Agosto de 2020 • Ano 03 • N 06
ELES NÃO ESPERARAM PELO FIM DA PANDEMIA Relatos de moradores da Amazônia mostram o sofrimento de famílias para levar, diariamente, o sustento físico e emocional para casa Desmatamento em alta no primeiro semestre de 2020. Pág. 06
Indústria busca estratégias para recuperar perdas na crise da Covid-19. Pág. 38
Estilista tikuna faz sucesso com moda que exalta design indígena. Pág. 57
Editorial www.revistacenarium.com.br
Semblantes ocultos
A mesma tormenta, barcos diferentes
EXPEDIENTE
Os semblantes dos brasileiros que estampam a capa da REVISTA CENARIUM desta edição nos obrigam a parar o tempo e refletir sobre cada um dos rostos, marcados por incertezas de um futuro sem promessas e sem planos. A luta dos trabalhadores informais em meio à tragédia da pandemia do novo coronavírus foi retratada na matéria “Medo e Resistência” e traz o olhar aparentemente revoltado do estivador Marcley Silva, de 30 anos. Ele, na verdade, esconde medos: medo de não conseguir sustento, medo de morrer doente, medo de não realizar sonhos nunca contados. A história de Marcley está entre tantas outras encontradas no sistema de subemprego do País, que compreende 40% da população ocupada, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São mais de 38 milhões de pessoas, o equivalente ao número de habitantes do Canadá. Um povo que não podia parar e sobreviver com três novas cédulas de R$ 200 ao mês, pagas pelo governo federal a título de “auxílio”, dentro de uma economia mergulhada oficialmente na recessão como aponta a Fundação Getúlio Vargas (FGV). Não podemos julgá-los por fatalmente disseminar a doença. A nós, cabe apenas contar suas histórias e torcer para que o maldito vírus não os alcance.
Estamos todos no mesmo barco? A pandemia de Covid-19 prova que não. Enquanto poucos podem cumprir o “fique em casa” sem se preocupar com as contas que chegarão, outros precisam se expor para garantir o sustento, seja nas filas do desemprego ou do auxílio emergencial, seja no trabalho informal nas ruas das cidades. Enquanto uns contam com atendimento médico de excelência, outros morrem em casa. E o que dizer dos indígenas que, se não estiverem em terras demarcadas, nem entram para as estatísticas do governo federal? Nem todos são contabilizados, mas seguem morrendo.
Paula Litaiff
Márcia Guimarães
Diretora-geral
Editora-executiva
Diretora-Geral Paula Litaiff – MTb-793/AM www.paulalitaiff.com Editor-executivo – On-line Luís Henrique Oliveira Editora-executiva – Impresso Márcia Guimarães Editora-executiva – TV Web Vanessa Taveira Coordenadora de Redação Caroline Givoni Reportagem Bruno Pacheco Carolina Givoni Gabriel Abreu Gabriel Ricardo Luciana Bezerra Luís Henrique Oliveira Jarleson Rabelo Márcia Guimarães Mencius Melo Michele Portela Naferson Cruz Paula Litaiff Vanessa Taveira Thiago Fernando Fotografia Ricardo Oliveira Clóvis Miranda Arleson Sicsu Projeto gráfico/diagramação Hugo Moura e Porto Agência Social Media Marcele Fernandes Gisely Coutinho Cinegrafista/Editor de Imagens Lourenço Filho Luiz Ricardo Editor de Imagens Luiz Reis Revisão Gracycleide Drumond Diretor Comercial Wilson Gonçalves (055 92) 98144-5657 Gerente Administrativa Elcimara Oliveira (055 92) 99196-4196 Assessor Jurídico Christhian Naranjo de Oliveira (OAB 4188/AM)
Na economia, donos de grandes empresas buscam fôlego para terminar o ano mitigando perdas, enquanto os pequenos fecham as portas ou tentam adaptar seus negócios para manter-se de pé. E, enquanto os humanos tentam sobreviver à doença e à crise econômica, o meio ambiente bate recordes de degradação. Nesta edição, a REVISTA CENARIUM mostra, ao longo das reportagens, que podemos até enfrentar a mesma tormenta, mas alguns navegam em transatlânticos e outros se equilibram em frágeis canoas para não se afogar.
Sumário Agosto de 2020 • Ano 03 • N 06
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE Amazônia devastada ............................................ 06 Povo Yanomami em perigo ................................. 08
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Fumaça e aquecimento......................................... 10
PODER & INSTITUIÇÕES Eleição na pandemia............................................. 14 Artigo - Os oportunistas em época de pandemia.............................................................. 17 STF decide: falta legitimidade ao MP de Contas para abrir investigação autônoma........... 18 Ranking da Transparência .................................... 21 ‘Má governança sobre Amazônia marginaliza Brasil’, diz Arthur Neto sobre gestão Bolsonaro... 23 Artigo - A precarização do trabalho e o pós-pandemia........................................................ 25
ECONOMIA & SOCIEDADE
34 Artigo - A pandemia e um novo propósito de vida................................................... 51
CAPA – Vírus da Fome............................................ 26
MUNDO & CONFLITOS INTERNACIONAIS
Vítimas Invisíveis................................................... 32
Greta Thunberg vai doar mais de R$ 600 mil
Desemprego na Amazônia..................................... 34
para combate à Covid-19 na Amazônia................. 52
Mapa da pandemia ............................................... 36
Pandemia: alguns países ainda enfrentam batalha “longa e difícil”, alerta OMS.................... 55
Indústria em alerta................................................ 38 ‘Feira Digital’ ........................................................ 40 Artigo - Por mais inclusão no processo democrático........................................... 43
ENTRETENIMENTO & CULTURA EstiloTikuna........................................................... 57 Lugar de Fala......................................................... 60
POLÍCIA & CRIMES AMBIENTAIS
Poetinha do Pará................................................... 62
Brasil é o terceiro País mais perigoso para ativistas ambientais, diz pesquisa ....................... 44
VIAGEM & TURISMO
Madeira ilegal........................................................ 46
Em busca de turistas............................................ 64
Campeão do desmatamento................................. 48
Entre rios............................................................... 68
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
AMAZÔNIA DEVASTADA
Crédito: Ricardo Oliveira
Desmatamento no primeiro semestre de 2020 é 25% maior do que em 2019 Luciana Bezerra – Da Revista Cenarium
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ANAUS – Nos seis primeiros meses deste ano, o desmatamento na Amazônia brasileira registrou um recorde de 3.070 quilômetros quadrados. A área devastada marca um aumento semestral de 25% na comparação com os 2.446 quilômetros quadrados desmatados no mesmo período do ano passado, de acordo com o relatório feito a partir de observações de satélite do sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Os dados foram ainda confirmados pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) em 17 de julho, dias após as duas maiores apreensões de madeira ilegal no Amazonas e no
Pará, que, somadas, resultaram em cerca de 4 mil metros cúbicos de madeira retiradas da floresta. Com base nos dados oficiais divulgados pelo Inpe, o desmatamento atingiu 1.034,4 quilômetros quadrados em junho, contra 934,81 quilômetros quadrados no mesmo período em 2019, o pior mês de junho da série histórica iniciada em 2015. A extração ilegal de madeira, a mineração e a pecuária em áreas protegidas são as principais causas de destruição, que, em 2019, superou pela primeira vez desde 2008 a marca de 10 mil quilômetros quadrados, de acordo com outro sis-
“
A floresta amazônica integra o sistema climático que sustenta a agricultura e o PIB do País. Vem da Amazônia boa parte da umidade, as chuvas, das quais dependem o Brasil e a América do Sul”
Crédito: Mayke Toscano Secom MT
REVISTA CENARIUM
Carlos Nobre, climatologista.
tema de observação por satélites do Inpe, o Prodes, mais ajustado que o Deter. O desmatamento parece não dar trégua, apesar da presença militar incorporada à vigilância ambiental e da pressão internacional e empresarial. A tendência provoca alarmes devido ao início da temporada de secas em junho. Em 2019, o desmatamento disparou em julho, a 2.255,33 quilômetros quadrados de superfície na Amazônia. A temporada seca também é o período de incêndios em áreas desmatadas, que este ano provoca uma preocupação dupla, tanto por seu impacto ambiental como pelo fato de que a fumaça geralmente provoca um aumento das doenças respiratórias, que acontecerá em plena pandemia do novo Coronavírus.
FLORESTA DE PÉ TRAZ RIQUEZAS Durante a webconferência “Desmatamentos e Queimadas na Amazônia”, promovida pelo Tribunal de Contas do Amazonas (TCE), também em 17 de julho, o climatologista Carlos Nobre e o ex-presidente do Inpe, Ricardo Galvão, debateram sobre o crescimento das queimadas e do desmatamento na região amazônica. Para um dos maiores especialistas do mundo na Amazônia, o climatologista Carlos Nobre, a Amazônia em pé, asso-
ciada a uma nova indústria, trará riquezas muito maiores que a gerada por sua destruição.
Dados do Inpe apontam que o desmatamento atingiu 1.034,4 quilômetros quadrados em junho deste ano, o pior mês de junho da série histórica iniciada em 2015
“A floresta amazônica integra o sistema climático que sustenta a agricultura e o PIB do País. Vem da Amazônia boa parte da umidade, as chuvas, das quais dependem o Brasil e a América do Sul. É um sistema que existe há milhões de anos e está sob ataque”, afirma o cientista. Segundo Nobre, a floresta amazônica é um ecossistema único, diferente das florestas tropicais, pois ela evoluiu com a maior biodiversidade do planeta, criando condições para sua própria existência. Além disso, ela tem um sistema biológico com capacidade de reciclar os nutrientes e de gerar grande parte de chuva, por isso ela se mantém viva. Nobre aponta alguns fatores como os responsáveis pelo desaparecimento da floresta amazônica. “O que causa esse risco ao desaparecimento da floresta amazônica são fatores antropogênicos, as mudanças climáticas, o aquecimento global, o desmatamento regional e as queimadas, o aumento da vulnerabilidade da floresta amazônica ao fogo. Esses são os três fatores que estão acontecendo ao mesmo tempo, eles interagem e o efeito sinergístico deles leva ao risco do desaparecimento da floresta”, avalia o pesquisador.
25% O desmatamento na Amazônia brasileira registrou aumento de 25% no primeiro semestre de 2020 em relação ao mesmo período de 2019. O recorde de 3.070 quilômetros quadrados desmatados neste ano superou os 2.446 quilômetros quadrados do ano passado. 07
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
Povo Yanomami em perigo Terra indígena é a mais pressionada para desmatamento na Amazônia Legal, revela estudo do Imazon Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium
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ANAUS – A terra indígena Yanomami, entre a fronteira do Amazonas e Roraima, é a mais pressionada da Amazônia Legal, registrando 72 ocorrências de desmatamento em 2020, até abril. O estudo é do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), que divulgou um boletim no dia 22 de junho sobre as áreas protegidas mais ameaçadas e pressionadas da região. O boletim considera os meses de fevereiro, março e abril deste ano e mostra, ainda, a Área de Proteção Ambiental (APA) Estadual Triunfo do Xingu, no Sul do Pará, ocupando o segundo lugar no ranking das áreas protegidas com maior pressão, com 56 registros de desmatamentos. A terra indígena do Alto Rio Negro, também no
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Amazonas, ocupa a terceira posição da lista, com 51 ocorrências. No período analisado, de acordo com o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon, um total de 4,4 quilômetros quadrados de área foi desmatada, o que representa cerca de 4,5% de todo o território indígena. O boletim divide o território em células de 10 quilômetros de extensão por 10 quilômetros de profundidade e a contagem considera o número de células dentro da área protegida que registraram ocorrências de desmatamento. Entre as unidades de conservação Federal, a Área de Proteção Ambiental do Tapajós (PA) e a unidade da Parna Maminguari, entre Roraima e o Amazonas,
junto à terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau, em Rondônia, estão entre as mais ameaçadas. “Áreas Protegidas (APs) representam um patrimônio nacional e, considerando a extensão das APs na Amazônia Legal (i.e., 46%), os seus benefícios para manutenção da biodiversidade, estoques de carbono e na geração de serviços ambientais como a regulação do clima, transcendem a fronteira nacional, alcançando relevância global. Propomos uma metodologia para monitorar as Ameaças e Pressões nas APs baseada em dados de desmatamento (sem sombra de dúvidas um dos maiores vetores de ameaças, mas há outros vetores como extração madeireira, garimpo, hidrelétricas)”, diz o boletim.
Crédito: Ricardo Oliveira
REVISTA CENARIUM
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Crédito: Ricardo Oliveira
MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
FUMAÇA E AQUECIMENTO Frota de veículos da Amazônia Legal emite até 12 milhões de toneladas de CO² por ano, diz Inpe Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium
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ANAUS – A frota de veículos de 9,6 milhões da Amazônia Legal, entre carros, motos e ônibus, emite entre 8 milhões a 12 milhões de toneladas de dióxido de carbono - CO² - todos os anos, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) repassados à REVISTA CENARIUM. O volume de emissão, embora represente apenas 2% do total de CO² emitido pelo desmatamento na região, ainda representa um perigo para o aumento do efeito estufa. O dado é confirmado pelo pesquisador do Inpe, na região, Jean Ometto, considerando a quantidade de gás carbônico que os veículos lançam na Terra e o levantamento realizado pela reporta-
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gem, com base na frota de veículos da Amazônia brasileira, disponibilizada pelo Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). O gás carbônico, ou dióxido de carbono (CO²), é um gás presente na atmosfera e está associado ao efeito estufa, sendo considerado prejudicial ao meio ambiente e um dos responsáveis pelo aumento do aquecimento global. De acordo com Jean Ometto, outros fatores também devem ser considerados para obter a quantidade aproximada de CO² emitida pelo número da frota, como emissão de quilograma do gás por litro de gasolina, o uso de combustível
REVISTA CENARIUM
Entre os benefícios obtidos com a menor circulação de veículos nas cidades, pontua o pesquisador, estão a redução de poluição do ar (material particulado, ou seja, partículas finas como poeiras), menor produção de dióxido de nitrogênio, enxofre, entre outros poluentes. De acordo com o pesquisador, quando um carro é movido somente à gasolina, a emissão de CO² por litro de gasolina é de dois quilos no período de um ano, o que não é muito diferente quando se fala em diesel. “No Brasil, o carro que roda somente com gasolina emite em torno de 2,5 quilos de CO² por litro de combustível, isso, por exemplo, se ele não tiver Etanol. De 23% a 27% da gasolina brasileira é etanol. Essa emissão de CO², que é contabilizada para inventário, é a emissão que vem de combustíveis fósseis. Porque no etanol a emissão de carbono é zerada, sendo considerada energia renovável”, esclarece Ometto.
DESMATAMENTO O desmatamento no Brasil é ainda o setor, do inventário de emissões, que mais emite gás carbônico em território nacional, com quase 2 bilhões de toneladas do poluente anualmente, de acordo
O Amazonas tem uma frota de 944.345 mil veículos e está em quarto lugar entre os Estados da Amazônia Legal
com os dados de 2018 e divulgados em 2019 pelo Projeto de Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (Prodes) do Inpe. Ao considerar todas as formas de emissão do gás na atmosfera, os números fazem do Brasil o sétimo maior emissor global de CO², o que representa entre 2,5% a 3% do total no mundo. Somente a Amazônia Legal foi responsável por emitir 400 milhões de toneladas de gás em 2018, número ainda mais alto em 2019, com a emissão de 570 milhões de toneladas do gás. Os dados de emissões de CO² são calculados a partir de um sistema do Projeto de Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (Prodes), que é liberado anualmente, em novembro. “Acredito que a emissão não vá mudar, inclusive porque vem aumentando o desmatamento na Amazônia a cada ano”, disse Jean Omeetto.
“
Precisamos estar atentos com a redução no meio urbano para ter qualidade de vida”
Jean Ometto, pesquisador do Inpe.
Crédito: Acervo pessoal
“Devemos lembrar que, mais ou menos, metade dessa frota (4,75 milhões) usa só etanol (combustível renovável). Admitindo essa quantidade, os veículos emitiriam em torno de 8 milhões a 12 milhões de toneladas de CO² por ano. Estamos falando de um valor que é menos de 2% do desmatamento na Amazônia brasileira, mas que não significa que podemos deixar de economizar, porque a redução da circulação de veículos envolve também outros benefícios. Precisamos estar atentos com a redução no meio urbano para ter qualidade de vida”, analisou o pesquisador à REVISTA CENARIUM.
Crédito: Ricardo Oliveira
renovável, a quantidade existente de veículos com tecnologia flex, que permite o abastecimento do transporte com gasolina ou álcool, a idade média da frota da região, quanto, em combustível, um veículo gasta, em média, anualmente, entre outros.
LIGAÇÃO O ambientalista e superintendente do Instituto Internacional de Responsabilidade Socioambiental Chico Mendes, José Coutinho, observa que o sistema de transporte de pessoas e mercadorias sempre esteve associado à geração de alguma forma de poluição, seja atmosférica, sonora ou visual. Para ele, o nível de organização e controle das atividades de transporte sejam públicos, privados ou individual pela população são condicionantes impor-
O pesquisador do Inpe, Jean Ometto, aponta que a redução da circulação de veículos envolve diversos benefícios que influenciam na qualidade de vida
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MEIO AMBIENTE & SUSTENTABILIDADE
VEÍCULOS POLUENTES Acre
297.813
Amapá
208.839
Amazonas
944.345
Pará
2.154.037
Rondônia
1.046.677
Roraima
233.205
Tocantins
735.456
Maranhão
1.803.422
Mato Grosso
2.256.068
Total Brasil Fonte: Denatran
9.679.862 106.010.452
Crédito: Ricardo Oliveira
Amazonia Legal
Rua de Manaus enfumaçada no período das queimadas
tantes para explicar os diferentes índices de poluição veicular.
“
A poluição do ar representa uma ameaça para todos, embora as pessoas mais pobres e marginalizadas sejam as que mais sofrem”
Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS
“Em Manaus, observando a rotina diária nos centros urbanos, isso não incomoda a população. Na maioria das vezes, a poluição não é perceptível, mas não quer dizer que os veículos não estejam poluindo. Com esse número crescente do transporte circulando na cidade, para um clima quente e úmido como é o nosso [na Amazônia], isso poderia ser evitado se os proprietários dos veículos cuidassem melhor e mantivessem as manutenções preventivas”, pontuou. Segundo Coutinho, na capital amazonense, ainda é possível perceber veículos circulando emitindo fumaça preta pelo escapamento, lançando no meio ambiente, prejudicando, principalmente, a saúde da população. “As poluições veiculares causam impactos, tanto ambientais, quanto de saúde pública, causados pelos motores e as fuligens expelidas pelos escapamentos que ficam encrostados nas plantas, calçadas e prédios, nas fachadas dos imóveis. O principal poluente nesta categoria é o dióxido de carbono (CO²)”, explicou Coutinho.
VEÍCULOS POLUENTES Os dados do Denatran, atualizados há menos de um mês, mostram que Mato 12
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Grosso é o Estado que mais possui veículos na Amazônia Legal, com 2.256.068 milhões de veículos entre carros, motos e ônibus. Em segundo lugar, aparece Pará, com 2.154.037 milhões de veículos. Completam a lista, respectivamente, os Estados de Maranhão (1.803.422 milhão), Rondônia (1.046.677 milhão), Amazonas (944.345 mil), Tocantins (735.456 mil), Acre (297.813 mil), Roraima (233.205 mil) e Amapá (208.839 mil).
ESTUDO Na capital amazonense, um estudo desenvolvido com pesquisadores da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) apontou que houve uma queda de 64% nos níveis de material particulado (poluição do ar) na área urbana, em Manaus, em consequência da diminuição das atividades industriais e da mobilidade urbana, durante o isolamento social decorrente da Covid-19. De acordo com dados do Instituto Municipal de Mobilidade Urbana (IMMU), em Manaus, durante os meses em que a doença esteve mais acentuada, o órgão informou que observou uma redução de, pelo menos, 30% na circulação de veículos nos principais corredores de tráfego da cidade.
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Foto: Clรณvis Miranda.
PODER & INSTITUIÇÕES
Eleição na pandemia Com 10,5 milhões de eleitores, TREs do Pará, Amazonas e Mato Grosso se preparam para ‘novo normal eleitoral’ Carolina Givoni – Da Revista Cenarium*
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ANAUS – Cerca de 19 milhões eleitores estão distribuídos nos nove Estados da Amazônia Legal. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a região, que detém 13% do colégio eleitoral do País, se prepara para o “novo normal” do pleito municipal, marcado para 15 e 29 de novembro e ainda cheio de incertezas. A equipe de reportagem da REVISTA CENARIUM fez alguns questionamentos aos TREs dos Estados com maior eleitorado da região para entender como o adiamento da votação pode interferir no planejamento, organização e distribuição de urnas para as regiões mais remotas dos Estados. Pará, Amazonas e Mato Grosso são os Estados da Amazônia Legal com maiores eleitorados. Juntos, eles concentram 10,5 milhões de eleitores, mais da metade de todo o eleitorado da região (55,2%). O Pará lidera com 5,7 milhões de votantes, seguido do Amazonas com 2,5 milhões e do Mato Grosso, com 2,3 milhões, no
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ranking atualizado pelo TSE em junho deste ano. O TRE do Pará afirmou que já vinha se preparando para realizar as eleições em outubro, como programado anteriormente. A alteração de data não interferiu o planejamento anterior, pelo contrário, contribuiu ainda mais com a preparação. Sobre a previsão de gastos no primeiro turno e em um possível segundo turno, o órgão paraense informou que o “orçamento de eleições para o TRE do Pará gira em torno de R$ 28 milhões”. A Revista Cenarium também questionou se as medidas de isolamento determinadas para conter a disseminação do novo Coronavírus poderiam onerar os custos do tribunal. “O orçamento para realização das eleições não sofreu alteração e o tribunal se organiza para atender as demandas de segurança, de acordo com o protocolo, com especial atenção para o uso de álcool em gel e uso de máscaras e demais EPIs”.
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19 milhões
O que diz o TSE?
Eleitorado dos Estados da Amazônia Legal soma 19 milhões de eleitores.
Pergunta: Quais medidas de proteção o TSE já sabe que precisarão ser adotadas para o pleito? Há previsão de custo? Há prazo para definição das medidas?
10,5 milhões Pará, Amazonas e Mato Grosso concentram 10,5 milhões de eleitores da Amazônia.
Resposta: A Justiça Eleitoral está elaborando a lista dos itens necessários, mas já se sabe que serão necessários: álcool em gel, álcool líquido, máscaras e marcadores de chão para distanciamento social, entre outros. O presidente do Tribunal, ministro Luís Roberto Barroso, está em diálogo com a iniciativa privada para as doações beneficiarem todo o Brasil, sem custo adicional para a Justiça Eleitoral. Pergunta: Muitos mesários voluntários podem desistir do voluntariado por causa da pandemia, por medo de contaminação. O que o TSE tem a dizer a essas pessoas? Resposta: A Justiça Eleitoral adotará todos os cuidados e fornecerá o equipamento de segurança individual para quem se voluntariar. O TSE conclama aqueles que não sejam do grupo de risco a colaborar neste momento, para que o País seja beneficiado e a democracia fortalecida.
Crédito: Roberto Jayme/ASCOM/TSE
Pergunta: É possível fazer parceria com órgãos de segurança, com o Exército Brasileiro ou polícias, para que estes ajudem nas filas no dia das eleições e evitem aglomerações? Resposta: As forças de segurança sempre são parceiras da Justiça Eleitoral no dia das eleições e o Tribunal pretende dialogar com o Ministério da Defesa para ampliar as parcerias em razão do momento delicado provocado pela pandemia. No entanto, ainda não há nenhuma medida concreta definida. 15
Crédito: Abdias Pinheiro/TSE
PODER & INSTITUIÇÕES
O presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, está em diálogo com a iniciativa privada para as doações de itens de proteção beneficiarem todo o Brasil
Além das medidas sanitárias, a adoção de agendamento para votação ou algum tipo de atendimento preferencial para eleitores do grupo de risco da Covid-19, são questões a serem ainda definidas pelo TRE.
AMAZONAS Em Manaus, no Amazonas, o diretor-geral do TRE-AM, Ruy Melo de Oliveira, também explicou que o adiamento das eleições não irá interferir na distribuição das Urnas Eletrônicas, o que é uma das principais preocupações do órgão, haja vista a dificuldade de logística do Estado. “O tribunal estaria pronto para realizar as eleições em 4 de outubro, caso não houvesse adiamento, e estará pronto para a nova data, qual seja, 15 de novembro de 2020”. O valor das eleições também não sofreu alteração, mantendo o custo previsto em R$ 18,9 milhões, valor esse repassado pelo TSE. Já sobre a compra de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), Oliveira diz que ainda não é possível estimar os gastos. “Não temos essa estimativa, por se tratar de uma eleição atípica e inédita no Brasil. Essa conta só será fechada com os valores dos EPIs do pessoal envolvido em momento oportuno”.
A previsão de gasto em custeio orçado na região mato-grossense está distribuída em R$ 16,7 milhões, sendo R$ 8,2 milhões para o primeiro turno e R$ 3,1 milhões para o segundo turno, com uma previsão de gasto em pessoal da ordem de R$ 5,3 milhões. Sobre o atendimento preferencial para eleitores do grupo de risco da Covid-19, o tribunal ainda afirma que nada foi definido. “Grupos de trabalho com servidores das unidades técnicas foram criados para definir quais providências serão adotadas em âmbito nacional. Assim que tivermos um posicionamento definitivo, faremos a devida divulgação”, finaliza.
BIOMETRIA O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) seguirá recomendação apresentada pelos infectologistas que prestam consultoria sanitária para as eleições municipais e
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A decisão foi tomada pelo presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, após ouvir os médicos David Uip, do Hospital Sírio-Libanês, Marília Santini, da Fundação Fiocruz, e Luís Fernando Aranha Camargo, do Hospital Albert Einstein, que integram o grupo que presta a consultoria. Para decidir excluir a biometria, médicos e técnicos consideraram dois fatores: a identificação pela digital pode aumentar as possibilidades de infecção, já que o leitor não pode ser higienizado com frequência; e aumenta as aglomerações, uma vez que a votação com biometria é mais demorada do que a votação com assinatura no caderno de votações. Muitos eleitores têm dificuldade com a leitura das digitais, o que aumenta o risco de formar filas.
Posição
Estado
Eleitorado
%
1
PA
5.757.079
3,825
2
MA
4.758.568
3,161
3
AM
2.503.211
1,663
4
MT
2.316.860
1,539
5
RO
1.190.505
0,791
6
TO
1.035.289
0,688
7
AC
561.261
0,373
MATO GROSSO No terceiro maior colégio eleitoral da Amazônia Legal, o TRE-MT afirma que a distribuição de urnas para as regiões mais remotas do Estado vai seguir o cronograma já utilizado em eleições anteriores. “Não haverá mudança significativa. No entanto, algumas adaptações podem ser necessárias e estão sendo estudadas pelos cartórios eleitorais responsáveis pelos locais de votação considerados de difícil acesso”.
excluirá a necessidade de identificação biométrica no dia da votação.
8
AP
517.082
0,344
9
RR
342.641
0,228
18.982.496
12,611495
AM LEGAL Fonte: TSE
ARTIGO – MARCO AURÉLIO CHOY
Os oportunistas em época de pandemia Marco Aurélio Choy
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ivemos a maior tragédia da nossa geração, trazendo contaminação e morte de pessoas próximas, sem nenhuma perspectiva de uma vacina, movimento que marca a história da humanidade e que modificará o nosso chamado processo civilizatório. Nesses momentos de crise mundial, observam-se comportamentos distintos: de um lado, encontramos o melhor da humanidade – a solidariedade; do outro, o egoísmo expresso nas intenções de lucrar, de ganhar visibilidade, de alavancar, politicamente, carreiras pouco sucedidas. Assim funciona a humanidade e suas vicissitudes. De um lado temos o empresário que vende bens de uso, absolutamente, necessários em tempos de pandemia como álcool em gel, máscaras e luvas e observam no surto de Coronavírus uma oportunidade, não de prestar um importante serviço para a sociedade, mas uma oportunidade de lucrar, aumentando os preços sem medida. De outro lado, temos empresários que, mesmo preocupados com a grande recessão que atinge o País, mostram-se solidários, doando lanches para os valorosos profissionais de saúde, os super-heróis da vida real.
Vi certo dia um político local que apresentou proposta de redução dos salários de vereadores, mesmo tendo conhecimento jurídico da impossibilidade de apreciação pelas limitações Constitucionais, mas o fez com o viés de promoção pessoal, afinal, no papel cabe qualquer coisa, e o papel mais bonito é posar de forma positiva para a opinião pública. Mais fácil que a autopromoção pessoal é pegar parte do seu salário e doar, por exemplo, para a Universidade do Estado do Amazonas (UEA), que faz um bonito trabalho de confecção de EPIs para os profissionais de saúde. Não é preciso lei para isso, nem dará a repercussão de promoção pessoal que se esperava, mas é para isso que se exerce um mandato? De qualquer forma, vivemos tempos difíceis, tempos de união, tempos de críticas construtivas, sem politização da saúde e da vida, e com o respeito às estruturas de controle do Estado. Que saiamos melhores que entramos nesta pandemia. * Marco Aurélio Choy é Presidente da OAB/Amazonas
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PODER & INSTITUIÇÕES
STF decide: falta legitimidade ao MP de Contas para abrir investigação
Carlos Moura/SCO/STF/Fotos Públicas
Paula Litaiff – Da Revista Cenarium
Debate sobre legitimidade do MPC para investigações autônomas foi parar no Supremo 18
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Rosinei Coutinho/SCO/STF/Fotos Públicas
ANAUS - O Supremo Tribunal Federal (STF) criou uma jurisprudência na qual reafirma a falta de legitimidade do Ministério Público de Contas (MPC) para instaurar investigação autônoma contra agentes públicos, isto é, sem o processo estar sob a tutela do Tribunal de Contas dos Estados e da União. A limitação institucional do MPC foi validada em uma decisão do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, na qual ele concedeu uma Medida Cautelar na Suspensão de Segurança para o governo do Distrito Federal (SS 5.416 MC/ DF), no último dia 29 de julho, em um processo de investigação do MPC junto às secretarias estaduais de Saúde e de Turismo. “(…) entendo, em juízo provisório, que acesso a informações sob custódia dos agentes públicos sujeitos a controle externo depende da instauração de procedimento devidamente regulamentado no âmbito do respectivo Tribunal de Contas, não se admitindo a requisição autônoma feita por membro do Ministério Público especial, sob pena de se admitir a usurpação de competências e a sobreposição de medidas de vigilância, dificultando ou, mesmo, inviabilizando o controle judicial de eventuais abusos ou irregularidades cometidos nesse exercício”, argumenta o presidente do STF. Além de usar os dispositivos da Constituição Federal, Toffoli reforçou seu entendimento em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proferida pelo ministro Celso de Mello em 1994. Em suma, o presidente do STF explica que cabe ao Tribunal de Contas fiscalizar e julgar e o MPC serve como órgão auxiliador do processo dentro do sistema estrutural da Corte de Contas. “Por se tratar a promoção de fiscalização e julgamento das contas dos responsáveis pela gestão de recursos públicos de prerrogativa institucional da Corte de Contas; bem como considerando a compreensão firmada pelo Supremo Tribunal Federal no sentido de que o Ministério Público especial “encontra-se consolidado na ‘intimidade estrutural’ d[a] Corte de Contas (ADI nº 789/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 19/12/1994, grifei)”, justifica Toffoli.
‘FISCALIZAÇÃO BUROCRÁTICA’ A existência de mais um órgão fiscalizando diretamente a administração pública como o Ministério Público de Contas foi outra tese levantada pelo governo do Distrito Federal ao STF, e classificou o processo como um “entrave à agilidade na gestão governamental em meio à pandemia” do coronavírus.
A limitação institucional do MPC foi validada em uma decisão do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli
“Não podem as políticas de enfrentamento ao vírus, legitimamente definidas por parte de governantes eleitos, com o apoio do corpo técnico-burocrático permanente dos órgãos de saúde locais, serem a todo tempo escrutinadas e questionadas por uma infinidade de órgãos de controle externo, para além do legítimo controle já exercido pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e do Tribunal de Contas do Distrito Federal”, diz o argumento. As alegações do governo do Distrito Federal foram aceitas pelo presidente do STF que proferiu decisão liminar (provisória), conforme trecho do despacho: “Sob essas considerações, entendo que a decisão liminar deferida nos autos do MS nº 0724082-87.2020.8.07.0000 institui risco à ordem jurídico constitucional e, nessa medida, justifica o provimento de contracautela para suspender sua execução até final julgamento do mandamus. Ante o exposto, defiro o pedido liminar”, finaliza Toffoli. 19
PODER & INSTITUIÇÕES
Cabe ao Tribunal de Contas fiscalizar e julgar e o MPC serve como órgão auxiliador do processo no sistema estrutural da Corte de Contas, aponta a decisão do presidente do STF
Divulgação/Assessoria
O caso teve origem em um mandado de segurança ingressado pelo Ministério Público de Contas de Goiás no Tribunal de Justiça estadual (TJ-GO) contra ato do Tribunal de Contas local (TCE-GO). Segundo informações do site do STF, o TCE-GO havia determinado o arquivamento da representação apresentada pelo MP para apurar irregularidades em processo licitatório para a construção da nova sede da corte de contas. O chefe do Ministério Público de Contas no Amazonas, procurador-geral João Barroso, foi procurado para comentar a decisão do Supremo Tribunal Federal, mas não retornou as ligações.
AUTONOMIA EM XEQUE A decisão do Supremo em validar a restrição de atuação do MPC é a segunda em menos de dois anos. A última ocor-
AS ALEGAÇÕES No mês passado, o governo do Distrito Federal ajuizou um pedido de suspensão de segurança com o objetivo de sustar – suspender – uma decisão da Justiça Federal (TJDF), em que foi determinado ao governador e aos secretários de Saúde e de Turismo que fornecessem informações e documentos requisitados pelo Ministério Público de Contas no prazo de quinze dias para atender a uma investigação em curso no órgão. O governo do Distrito Federal alegou, com base na Constituição Federal, que o Ministério Público de Contas é parte integrante do Tribunal de Contas e se qui-
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reu em 26 de abril de 2019, quando o STF reafirmou sua jurisprudência para reconhecer que o Ministério Público de Contas não tem legitimidade para impetrar mandado de segurança contra acórdão do Tribunal de Contas no qual atua. O entendimento ocorreu em decisão plenária no julgamento de mérito do Recurso Extraordinário (RE) 1178617, que teve repercussão geral reconhecida.
sesse o constituinte que os procuradores dos MPs de Contas tivessem atribuições idênticas aos membros do Ministério Público da União e dos Estados teria inserido na competência do órgão a função de oficiar junto às Cortes de Contas. A atividade de controle externo está prevista no art. 71 da Constituição. Nele diz que o controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: “[…] II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e manti-
Após análise, o TJ-GO afastou a legitimidade do Ministério Público de Contas para a impetração e determinou a extinção do mandando de segurança sem julgamento de mérito. Em seguida, o MP de Contas recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que proveu seu recurso para reconhecer sua legitimidade e determinar que a Justiça de Goiás desse prosseguimento ao trâmite do mandado de segurança.
das pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público“. O governo do Distrito Federal defendeu ainda que a decisão anterior do Tribunal de Justiça Federal põe em risco a ordem jurídico constitucional, em especial a capacidade do Poder Executivo em trabalhar com “independência na consecução dos interesses públicos, por alegada ilegitimidade do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Distrito Federal em promover ação de controle independentemente da instauração de procedimento no órgão perante o qual atua”.
Ranking da Transparência Amazonas se destaca entre os primeiros do País no acesso a dados de gastos na pandemia Da Revista Cenarium*
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ANAUS – O Governo do Amazonas manteve a avaliação positiva em nível de transparência quanto aos dados relacionados à pandemia do novo coronavírus. Em escala de zero a 100, o governo estadual registrou 97 pontos e foi classificado como ‘Ótimo’, ocupando o segundo lugar no Índice de Transparência da Covid-19, divulgado pela Organização Não Governamental (ONG) Open Knowledge Brasil (OKBR) no dia 06 de agosto. O ranking tem o objetivo de avaliar a qualidade dos dados e informações relacionadas à pandemia do novo coronavírus publicadas pela União e pelos Estados brasileiros por meio dos portais oficiais. No caso do Amazonas, a OKBR analisa o Portal da Transparência (www. transparencia.am.gov.br/covid-19/), que é mantido pelo Governo do Estado. Nesta edição, que considera dados verificados no período entre os dias 23 de julho e 05 de agosto, o ranking mostra o Amazonas empatado com os Estados
de Minas Gerais (MG) e Rio Grande do Sul (RS). A avaliação e os boletins semanais podem ser acessados no site www.transparenciacovid19.ok.org.br. Conforme o controlador-geral do Estado, Otávio Gomes, há uma força-tarefa entre órgãos como a Controladoria-Geral do Estado (CGE), a Fundação de Vigilância em Saúde (FVS), a Secretaria de Estado de Saúde (Susam) e também a Empresa Processamento de Dados do Amazonas (Prodam) com foco no atendimento a todos os critérios das organizações avaliadoras na questão de transparência da Covid-19. “O Governo do Estado preza pelo aprimoramento constante da disponibilização dos dados ao cidadão amazonense. O objetivo é alcançar e manter os resultados do Amazonas em primeiro lugar na transparência. Seguimos determinações do governador Wilson Lima”, disse o controlador. (*) Com informações da assessoria
Para avaliação dos Estados, a OKBR utiliza os seguintes critérios: Conteúdo:
São considerados itens como idade, sexo e hospitalização dos pacientes confirmados, além de dados sobre a infraestrutura de saúde, como ocupação de leitos, testes disponíveis e aplicados.
Granularidade:
Avalia se os casos estão disponíveis de forma individual e anonimizada; além do grau de detalhamento sobre a localização (por município ou bairro, por exemplo).
Formato:
Consideram-se pontos positivos a publicação de painéis analíticos, planilhas em formato editável e navegação simples.
Boa colocação na lista da Transparência Internacional Luís Henrique Oliveira – Da Revista Cenarium* MANAUS – O Amazonas alcançou a 12ª colocação no Ranking de Transparência no Combate à Covid-19, que analisa a forma com que órgãos de saúde divulgam informações sobre contratações emergenciais no período da pandemia. O Estado aparece ao lado de São Paulo e Rio Grande do Sul. Já a capital amazonense, Manaus, também obteve ótimo desempenho ficando em segundo lugar na colocação entre as capitais. O ranking, elaborado pela Transparência Internacional no Brasil, é considerado um importante instrumento de promoção do controle social. De acordo com a atualização do ranking, 12 Estados e 15 capitais brasileiras que tiveram avaliação Regular ou Péssima há um mês, passaram para as categorias “Bom” ou “Ótimo”. “Fomos procurados por prefeituras e governos estaduais do Brasil inteiro, interessados em melhorar e aumentar a transparência das informações que fornecem, mas também porque sabiam que estariam sob os holofotes novamente na segunda rodada”, conta o coordenador de pesquisa da Organização Não Governamental (ONG) Transparência Internacional no Brasil, Guilherme France. Lideram o ranking o Espírito Santo, entre os Estados, e João Pessoa, entre as capitais. Ambos alcançaram 100 pontos. (*) Com informações da Transparência Internacional.
Fonte: OKBR (Com informações da assessoria). 21
No Dia de Proteção às Florestas, o prefeito Arthur Neto fez críticas à política ambiental do governo federal 22
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REVISTA CENARIUM
‘Má governança sobre Amazônia marginaliza Brasil’, diz Arthur Neto sobre gestão Bolsonaro Da Revista Cenarium*
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ANAUS – O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, que recentemente se recuperou de Covid-19, mantém-se ativo nas redes sociais e atualizado, não só sobre as questões inerentes à capital do Amazonas, como também sobre assuntos ligados ao contexto político nacional. No dia 17 de julho, data em que se comemora o Dia de Proteção às Florestas, ele fez críticas à política ambiental do governo federal voltada à Amazônia, incluindo as etnias indígenas e povos tradicionais.
Crédito: Mário Oliveira/Semcom
Reconhecido nacionalmente como um dos maiores defensores da região amazônica, tanto no Congresso Nacional quanto na posição de prefeito da cidade de Manaus, Arthur Virgílio usou o seu Twitter para falar da importância da floresta para o planeta e ainda sinalizou direcionamentos óbvios e importantes que o Ministério do Meio Ambiente parece ignorar. “Dia de Proteção às Florestas. A nossa, além de ser a maior e mais estratégica do planeta, com os seus rios prodigiosos, detém o mais rico banco genético da Terra. Quem se respeita, a respeita também. Explorar a biodiversidade enriqueceria nosso povo e nossos parceiros, valorizaria os índios, PhDs em floresta, e não mataria a galinha dos ovos de ouro. O governo federal precisa entender que a má governança sobre a Amazônia marginaliza o Brasil e nos cria problemas econômicos graves. Precisamos reconquistar respeito e credibilidade”, apontou o prefeito.
POSSE ILEGAL A forte crítica em relação à posse ilegal de terras devolutas na Amazônia, garimpos e o desmatamento desenfre-
ado visando agronegócio, também foi reforçada em seu discurso na rede social. Segundo o prefeito, o Conselho da Amazônia, liderado pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão, deve agir e mudar a opinião do presidente Bolsonaro, para salvar a região e a imagem do País frente às grandes nações. “Proteger etnias indígenas, expulsar grileiros, proibir garimpo, não permitir agronegócio, significa seguir nossas vocações. É ter bom senso e responsabilidade. A Ministra da Agricultura disse que o agronegócio não precisa da Amazônia. Concordo 100%. O Brasil precisa muito do agronegócio. Já a Amazônia precisa ter a sua biodiversidade explorada. O vice-presidente Hamilton Mourão tenta mudar o discurso do governo sobre a Amazônia. Para dar certo, é essencial mudar primeiro a cabeça do presidente Bolsonaro. Se o governo não der efetiva proteção à floresta e aos povos indígenas, produtos ‘Made in Brazil’ serão boicotados, sobretudo na Europa”, explicou Arthur. Ao finalizar, o prefeito enfatizou o quanto o País precisa mudar o direcionamento das ações ligadas à Amazônia, o que significaria prestígio internacional e, principalmente, o fortalecimento da economia. “Se não alterar radicalmente sua política ambiental, o Brasil dificilmente vencerá qualquer eleição para direção de órgãos multilaterais. A tentativa de opor economia à ecologia é cega. Economia só progride se acompanhada de práticas ambientais corretas. A Amazônia bem governada seria o principal embaixador do Brasil. Maltratada, será nosso calcanhar de Aquiles”, concluiu o prefeito Arthur.
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O governo federal precisa entender que a má governança sobre a Amazônia marginaliza o Brasil e nos cria problemas econômicos graves. Precisamos reconquistar respeito e credibilidade”
Arthur Neto, prefeito de Manaus.
(*) Com informações da assessoria da Prefeitura de Manaus 23
Foto: Clรณvis Miranda.
ARTIGO – JOSÉ RICARDO
A precarização do trabalho e o póspandemia José Ricardo*
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om a pandemia do novo Coronavírus, aumentaram o desemprego e a precarização do trabalho. A situação já estava piorando desde o governo Temer e, agora, com o Bolsonaro só tende a piorar, até voltar à normalidade na economia. Estudiosos fazem uma reflexão sobre o mercado de trabalho e falam do surgimento de uma nova classe social no mundo e no Brasil também. O professor Guy Standing** chama de pós-proletariado, ou melhor, de “precariado”. São os trabalhadores em condições proletárias e precárias. É a classe que está perdendo seus direitos culturais, civis, sociais, políticos e econômicos. A característica dessa classe é o emprego casual, informal e precário. É o trabalhador que não tem benefícios sociais, não é assistido pelo governo ou tem reduzido atendimento. São trabalhadores sem carteira assinada, muitos nem estão nas estatísticas. Agora na pandemia, cresceram muito os trabalhadores na base do aplicativo, os que trabalham nos deliverys, que prestam serviços de baixos valores. Com o distanciamento social e a necessidade de os trabalhadores ficarem em casa também fez com que se ampliasse o trabalho remoto, conhecido como home office. Esta é uma nova forma de trabalho, que muitas empresas foram se adequando e devem ampliar o seu uso doravante. Muitas empresas vão modernizar suas atividades de trabalho.
A tendência é que as mudanças tecnológicas com o trabalho remoto, com reuniões, comunicação e decisões farão com que os trabalhadores não estejam mais vendendo seus dias de trabalho, mas prestando horas a serviço do trabalho em suas casas. A presença não será mais necessária. E custo a menos para as empresas e também para as instituições contratantes. Também menos direitos e benefícios para os trabalhadores. No Congresso Nacional, foram aprovados projetos do governo Bolsonaro, que permitiram a redução de salários e redução da jornada de trabalho. Dificilmente, voltarão às regras anteriores. E várias alterações foram feitas na legislação trabalhista, que reduziram vantagens para os trabalhadores. O auxílio emergencial ainda não chegou para todos que precisam. E não virá mais. O governo estuda esticar mais alguns meses, mas com valores menores. O desemprego aumentou e a informalidade também. Por ora, não há planejamento e ações que garantam que a economia retome de forma firme, a curto prazo. Até hoje, não foi regulamentada a política de crédito para as micro e pequenas empresas, as maiores geradoras de emprego. Por isso, a precarização do trabalho fará com que mais pessoas necessitem de proteções sociais. Não só na economia, no emprego e seguro-desemprego, mas na área da assistência social, saúde, educação e investimentos em saneamento e habitação
serão fundamentais para enfrentar a situação dramática que vive parte significativa da população. Mas não há garantias de que o governo fará esses investimentos públicos. Somente o poder público está atendendo a população na área da saúde e da assistência. Não é a iniciativa privada ou o chamado mercado, o neoliberalismo. Porém, essas ideias prevalecem no atual governo, que pretende reduzir ainda mais a estrutura do Estado, com privatizações e venda de empresas públicas e repasse de serviços para a iniciativa privada. Isso o ministro da Economia Paulo Guedes não esconde. Toda política econômica está voltada para garantir recursos e manter os serviços da dívida, dos credores financeiros. Portanto, a precarização do trabalho irá piorar no pós-pandemia, caso o Estado não realize investimentos para gerar emprego e políticas de inclusão social. Enquanto isso, o povo está morrendo com a pandemia. Já são 1,2 milhão de casos no Brasil e 53 mil mortes. No Amazonas, são 65 mil casos e 2,7 mil mortes. E não vai parar tão cedo. **O professor Guy Standing é PhD pela Universidade de Cambridge e ex-diretor da Organização Internacional do Trabalho (*) José Ricardo é economista e deputado federal 25
ECONOMIA & SOCIEDADE
MEDO E RESISTÊNCIA Trabalhadores se expõem à ameaça do novo Coronavírus nas ruas de Manaus para garantir sustento de famílias Luciana Bezerra - Da Revista Cenarium
O vírus letal com altíssimo poder de contágio modificou a rotina dos trabalhadores e desafiou os sistemas econômico e político mundial. No Brasil, a situação emergencial serviu ainda para agravar o histórico problema da fome. Aliada à falta de apoio do governo Jair Bolsonaro aos mais vulneráveis, a ameaça da doença está acelerando o crescimento da pobreza no Brasil e já coloca o País como “epicentro emergente” da fome extrema, de acordo com relatório divulgado no início de julho pela Organização Não Governamental (ONG) Oxfam. A Oxfam é uma confederação de 19 organizações e mais de 3 mil parceiros, que atua em mais de 90 países na busca de soluções para o problema da pobreza. A ONG coloca o Brasil na mesma classificação de Índia 26
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e África do Sul em seu relatório. Em um informe lançado no dia 08 de julho sob o título de “O Vírus da Fome: Como o Coronavírus está aumentando a fome num mundo faminto”, a ONG analisa os impactos da doença em países onde a situação alimentar e nutricional já era extrema antes da pandemia. De acordo com a Oxfam, até 2018, o número de pessoas em situação de fome no Brasil aumentou em 100 mil, chegando a 5,2 milhões, devido ao crescimento nas taxas de pobreza e desemprego e a cortes radicais nos orçamentos para agricultura e proteção social. Além disso, diz a ONG, fatores como cortes no programa Bolsa Família e, desde 2019, um “desmantelamento gradual” de políticas e instituições destinadas a combater a pobreza, como o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), intensificaram a situação da fome no Brasil. A pandemia de Covid-19, diz a ONG, somou-se a essa combinação já tóxica de fatores, aumentando rapidamente as taxas de pobreza e a fome no País. Com isso, de acordo com o relatório da Oxfam, milhões de trabalhadores mais pobres, que têm poucas economias e acesso limitado a benefícios, perderam empregos ou rendimentos devido à pandemia, sem que tenham sido beneficiados por apoios governamentais. É o caso do vendedor ambulante Arilson Abreu Cavalcante, que há quase três décadas comanda uma
fOTOS: Ricardo Oliveira
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ANAUS - “Medo da Covid-19, nós temos. Quem não tem? Mas ficar em casa esperando o tempo passar, sem saber o que vai acontecer e as contas chegando no fim do mês, é muito pior”. O relato do vendedor ambulante, Arilson Cavalcante, 46, que trabalha no Centro de Manaus há 28 anos, resume o sentimento de milhões de brasileiros que não têm o privilégio de cumprir o “fique em casa” sem temer a fome. Para esses trabalhadores, resta batalhar nas ruas o pão de cada dia, mesmo estando mais expostos ao novo Coronavírus, causador da pandemia de Covid-19.
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A feirante Rosa Pinheiro retomou o trabalho em sua banca há poucas semanas
barraca de óculos e bonés no Centro de Manaus. Os protocolos de segurança exigidos por conta da pandemia obrigaram o comércio não essencial a fechar as portas. Foram quase quatro meses sem trabalhar, afirma Arilson. Antes da pandemia, o vendedor tinha cinco funcionários e faturava cerca de R$ 10 mil por mês. Ele viu sua renda despencar para R$ 600 no primeiro mês após o fechamento do comércio.
mundo ia parar? Voltei a trabalhar há duas semanas. Como eu e meu marido somos do grupo de risco, passamos quatro meses sem trabalhar. A pandemia só não nos afetou profundamente porque tínhamos uma reserva no banco e o salário da aposentadoria do meu marido”, afirma Rosa.
Arilson diz que precisou se reinventar “para não deixar na mão” as pessoas que dependem dele, como família e funcionários. “Criei uma conta da barraca nas redes sociais e passei a vender os produtos on-line. O faturamento não foi o mesmo do ponto físico, mas deu para segurar as pontas e ajudar meus funcionários com cestas básicas, já que todos têm famílias”, enfatiza.
“Não escolhi ser estivador porque gosto. A escolha veio da necessidade de alimentar minha família e de sobreviver neste Brasil de desigualdades. Você acha que é fácil carregar 180 quilos na cabeça e nas costas todos os dias?”. O dramático depoimento é de Marcley Nunes da Silva, de 30 anos, estivador no Porto da Manaus Moderna, zona Centro-Sul de Manaus, há dez anos.
Assim como Arilson, a feirante Rosa Pinheiro, 65 anos, retomou há poucas semanas o trabalho na banca da família no mercado Dorval Porto, no bairro Nossa Sra. Das Graças, Zona Sul de Manaus. Sem a renda da feira, as economias guardadas no banco e a aposentadoria do marido salvaram a família da fome. “Quando na vida pensávamos que o
Marcley é mais um dos trabalhadores informais que se arrisca nas ruas, mesmo em tempos de pandemia, para não ficar sem o que comer. Sem máscara ou qualquer equipamento de proteção contra o novo Coronavírus, ele conta que é estivador porque não teve oportunidade de estudar e que deseja um futuro diferente para os filhos.
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TRABALHO PESADO
“Não tive muitas oportunidades na vida. Trabalho desde que me entendo por gente. Já fiz de tudo que você possa imaginar. Mas nenhum trabalho paga melhor do que este como estivador, minha renda diária varia de R$ 100 a R$ 500, de acordo com a carga, a quantidade de barcos que atraca na plataforma e com a época do ano. Falo todos os dias para os meus filhos estudarem para que eles não tenham o mesmo trabalho braçal que eu tenho. Chego em casa todos os dias ‘moído’, mas quando olho em volta e vejo meus filhos tendo o que comer, onde morar, por mais humilde que seja, e onde estudar, esqueço a dor, durmo e no dia seguinte estou aqui novamente”, afirma o estivador.
AUXÍLIO EMERGENCIAL O relatório da Oxfam aponta também que apenas 47,9% dos fundos destinados à ajuda de emergência a pessoas vulneráveis haviam sido distribuídos até o início de julho. Por isso, a ONG entende que “o governo federal está falhando em apoiar os brasileiros com mais vulnerabilidade no enfrentamento da pandemia”. Outra falha, segundo a Oxfam, está na implementação do programa de
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Renda Básica Emergencial, que registra longos atrasos na resposta aos pedidos de ajuda, recusas injustificadas, além da dificuldade imposta pela necessidade de ter um telefone celular, conexão à internet e endereço de e-mail para se qualificar à assistência. É nesse quadro de desassistência que a diarista Terezinha Assis da Silva, 48 anos, sem marido e com três crianças pequenas para sustentar, se viu diante de um dilema com a chegada da pandemia: parar de trabalhar e ficar sem dinheiro ou se expor ao vírus para garantir o sustento da família. Segundo Terezinha, apenas três de seus patrões conseguiram manter o pagamento das diárias nos dois primeiros meses de isolamento social, sem que ela trabalhasse. Depois, precisou se reinventar para não passar fome com os filhos, já que um problema de documentação impediu que recebesse o auxílio emergencial do governo federal. Por ser mãe solteira, a diarista tem
direito a duas cotas do auxílio de R$ 600, num total de R$ 1.200. “Nos quatro [primeiros] meses da pandemia, perdi todos os meus clientes. Uns três me pagaram o valor das diárias como forma de ajuda, pois conhecem a minha realidade. Mas depois eles pararam de pagar e comecei a fazer bolo e vender no bairro onde moro. Não era muito, mas dava para comer com meus filhos”, disse Terezinha. A diarista conta que conseguiu resolver o problema do auxílio emergencial e agora aguarda a liberação do dinheiro. Voltei a trabalhar há duas semanas, somente para as três famílias que me ajudaram no início. As demais me dispensaram. Difícil, viu”, assinala.
NAS RUAS Sem trabalho desde que chegaram ao Brasil, em 2018, o casal de indígenas
venezuelanos da etnia Warao, Carmen Perez, 40, e José Moreno, 39, estava totalmente vulnerável nas ruas de Manaus quando foi abordado pela reportagem. Ao lado do filho Alfredo Jose Perez, 7, e da filha Rosane Perez, 6 meses, estava sentado no chão da calçada da Praça da Matriz, Centro da cidade, sobre um pequeno pedaço de pano e pedia trocados a quem passava. A família inteira desprotegida, sem máscaras ou qualquer tipo de equipamento e produto de prevenção ao novo Coronavírus. “Consegui comprar as passagens, graças a Deus. Só tinha vaga para o dia cinco de agosto. Vamos para Belém e de lá para o Maranhão, a família toda. Cansamos daqui. Foram dois anos tentando conseguir um emprego para o sustento da minha família. Tenho oito filhos que ficaram na Venezuela e gostaria de mandar dinheiro para eles”, disse José.
O lavador de carros Raimundo Nonato se expõe nas ruas de Manaus para garantir seu sustento
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ECONOMIA & SOCIEDADE
O guardador e lavador de carros, Raimundo Nonato da Cruz de Lima, 38 anos, é outro que se expõe à doença nas ruas do Centro de Manaus para sobreviver. O dinheiro que consegue lavando carros é insuficiente para que Raimundo pague aluguel ou compre um local para morar. Assim, ele vive com a mulher nas ruas ou em abrigos.
Desemprego A pandemia deixou um rastro de desemprego em todo o mundo e tem sido particularmente feroz na América Latina. No Brasil, 7,8 milhões de empregos foram perdidos e 12,7 milhões de trabalhadores estão desempregados. O Chile registrou sua maior taxa de desemprego em 10 anos. Na Bolívia, o desemprego aumentou quase dois pontos, de 5,7% para 7,3% somente em abril. Em maio, a taxa de desemprego urbano na Colômbia registrou seu maior nível mensal desde 2001.
Trabalho informal do Amazonas 30
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Durante os primeiros meses da pandemia, o casal conseguiu vaga para dormir no Abrigo Áurea Pinheiro Braga, Compensa, Zona Oeste de Manaus, mas não deixou de ir para as ruas em busca de sustento. “O pior horário de morar na rua é à noite, onde ficamos mais vulneráveis. Posso estar dormindo e ser agredido ou morto por alguém. No abrigo estamos seguros, temos refeição e um espaço para tomar banho e fazer higiene pessoal”, destaca Raimundo, também sem usar máscara ou algum equipamento que o proteja do novo Coronavírus.
FORÇA DE TRABALHO Para o sociólogo e professor de Sociologia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Luiz Antônio Nascimento, os trabalhadores que não puderam parar durante a pandemia são uma expressão máxima da força de trabalho e deveriam ser tratados de uma forma mais digna pelo Estado. Segundo o sociólogo, a economia e a sociedade precisam dessa força de trabalho. “A sociedade precisa enxergar com outros olhos os trabalhadores que precisaram se expor ao risco do vírus para fazer a economia funcionar, enquanto a maioria das pessoas estava isolada em casa. Isso inclui
os profissionais de saúde, dos supermercados, dos transportes, feirantes, produtores rurais e até mesmo os trabalhadores informais que, neste último caso, têm como única renda a que vem do trabalho diário”, afirma o professor. Em relação ao dilema entre parar de trabalhar e responder à demanda da fome, o sociólogo lembra que a solução encontrada em países como França, Inglaterra, Japão, Estados Unidos e até Brasil foi o auxílio emergencial. “Todos esses países criaram um modelo econômico de fazer o dinheiro circular de alguma forma e ajudar a população em geral que estava isolada por causa da pandemia”, disse Luiz Antônio. No Brasil, foi criado o auxílio de R$ 600 para trabalhadores em geral e de R$ 1.200 para mães solteiras que sustentam sozinhas suas famílias. Para Luiz Antônio, esse dinheiro movimenta a economia e volta aos cofres públicos por meio dos impostos.
A COVID-19 NO BRASIL O Brasil ultrapassou a marca de 106 mil mortos pela Covid-19 no dia 14 de agosto, segundo levantamento do consórcio de veículos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde. O número de infectados era de mais de 3,2 milhões em todo o País, até esta data. No Amazonas, até 14 de agosto, a doença matou mais de 3,4 mil pessoas. O número de infectados era de mais de 109,8 mil até esta data, conforme o boletim epidemiológico da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM).
A quantidade de trabalhadores informais no Estado do Amazonas é a maior do País. Enquanto a taxa do País é de 40,9%, na cidade de Manaus, 58,35% dos ocupados trabalham em regime informal. Os dados referem-se ao último trimestre de 2019, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em fevereiro deste ano. Segundo dados apresentados pelo IBGE, o Estado possui 1,6 milhão de pessoas na força de trabalho. Destes, 967 mil estão na informalidade. No Brasil, são 94.552 milhões na força de trabalho e 38.735 milhões sem carteira assinada ou CNPJ. Os números referem-se aos trabalhadores que estão ocupados nos grupos de setor privado, por conta própria, empregadores, trabalhadores domésticos e trabalhador familiar auxiliar.
O vendedor Arilson Cavalcante sentiu o impacto econômico da pandemia com a perda de renda e diz que teme o novo Coronavírus, mas precisa trabalhar nas ruas
O casal Carmen Perez e José Moreno, indígenas venezuelanos, não conseguiu trabalho em Manaus e teve que pedir esmolas no Centro
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ECONOMIA & SOCIEDADE
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anaus – Mais de 5 mil casos de Covid-19 em indígenas separam os números da pandemia divulgados pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ligada ao Ministério da Saúde, dos dados considerados pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). A divergência se deve ao critério utilizado pelo governo federal, que considera apenas os infectados que vivem em aldeias ou terras demarcadas, enquanto que entidades representativas
VÍTIMAS INVISÍVEIS Mais de 5 mil indígenas com Covid-19 estão excluídos da conta do governo federal Náferson Cruz – Da Revista Cenarium
dos povos tradicionais levam em conta a infecção de indígenas nas áreas urbanas ou em terras não demarcadas. O resultado é a subnotificação e a desassistência, afirmam lideranças indígenas. Até o dia 5 de agosto, a Sesai registrou 16.840 indígenas contaminados pelo novo Coronavírus, enquanto que a Apib contabilizou 22.325 casos, uma diferença de 5.485 casos. Há divergência também no número de mortes. Para a Sesai haviam 300 mortes de indígenas causadas pela Covid-19 até 5 de agosto e para a Apib, esse número era de 633. A diferença entre os dados divulgados são recorrentes, desde abril, logo no início da pandemia. Organizações dos povos indígenas vêm reagindo com críticas e até medidas judiciais contra os critérios do governo federal para prestar assistência aos povos tradicionais no enfretamento à Covid-19. A Apib, além de outras entidades e Organizações Não Governamentais (ONGs) que atuam na assistência de povos indígenas contestam os dados da Sesai e afirmam que os mesmos refletem a subnotificação da gravidade pandemia entre as etnias.
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No entendimento de Mário Nicácio Wapichana, vice-coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), a inconsonância de dados é altamente prejudicial aos povos indígenas, principalmente, na adoção de estratégias para o enfrentamento da doença. “Desde o mês de março estamos atuando com mobilizações no sentido de trazer melhorias na área da saúde aos indígenas que moram nas aldeias e zona urbana. No entanto, o plano colocado pela Sesai atende apenas os casos nas Terras Indígenas, enquanto que, os casos no contexto urbano e em terras não indígenas, territórios em retomada ou em processo de demarcação não são contabilizados, o que resulta na divergência dos números”, disse Mário Wapichana à REVISTA CENARIUM. Wapichana relata que as organizações indígenas desenvolveram, no início de março, um plano emergencial onde foram postas as demandas e os riscos da ampliação de contaminação dos povos indígenas na Amazônia, por doenças já existentes e pela Covid-19. Ele ressaltou ainda que as temáticas também foram debatidas junto à Frente Parlamentar Mista, liderada pela deputada federal Joênia Wapichana (Rede), mas sem êxito e retorno do governo federal. “Alertamos quanto à providência imediata de controle e do uso de equipamentos de proteção nos pontos estratégicos de barreiras sanitárias na entrada e no entorno das Terras Indígenas, porém o que aconteceu foi que o governo fez seu plano por meio dos distritos, mas sem a participação dos povos indígenas para dar apoio à elaboração do mesmo”, comentou o vice-coordenador da Coiab.
RASTRO DE MORTES De acordo com os dados da Apib, o rastro de 633 mortes por Covid-19, entre indígenas, atingiu 146 povos nos Estados do Amazonas, Pará, Mato Grosso, Roraima e Maranhão, de acordo com dados da Apib. A média, segundo a associação, é de mais de quatro mortes por dia, com um total de 22.325 indígenas contaminados pela doença.
O governo federal só considera como indígenas os que vivem em aldeias e terras demarcadas
REVISTA CENARIUM
RANKING DE MORTES POR COVID-19 Estado | Mortes Estado | Mortes
Amazonas Pará Amazonas Mato Grosso Pará Roraima Mato Grosso Maranhão Roraima Acre Maranhão Amapá Acre Pernambuco Amapá Mato Grosso do Sul Pernambuco Rondônia Mato Grosso do Sul
182
86
182
77 86 57
77
56 57 25 14
56
25
12 14 12 12 1012
Rondônia 0
1020
40
60
80
100
120
140
160
180
200
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
200
Etnias afetadas | Etnia - Óbitos Etnias afetadas | Etnia - Óbitos
Kokama
58
Xavante Kokama
4758
Guajajara Xavante
30
Crédito: Mário Oliveira/Semcom
Tikuna Guajajara
O Amazonas lidera o ranking dos Estados com maior número de óbitos de indígenas pela Covid-19, com 182 mortes, seguido do Pará com 86, Mato Grosso (77), Roraima (57), Maranhão (56), Acre (25), Amapá (14), Pernambuco (12), Mato Grosso do Sul (12) e Rondônia com 10 óbitos. Em relação às etnias afetadas, o povo Kokama lidera os dados alarmantes com 58 óbitos, seguido do povo Xavante (47), Guajajara (30), Tikuna (17), Macuxi (17), Munduruku (15) e Kayapó Mebêngôkrê (10). Os casos registrados como SI (Sem Informação) alcançaram a marca de 140 óbitos. O levantamento da Apib relata ainda que a data com a maior crescente de óbitos ocorreu no dia 10 de julho.
PLANO DE ENFRENTAMENTO Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) elaboram no final de julho, o plano de apoio ao enfrentamento à Covid-19 junto aos povos indígenas. Um dos objetivos é intensificar a vigilân-
17
Macuxi Tikuna
17 17
Munduruku Macuxi
15 17
Kayapó Mebêngôkrê Munduruku
47
30
1015
Casos registrados como Kayapó Mebêngôkrê sem Informação (SI)
140
10
Casos registrados como 0 sem Informação (SI)
20
40
60
80
100
120
140140 160
0
20
40
60
80
100
120
140
cia e aprimorar informações acerca dos impactos da pandemia nessas populações, por meio de seis eixos de atuação. A iniciativa mobilizou diferentes unidades e vice-presidências e foi destacada pela presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima. “Essa é uma ação conjunta da fundação, presente em todo território nacional, para dar suporte ao enfrentamento desta grave crise humanitária que atinge os povos indígenas no Brasil”, alertou a presidente da Fiocruz.
DECISÃO NO STF O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, no dia 5 de agosto, referendar a decisão individual do ministro Luís Roberto Barroso que determinou ao governo federal a adoção de uma série de medidas para conter o contágio e as mortes por Covid-19 entre os indígenas. Entre as medidas, estão a manutenção de barreiras sanitárias para proteger a população indígena isolada da contaminação e a criação de um comitê para
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Fonte: Apib
acompanhamento das ações durante a pandemia. O governo federal precisa ainda apresentar planos para a retirada de ocupantes ilegais de territórios indígenas e expandir o atendimento do Subsistema de Saúde Indígena, que terá como suporte técnico a Fundação Oswaldo Cruz. A determinação vale para sete Terras Indígenas em que a população já ultrapassa 20 mil pessoas: Yanomami, Karipuma, Uru-Eu-Wau-Wau, Kayapó, Araribóia, Mundukuru e Trincheira Bacajá. No dia 8 de julho, Barroso atendeu a um pedido de liminar da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e dos partidos PSB, PSOL, PCdoB, PT, Rede e PDT para determinar as medidas. Na decisão, Barroso reconheceu a atuação das Forças Armadas e do Ministério da Saúde, por exemplo, na distribuição de cestas básicas, suprimentos e materiais de saúde a diversas comunidades indígenas, entre outras ações. 33
ECONOMIA & SOCIEDADE Crédito: Ricardo Oliveira segundo IBGE.
Após estabilização da pandemia, taxa de desocupação chega a 13% Carolina Givoni – Da Revista Cenarium
Taxa de desocupação aumentou 2% na Amazônia Legal, na comparação entre junho e maio
M
ANAUS – Um levantamento feito pela REVISTA CENARIUM aponta que os nove Estados da Amazônia Legal detêm uma média de 13% de taxa de desocupação, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no dia 23 de julho. O percentual corresponde a junho e sobe 2% em comparação a maio, quando a população da Amazônia Legal acumulava 11% de taxa de desocupação. Resultados da nova rodada mensal da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), com versão voltada para a pandemia, destacam que os Estados do Amazonas, Pará, Acre, Roraima, Rondônia, Amapá, Maranhão, Mato Grosso e Tocantins sentiram uma forte retração do mercado de trabalho. No Amapá, por exemplo, 17,6% da população estava desocupada, com cerca
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de 129 mil pessoas que não procuraram trabalho por causa da pandemia de Covid-19, mas gostariam de trabalhar. Em maio, o número era de 126 mil, correspondendo a 2% de aumento. No Amazonas, os números apontam que 15,1% da população entrou para o rol da desocupação. Sendo que, em junho, 496 mil pessoas não buscaram trabalho por conta do vírus, ou seja, uma queda de 11%, comparados aos 560 mil de maio. Já no Acre, os números estacionaram em 14,2 % da população, representando atualmente 122 mil acreanos desempregadas na pandemia, uma queda de 4% em relação a maio, quando eram registrados 127 mil desocupados. Os demais resultados de desocupação seguem com Maranhão (14,1%), Roraima
(13,6%), Pará (11,3%), Tocantins (11%), Mato Grosso (10,9%) e Rondônia (9,1%).
ADESÃO AO HOME OFFICE A pesquisa também apontou a tendência de redução dos trabalhos em home office, quando o trabalhador executa atividades laborais em casa. No mês de junho, a Região Amazônica registrou média de 17% de ocupados sob a jornada afastada dos postos de trabalho. Em maio, o índice abrangia 2.262 milhões de pessoas. Já em junho, chegou a 1.670 milhões, queda de 26%. Esse ranking também é liderado pelo Amapá, com 31% de pessoas ocupadas que foram afastadas do trabalho em decorrência do distanciamento social, que mantém 84 mil pessoas em home office.
Crédito: Ricardo Oliveira
DESEMPREGO NA AMAZÔNIA
REVISTA CENARIUM
Apesar de liderar o ranking em junho, o resultado apresenta queda de 17% em relação a maio, quando 101 mil trabalhadores foram afastados do trabalho presencial. Além disso, no mês de junho, o Estado do Maranhão, segundo colocado, manteve 445 mil pessoas em home office. Da mesma forma, correspondendo a 22% de ocupados afastados do trabalho local. Em maio, 627 trabalhadores estavam na modalidade, representando uma queda de 29% em um mês Em último lugar no ranking, o Acre agora detém 55 mil trabalhadores em home office, uma queda de 10% em relação a maio, quando eram registrados 61 mil postos de trabalho nesse formato. Os demais resultados de baixas no trabalho em casa, seguem com Pará (19,6%), Roraima (17,7%), Amazonas (15,2%), Tocantins (12,2%), Mato Grosso (8,8%) e Rondônia (7,9%).
SOBRE A PESQUISA A coleta da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Covid-19) teve início em 4 de maio de 2020, com entrevistas realizadas por telefone em, aproximadamente, 48 mil domicílios por semana, totalizando cerca de 193 mil domicílios por mês, em todo o Território Nacional.
Cabe ressaltar que a PNAD Covid-19 é uma pesquisa com instrumento dinâmico de coleta das informações. Portanto, o questionário está sujeito a alterações ao longo do período de sua aplicação.
recebeu outros rendimentos não oriundos do trabalho, tais como: aposentadoria, BPC-LOAS, Bolsa Família, algum auxílio emergencial relacionado à Covid-19, seguro-desemprego, aluguel e outros.
O desemprego na Amazônia em junho Confira a taxa de desocupação por Estado Amapá
17,6
Amazonas
15,1
Acre
14,2
Maranhão
14,1
Roraima
13,6
Pará
11,3
Tocantins
11
Mato Grosso
10,9
Rondônia
9,1 0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
20
Fonte: IBGE/PNAD-COVID-19
A amostra é fixa, ou seja, os domicílios entrevistados no primeiro mês de coleta de dados permanecerão na amostra nos meses subsequentes, até o fim da pesquisa. Nas questões de trabalho, busca-se classificar a população em idade de trabalhar nas seguintes categorias: ocupados, desocupados e pessoas fora da força de trabalho.
Por fim, visando compor o rendimento domiciliar, pergunta-se se algum morador
Crédito: Ricardo Oliveira
Investiga-se, ainda, os seguintes aspectos: ocupação e atividade; afastamento do trabalho e o motivo do afastamento; exercício de trabalho remoto; busca por trabalho; motivo por não ter procurado trabalho; horas semanais efetivamente e habitualmente trabalhadas; Assim como o rendimento efetivo e habitual do trabalho, por exemplo. Pesquisa ouviu 193 mil domicílios por mês, em todo o Território Nacional
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ECONOMIA & SOCIEDADE
MAPA DA PANDEMIA Oito Estados da Amazônia Legal apresentam queda ou estabilidade em mortes por Covid-19 Bruno Pacheco e Gisele Coutinho Da Revista Cenarium
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ANAUS – Os nove Estados da Amazônia Legal registraram até o dia 5 de agosto deste ano, 17.268 mortes pela Covid-19, o que representa 17,7% do total no País (97.418). Segundo levantamento feito pelo consórcio de veículos de imprensa (Estadão, G1, O Globo, Extra, Folha e UOL), com base nos boletins diários das secretarias estaduais de Saúde, oito desses Estados apresentaram estabilidade ou queda no número de óbitos pela doença, nos últimos 14 dias. A exceção é o Acre, que apresentou alta.
Até o dia 5 de agosto, também foram confirmados 613.986 casos da Covid-19, sendo que os nove Estados da Amazônia Legal registraram 21,4% do total no Brasil (2.862.761). Na liderança entre os Estados com mais casos, óbitos e recuperados, Pará está em primeiro, com 162.882 infectados, 5.835 mortes e 147.576 curados. Em 24 horas, o Pará foi o que mais registrou casos da doença, com 2.127 infectados, segundo a Secretaria de Saúde do Estado (Sespa). Maranhão, apesar de estar em segundo no número de casos
Casos da Covid-19 na Amazônia Legal
Estados
Casos
Mortes por Covid-19 na Amazônia Legal
Estados
Casos
1
Pará
162.822
1
Pará
5.835
2
Maranhão
125.459
2
Amazonas
3.317
3
Amazonas
104.250
3
Maranhão
3.103
4
Mato Grosso
58.475
4
Mato Grosso
2.013
5
Rondônia
42.021
5
Rondônia
918
6
Amapá
37.318
6
Amapá
588
7
Roraima
34.296
7
Acre
547
8
Tocantins
28.312
8
Roraima
532
9
Acre
21.033
9
Tocantins
415
Fonte: Consórcio de veículos de imprensa 36
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REVISTA CENARIUM
confirmados da Covid-19, com 125.459 infectados, aparece em terceiro no número de mortes, com 3.103 óbitos. O Amazonas, por sua vez, aparece em segundo no número de óbitos pela pandemia do novo Coronavírus, com 3.317, e em terceiro no número de casos, com 104.250. O Acre, mesmo sendo o Estado que menos tem casos pela Covid-19, com 21.033, tem mais mortes do que Roraima (532) e Tocantins (415), com 547 vítimas fatais. Confira os números na íntegra, de acordo com dados até 05 de agosto:
IMUNIDADE DE REBANHO O boletim diário da Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS-AM) do dia 5 de agosto confirmou mais 583 pessoas recuperadas da Covid-19 em 24 horas, chegando a 88.220 o número de pessoas que passaram pelo período de quarentena (14 dias) e se recuperaram da doença. Em compensação, ainda segundo a FVS, 981 pacientes foram diagnosticados com a Covid-19 e 18 novos óbitos foram confirmados. No dia 4 de agosto, especialistas que participaram de debate on-line promovido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e pelo canal do Instituto Butan-
tan avaliaram que os dados da pandemia no Amazonas fortalecem a hipótese de imunidade coletiva (a imunidade de rebanho) ao novo Coronavírus, teoria que começa a ganhar força na comunidade científica.
estão instaladas na população, é esperado que o número de casos acumulados continue a crescer, ainda que de forma mais lenta, podendo chegar ao dobro do que foi registrado no pico da curva epidêmica.
A teoria indica que a imunidade coletiva pode ser alcançada quando em torno de 20% da população é infectada. Para os especialistas, portanto, os dados do Amazonas apontam para algo bem antes do que estimaram trabalhos de modelagem feitos no início da pandemia (50% e 70%).
Para o infectologista Júlio Croda, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), somente a imunidade coletiva poderia explicar porque os Estados do Norte, Nordeste e a capital fluminense – mesmo sem um distanciamento social efetivo – apresentam uma taxa de contágio inferior a 1. Ele ressalta, no entanto, que a imunidade de rebanho não deve ser adotada como política pública, pois nenhum sistema de saúde foi capaz de ofertar a quantidade de leitos de terapia intensiva necessária para enfrentar a primeira onda da doença sem medidas de mitigação.
“Chegamos à conclusão de que essa heterogeneidade pode alterar muito os resultados e em um sentido positivo. A epidemia deve ser menor do que o previsto pelos modelos homogêneos [que não consideram os diferentes níveis de suscetibilidade e exposição entre os indivíduos] e o limiar da imunidade coletiva também deverá ser menor do que aquele que os modelos clássicos indicam”, afirmou a biomatemática portuguesa Gabriela Gomes, que coordena um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), durante o debate on-line. A especialista afirma, no entanto, que alcançar o limiar de imunidade coletiva não significa o fim imediato da epidemia. Como as cadeias de transmissão já Ione Moreno/Semcom
“Manaus teve o maior excesso de óbitos entre todas as cidades do Brasil, chegou a 500%. Foram registradas em 2020 cinco vezes mais mortes que nos anos anteriores – 90% delas por causas respiratórias. O caso do Amazonas nos permite entender como seria a história natural da doença. Mas não estamos propondo isso como estratégia. É a constatação de uma tragédia. Temos de aprender com os dados reais”, defendeu Croda, no debate on-line.
AGUARDANDO RESPOSTAS A reportagem buscou contato junto ao Governo do Acre para saber das ações de combate ao novo Coronavírus no Estado, assim como um posicionamento a respeito do aumento no número de mortes, divulgado pelo consórcio jornalístico, mas, até a publicação desta reportagem, a assessoria do governo informou que estava formulando uma resposta e que enviaria em breve.
Estado do Amazonas chegou a 88.220 recuperados da Covid-19 no dia 5 de agosto, segundo a FVS
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ECONOMIA & SOCIEDADE
Polo industrial busca recuperar perdas e floresta amazônica é ameaçada por exploração agressiva Mencius Melo – Da Revista Cenarium
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Recessão no Brasil atinge diretamente a Zona Franca de Manaus, que tem como consumidores as regiões Sul e Sudeste do País
Crédito: Ricardo Oliveira
INDÚSTRIA EM ALERTA
REVISTA CENARIUM
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ANAUS – Especialistas analisam o cenário para o pós-pandemia no Polo Industrial de Manaus (PIM), que ainda contabiliza perdas econômicas causadas pela Covid-19. Para eles, o parque formado por mais de 500 indústrias precisa se reinventar para fugir do capitalismo predatório, onde a atividade fabril na capital amazonense daria lugar à intensa exploração da floresta. Informações da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) declaram que o PIM obteve um faturamento estimado de R$ 86,78 bilhões, recolhido entre os meses de janeiro e outubro de 2019. Com a redução não contabilizada, iniciativas para exploração de madeira, garimpo, bem como pecuária extensiva poderiam ganhar status de alternativa econômica. O vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Nelson Azevedo, faz uma análise de conjuntura relembrando a histórica marca da geoeconomia brasileira. “Nunca vivemos um momento como esse, dentro de uma realidade que une recessão econômica e pandemia, uma crise de proporções mundiais. Infelizmente, sempre fomos tratados como o ‘quintal do Brasil’, o problema é que nesse quintal está concentrada a maior riqueza biológica do País, que é a floresta amazônica”, atentou. No final dos anos 1960, quando se iniciou o processo de implantação da Zona Franca de Manaus (ZFM), o tripé ‘comércio, indústria e agropecuária’ era o norte do projeto. “Com o passar do tempo, o comércio perdeu força, a indústria se fortaleceu e o agro nunca chegou a ser implantado”, relembrou Azevedo. Para ele, a ausência desse terceiro setor, causou a falta de diálogo entre o modelo ZFM e a floresta amazônica. “Esse diálogo é fundamental e passados mais de 50 anos de ZFM, o Governo do Estado do Amazonas, o governo federal e a Suframa ainda não conseguiram repactuar dentro da visão agro, para podermos usar a floresta de forma responsável, nunca é tarde para recomeçar”, otimizou.
Segundo o economista e deputado estadual, Serafim Correa (PSB), a fragilidade do único modelo que sustenta as florestas
Crédito: Divulgação/Fieam
do Amazonas não deve apresentar perspectiva positiva para os próximos meses. “A recessão atinge em cheio o PIM porque nossos produtos são do campo do entretenimento, como celulares, motocicletas e eletroeletrônicos, não são bens de primeira necessidade. Manaus concentra um polo que garante a floresta em pé, a questão é que quando o Brasil gripa, Manaus pega uma pneumonia”, alegorizou.
ÊXODO REVERSO Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estimam que Manaus concentra 2.182.763 habitantes, sendo a maior concentração populacional de uma cidade na Amazônia. Tal característica se deve ao conjunto de indústrias parqueadas na capital amazonense. Serafim Corrêa explica que, caso a cidade não consiga conter a onda de desempregados, não terá outra alternativa, senão migrar para o interior. “Se este arranjo continuar se desestruturando, o homem partirá para o interior, em uma espécie de ‘êxodo reverso’ tendo as árvores como primeiro alvo de sobrevivência econômica”, alertou.
SUPERINTENDÊNCIA DA ZFM A coordenadora-geral de estudos econômicos e empresariais da Suframa, Ana Maria Souza, endossa os discursos anteriores, afirmando que os próximos dias darão um panorama exato do estrago. “O quadro recessivo impacta diretamente na ZFM porque nosso polo consumidor está concentrando no sul e sudeste, ou seja, nosso mercado é interno. Ainda vamos saber a exata dimensão de como se comportou essa produção que recuou aproximadamente 30% a 33%”, previu. Ainda segundo ela, a relação ‘PIM – Floresta’ é indissociável. “A gente percebe que quando a indústria do Amazonas recua, naturalmente gera desemprego e isso causa um quadro danoso ao meio ambiente do Amazonas”, lamentou. A coordenadora, no entanto, aponta que a Suframa tenta fazer sua parte. “Buscamos investimentos voltados para o agronegócio, voltados para as potencialidades que o Estado do Amazonas
O vice-presidente da Fieam, Nelson Azevedo, aponta que é preciso encontrar o equilíbrio no diálogo para a criação de um terceiro setor na região
“
Nunca vivemos um momento como esse, dentro de uma realidade que une recessão econômica e pandemia, uma crise de proporções mundiais”
Nelson Azevedo, vice-presidente da Fieam.
R$ 86,78 bilhões O PIM obteve um faturamento estimado de R$ 86,78 bilhões entre janeiro e outubro de 2019, segundo a Suframa.
33%
A Suframa estima que a produção do Polo Industrial de Manaus recuou até 33% com a pandemia.
naturalmente possui, como investimento em projetos de laticínio ou outros produtos próprios e característicos da região amazônica. Nossa intenção é induzir novos vetores econômicos atrelados ao PIM’, finalizou a coordenadora. 39
‘Feira Digital’ Jovem empreendedor é uma das 30 lideranças sustentáveis no planeta por criar aplicativo que une consumidores a feirantes Luciana Bezerra – Da Revista Cenarium
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ANAUS – Macaulay Souza Abreu, de 26 anos, se tornou um dos jovens empreendedores de maior destaque de sua geração. Em 2018, fundou a Onisafra, plataforma que conecta produtores da agricultura familiar a consumidores, com uma feira digital. Ele foi o único da América Latina a ter o nome citado na revista americana GreenBiz como uma das 30 jovens lideranças que estão implementando mudanças sustentáveis no planeta. O empreendedor falou à REVISTA CENARIUM sobre a conquista. Para Macaulay, o título, publicado em junho, enaltece a região amazônica. “Não esperava ser reconhecido quando criei a plataforma, mas isso envolve muitas pessoas, muitos parceiros e o resulta-
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do desse reconhecimento é coletivo. Sem dúvida, é uma responsabilidade muito grande. É importante termos essa representatividade em espaços como esses porque mostra que a região amazônica não é tão atrasada como pensam. Nossa região tem potencial de criar empresas grandes para operar em várias regiões do País ou apenas resolver problemas locais”.
que estão moldando uma próxima geração de negócios sustentáveis.
A lista dos empreendedores sustentáveis é divulgada anualmente e já está em sua 5ª edição. Em 2020, além do líder brasileiro, jovens de outros seis países despontam em diversas áreas, todos com menos de 30 anos.
Atualmente, engenheiro agrônomo e mestre em Agronomia Tropical pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), o jovem empreendedor idealizou o negócio, em 2015, mas a motivação surgiu ainda na infância, quando via as dificuldades do setor Agrícola e dos pais, agricultores.
Com base em uma pesquisa global, o GreenBiz mapeia líderes emergentes de todo mundo com atuação em setores
Os jovens foram indicados pelos leitores do site do grupo e selecionados por sua equipe editorial, entre centenas de indicados, como líderes que estão impulsionando importantes mudanças em suas áreas de atuação.
O INÍCIO DE TUDO
Aos 14 anos, Macaulay Souza deixou a cidade de Borba (a 149 quilômetros de
ECONOMIA & SOCIEDADE
REVISTA CENARIUM Crédito: Ricardo Oliveira
Manaus), no interior do Amazonas, em busca de oportunidades na cidade grande. Na mala, trouxe muitos sonhos, entre eles, o de criar uma solução voltada para ajudar a agricultura familiar a escoar a produção que eliminasse intermediários e ligasse os produtores diretamente ao consumidor final e, também, que garantisse alimento de qualidade e com preço justo para os produtos. Segundo Macaulay, apesar da ideia ter iniciado em 2015, a plataforma só começou a operar em definitivo, em 2019, mas a proposta é expandir o negócio ainda mais. “Nosso modelo de negócios foi criado para otimizar todos os processos logísticos e de venda direta, mas achamos que precisamos dar mais consistência,
“
É importante termos essa representatividade em espaços como esses porque mostra que a região amazônica não é tão atrasada como pensam”
Macaulay Souza Abreu, 26, empreendedor. por isso estamos nos preparando para crescer ainda mais”. Desenvolvemos uma ferramenta ao longo desse processo baseado muito no que tínhamos de retorno, tanto dos fornecedores quantos dos consumidores”. Atualmente, o aplicativo tem dez colaboradores, entre sócios, funcionários diretos e indiretos e mais de 400 pessoas, entre assinantes e consumidores avulsos, que compram por meio do Onisafra todos os meses. A plataforma trabalha com diversas cadeias de agricultores, como feirantes e redes de produtos beneficiados, como chocolate, tapioca, que utilizam a matéria-prima local para produzir o alimento.
‘Feira digital’ foi idealizada por Macaulay Souza em 2015 e rendeu uma posição na lista das 30 jovens lideranças que implementam mudanças sustentáveis no planeta
“Hoje, o Onisafra é uma feira digital, onde o cliente, sem sair de casa, recebe confortavelmente os produtos escolhidos por meio da plataforma. Quem define os preços dos produtos são os feirantes e, na maioria da vezes, os produtos são mais baratos do que em uma feira ou supermercado físico”. Macaulay informou ainda que a monetização do aplicativo não é baseada na taxa de entrega, que é repassada integralmente para os produtores ou para o entregador responsável pela corrida. “Ganhamos uma monetização de uma taxa que é até 20% sobre os produtos vendidos pela plataforma. Não cobramos sobre essa taxa porque estamos procurando reduzir os custos, mas garantir que aquele entregador receba o valor justo pelo trabalho. Nossa ideia é desenvolver uma cadeia justa e transparente para que todos os envolvidos ganhem de forma integrada pela atividade que está desenvolvendo dentro da plataforma”.
SOBRE A PANDEMIA Antes da pandemia, a plataforma vendia, aproximadamente, 70 cestas por mês. Com a pandemia, os empreenderes perceberam um aumento significativo após o fechamento do comércio. Em apenas um mês, os pedidos subiram para 140 ao mês, um aumento de 100% no faturamento. Macaulay não sabe quais
100% Número de pedidos na plataforma Onisafra aumentou 100% durante a pandemia de Covid-19.
serão os desafios no pós-pandemia, no entanto, segue confiante. “Ainda não sabemos como serão as vendas após a flexibilização do comércio, pois as pessoas já podem sair de casa e as feiras voltaram a funcionar. Vamos esperar para ver como será o comportamento do consumidor, que certamente ainda é tímido, em relação à pandemia”.
EXPECTATIVAS PARA O FUTURO A Expectativa é expandir o negócio para outros Estados brasileiros no segundo semestre de 2020. As primeiras cidades a serem incluídas na plataforma serão Belém e São Paulo. “Já estamos negociando com parceiros para expandir o negócio. Com esse conceito de startup, conseguimos operar em outras cidades sem necessariamente abrir um escritório lá. Podemos fazer isso apenas criando uma rede de parceiros porque o nosso trabalho é remoto. Este ano ainda vamos lançar uma ação de teste para ver o resultado e em seguida, aplicarmos em definitivo, em 2021”. 41
Foto: Clรณvis Miranda.
ARTIGO – DANIELA CARDOSO
Por mais inclusão no processo democrático *Capitão Alberto Neto
A
Foto: Clóvis Miranda.
pesar de todos os esforços para garantir os direitos constitucionais à comunidade surda, muitas vezes encontramos situações em que a acessibilidade não é respeitada como, por exemplo, nos encontros políticos. Pensando nessas pessoas que precisam participar do processo democrático, decidimos iniciar nossa caminhada com a participação de intérpretes de Língua Brasileira de Sinais (Libras), em todas as nossas reuniões. Uma prévia de respeito e inclusão, que teremos na elaboração dos projetos para a Prefeitura de Manaus, como utilizar a Escola de Serviço Público Municipal e Inclusão Socioeducacional (Espi), para capacitar servidores públicos em Libras, desta forma multiplicaremos in-
térpretes para todas as secretarias e as autarquias do Executivo Municipal. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil possui cerca de 9,8 milhões de surdos e no Amazonas há aproximadamente 150 mil. Respeito que assegurei na primeira grande reunião, realizada no dia 7 de agosto, na Zona Leste de Manaus, com a participação de uma intérprete de Libras, para traduzir o meu discurso aos surdos presentes, tirando do papel o que é direito garantido. E um compromisso de acessibilidade a todos. (*) Deputado federal e pré-candidato à Prefeitura de Manaus 43
Brasil é o terceiro País mais perigoso para ativistas ambientais, diz pesquisa
Paulo Paulino Guajajara era conhecido como guardião da floresta e foi assassinado na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão, em novembro de 2019
Crédito: Patrick Raynaud/Divulgação Apib
Jarleson Lima – Da Revista Cenarium*
POLÍCIA & CRIMES AMBIENTAIS
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ANAUS – De acordo com relatório emitido no dia 29 de julho pela Organização Não Governamental (ONG) Global Witness, com sede em Londres (Reino Unido) e Washington D.C. (Estados Unidos), o Brasil voltou a figurar nas três primeiras posições da lista que aponta os países mais perigosos para ambientalistas no mundo. Com 24 mortes registradas em 2019, o País se encontra no terceiro lugar do ranking, um aumento de 4 homicídios em relação à pesquisa anterior. Desde que a organização passou a sistematizar informações do tipo, em 2012, nunca houve tantos crimes como em 2019. Só no ano passado foram registrados mundialmente 212 assassinatos relacionados à luta ambiental. No topo do ranking está outro País sul-americano, a Colômbia, com 64 mortes. Filipinas, o País “líder” do ano passado, aparece agora em segundo lugar, com 43 vítimas. Para o ativista da Global Witness, Ben Leather, em entrevista à DW Brasil, entre os motivos para o aumento dessa violência está a crescente demanda pelo consumo. Além disso, segundo ele, a tendência é que as coisas piorem a cada ano. “Para suprir seus negócios, empresas buscam novas áreas, novos territórios, e colocam em ameaça as comunidades que estão lá e defendem suas terras, seus direitos”, pontuou. A impunidade é vista também como parte da engrenagem que sustenta o cenário. “A cada ano, defensores são mortos e quase nenhum caso vai parar na Justiça. Quem comete os crimes se sente livre para continuar. Por isso, os governos precisam agir”, ressaltou Leather. No Brasil, a grande maioria dos assassinatos de ambientalistas em 2019 ocorreu na Amazônia. Para a Global Witness, é preciso destacar que alguns tipos de ambientalistas brasileiros enfrentam riscos mais específicos e sérios. “São os indígenas os mais expostos à violência”, destaca Leather. Das 24 mortes contabilizadas em território brasileiro pelo relatório, dez delas, ou cerca de 42%, foram de indígenas. “Eles representam apenas 0,4% da população do País, ou seja, estão super-
-representados entre os ativistas assassinados”, lamenta o membro da Global Witness.
VIRADA HISTÓRICA Nomes de brasileiros como o de Paulo Paulino Guajajara estão na lista da Global Witness. Conhecido como guardião da floresta, ele foi assassinado na
“
São os indígenas os mais expostos à violência”
Ben Leather, ativista da Global Witness. Terra Indígena Arariboia, no Maranhão, em novembro de 2019. Paulino Guajajara fiscalizava e denunciava invasões das terras e roubo de madeira – função que se tornou mortal no País. Um levantamento feito pelo Instituto Socioambiental (ISA) mostrou que esse território indígena na Amazônia tem sofrido com invasões e desmatamento sem precedentes. Para tirar a madeira roubada do local, os criminosos chegam a abrir mais de 100 quilômetros de estradas clandestinas por mês na mata. “De uns tempos para cá, os ataques se voltaram mais contra os indígenas. No passado, eram os missionários que defendiam a causa que eram assassinados, mas houve esta virada histórica”, analisou Christian Ferreira Crevels, antropólogo do Conselho Missionário Indigenista (Cimi). Um dos casos marcantes foi o da Irmã Cleusa, assassinada em 1985. Como missionária, defendia a terra indígena dos Apurinã às margens do rio Paciá, em Lábrea, Estado de Amazonas. A mudança, segundo Crevels, tem uma explicação clara. “No Brasil da impunidade, as mortes dos indígenas defensores dos territórios, do meio ambiente, repercutem menos. Quantos brasileiros perderam a vida no interior e nunca foram conhecidos”, complementou.
São nomes como o de Dilma Ferreira Silva, líder rural e coordenadora regional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), assassinada em 2019 no Pará, que também consta no relatório da Global Witness. Segundo a denúncia oferecida pelo Ministério Público Estadual do Pará, o fazendeiro Fernando Ferreira Rosa Filho, mandante do crime, encomendou a morte da ativista por ela ameaçar denunciar suas atividades ilegais – como desmatamento ilegal – às autoridades. “Sabemos que nosso relatório traz só a ponta do iceberg. Só contamos o número de assassinatos. Sabemos que em todo o mundo, inclusive no Brasil, há muitos defensores do meio ambiente e membros de suas famílias que sofrem muita violência: são difamados, censurados, ameaçados, assediados e presos”, comentou Leather. (*) Com informações da DW
42%
Das 24 mortes contabilizadas em território brasileiro pelo relatório da Global Witness, dez, ou cerca de 42%, foram de indígenas.
RANKING Países mais perigosos para ativistas Colômbia
64 mortes
Filipinas
43 mortes
Brasil
24 mortes
Fonte: Global Witness
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Crédito: Semas Pará
A Secretaria de Meio Ambiente do Pará informou que de janeiro a junho de 2020 foram apreendidos 4.666 metros cúbicos de madeira
Madeira ilegal Apreensão aumenta em operações militares na Amazônia Legal Gabriel Abreu – Da Revista Cenarium
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ANAUS - O volume de madeira ilegal apreendida pelas Forças Armadas na Amazônia Legal aumentou 21,7% em 2020 comparado ao ano passado. Em 2019, a Operação Verde Brasil, instituída por um decreto presidencial de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), apreendeu 23 mil metros cúbicos em dois meses de duração. Neste ano, a Operação Verde Brasil 2, que deve seguir até novembro, já contabiliza 28 mil metros cúbicos apreendidos durante o mesmo período de tempo de 60 dias. Para ambientalistas, apesar do aumento do volume de apreensões, as operações refletem a militarização do combate a crimes ambientais, o enfraquecimento de órgãos de fiscalização, como Ibama e ICMBio, além da flexibilização da fiscalização de punições aos autuados por crime ambiental. De acordo com informações divulgadas no site oficial do governo federal, em 2019, a operação instituída, por meio de decreto presidencial, autorizou o emprego das Forças Armadas para a Garantia da Lei e da Ordem [Ambiental] (GLO) entre os dias 24 de agosto e 24 de
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setembro nas áreas de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas dos Estados da Amazônia Legal. Durante a vigência deste primeiro período de atividades na Amazônia Legal, a GLO foi estendida por mais 30 dias até 24 de outubro. Durante os dois meses de atuação da Operação Verde Brasil foram presas 127 pessoas, apreendidos 23 mil metros cúbicos de madeira, 26 mil litros de combustível, 178 embarcações e 112 veículos. Ainda foram destruídos 45 acampamentos e 13 pontes clandestinas. As informações foram divulgadas no site oficial do governo federal. Em 2020, segundo informações divulgadas pelo Ministério da Defesa à REVISTA CENARIUM, a operação foi deflagrada em 11 de maio e, em 60 dias de atuação, foram realizadas mais de 13 mil ações entre inspeções, patrulhas navais e terrestres, vistorias e revistas. Cerca de 370 quilos de drogas foram apreendidos e 153 prisões realizadas. Na lista de apreensões, constam ainda 28 mil metros cúbicos de madeira ilegal, 93 tratores, 85 maquinários de mineração, 193 embarcações e 174 veículos. Foram emitidos 1.207 termos de infração que alcançam um valor total de R$ 407 milhões em multas. “Ou seja, quase sete vezes o valor inicial do custo da operação, de R$ 60 milhões”, diz nota do ministério enviada à revista. Mas, segundo publicação do El País Brasil do dia 26 de maio deste ano, estes R$ 60 milhões equivalem ao orçamento anual do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para ações de controle e fiscalização ambiental em todo o território nacional, que é de 76 milhões, 25% a menos do que em 2019. Segundo Itamar Araújo, ativista e pesquisador da Universidade Federal do Amapá, o presidente Jair Bolsonaro facilitou a vida de quem é autuado por crime ambiental no Brasil. Isso porque o infrator pode parcelar o valor definido pela Justiça, diminuir ou até mesmo converter em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente. “Isso é muito grave. As multas, se não forem aplicadas, podem prescre-
ver. O governo Bolsonaro tem atacado as agências de fiscalização ambiental e tem culpado ONGs, instituições voluntárias e povos indígenas pelos incêndios na Amazônia sem nenhuma prova, e, ao mesmo tempo, fracassado em agir contra as redes criminosas que estão derrubando árvores e queimando a floresta para dar lugar à criação de gado e agricultura”, explicou Itamar. Ainda de acordo com as informações do Ministério da Defesa enviadas à REVISTA CENARIUM, a Operação Verde Brasil 2 é coordenada pela Vice-Presidência da República, comandada pelo general Hamilton Mourão, em apoio aos órgãos de controle ambiental e de segurança pública.
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O governo Bolsonaro tem atacado as agências de fiscalização ambiental e tem culpado ONGs, instituições voluntárias e povos indígenas pelos incêndios na Amazônia sem nenhuma prova”
Itamar Araújo, pesquisador e ativista. O ministério também informou que o Grupo de Integração para proteção da Amazônia (Gipam), responsável pela tomada de decisões da operação, é composto por Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ibama, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Serviço Florestal Brasileiro, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Polícia Federal, Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Agência Nacional de Mineração, Fundação Nacional do Índio (Funai) e Polícia Rodoviária Federal. No entanto, estes órgãos estão hierarquicamente subordinados aos militares, conforme texto do decreto presidencial da GLO.
NOS ESTADOS Também foram solicitados dados sobre apreensão de madeira ilegal aos governos de nove Estados da Amazônia Legal e a órgãos de fiscalização, mas apenas três responderam. O Amazonas, por meio do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), informou que no ano de 2019 foram realizadas 29 apreensões de madeira ilegal no Estado, com um total de 9 mil metros cúbicos apreendidos. No ano de 2020, de janeiro a junho, foram feitas 7 apreensões, sendo 5 na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã, somando 87 metros cúbicos de madeira ilegal apreendidos. O Ipaam ressaltou que as fiscalizações são realizadas por meio de demandas externas e que a quantidade de madeira apreendida variou em cada fiscalização, sendo as ilegalidades de várias naturezas, como madeira serrada sem o documento de origem florestal (DOF) e madeira em tora sem licença válida para armazenamento. As fiscalizações foram realizadas em 12 municípios diferentes. A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do Pará informou que de janeiro a junho de 2020 foram feitas 66 operações de combate aos crimes ambientais, com a apreensão de 4.666 metros cúbicos de madeira. Em 2019, foram 6.561 metros cúbicos apreendidos. Segundo a Semas, os responsáveis se tornam alvos de processos que podem gerar advertências, multas e outras sanções e os suspeitos respondem pelos crimes ambientais praticados. A Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) do Mato Grosso informou que em 2019 apreendeu 280 mil metros cúbicos de madeira ilegal, mas não respondeu à reportagem sobre dados de 2020. Já o Governo de Roraima informou, por meio de nota, que as apreensões de madeira ilegal são feitas pelo Ibama e que a Companhia de Policiamento Ambiental da PMRR, apenas participa das operações. Acre, Amapá, Maranhão, Rondônia e Tocantins não repassaram os dados até o fechamento desta reportagem. 47
POLÍCIA & CRIMES AMBIENTAIS
Campeão do desmatamento Altamira, no Pará, lidera ranking da devastação na Amazônia
Crédito: Exército/Divulgação/Fotos Públicas
Gabriel Abreu – Da Revista Cenarium
De acordo com levantamento do Inpe, 233.011 hectares estão no Estado do Pará, sendo Altamira a cidade que mais possui área desmatada
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ANAUS – O município de Altamira, no Pará, foi em 2019 o campeão do desmatamento entre cidades da Amazônia Legal. De acordo com dados do Prodes, um dos sistemas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) que monitora o desflorestamento na região, são também do Pará seis dos dez municípios que mais desmataram a Amazônia no ano passado, sendo que cinco dessas cidades paraenses integram a Bacia do Xingu: Altamira, São Félix do Xingu, Senador José Porfírio, Pacajá e Anapu. Além deles, o município paraense de Portel aparece em oitavo lugar. O ranking dos 10 maiores municípios desmatadores da Amazônia tem ainda três cidades do Amazonas e uma de Rondônia. O ranking dos municípios com maiores taxas de desmatamento é um reflexo
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do forte crescimento da derrubada de vegetação no Brasil. Em termos gerais, o monitoramento do Inpe revelou que 2019 bateu recorde dos últimos 10 anos. De acordo com levantamento do instituto, entre julho de 2019 e maio deste ano foram desmatados 566.624 hectares de floresta no País. Desse total, 233.011 hectares estão no Estado do Pará, sendo Altamira a cidade que mais possui área desmatada. O secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará, José Mauro O’ de Almeida, disse que as ações estão sendo intensificadas em Altamira para diminuir os índices de desmatamento. “Altamira entra na estratégia global da Força Estadual de Combate ao Desmatamento, nós já fomos até o município, já fizemos autuações, já foram abertos inquéritos pela Polícia Civil do Pará por crimes
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O desmatamento está crescendo, ele já estava crescendo desde 2012, mas o que a gente viu nos últimos dezesseis meses é um crescimento muito grande”
Rômulo Batista, porta-voz do Greenpeace no Brasil.
REVISTA CENARIUM
No Amazonas, a região sul do Estado é a que concentra a maior taxa de desmatamento por conta das atividades agrícolas e pecuárias. Os três municípios amazonenses que estão no ranking dos dez maiores desmatadores são Lábrea, Apuí e Novo Aripuanã, que aparecem em quarto, sétimo e nono lugar do ranking, respectivamente. Os três municípios do Amazonas estão sendo alvo de uma operação da Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Amazonas (Sema) em parceria com o Exército, que combate o escoamento ilegal de madeira da floresta. “O Estado (Amazonas) está trabalhando em conjunto com o governo federal, por meio do Comando Militar da Amazônia (CMA), onde a gente integra as nossas ações. O Estado trabalha nas áreas estaduais, o governo federal, nas áreas federais, mas a equipe da Sema integra essas ações para poder reduzir o custo logístico, aproveitar essas caronas para ter mais capilaridade nas ações”, destacou o secretário estadual de Meio Ambiente, Eduardo Taveira.
ÍNDICES PREOCUPAM O Greenpeace acompanha com preocupação os números de desmatamento na Amazônia. O porta-voz da organização Não Governamental (ONG) no Brasil, Rômulo Batista, afirma que o ano de 2020 pode bater o recorde do ano passado se as ações do Governo Federal não forem mais incisivas na Amazônia Legal. “O desmatamento está crescendo, ele já estava crescendo desde 2012, mas o que a gente viu nos últimos dezesseis meses é um crescimento muito grande. Ano passado, a taxa oficial ficou em mais de 1 milhão de hectares, isso é mais que 1 milhão de campos de futebol que foram perdidos da floresta mais biodiversa do mundo, onde você encontra as mais diversas formas de vida. Foram incontáveis as perdas”, explicou Rômulo.
Municípios que mais desmataram em 2019 (Prodes/INPE) Altamira (PA)
57.521
São Félix do Xingu (PA)
54.432
Porto Velho (RO)
41.219
Lábrea (AM)
38.137
Senador José Porfírio (PA)
32.769
Pacajá (PA)
31.180
Apuí (AM)
28.758
Portel (PA)
23.122
Novo Aripuanã (AM)
23.007
Anapu (PA)
Hectares desmatados
21.745 0
10.000
20.000
30.000
rias estaduais de Meio Ambiente informaram que vêm desenvolvendo diversas operações para coibir o desmatamento. No Pará, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) informou que realizou 66 operações de combate a crimes ambientais entre janeiro e junho de 2020, apreendendo 4.666 metros cúbicos de madeira ilgeal. Os números mostram um crescimento nos seis primeiros meses deste ano. Em 2019, foram 6.561 metros cúbicos apreendidos, os responsáveis respondem a processo que pode gerar advertências, multas e
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Nós estamos voltando periodicamente em Altamira e nos dez municípios que mais desmatarem no Estado entre julho, agosto e setembro pelo menos para diminuir esses índices”
40.000
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outras sanções. Os suspeitos também respondem pelos crimes ambientais praticados. No dia 3 de julho, o governo federal anunciou a criação do Programa Floresta+ para valorizar quem preserva e cuida da floresta nativa do País. O projeto-piloto vai começar destinando R$ 500 milhões para conservação da Amazônia Legal. O programa conta com a participação do setor privado e de recursos de acordos internacionais só não foi informado como o Estado deve receber desse programa. Crédito: Semas Pará
ambientais. Mas nós estamos voltando periodicamente em Altamira e nos dez municípios que mais desmatarem no Estado entre julho, agosto e setembro pelo menos para diminuir esses índices”, afirmou Almeida.
José Mauro O’ de Almeida, secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará.
Amazonas e Pará são os maiores Estados da região amazônica e as secreta49
ARTIGO – DANIELA CARDOSO
A pandemia e um novo propósito de vida Cristina Monte*
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pesar de levarmos nossas vidas no modo hard e estarmos sempre acelerados e em movimento, tudo parecia ir bem! Parecia! Até a pandemia do novo Coronavírus contaminar o planeta e provocar transformações que vão além dos cuidados com a higiene básica e com a saúde, de modo geral. Nesse novo momento da história da humanidade, estamos revendo comportamentos, negócios, prioridades, buscando outros meios e formas de adaptação num mundo que – de repente – se tornou inóspito. E como fica o propósito de vida nessa nova atmosfera? Como conciliar os interesses individuais com os coletivos? Quem você é ou está se tornando, e qual a sua busca ou satisfação?
PERDAS E ENCONTROS A gente já conhece os efeitos nocivos do novo Coronavírus! Todos os dias nos deparamos com as piores histórias: pai que perdeu o filho, esposa que perdeu o marido, filho que perdeu os pais e assim
por diante. Além dessas perdas irreparáveis, as consequências no mercado de trabalho e nos negócios são gigantescas. E se tudo isso não fosse suficiente para nos obrigar a sair do lugar comum, nossa saúde mental também ficou abalada! É quase como se tivéssemos perdido o chão e isso nos traz frustração, medo, insegurança! Uma soma de diferentes emoções e sensações que se misturam às atividades do dia a dia e nos faz perder o elo com o passado, lugar em que nos sentíamos mais seguros e protegidos. Agora é preciso encontrar o novo “eu”. Entretanto, por outro lado, a pandemia nos trouxe várias reflexões e nos convida a desenvolver a empatia, a pensar mais no outro, a perceber que todas as vidas são importantes e, mais, que é preciso romper com velhas crenças e paradigmas por não caberem mais nesse atual contexto.
mica mundial mais humana e solidária, em que a gente não se baseie ou se contente com respostas prontas, mas que se empenhe em fazer as perguntas corretas. O novo Coronavírus convida a humanidade e a cada um de nós individualmente a repensar o que realmente é um “propósito de vida”, o que faz com que cada ser humano saia dos seus muros individuais imaginários e viva para a coletividade, para algo que tenha um sentido maior!
O LADO BOM
Isso não significa – necessariamente – largar tudo e sair pregando por aí, mas significa ampliar a visão e abraçar o mundo como um lugar de todos e para todos. Uma pergunta importante que precisamos nos fazer internamente é como posso, dentro da minha condição, tornar a vida de todos ao meu entorno melhor? É um propósito simples, mas é um caminho que a pandemia vem nos mostrando!
A Covid-19 despertou o sentimento de pertencimento, o desejo de contribuir para uma nova construção socioeconô-
*Cristina Monte é jornalista, pós-graduada em Comunicação Empresarial e Historiadora.
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Greta Thunberg vai doar mais de R$ 600 mil para combate à Covid-19 na Amazônia
Crédito: World Economic Forum/Manuel Lopez/Fotos Públicas
Da Revista Cenarium*
Greta Thunberg avalia como um ponto positivo as críticas feitas pelos presidentes Donald Trump e Jair Bolsonaro contra o movimento liderado por ela.
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MUNDO E CONFLITOS INTERNACIONAIS
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ANAUS – A ativista sueca Greta Thunberg anunciou a doação de 100 mil euros (R$ 610.000 reais na cotação atual) para um projeto em combate ao coronavírus na Amazônia. Recentemente, Greta recebeu mais de R$ 6 milhões por meio do Prêmio Gulbenkian para a Humanidade, um projeto que integra a campanha SOS Amazônia, do movimento Friday’s for Future. Essa não é a primeira vez que a ativista sueca se mobiliza em favor do Brasil contra o Coronavírus. Em maio, ela fez uma campanha mundial em apoio à capital do Amazonas, Manaus, no combate ao novo coronavírus. Agora, o objetivo da atual doação é coletar insumos médicos e serviços de medicina à população
as comunidades da região Norte, que enfrentam dificuldades econômicas, sanitárias e logísticas durante a pandemia do coronavírus. “Sabemos que não podemos enfrentar a crise climática sem antes enfrentar a crise do coronavírus”, diz o manifesto da campanha. Questionada pela reportagem sobre as críticas recebidas de grupos conservadores e até líderes como Donald Trump, nos Estados Unidos, e o presidente Jair Bolsonaro, no Brasil, Greta avaliou que as reações indicam um sinal positivo. “Nós deveríamos entender como uma prova de que nós estamos fazendo alguma coisa. Eles sentem que devem nos
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Sabemos que não podemos enfrentar a crise climática sem antes enfrentar a crise do coronavírus”
Trecho do manifesto da campanha. que vive na floresta amazônica. Estima-se que mais de 10.000 indígenas contraíram a Covid-19 até o início de julho, segundo entidades de apoio à população amazônica. O projeto Friday’s for Future é um movimento popular iniciado em agosto de 2018 por Greta Thunberg. Na época, a ativista decidiu fazer greves todas as sextas-feiras até que as políticas suecas assegurassem a contenção do aquecimento em um nível seguro, bem abaixo dos 2° C, segundo o Acordo de Paris. As hashtags #FridaysForFuture e #Climatestrike se espalharam pelo mundo e muitos estudantes se uniram ao movimento.
‘VIRAMOS UMA AMEAÇA’ Greta Thunberg reuniu-se pela primeira vez no dia 5 de julho com os jovens brasileiros que organizam no País o movimento Fridays for Future. O encontro serviu para lançamento da campanha SOS Amazônia, que por meio do site www.sosamazonia.fund, busca arrecadar R$ 1 milhão em doações para
silenciar porque nós nos tornamos barulhentos demais em relação ao que eles podem lidar, nós viramos uma ameaça”, disse Greta. Greta evitou nomear os líderes ao direcionar suas críticas e reforçou que governos no mundo todo estão falhando ao lidar com as crises do coronavírus e das mudanças climáticas. Os jovens brasileiros, no entanto, não pouparam críticas ao governo federal, apontando omissões no combate ao coronavírus e também ao desmatamento na Amazônia. “Se o ministro do Meio Ambiente não é capaz de proteger o meio ambiente, precisa sair”, disse o ativista Iann Coêlho, 18. No ano passado, durante reunião na Câmara dos Deputados, Iann entregou ao ministro Ricardo Salles uma premiação irônica, o troféu ‘Exterminador do Futuro’. Segundo o movimento, os recursos da campanha SOS Amazônia irão para o território de Santa Isabel, no alto do
rio Negro, para as terras Caititu, Tapaua e Deni, na região do rio Purus, atendendo os povos de Paumari, Apurinã, Deni, Jamamdi e Jarauwara, e também para 1.489 famílias em Manaus e no entorno urbano. “Os recursos vão apoiar a compra de alimento, material de higiene e também para garantir acesso a técnicos de saúde”, explicou a ativista indígena Samela Sateré Mawé, que vive em uma comunidade indígena urbana em Manaus. “Nós não temos como vender nossos artesanatos, então esses alimentos vão nos ajudar, porque não estamos recebendo de nenhuma forma. É diferente de viver em aldeia. Aqui na cidade nós temos que comprar tudo que precisamos para viver”, diz. O valor arrecadado será gerido por um comitê formado pelos jovens do Fridays for Future junto à Fundação Amazônia Sustentável. A campanha é internacional e conta com apoio de jovens europeus, como a também sueca Isabelle Axelsson, 19. Ela cobra do governo de seu País e de outras nações desenvolvidas que assumam suas responsabilidades pelas emissões de gases de efeito estufa históricas, “antes de exigirem que os outros façam o mesmo”. A posição é semelhante à cobrança feita por diplomatas brasileiros e de outros países em desenvolvimento em negociações climáticas. “As pessoas esperam que nós possamos lhes dar esperança, mas é difícil para os jovens ter esperança hoje. É muito individual, mas eu não tenho muita, porque não vejo ação dos políticos”, disse Isabelle. “Esperança não deveria ser a chave para a ação. Precisamos salvar vidas. Se não agirmos, vamos viver um pesadelo, como parte de nós já está vivendo”, disse o brasileiro Abel Rodrigues, 20. Para a porto-alegrense Amália Garcez, 17, “nossa perspectiva [para o futuro] é levar [a questão climática] para todos os aspectos da nossa vida e seguir lutando nossa vida toda”. (*) Com informações da Folhapress e da Reuters 53
Foto: Clรณvis Miranda.
MUNDO E CONFLITOS INTERNACIONAIS
Crédito: Niaid/Fotos Públicas
Mais de 15 milhões de pessoas já foram infectadas pelo novo coronavírus e mais 600 mil morreram pela doença, segundo a OMS
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Pandemia:
alguns países ainda enfrentam batalha “longa e difícil”, alerta OMS Da Revista Cenarium
enebra – A Organização Mundial da Saúde (OMS) fez um alerta de que os países que não têm usado todas as ferramentas disponíveis para combater a pandemia do novo coronavírus e que ainda apresentam alto índice de contaminação terão mais dificuldade para vencer a doença. “Alguns países… adotaram uma abordagem fragmentada. Esses países enfrentam um caminho longo e difícil pela frente”, disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, em entrevista por videoconferência da sede da OMS em Genebra, no início de julho. Mais de 15 milhões de pessoas foram infectadas globalmente e mais de 600 mil morreram desde que a doença Covid-19 surgiu pela primeira vez na cidade chinesa de Wuhan. O chefe do programa de emergências da OMS, Mike Ryan, disse na mesma entrevista que a agência planeja enviar dois especialistas de sua sede para se juntar à equipe da China no País, a fim de estabelecer o escopo de uma missão que analisará as origens do coronavírus. (*) Com informações da Reuters 55
EDITORIA CULTURA E ENTRETENIMENTO
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ENTRETENIMENTO & CULTURA
Estilo Tikuna
Estilista We’e’ena Tikuna, do AM, dá primeiros passos no mundo fashion Luciana Bezerra – Da Revista Cenarium
M CréditoS: Divulgação/Acervo Pessoal
ANAUS – Se José de Alencar fosse escritor do século 20, sem dúvida, ele escreveria a história de We’e’ena Tikuna. Uma jovem nascida na reserva indígena Tikuna Umariaçu, no Alto Solimões, localizada no município de Tabatinga (AM), onde se concentra a maior população indígena Tikuna brasileira, com 48 mil habitantes, conforme último balanço do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na língua Tikuna, We’e’ena, um nome pronunciado em forma de canto, significa “onça nadando para o outro lado do rio”. Como consta em seu Registro Administrativo de Nascimento Indígena (Rani), emitido pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Aos 12 anos, We’e’na mudou para Manaus, capital do Amazonas com toda a família, por uma vontade do pai. Aos
18 anos, ela trocou a Amazônia pela ‘selva de pedra’ da cidade de São Paulo. Aos 31, hoje, artista plástica, estilista, cantora, nutricionista, feminista e defensora dos direitos das mulheres indígenas, conta que sofreu no início da vida longe da floresta. “No primeiro momento, minha mãe não se acostumou a viver fora da aldeia. Mas meu pai criou a comunidade indígena Wotchimaucu, na Cidade de Deus, zona Leste de Manaus, próxima ao jardim botânico da cidade. Foi um choque cultural para todos nós, que éramos acostumados a viver livremente na aldeia. Aos 12 anos, fui matriculada na primeira série do ensino fundamental, em uma escola da região, sem saber falar português e, sequer, ler. Sofri bullying, preconceito, chorei inúmeras vezes e, como tinha dificuldade de me comunicar, repeti de ano duas vezes por falta de paciência dos professores. Eles não me entendiam e eu não entendia eles”.
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O povo Tikuna é conhecido pelos grafismos. Somos divididos por clãs, retratados em animais. Por isso, eu expresso essa ancestralidade na criação das minhas peças’’
We’e’ena Tikuna, estilista, artista plástica, nutricionista e ativista dos direitos indígenas.
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ENTRETENIMENTO & CULTURA
ORIGEM DE TUDO De todos os percalços daquele período de mudanças We’e’ena lembra das aulas de artes na escola, onde, segundo ela, sempre se destacava. Foi a partir dali que a vida da indígena começou a se transformar na cidade grande. Em 2005, ela ganhou uma bolsa de estudos no Instituto Dirson Costa de Arte e Cultura do Amazonas (IDC), para cursar artes plásticas. We’e’ena não só se formou, como se especializou em pintura acrílica sobre tela sempre expressando a arte indígena. Atualmente, 12 de suas obras estão no acervo do Estado do Amazonas. A artista plástica também se orgulha de ter trabalhado ao lado de artistas de renome nacional, de ter tido a oportunidade de ex-
“Eu não vejo como uma vitória pessoal, mas sim coletiva, pois é um passo a mais para a visibilidade do meu povo”, compartilha We’e’ena.
MARCA E GRIFE COM RAÍZES INDÍGENAS We’e’ena é a primeira indígena Tikuna a assinar profissionalmente uma coleção e a expor suas peças autorais para o mundo fashion em um dos maiores eventos da moda sustentável do País, Brasil Eco Fashion Week, realizado em São Paulo, em 2019. Segundo a estilista, a ideia de criar uma marca que esboçasse a cultura indígena surgiu há 12 anos, quando ainda confeccionava as peças para uso pessoal. No entanto, o sonho só se concretizou em
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Sofri bullying, preconceito, chorei inúmeras vezes e, como tinha dificuldade de me comunicar, repeti de ano duas vezes por falta de paciência dos professores. Eles não me entendiam e eu não entendia eles”. We’e’ena Tikuna, estilista, artista plástica, nutricionista e ativista dos direitos indígenas. por suas obras na Casa da Fazenda de São Paulo, além de ser homenageada como melhor artista plástica indígena pela Sociedade Brasileira de Educação e Integração e pelo Prêmio Quality Internacional Do Mercosul.
2018, quando lançou a primeira coleção intitulada ‘Eware’ (lugar sagrado, na língua Tikuna), que nasceu com objetivo de combater o preconceito, o racismo e o não reconhecimento da verdadeira história das suas origens.
Dona de diversos dotes artísticos, We’e’ena é engajada em inúmeras vertentes culturais, além da artes plásticas, como música e moda, é ativista e palestrante. Como cantora, ela é divulgadora cultural do povo indígena, compôs um álbum dedicado à língua Tikuna, com letras que falam da resistência cultural, da identidade e da preservação da natureza.
Sem incentivo para subsidiar sua marca e a grife, a estilista conta que o maior apoio veio do companheiro, o violonista espanhol, Anton Carballo, que compõe a Orquestra Sinfônica do Rio de Janeiro.
No cenário nacional, We’e’ena foi a primeira indígena a participar do maior encontro da música popular brasileira, a Festa Nacional da Música 2017 e fez inúmeras aberturas no Rio +20, Itaú Cultural, Palácio do Governo de Brasília, Revelando São Paulo, Jogos Indígenas, Festival de Bertioga, Dia internacional dos Povos Indígenas. 58
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“A ideia de criar peças e uma marca nasceu quando as pessoas demostraram interesse pelas roupas que eu usava nos eventos. E pensei, por que não criar uma coleção exclusiva e vender? Há mais de 12 anos faço minhas próprias roupas”. Utilizando matérias-primas regionais da cultura indígena, como sementes de açaí, palha de tucumã, tururi, fibra de madeira, usadas em rituais do povo Tikuna, e tingimentos naturais nas pinturas dos tecidos, como jenipapo e urucum, a marca
‘We’e’ena Tikuna Arte Indígena’’ ganhou destaque em desfiles nacionais e a estilista foi convidada a participar da semana de moda de Milão, na Itália, que estava prevista para setembro antes da pandemia. “A marca trabalha exclusivamente com tecido de algodão e misturas de fibras de tururi, a pintura dos grafismos é manual, as peças são confeccionadas uma por uma por mim, as pinturas nos tecidos são de tingimentos naturais (jenipapo, urucum) e estamparia com os grafismos nativos e escolhi o algodão porque é orgânico, além de desenvolver a criação das modelagens das peças”, destaca. O estilo dos grafismos nas peças tem diversas simbologias e cada modelo expressa um significado diferente. Imitando a escama de tartarugas e cobras, o peixe bodó e penas de aves, a arte reflete a origem da criadora. “O povo tikuna é conhecido pelos grafismos. Somos divididos por clãs, retratados em animais. Por isso, eu expresso essa ancestralidade na criação das minhas peças’’, explica We’e’ena Tikuna, a estilista por trás das obras. We’e’ena adiantou ainda que recebeu um convite para participar da semana de moda de Milão, que estava prevista para setembro, mas em decorrência da pandemia, não sabe se o evento será realizado neste ano. A nova coleção, nomeada de Tururi, traz um viés mais sustentável, já foi desenhada e será apresentada no evento de Milão.
COMO ATIVISTA We’e’ena que também exerce a carreira de nutricionista e se divide entre o Rio de Janeiro, onde tem um consultório, em Ipanema, e Alter do Chão, no Pará, onde mora. Como ativista das questões indígenas, ela defende a bandeira da visibilidade e da inclusão indígena e, paralelamente aos projetos pessoais, é militante dos direitos do povo nativo. “Muitos artistas indígenas também fazem sua própria arte. Isso mostra uma mensagem clara que não somos excluídos, estamos nos incluindo na sociedade sem esquecer nossa essência. A história que eu escrevi, vai ficar aqui”, finaliza.
Crédito: Ricardo Oliveira
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Eu não vejo como uma vitória pessoal, mas sim coletiva, pois é um passo a mais para a visibilidade do meu povo”
We’e’ena Tikuna, estilista, artista plástica, nutricionista e ativista dos direitos indígenas.
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ENTRETENIMENTO & CULTURA
Lugar de Fala Irmãs indígenas fazem parte da nova geração que atua em defesa da Amazônia Mencius Melo – Da Revista Cenarium
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ANAUS – Politizadas, conscientes e libertárias são adjetivos que definem bem as irmãs Sâmela e Sandiely Sateré. Duas jovens mulheres nascidas na “aldeia urbana” da capital amazonense, descendentes diretas do povo Sateré Mawé (1) e do povo Dessana (2). As irmãs são filhas de mãe Sateré e pai Dessana e são representantes étnicas da Amazônia brasileira no ‘Fridays For Future’, movimento liderado pela ativista ambiental Greta Thunberg. Em recente campanha mundial intitulada ‘SOS Amazônia’, elas ajudaram a arrecadar recursos para apoiar as comunidades indígenas afetadas pela pandemia da Covid-19, que no Amazonas ganhou proporções assustadoras. Em entrevista à REVISTA CENARIUM, as irmãs Sateré-Dessana falaram sobre como chegaram ao Fridays, suas lutas e posturas diante do mundo que as cerca. Com 23 anos, a estudante de Biologia da Universidade Estadual do Amazonas (UEA), Sâmela Sateré, conta as experiências de uma jovem indígena. “Entrei na UEA em 2016 pelo sistema de cotas, no começo não encontrei nenhum acadêmico indígena e então me encolhi”, recordou. A estudante conta que esse comportamento é quase natural em função do preconceito contra os indígenas em boa parte da academia. “Temos um preconceito estrutural na sociedade brasileira e, nas universidades, isso não seria diferente, por isso muitos não assumem a des-
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cendência étnica, principalmente em cursos elitizados como a medicina”.
EMPODERAMENTO E ATIVISMO Oriunda de uma família engajada, Sâmela relembra a luta de sua vó. “Nasci na Associação de Mulheres Indígenas Sateré Mawé (Amism), movimento criado por minha vó em 1992, mas o empoderamento veio quando ingressei em 2016 no Movimento Estudantes Indígenas do Amazonas (Meiam)”, recordou. “Nesse período, identificamos 25 acadêmicos indígenas na UEA e de lá para cá, iniciamos a fortalecimento dessa entidade e posso dizer com orgulho que me aceito como sou, sou aceita como sou e hoje faço parte do Núcleo de Estudantes Indígenas da Escola Normal Superior da UEA”, orgulhou-se. Questionada como se deu a aproximação com o grupo de Greta, Sâmela relembrou: “Em 2019 participei da ‘Greve pelo Clima’, um protesto mundial com apelo ao meio ambiente, acredito que isso me credenciou e o Friday me contatou via uma Friday de Curitiba que não sei como me achou”, relembrou com humor. “A partir desse contato, apresentei o Fridays para o pessoal da Fundação Amazonas Sustentável (FAS) e assim iniciamos a parceria”, descreveu.
IRMÃ DE LUTAS Sandiely Sateré é a mais nova militante da família, com apenas 15 anos, estuda o primeiro ano do ensino médio em Manaus. Fã de Sâmela, ela credita à irmã o engajamento e a indicação para o Fridays For Future. “Ela me motivou a entrar no movimento ambiental, ela está me ensinando a me defender e a defender meus irmãos”, falou com orgulho. Para ela, o momento político no Brasil exige a participação dos ‘parentes (3)’. “Hoje estamos lutando contra o genocídio dos nossos irmãos e a morte de nossas matas”, avançou.
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Por estar em um ambiente juvenil, Sandyely relata que o bullying não a assusta. “Aprendi a não baixar a cabeça, sou convocada pelos meus professores a debater sobre meio ambiente, orgulho étnico e outros temas”, relatou. Sobre a vaidade de ‘cunhã-poranga (4) ela não abre mão. “Na escola uso meus colares, brincos e outros assessórios Sateré, sou indígena pura, não tenho para onde correr e eu gosto muito disso”, descreveu-se.
‘FUTURE’ E FUTURO
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Sâmela Sateré, estudante e ativista.
Sandyely Sateré, estudante e ativista.
Sâmela estuda Biologia na UEA e também integra o Movimento de Estudantes Indígenas do Amazonas
Sandyely tem orgulho da identidade indígena e planeja cursar administração em nível superior
Temos um preconceito estrutural na sociedade brasileira e nas universidades, isso não seria diferente”
Planejo fazer administração para ajudar a associação e quem mais da nossa gente precisar”
Questionadas sobre o futuro no ‘Future’ elas comentaram: “Estamos estudando inglês para dominar melhor as participações, inclusive no próximo vídeo do ‘SOS Amazônia com data a confirmar”, adiantaram Sâmela e Sandyely. Quanto ao futuro no Amazonas, Sâmela estuda um ativismo político mais engajado. “Estou estudando a possibilidade de um engajamento partidário, mas, ainda não sei de fato como isso se dará”, hesitou.
Crédito: Ricardo Oliveira
Já Sandyely planeja cursar administração em nível superior. “Planejo fazer administração para ajudar a associação e quem mais da nossa gente precisar”, finalizou.
LUGAR DE FALA O sociólogo Luiz Antônio aprova e incentiva que cada vez mais surjam ‘Sâmelas e Sandyelys’. “Acho um barato essa molecada estar tomando a frente, enquanto muitos estão apenas olhando vídeos na internet”, criticou. Para o estudioso, no entanto, é preciso ter cuidado com o que hoje se convencionou a chamar de ‘lugar de fala’. “É preciso que os próprios sujeitos de uma realidade falem, como é o caso das jovens Sateré, mas é preciso falar com propriedade e expressar os anseios do seu povo, é preciso estar em sintonia com sua gente”, alertou. “Caso isso não ocorra, torna-se apenas algo midiático e até perigoso, como é o caso do atual presidente da Fundação Palmares que é negro, mas ataca e agride seu próprio povo”, lamentou.
Sateré Mawé
povo que habita o Estado do Amazonas, na região dos rios Maraú e Andirá. São conhecidos como os criadores da cultura do guaraná no Brasil e pela prática do Ritual da Tucandeira.
Dessana
povo habitante do Alto Rio Negro, no Amazonas, conhecidos como a “gente do universo” e pelo forte xamanismo.
Parentes
expressão de tratamento que significa ‘irmandade’ entre os povos indígenas do Brasil.
Cunhã-poranga
‘moça mais bonita da tribo’ ou ‘mulher bonita da aldeia’, em tupi.
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Crédito: Reprodução/Instagram
ENTRETENIMENTO & CULTURA
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ANAUS – A história do pequeno Mateus Nunes Marinho, 8 anos, morador da comunidade Boa Nova, em Óbidos, no Pará, viralizou nas redes sociais, após sua tia divulgar um vídeo onde ele recita poesias autorais e expressa a vontade de se tornar um poeta para poder mudar de vida e ajudar seus familiares. O vídeo foi compartilhado no dia 20 de julho por diversas celebridades, como a atriz Bruna Marquezine, a escritora e roteirista Glória Perez, a ex-ministra Marina Silva, além do poeta do programa da Rede Globo, Encontro, Bráulio Bessa. Mateus viu sua vida mudar por meio dos seus poemas. Atualmente, ele tem nove poemas autorais, o primeiro deles “O menino lá da roça” foi escrito com a ajuda da avó, Maria Madalena, de 65 anos, que é deficiente visual.
Menino de comunidade do Pará usa cotidiano difícil para escrever poesias na Amazônia
Luciana Bezerra – Da Revista Cenarium
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A poesia que ele escreveu para os profissionais da saúde, em agradecimento ao período da pandemia do novo coronavírus, rapidamente ficou famosa, assim como o menino. Após seu vídeo viralizar nas redes sociais, o pequeno poeta conseguiu arrecadar cerca de R$ 50 mil, em uma vaquinha virtual, dinheiro que chegou em boa hora para ajudar a família. No entanto, a vida do pequeno paraense de olhos esverdeados não foi tão fácil quanto parece. Apesar da pouca idade, Mateus teve de aprender desde cedo a dura lição da sobrevivência. Aos seis meses, foi abandonado pela mãe, que sofre de problemas mentais. Sem pai, ele morava com a avó e com uma irmã de 11 anos, que também tem problemas mentais, segundo relatou a ‘tia’ e responsável pela guarda do menino, Lúcia Nunes da Silveira, em entrevista à REVISTA CENARIUM. O gosto pela poesia começou após Mateus assistir à novela Bom Sucesso, onde o personagem Mário [interpretado pelo ator Lucio Mauro Filho] escrevia e recitava poemas para sua amada Nana [interpretada por Fabiula Nascimento]. Partindo desse
REVISTA CENARIUM
pressuposto, de acordo com Lúcia, Mateus pediu que ela mostrasse para ele outros poemas. “Não entendia nada de poema. Quando o Mateus me pediu ajuda. Lembrei que no WhatsApp recebia muitas mensagens. Quando abri o grupo da família, por acaso, tinha um vídeo do Bráulio Bessa, falando o poema ‘Recomeçar’. Até então só conhecia ele pelo programa da Fátima [apresentadora do Encontro com Fátima Bernardes], mas não sabia que ele era poeta e que aquilo era poesia. Quando o Mateus viu o vídeo, ele disse: ‘Tia, é isso que eu quero fazer’”, relembra Lúcia Silveira, com a voz embargada. Em sua conta no Instagram, Mateus relata em vídeo como decidiu ser poeta e sintetiza como estava sua vida naquele momento.
INFÂNCIA DESESTRUTURADA De família humilde, Mateus vive uma vida simples, na zona rural do município de Óbidos (a 781 quilômetros de Belém). Segundo Lúcia, o pequeno paraense vem de um histórico com diversos problemas familiares, incluindo abusos e maus-tratos. Em decorrência dessa vida e, sem amor ou carinho, Mateus estava se tornando uma criança agressiva tanto em casa, como na escola. No colégio, os responsáveis eram sempre advertidos pelas atitudes do menino com os colegas e até mesmo com a professora. Cansada de ver o sofrimento das crianças, de Mateus e de sua irmã, Lúcia, resolveu ligar para o Conselho Tutelar, da região, e pedir ajuda.
“O Mateus me procurou quando mais faltava amor na família dele. Eu entendi aquilo como um pedido de socorro. Por ser vizinha e amiga da família, acompanhava tudo que acontecia com eles. Até que um dia cansei de ver as crianças vivendo sem carinho, desestruturadas e sem cuidados. A avó é cega, frágil e não tem condições de cuidar dela, imagina de duas crianças.
Foi quando me senti na obrigação de pedir ajuda”, relembra Lúcia. “Hoje, eu me sinto mãe, avó, ou seja, tudo que ele nunca teve. Ele precisa de uma pessoa que dê amor, carinho, atenção, afeto que ele não recebeu da família biológica”, completa Lúcia. A professora de Mateus, Marinelma Marques, também acompanhou a vida desestabilizada que a criança vivia antes da poesia e dos cuidados da tia. Segundo Marinelma, tudo isso, afetava o desempenho do menino na escola, mesmo ele que sempre demonstrou inteligência acima da média dos colegas da classe. “O Mateus agora é uma benção”, diz a professora sorrindo. “Ele sempre foi uma criança muito inteligente e tem uma capacidade enorme de assimilação. Capta tudo muito rápido. Quando ele entrou na escola, ele era muito revoltado. Mas, com a ajuda de todos, ele foi melhorando. Hoje ele é a alegria da escola e da comunidade”, destaca a professora.
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VIAGEM & TURISMO
EM BUSCA DE TURISTAS Com medidas de distanciamento social, hotéis da Região Norte buscam reaquecer setor Thiago Fernando – Da Revista Cenarium
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Tivemos que abrir, mas as previsões não são boas. Estamos com uma média de dois hóspedes por dia, sendo que temos 41 quartos. Nosso restaurante está funcionando normalmente”
Rodrigo Dezan, gerente-geral do hotel Juma Ópera.
R$
15,1 bilhões
Em abril, a Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa) divulgou que o faturamento das empresas do setor aumentou 1,4% em 2019, e somou R$ 15,1 bilhões.
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ANAUS – Mesmo de maneira tímida, setores como o de hotelaria já sentem um aumento na procura para o segundo semestre de 2020. Visando diminuir os prejuízos acumulados desde o início do ano, empresários da Região Norte implementam medidas para vencer os fantasmas deixados pela Covid-19. De acordo com a empresária Eliana Barreto de Paula, proprietária da Pousada Sombra do Cajueiro, localizada em Alter do Chão, distrito de Santarém (PA), as pousadas e hotéis da região – conhecida como Caribe Amazônico – estão se readequando para atenderem as medidas de segurança implementada no último mês pelo Ministério do Turismo (MTur). Antes da pandemia, a economia brasileira projetava grandes expectativas para 2020. Entretanto, esses e muitos outros planos foram cancelados devido à pandemia da Covid-19. Agora, após a reabertura do comércio em grande parte dos Estados, os brasileiros buscam se adaptar ao ‘novo normal’, para retomar suas atividades. “A procura ainda é tímida. Recebemos ligações e e-mails de pessoas procurando informações sobra a pousada para setembro. Vamos fazer tudo para que as pessoas se sintam acolhidas e seguras nas dependências. Vamos colocar vários dispensers de álcool em gel pelo hotel. Além disso, vamos trocar as toalhas de rosto por toalhas descartáveis. O check-in e o pagamento serão on-line. Vamos respeitar o distanciamento nas áreas comuns. O café será servido individualmente. Não será mais estilo buffet”, informou a empresária.
ABATIDOS EM PLENA DECOLAGEM Localizado em uma das mais charmosas ruas de Manaus, a 10 de Julho, o Juma Ópera teve que fechar as portas temporariamente, menos de dois meses após sua inauguração, por causa da pandemia da Covid-19. Para o gerente-geral do hotel, Rodrigo Dezan, o time não poderia ter sido pior. “Fomos abatidos em plena decolagem. Inauguramos em fevereiro e tivemos que fechar tudo em março. Cancelamos as reservas e mandamos os funcionários para casa. Ficamos apenas com a segurança e a equipe de manutenção. Esperávamos um ano muito bom, mas 2020 já acabou”, afirmou o administrador. Após a reabertura do comércio, o hotel voltou a funcionar com força total. Medidas foram implementadas, tanto para garantir o conforto e segurança dos hóspedes como dos próprios funcionários do local. Apesar disso, Dezan informou que a previsão até o final do ano é de prejuízos e que as entradas dos próximos meses servirão apenas para amortizar os custos de funcionamento do Juma. “Tivemos que abrir, mas as previsões não são boas. Estamos com uma média de dois hóspedes por dia, sendo que temos 41 quartos. Nosso restaurante está funcionando normalmente. Apesar disso, sabemos que o nosso planejamento foi comprometido. O Amazonas recebe turistas estrangeiros e de negócios, e os dois estão parados. Não temos um cenário político bom no nosso País e isso também complica uma possível retomada”, analisou o gerente.
Créditos: Divulgação
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Por conta da pandemia, o hotel Juma Ópera, no centro de Manaus, teve que fechar apenas dois meses depois de inaugurar e agora voltou a funcionar
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VIAGEM & TURISMO Crédito: Divulgação
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Estamos funcionando apenas por reservas, justamente para controlar o número de pessoas. A procura está sendo grande. Percebemos que o nosso público é fiel”
Forylan Filho, sócio-proprietário da Pousada Cirandeira Bela.
Dezan ressaltou a imagem negativa do Estado durante a pandemia como principal adversário do setor nos próximos meses. “As imagens das covas abertas com máquinas durante a pandemia circularam o mundo. A instalação de caminhões frigoríficos nas portas dos hospitais para armazenarem os corpos também virou manchete em vários países. Esse marketing negativo reflete diretamente na economia do Amazonas. As pessoas estão com medo de visitar o Estado”, finalizou.
COMPARAÇÕES Em abril, a Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa) divulgou que o faturamento das empresas do setor aumentou 1,4% em 2019, e somou R$ 15,1 bilhões. Segundo Eliana, esse crescimento do setor foi bastante sentido pelos empresários de Alter do Chão, que tinham uma expectativa alta para 2020. “O ano de 2019 foi bem próspero. Nosso movimento crescente foi muito bom. Ficamos com a lotação completa do dia 1º de julho até o dia 31 de janeiro. Tivemos muitos incentivos culturais que impulsionaram os eventos musicais e gastronômicos. Alter do Chão já tinha se tornado um dos principais destino dos turistas bra66
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Trazendo para o Norte, a expectativa é bem pior. Apesar de alguns empresários relatarem uma tímida retomada, representantes da hotelaria dos Estados mais populosos da região afirmam que os prejuízos causados pela Covid-19 serão sentidos durante os próximos três anos.
A Pousada Cirandeira Bela, na estrada de Novo Airão, aposta no turista interno para tentar recuperar perdas
sileiros. Agora, não sabemos como será a alta temporada, que inicia em julho. Mas a procura está bem menor devido ao cenário em que vivemos”, disse a empresária, que acredita no aumento do turismo interno no Brasil nos próximos dois anos.
INVESTIMENTO NO TURISMO INTERNO Porta de entrada do Parque Nacional de Anavilhanas, o município de Novo Airão (a 115 quilômetros a noroeste de Manaus) foi abençoado por Deus com diversas belezas naturais como a Cachoeira do São Domingo e Grutas do Madadá. Além disso, passeios pelas ruínas do Velho Airão e nadar com botos cor-de-rosa são atrações indispensáveis para os turistas. É apostando no ecoturismo local que a Pousada Cirandeira Bela Amazon Cabins Spa vem reconquistando o público, em meio à pandemia do novo coronavírus. De acordo com o sócio-proprietário Froylan Filho, a procura tem sido grande, sendo que mais de 95% são turistas no Amazonas. “Estamos seguindo as recomendações da OMS (Organização Mundial de Saúde) e vamos fazer o possível para não aglo-
merar pessoas nos espaços sociais. Além disso, contratamos uma empresa especializada em limpeza de hospital e hotéis. Estamos funcionando apenas por reservas, justamente para controlar o número de pessoas. A procura está sendo grande. Percebemos que o nosso público é fiel. Os moradores da região estão explorando mais o Amazonas”, revelou Froylan. Segundo estudo divulgado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), no ano passado, o turismo brasileiro criou 35.692 novos postos de trabalho, uma alta de 1,2% em relação ao total de empregados do setor em 2018.
REPRESENTANTES DO SETOR ESPERAM LENTA RECUPERAÇÃO Em junho, a Rede Brasileira de Observatórios de Turismo (RBOT) em parceria com o Observatório de Turismo (Obstur/ PR) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) produziu um estudo após ouvir cerca de 5 mil empresários do setor sobre os impactos da Covid-19 no Brasil. De acordo com os dados coletados, os profissionais acreditam que a recuperação financeira só deve ocorrer em 2021.
De acordo com o gerente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado de Rondônia (Sindhotel/RO), Francisco Neto, o ano de 2020 já acabou para o setor e a pandemia afeta o planejamento do ano que vem, principalmente pela incerteza em torno de um real controle da doença no Brasil. “Tínhamos uma previsão muito boa para 2020, principalmente porque Porto Velho seria sede do Fórum Internacional Amazônia + 21, mas tudo foi cancelado em março. Todos os eventos foram cancelados no Estado. Assim, para a hotelaria, 2020 já morreu. Estamos há três meses fechados e não sabemos quando vamos conseguir reabrir”, salientou Neto. Segundo o representante da Sindhotel/ RO, as idas e vindas no processo de reabertura da economia no Estados da região, que intercala avanços e retrocessos, causam ainda mais incerteza no setor. “Nem no mercado interno está circulando dinheiro. Estávamos no segundo ciclo de reabertura do comércio na capital, mas voltamos para o primeiro após um novo pico de casos confirmados. No interior, estão na segunda fase. Assim, as pessoas não estão saindo de casa. As viagens estão limitadas. Não tem previsão nenhuma. Em Porto Velho, os hotéis estão com 30% da capacidade. Mas temos cidades vizinhas que estão quase zeradas. Todos estão no prejuízo”, completou. No segundo maior Estado do Norte, a hotelaria deve passar por uma reestruturação no pós-pandemia. O presidente do SindHotéis/AM), Paulo Rogério Tadros, afirmou que alguns empresários terão que fechar as portas no Amazonas. 67
ENTRE RIOS
Falta de ligação por rodovias impacta na recuperação do turismo para Amazonas, Roraima e Amapá Thiago Fernando – Da Revista Cenarium
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VIAGEM & TURISMO
Grande parte da região amazônica é interligada somente por avião com outras regiões do País
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ANAUS – Economistas e representantes do setor turístico da região amazônica avaliam a recuperação da atividade, estimando que Estados como Amazonas, Roraima e Amapá terão recuperações tardias, provocadas pela falta de ligações com rodovias interestaduais. O presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e similares do Estado do Amazonas (SindHotéis/AM), Paulo Rogério Tadros, afirma que o distanciamento geográfico da Região Norte influencia o ritmo da retomada econômica do turismo. “Estamos em uma região muito difícil e distante de tudo, os custos são altos para realizar transporte para cá. Necessitamos de avião para tudo e com a diminuição dos voos, não temos como trazer pessoas para a região. Além disso, a pandemia afetou economicamente o Brasil. As pessoas estão sem dinheiro, tentando pagar as contas atrasadas e refazer as poupanças. Assim, o turismo será um dos últimos setores a se recuperar, principalmente o da Amazônia”, explicou Tadros.
Crédito: Clóvis Miranda
Tadros defende que o turismo interno será a solução imediata para Estados que contam com municípios ricos, realidade diferente do Amazonas, Roraima e Amapá. “No Acre, Rondônia e Pará, a população viaja dentro do próprio Estado. Já no Amazonas, Roraima e Amapá, o setor do turismo não tem para onde correr. Eles não têm estradas e os interiores são pobres. Quem vai para a capital, vai para trabalhar ou comprar, mas não contam com um poder aquisitivo para o turismo”, citou o presidente.
VISIBILIDADE NEGATIVA Para Tadros, a gravidade da pandemia de Covid-19 em Estados como Pará e Amazonas, que registram números expres-
sivos de infectados e mortos pela doença deixou possíveis turistas alarmados em relação à região. Tadros ressalta que as imagens dos sepultamentos coletivos realizados em Manaus (AM) e em Belém (PA) repercutiram de forma negativa pelo mundo. “Tivemos uma visibilidade muito ruim durante a pandemia. As propagandas que fizeram foram absurdas, a imagem dos sepultamentos coletivos em várias covas rodou o mundo. Os turistas estão com medo de virem para a região”, criticou.
RETOMADA DA INDÚSTRIA AJUDARÁ O TURISMO Na visão do economista Inaldo Seixas, enquanto o Polo Industrial de Manaus (PIM) continuar em queda, o turismo do Amazonas também continuará em crise, pois, segundo ele, os dois mercados estão ligados diretamente com a vinda de turistas a negócios e lazer. “Os rumos da economia nacional não são bons e isso vale para os setores de serviços, principalmente o do Turismo. Podemos observar que a economia já vinha capenga antes mesmo da pandemia. Em Manaus, o PIM influencia diretamente no setor de serviço, porque movimenta a hotelaria, restaurantes e o turismo de selva. A pandemia pegou tudo isso e colocou no saco”, explicou Seixas. Para reforçar a análise, o economista relembra que, em 2019, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil foi menor que os registrados nos dois anos anteriores. “Estamos no ‘fundo do poço’ e as perspectivas da pós-pandemia não são boas no curto prazo. A situação para o turismo será muito difícil. Talvez não seja possível para algumas empresas, que vão ter que fechar as portas. Temos um quadro que já vinha capenga, que somou com as complicações da pandemia e as medidas insuficientes to69
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madas pelo governo federal. Acredito que vamos levar muito tempo para retornar”, afirmou.
MELHORIAS NO SEGUNDO SEMESTRE DE 2021
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Estamos em uma região muito difícil e distante de tudo, os custos são altos para realizar transporte para cá. Necessitamos de avião para tudo”
Paulo Rogério Tadros, presidente do SindHotéis/AM.
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Queda no faturamento de empresas de turismo variou entre 70% e 100% devido à suspensão das atividades no início da pandemia, segundo a RBOT.
De acordo com os dados levantados pelo Observatório de Turismo da Universidade do Estado do Amazonas (Observatur/UEA), durante pesquisa realizada com prestadores de serviços turísticos em abril, a recuperação do faturamento do setor só deve ocorrer a partir do segundo semestre de 2021. A coordenadora do Observatur, Selma Batista, diz que esse processo será gradual e dependerá da reabertura das fronteiras e da redução do número de casos confirmados da Covid-19 no Amazonas. “Teremos que fazer ‘a lição de casa’ para acelerar a retomada do setor pós-pandemia. Os empresariados e os prestadores de serviços turísticos precisam de ações que permitam a permanência no mercado, após meses sem faturamento. Além disso, precisamos implementar os protocolos de higiene e segurança para garantir a confiança do turista internacional ou doméstico. Particularmente, vejo o Amazonas como um destino competitivo pelo potencial de atrativos.”, informou. Segundo o levantamento da UEA, os segmentos que mais contribuirão para alavancar o turismo amazonense serão o Ecoturismo, o Turismo de Pesca, Cultural, de Aventura e o de Negócios e Eventos.
HOTELARIA NA BERLINDA De acordo com o estudo da Rede Brasileira de Observatórios de Turismo (RBOT), somente no mês de abril, a queda no faturamento dos empresários do setor variou entre 75% e 100% devido à suspensão das atividades. Os prejuízos se repetiram em maio e a pesquisa ainda revelou que pelo menos quatro em cada 10 empresas cadastradas na associação tiveram que demitir empregados para reduzir gastos. Questionado sobre os impactos na hotelaria do Amazonas, Paulo Rogério Tadros informou que a estrutura do setor vai sofrer uma forte redução pós-pandemia, principalmente com fechamento de hotéis.
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“Vamos regredir a estrutura de hotelaria no Estado. Não adianta pensar que vai ser como era antes da pandemia, até porque, não tem como sobreviver a seis meses sem movimento, apenas com despesas e sem esperança”, revelou.
DEMISSÕES NO PARÁ Para conhecer o real impacto causado pela pandemia de Covid-19 no turismo paraense, a Secretaria de Turismo do Pará (Setur) realizou uma pesquisa com empresas de 19 municípios paraenses. Dos entrevistados, 49% reconheceram que já desligaram ou vão ter que demitir por causa dos prejuízos. O estudo abrangeu empresas de turismo localizadas na capital Belém (33%), seguida pelos municípios de Marabá (17%), Bragança (11%), Salinópolis (9%) e Santarém (7%). Também foram ouvidos empreendedores de Soure, Alenquer, Ananindeua, Augusto Corrêa, Barcarena, Castanhal, Itupiranga, Juruti, Limoeiro do Ajuru, Medicilândia, Monte Alegre, Parauapebas e Tucuruí.
GOVERNOS LANÇAM PROTOCOLOS DE SEGURANÇA O Ministério do Turismo (MTur) lançou o ‘Selo Turismo Responsável’. O programa estabelece boas práticas para cada segmento. O selo é um incentivo para que os consumidores se sintam seguros ao viajar e frequentar locais que cumpram protocolos específicos para a prevenção da Covid-19. Já no Amazonas, em meados de junho, a Empresa Estadual de Turismo (Amazonastur) recebeu o Protocolo de Biossegurança dos Serviços Turísticos. O estudo reúne as principais orientações dos órgãos mundiais de saúde para as boas práticas sanitárias, que devem ser utilizadas no período pós-pandemia. A cartilha oferece aos operadores, durante a retomada gradual dos serviços, orientações sobre as condutas a serem implementadas, nos empreendimentos, para que ofereçam aos turistas, consumidores e profissionais do setor a segurança necessária à prevenção da Covid-19, transformando o maior Estado do País em um destino seguro para a atividade turística.