENTÁVEL E se a formação das novas gerações é uma das grandes contribuições do clube de desbravadores, o ensino de valores importantes, como a fé em Deus e a responsabilidade para com Sua criação não poderiam faltar no campori. Dois espaços colaboraram para isso durante o acampamento. Quem passou pelo Creation Place, observou 26 representações de dinossauros e 42 fósseis completos e fragmentados entre réplicas e peças reais. Escavações de fósseis na areia e uma viagem pelos dias da criação do mundo, a partir da história dos dinossauros, também foram atrações desse estande. Na área de cuidado com o meio ambiente, o espaço Campori Sustentável cumpriu um papel importante, idealizado pelo Núcleo de Tecnologia, Engenharia e Arquitetura do Unasp. Os desbravadores que passaram por ali aprenderam sobre energia limpa. Foi possível carregar os celulares em “árvores” fotovoltaicas, gerar energia por indução magnética pedalando em bicicletas e descobrir que a força da gravidade também pode acender lâmpadas. Na chamada Agência Banco Global, por sua vez, eles receberam informações sobre reciclagem do lixo e trocaram itens recicláveis por “camporitos”, a moeda do evento. SELO E MUSEU Se já não bastassem as supresas e fortes emoções que os desbravadores experimentaram ao longo de cinco dias de acampamento, algumas iniciativas procuraram tornar esse megaevento algo histórico. Uma delas foi o lançamento pelos Correios de oito selos comemorativos, um deles em referência ao 5º Campori Sul-Americano e outro em relação aos 60 anos da fundação do primeiro clube no Brasil. A iniciativa junto à estatal foi dos irmãos e empresários Samuel de Paula e Priscila Silvana de Paula. Já foram produzidas duas séries com 18 mil selos.

Outra dupla empreendedora e apaixonada pelos desbravadores são os amigos Carlos Araújo e Nelson Pires. Carlos é administrador e Nelson empresário e ambos vivem em Curitiba (PR). Em 2014, depois de terem participado do 4º Campori Sul-Americano, eles decidiram montar um acervo com objetos que estavam colecionando sobre a história dos desbravadores. Hoje eles tem 50 mil itens, mais de 7,5 mil trunfos de eventos, e expuseram 80% desse acervo em Barretos. Carlos e Dimas pretendem lançar um site do acervo no segundo semestre deste ano e inaugurar, em 2020, uma sede própria do museu na região Sul do Brasil. Mesmo recebendo público recorde, nem todos os desbravadores sul-americanos puderam estar em Barretos. Por isso, um time de cem comunicadores e técnicos trabalhou na cobertura do evento, o que incluiu registrar muita coisa por meio de vídeos, fotografias e reportagens (camporidsa.org). As transmissões ao vivo e as entrevistas realizadas num estúdio montado próximo à arena aproximaram internautas dos acampantes. A participação de youtubers adventistas no evento e a produção de uma websérie específica para o campori (disponível na plataforma feliz7play.com) também potencializaram a interação nas mídias sociais. Quando e onde será o próximo campori sul-americano são perguntas que ainda não têm resposta. Os líderes estudem possibilidades e devem anunciar em breve mais informações. O que se sabe é que, se o crescimento do ministério continuar no ritmo dos últimos anos, talvez seja necessário pensar num acampamento com três edições; e que o melhor local até agora para um evento desse porte continua sendo o Parque do Peão, em Barretos (leia a seção Entenda, na p. 00). O jeito é aguardar a data e o local da próxima aventura. ] MATEUS TEIXEIRA é estudante de Teologia e Jornalismo na Universidade Adventista del Plata, na Argentina

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LOGOS

NÃO SE ESCONDA DE DEUS LIBERTE-SE DAS ORAÇÕES VAZIAS E EXPERIMENTE UM RELACIONAMENTO REAL COM O CRIADOR DIOGO CAVALCANTI

D

eus não está preso às expectativas humanas. Embora Se apresente por meio de uma revelação encarnacional, falando nossa língua, por vezes Ele quebra protocolos humanos e até nos escandaliza. Pense nos profetas e seus atos simbólicos ultrajantes, em Isaías andando nu por três anos, em Oseias e a prostituta, em Maria, que foi vista como mãe solteira por alguns, entre eles o próprio José. Talvez isso possa chocá-lo por um instante, mas o Rei do Universo não está nem um pouco preocupado com as normas da etiqueta, com a estética tão celebrada na mentalidade evangélica dos nossos dias, muito menos com uma piedade apenas aparente. Isso não significa que Deus seja grosseiro nem que não Se importe com nossos sentimentos. O ponto é que Ele sabe do que realmente precisamos e que, muitas vezes, escondemos nosso verdadeiro eu. Deus, então, quebra os protocolos humanos para mostrar a verdade e nos libertar dos nossos pecados e de nós mesmos. Tenha em mente essa pequena introdução ao refletirmos um pouco sobre o tema da oração. Por vezes, nos escondemos Dele, mesmo quando oramos. Ocultamos nossa verdadeira face, obscurecemos nossa consciência e nossas palavras para que Ele não veja o que realmente vai dentro de nós. Como superar essa condição? 44

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Foto: Adobe Stock

LIGAÇÃO RESTAURADA Pense em Davi, no período de um ano em que ocultou seus crimes (Sl 32:3, 4). Sua ética exagerada o fez condenar hipoteticamente à morte um homem que havia tomado uma cordeirinha de seu vizinho, indo muito além da punição prevista na lei mosaica (Êx 22:3). Por outro lado, na vida real Davi tinha não somente tomado uma “cordeirinha” do vizinho, mas sacrificado o próprio vizinho. Seu rigor como juiz parecia refletir uma compensação de suas falhas pessoais. Durante o período em que escondeu seus crimes, Davi de alguma forma interrompeu sua comunicação com Deus. Ele, que era profeta (At 2:29, 30), não mais recebia mensagens do Senhor. Espiritualmente, passou um ano em branco. Não mais compunha salmos inspirados. Algo não corria bem. Ele, que havia sido chamado para acalmar o perturbado rei Saul, também tinha se tornado um rei perturbado. Implodiu sobre si mesmo e sofreu miseravelmente. Por um ano conseguiu levar adiante essa situação. Mais tarde, reconheceu: “Compadece-Te de mim, SENHOR, […] os meus ossos se consomem” (Sl 31:9, 10). O quadro só mudou quando Deus tomou a iniciativa de quebrar a muleta na qual o filho de Jessé insistia em se apoiar. Natã levou o rei a se enxergar no espelho da moral divina, e então Davi finalmente se reconectou com Deus por meio da confissão e da oração (Sl 32:5; 51:3, 4). Perceba que a oração está na essência da religião, entendida aqui por seu sentido original de religar. Outros verbos poderiam traduzir melhor esse sentido nos dias atuais, como “sintonizar” ou “conectar”. O sinal de Deus está por toda parte. Sua rede Wi-Fi da graça cobre todo o Universo. Ela pode ser ignorada por um longo tempo, mas nunca é tarde para a reconexão. MONÓLOGO Jesus contou a história de um homem que foi ao templo para orar. Exercitava, assim, uma das práticas mais importantes de sua religião. Porém, sua oração não o religava ao Criador. Era artificial. Sua prece tinha se transformado em um monólogo no qual “orava de si para si mesmo” (Lc 18:11). O fariseu proclamava sua suposta justiça medida pelas ações externas que ele mesmo considerava serem o aspecto mais importante de sua religião. Mais uma vez, elementos exteriores de uma ética elevada são usados como muletas da experiência religiosa. “Seu espírito desvia-se de Deus para a humanidade. […] Dá-se por contente com uma religião que só se refere R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

à vida exterior” (Ellen G. White, Parábolas de Jesus, p. 151). Ele observava os outros com suas falhas e os acusava na própria oração (Lc 18:11). Quando teve a chance de se religar a Deus e ter a imagem divina restaurada em si, o fariseu terminou por refletir o caráter do acusador. Sua religião resvalava em um raciocínio circular: “Sou bom porque sou melhor do que os outros”; “sou melhor do que os outros; por isso, sou bom”. Essa lógica quebradiça se esfarela diante da compreensão de que “todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças, como trapo da imundícia” (Is 64:6). O texto não afirma que nossas injustiças são imundas (o que seria mais lógico), mas as nossas justiças! Visitas aos doentes, trabalhos comunitários,

É MUITO FÁCIL SE ILUDIR COM UM CRISTIANISMO SEM CRISTO. PODEMOS MANTER UMA RELIGIÃO APENAS DE DESEMPENHO, TÃO COMUM NO MUNDO GOSPEL E MIDIÁTICO ATUAL

doações, estudos bíblicos ministrados, enfim, tudo o que há de melhor em nossas ações ainda carrega a mancha do pecado. É como se alguém pedisse a uma pessoa recém-saída de um profundo poço de lama que escrevesse uma bela carta. Ela poderia ter a melhor caligrafia, mas a folha

branca terminaria enlameada. Essa foi a carta que o fariseu escreveu para Deus e, sem a graça divina, ela não foi lida (Lc 18:14). QUESTÕES CRUCIAIS Podemos ligar as duas histórias acima a mais outra, que ainda vai acontecer: a dos fervorosos cristãos reprovados no fim dos tempos. Eles profetizam, expulsam demônios, realizam milagres, “fazem e acontecem”, mas Cristo, no fim de tudo, lhes dirá que não os conhece (Mt 7:22, 23). Por quê? Por causa da iniquidade e da completa desconexão embutida nela. É muito fácil se iludir com um cristianismo sem Cristo. Podemos manter uma religião apenas de desempenho, de performance, tão comum no mundo gospel e midiático atual. Podemos ter toda a aparência, mas ainda assim faltar com a essência. Podemos ter todas as folhas, mas ainda assim estar sem frutos. Enquanto isso, a distância de Cristo pode ser tamanha que nem seja sentida. Para muitos, essa triste condição só será percebida tarde demais. A verdadeira religião se manifesta em uma ligação viva com Deus, marcada, entre outras coisas, por orações em que você realmente se comunica com Ele, em que se faz entendido e correspondido. Trata-se de conhecer a Deus e se deixar ser conhecido e sondado por Ele (Sl 139:23). Isso envolve sua mente e seu espírito (1Co 14:15). Implica verdade (Jo 4:24), estudo da Palavra e resulta em amor ao próximo, intercessão e espírito de missão. Questione-se no fundo de sua alma. Isso pode fazer a diferença para a eternidade: Conheço a Deus realmente? Em minhas orações, falo com Ele ou comigo mesmo? Minha vida reflete minha ligação com Ele? Afinal, eu O conheço? Ele me conhece? Abra seu coração para uma comunhão viva com Deus! ] DIOGO CAVALCANTI é pastor, jornalista e coordenador editorial de livros na CPB

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MEMÓRIA Elizabeth Giancotti Moro, aos 94 anos, em Irati (PR). Natural de Itararé (SP), foi muito ativa nas igrejas que frequentou no Paraná, atuando especialmente como musicista, organista e regente de grupos vocais. Deixa uma filha e dois filhos. Ervino Grams, aos 90 anos, em Curitiba (PR), de morte natural. Nascido em lar adventista, foi sempre ativo na igreja. Serviu como diácono, ancião e diretor do patrimônio da igreja, ajudando especialmente na parte de marcenaria do templo. Apoiador dos programas para os adolescentes e jovens, foi também um evangelista voluntário, colaborando no plantio de igrejas em lugares retirados e sítios. Pai exemplar, costumava ler o livro de Salmos no culto de pôr do sol a fim de aconselhar os filhos. Deixa a esposa, Siloca (com quem foi casado por quase 67 anos), quatro filhos, sete netos e quatro bisnetos. Frederico Calson, aos 91 anos, no início de 2018, em Miraguaí (RS), vítima de parada respiratória. Ele contribuiu para a construção de várias igrejas e serviu como ancião e professor da Escola Sabatina. Gostava de música, especialmente de violino. Natália de Oliveira Calson, aos 92 anos, no fim de 2018, vítima de infeccção do trato

urinário. Era assídua leitora da Revista Adventista e, por várias vezes, abrigou pessoas carentes em sua casa. Frederico e Natália nasceram e foram batizados no mesmo ano. O casal teve seis filhos, 16 netos e 24 bisnetos. Gustavo Germano Lubke, aos 88 anos, vítima de insuficiência respiratória aguda. Por muitos anos foi diácono da Igreja do Córrego da Divisa, em São Domingos do Norte (ES). Deixa dois filhos. Ilda Banhos Gorski, aos 81 anos, em Curitiba (PR). Foi uma fiel companheira do ministério pastoral do esposo no Rio de Janeiro, São Paulo, Goiânia e Curitiba. Serviu na Igreja Adventista como funcionária nas áreas educacional e administrativa. Sua vida foi marcada pelo trato amável e sorriso constante, mesmo em meio às dores da doença que a levou ao descanso final. Sua confiança em Deus impressionou os médicos e enfermeiros que cuidaram dela. Deixa o esposo, pastor Rodolpho Gorski, dois filhos e uma filha, oito netos e três bisnetos. Isabel Alvares Oliveira, aos 97 anos, vítima de insuficiência respiratória. Natural de Santana (BA), era membro da Igreja do Setor Sul, em Goiânia (GO). Aluna do Instituto Tecnológico da Aeronáutica na década de 1940, foi muito ativa nas igrejas que frequentou. Também ajudou o esposo a

construir escolas e igrejas. Deixa o esposo, Clodoaldo (hoje com 100 anos), três filhas, sete netos e sete bisnetos. Kerlyn Alves Loura Menezes, aos 18 anos, vítima de afogamento, depois de resgatar um adolescente e uma criança do rio, na Argentina. Filha do casal pastoral Kedson e Célia Regina Alves Loura Menezes, ela estudava o curso pré-universitário para ingressar em Medicina na Universidad Adventista del Plata. Destacouse por seu sorriso contagiante e integridade, além disso, gostava de cantar e liderar os desbravadores. Deixa os pais, dois irmãos e um sobrinho. Maria das Montanhas Barros, aos 80 anos, em Paiçandu (PR), vítima de falência hepática. Natural de Arco Verde (PE), mudou-se para São Paulo, onde constituiu família e conheceu a mensagem adventista em 1977. Serviu no Ministério da Mulher, na assistência social e no diaconato feminino. Ministrou estudos bíblicos e ajudou muitas pessoas a conhecer pessoalmente a Cristo. Deixa o esposo, Joaquim, três filhos, quatro netos e uma bisneta. Oscar Aniceto de Souza, aos 90 anos em Piracicaba (SP), vítima de falência de múltiplos órgãos, e Zenita Reis de Souza, quatro dias depois, aos 88 anos, na mesma cidade, vítima de pneumonia. Em maio completaram 68

anos de casados. Ele nasceu em Santo Antônio da Patrulha (RS) e conheceu a mensagem adventista aos 9 anos de idade. Ela nasceu na mesma cidade, num lar adventista e era sobrinha-neta do pastor José Amador dos Reis. Sempre priorizaram a devoção pessoal a Deus e a fidelidade nos dízimos e ofertas. O casal foi um dos fundadores da Igreja do Evaristo, em Santo Antônio da Patrulha (RS), e da Igreja do Guanandi, em Campo Grande (MS). Trabalharam por 18 anos no Hospital Adventista do Pênfigo. Deixam cinco filhos, 11 netos e oito bisnetos. Osvaldo Trevisan, aos 82 anos, em Garça (SP), vítima de infarto. Batizado em 1987, serviu à igreja como diácono e pregador. Destacou-se como instrutor bíblico voluntário, ensinando as pessoas de casa em casa e distribuindo folhetos nas ruas. Deixa a esposa, Rita, seis filhos, 15 netos e oito bisnetos. Sydônio Barros, em Cariacica (ES), vítima de acidente. Foi batizado na Igreja da Concórdia, em Belo Horizonte (MG), na década de 1970. Desde então, trabalhou incansavelmente para conduzir pessoas a Jesus. Na capital mineira, ele também serviu como ancião e ajudou no plantio de várias igrejas, os mesmos ministérios que desempenhou na região metropolitana de Vitória. Era conhecido por sua paixão pela pregação do evangelho e pelas habilidades de pastorear e aconselhar pessoas e resolver conflitos. Deixa quatro filhos e sete netos.

“ B E M - AV E N T U R A D O S O S M O R T O S Q U E , D E S D E A G O R A , M O R R E M N O S E N H O R ” 46

(APOCALIPSE 14:13)

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EM FAMÍLIA

A DOR DA TRANSIÇÃO AS MUDANÇAS PODEM PROVOCAR RESISTÊNCIA E NOS IMPACTAM POSITIVA OU NEGATIVAMENTE TALITA CASTELÃO

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À

s vezes, acontece inesperadamente. Em outras, vem lentamente se anunciando. Seja como for, as mudanças são inevitáveis e impactam nossa vida. Quem literalmente já se mudou sabe como é: caixas e malas por todos os lados; você separa o que vai levar, vende, doa ou joga fora o que não vai mais precisar... É o exercício do desapego. De forma individual ou como unidade familiar, mudanças internas e externas fazem parte da vida e dificilmente há como evitar. Quando a mudança ocorre no contexto organizacional, por exemplo, a resistência é muito comum e geralmente revela a inf luência de va riáveis individuais e situacionais advindas da maneira de cada pessoa criar sua própria representação da realidade. Isso foi constatado por José Mauro Hernandez e Miguel Caldas, administradores de empresas e doutores pela FGV EAESP. Autores de um modelo de resistência individual à mudança, eles creem que as pessoas o vivenciam em sete estágios. Para entender melhor o modelo, imaginemos a transferência de trabalho que resulte numa mudança de endereço para uma família. 1º estágio: Exposição à mudança ou inovação. Consiste no momento em que a família é comunicada a respeito da transferência. Nesse momento, vários fatores interferem no processo, mas em geral surge um sentimento de ambiguidade relativo a perdas e ganhos. 2º estágio: Processamento inicial. Ocorre a comparação entre as prováveis consequências da mudança e expectativas, atitudes e comportamentos do passado. R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

É IMPORTANTE CONSIDERAR A CAPACIDADE DE ADAPTAÇÃO DO SER HUMANO E TER EM MENTE QUE AS MUDANÇAS INEVITÁVEIS DOEM MAIS QUANDO TENTAMOS RESISTIR A ELAS 3º estágio: Resposta inicial. Após a comparação ocorrida no segundo estágio, gera-se na família uma aceitação ou rejeição inicial à nova realidade. 4º estágio: Processamento estendido. Nessa etapa, a avaliação da mudança será feita de maneira mais cuidadosa e demorada, podendo ser percebida como oportunidade, ameaça ou ambos.

5º estágio: Aceitação e resistência emocionais. É o momento de comparações entre a situação real e a situação almejada, gerando, por sua vez, emoções e estados mentais que podem ser de aceitação ou de resistência. O processo cognitivo de cada pessoa interfere nesse estágio. 6º estágio: Integração. Ocorre a integração das emoções e respostas cognitivas produzidas no estágio anterior. 7º estágio: Conclusão. Resulta na adoção de um dos quatro comportamentos a seguir: (1) adoção espontânea da mudança; (2) decisão para se superar a resistência à mudança; (3) adoção de um comportamento resistente; (4) indecisão (principalmente nos casos em que a decisão é muito complexa). Como o modelo é cíclico, durante o processo de mudança, a pessoa pode ser surpreendida com novos estímulos, interiores e exteriores, de natureza distinta (novas informações sobre o novo trabalho e endereço, diferentes pressões de grupo, novas emoções, etc.). Por isso, é importante lembrar-se da capacidade de adaptação do ser humano e ter em mente que, embora possam ser dolorosas, as mudanças inevitáveis doem mais quando somos resistentes a elas. ] TALITA CASTELÃO é psicóloga clínica, sexóloga e doutora em Ciências

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INSTITUCIONAL

POR CAUSA DE SEU RÁPIDO E INCONTROLÁVEL ALCANCE, ESSA PLATAFORMA DIGITAL PRECISA SER USADA COM RESPONSABILIDADE

APLICATIVO É UMA FERRAMENTA EFICAZ PARA NOS AJUDAR NA TAREFA DE PREGAR O EVANGELHO E DEVEMOS FAZER BOM USO DELE RAFAEL ROSSI

WhatsApp é um fenômeno da comunicação digital. No mundo, o aplicativo de mensagens conta com cerca de 1,5 bilhão de usuários. Como mídia social, perde apenas para o Facebook, empresa do mesmo grupo. O número de usuários é equivalente às populações dos maiores países do planeta, como China e Índia. No Brasil, por exemplo, 91% da população que possui acesso à internet utilizam WhatsApp, segundo pesquisa on-line do Ibope. Com características como custo zero, interatividade, facilidade de uso e alcance, o aplicativo é uma novidade comunicacional importante demais para ser ignorada. Como líderes da igreja, temos o interesse em usá-lo como ferramenta para disseminação do evangelho. Na sede sul-americana da denominação, por exemplo, temos explorado a ferramenta como uma forma de contato

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com as pessoas e também como canal para oferecer estudos bíblicos que são disponibilizados na própria plataforma. Contamos até com recursos de inteligência artificial para ajudar os evangelistas digitais na identificação das necessidades das pessoas. No entanto, o WhatsApp pode também ser usado para desestabilizar a reputação da igreja e consequentemente prejudicar a missão. Nesse caso, é uma nova realidade desafiadora para quem se preocupa com a imagem e a reputação da nossa denominação. Uma das formas de esse prejuízo acontecer é quando o aplicativo é usado para divulgar fatos da vida privada ou deslizes morais de pastores, oficiais ou membros da igreja. Essas informações costumam circular com dados exagerados e distorções. E, mesmo quando se trata de algo verdadeiro, não agrega para quem envia nem

RAFAEL ROSSI é pastor e diretor do departamento de Comunicação da sede sul-americana da Igreja Adventista

R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

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O WHATSAPP E A MISSÃO

para quem recebe. Na verdade, fazer isso é falta de ética, discernimento espiritual e compaixão. O WhatsApp tem servido de prova em ações civis e trabalhistas no Brasil e no mundo. Há registros de chefes e empregados que perderam seus postos de trabalho e tiveram problemas legais devido ao uso do aplicativo. Situações como calúnia, difamação e injúria, entre outras coisas, servem de referência. Isso mostra a atenção que precisa haver ao compartilhar conteúdos sobre terceiros de forma irrefletida e sem a devida orientação. Apesar de não haver ainda uma regulamentação clara sobre o aplicativo, o conteúdo que você publica nele pode ser facilmente “printado” por alguém e usado contra você. Nesse caso, a pergunta que precisa se fazer é: Eu veicularia esse mesmo conteúdo em um canal de comunicação aberto da igreja, como uma revista, rádio ou TV? A comissão dada por Cristo à igreja é muito clara: pregar o evangelho a todas as pessoas. Para tanto, é preciso usar todos os meios possíveis. Desconsiderar isso é ignorar o propósito de Deus de alcançar quanto antes o mundo inteiro com a mensagem de esperança e, desse modo, consumar a nossa tão aguardada redenção. ]


ESTANTE

NO TOM CERTO

TRECHOS

SEM DOGMATISMOS, LIVRO OFERECE CRITÉRIOS E ORIENTAÇÕES PARA O MINISTÉRIO DA MÚSICA NA IGREJA LOCAL NERIVAN SILVA

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úsica é um dos temas mais discutidos na Igreja Adventista nas últimas décadas. E em muitos lugares há divergências sérias sobre esse assunto. De um lado estão os chamados “conservadores”, que, muitas vezes, movidos pela defesa do que consideram princípios eternos, buscam definir todas as nuances da música da igreja com base no que julgam que será o estilo de música do Céu. Do outro, estão os “liberais”, que, em nome da inovação e relevância litúrgica, descuidam de alguns critérios, pensando apenas em como atrair pessoas para as celebrações. A difícil tarefa de tentar promover um diálogo entre música, teologia, arte e religião é encarada por Daniel Oscar Plenc no livro Música na Igreja (p. 192), que será lançado no próximo mês pela CPB. Plenc é professor de Teologia na Universidad Adventista del Plata, na Argentina, e há décadas tem estudado as áreas de história da igreja, escritos de Ellen White e adoração. Seu livro é mais uma busca por repostas do que uma receita litúrgica pronta. Por isso, como caminho para pesquisa, ele faz um extenso estudo sobre a música no Antigo e Novo Testamentos, destacando os livros em que as narrativas sobre adoração e louvor são mais frequentes e explícitas. Plenc mostra que na Bíblia a música está relacionada com vários sentimentos e circunstâncias, como alegria, tristeza, luto, R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

alarme, coroação, prazer, vitória, êxtase e terapia. Ele também se debruça sobre os escritos de Ellen G. White, uma de suas especialidades, para verificar o que a pioneira escreveu sobre o assunto. Plenc resgata ainda a história da produção de hinários adventistas e dos documentos da igreja sobre o tema. Na quarta e última parte do livro, ele aborda aspectos práticos para a igreja local quanto ao lugar da música no culto de adoração. Com base no Manual da Igreja e no Guia Para Ministros, ele descreve também as atribuições e o perfil daqueles que servem no Ministério da Música, como os instrumentistas, regentes e diretores de coral. Música na Igreja trata-se de uma leitura imprescindível para os que desejam ter uma compreensão mais ampla desse assunto, bem como esclarecer dúvidas, e cumprir com o propósito desse ministério que, na visão do autor, é tríplice: adorar a Deus, edificar a igreja e evangelizar o mundo. ] NERIVAN SILVA é pastor, jornalista e editor da Revista do Ancião

“Nunca houve um tempo em que as igrejas tivessem a seu alcance mais recursos para o desenvolvimento de um Ministério da Música como hoje. Cada vez mais, os instrumentos contam com maiores possibilidades e a musicologia tem prestado contínuas contribuições. Por sua vez, muitas congregações enfrentam tensões relacionadas com os estilos de música destinados à adoração” (p. 8). “A música do culto segue os mesmos propósitos da celebração litúrgica, ou seja, cumpre um objetivo triplo: a adoração a Deus, a edificação da igreja e a evangelização do mundo” (p. 85). “O talento musical, quando usado para a glória de Deus, marca o programa da igreja com beleza, arte e graça. É preciso oferecer o melhor de si mesmo para o serviço de Deus” (p. 173). 49


ENFIM

LEITURA QUE TRANSFORMA

O BOM LEITOR INTERNALIZA AS VIRTUDES DA BOA LEITURA, MAS ISSO SÓ É POSSÍVEL COM DISCIPLINA E CONCENTRAÇÃO ADRIANA TEIXEIRA

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ALÉM DE SER BENÉFICA EM SI MESMA, A BOA LEITURA NOS AJUDA A CULTIVAR OUTROS VALORES tornou um vício limitador da leitura calma e reflexiva, que edifica e transforma. De acordo com Gloria Mark, professora de informática da Universidade da Califórnia (EUA), distrair-se causa prejuízo de tempo e energia, e a cada interrupção são necessários 23 minutos para voltar à tarefa original, segundo a especialista que estuda o fenômeno da distração digital, em entrevista ao site do The Wall Street Journal. Por isso, é importante entender que o cérebro funciona de um modo quando intercala continuamente links e imagens em alta velocidade e, de outra maneira quando o padrão de leitura é lógico e linear. O segundo modo cria uma forma virtuosa de leitura, que favorece a captação e interpretação mais precisa e perspicaz dos conceitos. Praticar qualquer uma dessas habilidades é cultivar as virtudes que elas exigem. Segundo Sarah Clarkson, autora do livro Caught Up in a Story (2014),

“os livros nos ensinam a tomar conta de nós mesmos para que sejamos agentes, com a capacidade de aprender, sonhar, pensar e moldar o mundo ao redor”. Nessa obra, ela explica para os pais e educadores como expor as crianças diante de histórias que podem ajudá-las a escolher bem, perseverar e ter esperança. Portanto, dedicar-se à leitura de um bom livro, principalmente da Bíblia ou dos que ressaltam seus conceitos, exigirá de nós, sobreviventes de uma era frenética e acelerada, uma atitude decisiva de concentração, disciplina e certeza de que as virtudes necessárias para a tarefa colaborarão para a transformação da nossa vida. A pioneira adventista Ellen White, já no fim do século 19, orientava que a cultura da leitura deveria tomar o devido lugar nos lares e nas escolas adventistas (Conselhos aos Pais, Professores e Estudantes, p. 218). Ela instruiu também que a família se reunisse para ler, após o dia cansativo de trabalho e estudos (Conselhos Sobre Saúde, p. 427). Além de ser virtuosa em si mesma, a boa leitura nos ajuda a cultivar outras virtudes. Experimente! ] ADRIANA TEIXEIRA, mestre em Linguística Aplicada, é editora

R e v i s t a A d ve n t i s t a // Fevereiro 2019

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mente humana é uma das mais belas obras do Criador. E Ele concedeu ao ser humano o privilégio de moldá-la ou renová-la lançando mão de variados métodos. Um deles, talvez o mais eficaz, seja a leitura, a boa leitura. Não é recente a discussão de que ler é a chave do sucesso para quem quer escrever e falar bem. As narrativas ajudam a dar forma à vida e a definir uma pessoa. Ao passar tempo em leitura, as histórias entram na mente e são capazes até mesmo de transformá-la. Sabedores desse efeito, muitos pais se preocupam em colocar seus filhos, desde que nascem, em contato com livros das mais diversas cores e texturas. Contudo, será que temos lido aquilo que influencia para o bem, para a utilidade e potencialidade? Pesquisas mostram que, apesar de muitos viverem uma vida sedentária, não se sentam para ler com concentração e foco. Dessa maneira, não costumam se expor às ideias e conceitos mais profundos, que exigem reflexão. O fato é que neste mundo repleto de escolhas, em que nossa atenção é disputada, a simples decisão de reservar um tempo para ler requer uma vida de moderação. A pesquisa na internet tem seu valor e não deve ser dispensada, mas essa facilidade pode estar dispensando a leitura centrada de um livro por completo, de “capa a capa”. Checar mensagens pessoais ou as mídias sociais o tempo todo é prazeroso e se


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