Material Digital do Professor Adriano Messias
Sumário
Carta ao Professor...................................................... 3 Propostas de Atividades 1...........................................10 Pré-leitura...............................................................................................................10 Leitura....................................................................................................................10 Pós-leitura...............................................................................................................10 Atividade 1: I-Juca-Pirama – os timbiras de Gonçalves Dias e os de hoje........11 Atividade 2: Outro? Para quem? Depende do ponto de vista...........................12 Atividade 3: O dinamismo histórico e social da língua: antropofagias.............14 Atividade 4: O livro, o leitor, a leitura.............................................................15 Atividade 5: Reportagem científica.................................................................17 Atividade 6: Literatura e visões de mundo......................................................18
Propostas de Atividades II..........................................19 Atividade 1: O perspectivismo ameríndio.......................................................19 Atividade 2: Filmes para se pensar a violência contra os indígenas...................20
Aprofundamento........................................................22 Sugestões de Referências Complementares................ 26 Bibliografia Comentada............................................ 28
Carta ao Professor Caro professor,
O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica é uma obra voltada para os anos do Ensino Médio e contempla temas como, 2.6.7.1 Projetos de vida, 2.6.7.2 Inquietações da juventude, 2.6.7.7 Protagonismo juvenil, e 2.6.7.9 Diálogos com a sociologia e com a antropologia, todos eles caros à Base Nacional Comum Curricular, a BNCC. Neste material digital, você encontrará subsídios para desenvolver várias atividades em sala de aula, bem como para se aprofundar sobre alguns tópicos derivados das propostas de trabalho. E não deixe de aproveitar as sugestões de referências complementares. Nesta carta de abertura, estão também as palavras do autor e do ilustrador a respeito de si mesmos e de seus trabalhos profissionais e do livro O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica.
O Autor Aos doze anos, escrevi meus primeiros contos com a intenção de ser escritor. O curioso é que, com aquela idade, eu já queria escrever para crianças e adolescentes. Amava os romances e os contos, as histórias de mistério, mas, também, as crônicas de humor. E, aos quatorze anos, atrevi-me a ler um senhor que passou a ter lugar de destaque em minha vida: Sigmund Freud. Hoje, vivo rodeado por livros: os que li, os que estou lendo, os que releio e os que quero ler. Aprendi que, quanto mais livros de boa qualidade você tem ao redor de si, mais segura é sua vida emocional e mais conteúdos você dispõe para compartilhar com os outros. A leitura nos proporciona prazer, mas também senso crítico e capacidade de reflexão. Em especial, reflexão política, pois somos uma espécie gregária, que se movimenta por redes e abomina a solidão.
© Adriano Messias – arquivo pessoal
A leitura nos assegura um lugar como sujeitos no mundo. Nos ensina a pensar por nós mesmos. Fosse o brasileiro um leitor com melhor formação, certamente estaríamos hoje em um país com mais capacidade de estabelecer diálogos, apesar das diferenças. Neste sentido, ler nos liberta, por um lado, e, por outro, nos torna absolutamente responsáveis pela construção do mundo que nos cerca. Paralelamente à ficção, atuo como pesquisador nas áreas de semiótica, psicanálise e comunicação. Podemos dizer que somos feitos, em grande medida, por aquilo que lemos. As histórias são um material palpável e extremamente plástico. Por elas – especialmente por elas –, nos constituímos como Homo sapiens, essa espécie capaz de representar o que não se faz presente, de pressupor, de prever, de inventar. Em suma: somos seres de falta, conscientes da finitude e, por isso também, linguageiros. O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica – Material Digital do Professor
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O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica é uma obra histórica e de aventuras que escrevi pensando no leitor jovem. Sua história foi se construindo pouco a pouco e, quando me dei conta, ela saltava da página como um peixe no mar. O enredo traz o sabor do início da adolescência, quando eu então me perdia em livros de aventura.
O mar é tão plástico a três mil quilômetros de qualquer rocha!
Ao terminar de escrever o livro, lembrei-me que, durante meus estudos de doutorado em Paris, eu tinha visitado Provins, a terra de Villegagnon, ainda sem saber que ela faria parte de um de meus romances. Medieval e amuralhada, por aquela cidade francesa incensa o perfume da cidra e dos doces de rosas.
Passei pelo estreito de Gibraltar e subi em seu rochedo, povoado por macacos, em verde mata e feérica bruma. Também cruzei as colunas de Hércules de norte a sul, rumando ao profundo Marrocos, por onde viajei até dunas nas quais tempestades de areia nos arrebatam em vermelho morno.
E, como meu personagem Jean, atravessei o Atlântico de um lado a outro, ida e volta, percorrendo o mesmo caminho e tendo as mesmas paragens dos navegadores do século XVI: Rio de Janeiro, Cabo Frio, Salvador; depois, acenos ao arquipélago de Fernando de Noronha antes de ganhar, por vários dias, o marasmo assombroso do oceano na altura do Equador – linha reta, silenciosa e profunda. O Atlântico, em seu coração de abismo, carrega o mistério de cinco mil metros de profundidade. Ao entardecer, na superfície esverdeada como o azeite, nenhum sopro, nenhum peixe. Quase se pode caminhar sobre aquelas águas.
Senti depois as aragens de Cabo Verde, até avistar, dias mais tarde, a suntuosidade do vulcão Teide. Subi até seu sopé no interior da ilha de Tenerife, formosas Canárias! Os alísios são uma bênção. Nunca pensei que o vento trouxesse alegrias tão doces.
Aportei em Barcelona, cidade de minh’alma – porto magnífico da novela humana. Menino perplexo do Sul das Gerais, que viveu entre mares de montanhas verdes e azuladas, não imaginei ir tão longe, meu horizonte! Deixo para você, leitor, as confidências deste escritor que sabe que um poeta só se torna arauto da própria aldeia quando ganha o mundo.
* Nota No romance O grumete e o tupinambá, os nomes de tribos e etnias indígenas foram aportuguesados, como se faz em literatura. Ou seja, eles aparecem escritos em iniciais minúsculas e adotando-se o plural sempre que necessário. Porém, em trabalhos científicos, acadêmicos e didáticos, em geral, se usa a grafia das iniciais em maiúscula e sempre no singular. Portanto, esta é a opção gráfica para este material. O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica – Material Digital do Professor
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O Ilustrador Carlos Caminha nasceu em Caxambu, sul de Minas Gerais, e desde criança gosta de desenhar. Passou pela Escola de Belas-Artes da UFMG, na década de 1980, e pela Escola Guignard, já nos anos 2000. Trabalha no mercado editorial há dezessete anos, fazendo ilustrações para os mais diversos projetos, desde livros infantis e de poesia, a obras didáticas. Seu estilo vai de traços livres ao realismo, e varia enormemente as técnicas. Desenvolve ainda um trabalho em artes plásticas que tem, como principal característica, a forte expressividade no uso de tintas, principalmente aquarela, acrílico, nanquim e grafite. Suas influências vão desde artistas do Renascimento até os modernistas. Aprecia os desenhos e as pinturas de Egon Schiele, as © Carlos Caminha – arquivo pessoal “pinturas” de Anselm Kiefer, e as obras contemporâneas de Jenny Saville. Em ilustração, possui grande influência das histórias em quadrinhos, uma paixão desde sua infância e que se desenvolveu graças aos quadrinistas das décadas de 1970 e 1980. Em se tratando de ilustrações para livros, a comunicação tem de despertar o interesse e ampliar as perspectivas do leitor. Em alguns de seus recentes trabalhos, Caminha usou aquarelas livres e bem manchadas com colagens de recortes de revistas, pedaços de renda e jornais rasgados.
A Obra
Estilo
O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica é uma obra de ficção histórica e juvenil de 144 páginas, dividida em duas partes. O livro possui ainda uma apresentação (Escritor navegante), na qual Adriano Messias explica o processo de escrita do romance, além de uma nota explicativa à guisa de epígrafe sobre a palavra “grumete”, uma seção para breve contextualização sobre as figuras históricas mencionadas, e notas explicativas sobre determinadas opções terminológicas e a respeito do ponto de vista do narrador. Após o título de cada parte, há uma epígrafe literária.
Pode-se entender por estilo a maneira específica de um autor escrever, a forma como ele se apropria da linguagem para organizá-la. Estilo tem a ver com forma.
No aspecto gráfico, O grumete e o tupinambá conta com ilustrações e vinhetas coloridas de Carlos Caminha, proposta que oferece uma bela configuração realista que acrescenta ainda mais aos sabores de aventura do livro.
O estilo em O grumete e o tupinambá é dinâmico, envolvendo o leitor na trama a cada capítulo. Existe uma preocupação em se retratar a realidade histórica, mas sem que esta se torne mais forte do que o desenrolar das ações. A linguagem é acessível ao adolescente do Ensino Médio, que também poderá enriquecer seu vocabulário com criações e recursos linguísticos que homenageiam a época privilegiada pelo romance. Além disso, o livro se abre a várias relações dialógicas e intertextuais com obras clássicas de nossa literatura.
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O romance como gênero narrativo O gênero literário narrativo de O grumete e o tupinambá é o romance. Esta obra possui tanto características de romance histórico quanto de romance de aventuras. Ao mesmo tempo, o caráter intimista das reflexões do narrador, que propõe uma leitura em flashback, confere à obra o aspecto de romance psicológico. Por oferecer um arco da vida do protagonista narrador, também se pode detectar algo de romance de formação presente na obra de Adriano Messias. Dessa forma, percebe-se como as classificações em literatura são porosas e intercambiáveis. O romance histórico busca tratar de fatos, eventos e situações que aconteceram e que fazem parte da chamada realidade e de seus registros. Mesmo que haja personagens fictícios, os romances deste subgênero tentam seguir uma coesão histórica que esteja conforme pesquisas, investigações e dados, por exemplo. É nesse contexto que O grumete e o tupinambá se enquadra de forma mais precisa.
de Galvez, imperador do Acre (1976), de Márcio Souza; A prole do corvo (1978), de Luiz Antonio de Assis Brasil; Mad Maria (1980), de Marcio Souza; A estranha nação de Rafael Mendes (1983), de Moacyr Scliar; Viva o povo brasileiro (1984), de João Ubaldo Ribeiro; Os varões assinalados (1985), de Tabajara Ruas; A cidade dos padres (1986), de Deonísio da Silva; Boca do Inferno (1989), de Ana Miranda; Agosto (1990), de Rubem Fonseca; Ana em Veneza (1994), de João Silvério Trevisan; e Terra Papagalli (1997), de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta. No século atual, podemos destacar A máquina de madeira (2012), de Miguel Sanches Neto; O bibliotecário do Imperador (2013), de Marco Lucchesi; Em breve tudo será mistério e cinza (2013), de Alberto A. Reis; e Quatro soldados (2017), de Samir Machado de Machado.
Informação histórica, evocação do passado e cor local costumam ser características notadas em um romance histórico. De forma consensual, a obra que demarca o aparecimento do romance histórico é Ivanhoé (1820), do escocês Walter Scott, que trata das pelejas medievais entre os normandos e os saxões. Em nosso país, considera-se José de Alencar um dos fundadores do romance histórico com suas obras de ambientação colonial (As minas de Prata e A guerra dos mascates), e também de cunho indianista e regionalista.
De forma geral, o romance histórico está, assim como todo o gênero do romance, em constante reinvenção, e pode oferecer tanto continuidades quanto rupturas com as vertentes clássicas do subgênero, sobretudo a partir dos anos de 1990, quando o revisionismo histórico incentivou novas leituras sobre o passado do Brasil. Talvez seja esse um dos diferenciais de um romance histórico contemporâneo para com um romance histórico tradicional, além da relativização da versão oficial – categoria questionável e dúbia. Afinal, desde os “mestres da suspeita” – Friedrich Nietzsche, Karl Marx e Sigmund Freud –, jamais vimos o mundo da mesma forma.
No século XX, destacam-se, por exemplo, a trilogia O tempo e o vento, de Érico Veríssimo, e os três volumes de Os subterrâneos da liberdade (1954), de Jorge Amado. A partir da década de 1970, nossa literatura presenciou uma onda de romances históricos, a exemplo
Além disso, tem-se de considerar que um romance histórico, ainda que atrelado a fatos históricos, é sempre produto da ficção artística e jamais deve ser considerado um documento ou testemunho da história. Um romance histórico é, antes de tudo, literatura.
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O romance de aventuras como subgênero literário O romance de aventuras é um subgênero sempre apreciado por jovens, seus leitores implícitos principais. Na estrutura, costuma haver um herói colocado em espaços e ambientes muitas vezes hostis para que possa dominar a si mesmo e desenvolver seu arco de maturidade. Ao longo do século XIX, em especial, autores europeus valorizaram esse tipo de criação literária, transportando seus personagens a “lugares exóticos”. Com isso, também se tentava vincular o interesse dos leitores à abrangência territorial dos impérios e domínios ultramarinos das nações da Europa. Entretanto, a distância geográfica do escritor para com o local retratado também facilitou exageros e incongruências em muitos relatos. No final das histórias de aventura, o herói costuma ser recompensado com crescimento emocional, espiritual e, às vezes, até mesmo material. Vê-se, em tal esquema, muito da tradição das narrativas mitológicas (como a epopeia) e das novelas de cavalaria da Idade Média, quando o herói se torna metáfora das descobertas pessoais e existenciais do indivíduo.
Construção do narrador Na obra O grumete e o tupinambá, o narrador empregado é em primeira pessoa, como se pode verificar no excerto a seguir: “O que eu fazia durante aqueles meses todos em alto-mar era cuidar atenciosamente das madeiras do convés que, com a secura e o calor, ameaçavam sofrer rachaduras” (p. 21). Jean, o narrador, propicia um contraste do leitor contemporâneo para com a vida dos indígenas do século XVI. Ao mesmo tempo, pelos olhos do francês se conhece o enredo
e se apreende a visão de estrangeiro a respeito daquele mundo novo. Em outro prisma, este mesmo olhar serve, ao leitor implícito, como ponto de partida para que se realizem reflexões pessoais sobre a narrativa, relativizando-se qualquer discurso de “verdade” que, em um primeiro momento, possa emoldurar o relato de um narrador.
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Construção dos personagens A obra O grumete e o tupinambá coloca personagens fictícios ao lado de figuras históricas, como o vice-almirante Villegagnon. Jean-François Delamare, o grumete; Îagûanharõ, o índio tupinambá amigo de Jean; Paskou, o cozinheiro; Grégoire, o compenetrado cronista e copista; Michel Le Gros, espécie de líder da tripulação; Gonzagues, o timoneiro; Jean-Cent-Hommes, bravo marujo com uma misteriosa tatuagem; Le Bon, um franzino artista beberrão; Ron, o marinheiro que foi picado por uma cobra; e María Del Mar, a louca catalã; são os principais personagens do livro. Jean tem dezesseis anos quando as embarcações de Villegagnon aportam no litoral carioca. Ele é descrito como um francês de sardas no rosto, órfão criado por monges que desenvolverá um arco de maturidade a partir
das aventuras proporcionadas pelo encontro entre dois mundos: o europeu e o americano. Jean recebe sempre alguma proteção paterna, seja de Villegagnon, de Cent-Hommes ou de Le Bon, e convive na fratria de seus camaradas mais velhos. Já Îagûanharõ é o adolescente tupinambá que, em boa parte do livro, intrigará Jean. Ambos não se comunicarão muito bem em termos idiomáticos, mas demonstrarão afeições e afinidades que vencerão algumas das estruturas culturais que permeiam o mundo de cada qual. A tripulação que desembarcou na Guanabara era formada por marujos normandos e bretões, em sua maioria. Alguns haviam sido bandidos ou eram reincidentes que mereceram o perdão em troca de participar das perigosas explorações no Novo Mundo.
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Jean-Cent-Hommes, como o apelido dizia, valia por cem: era um homenzarrão silencioso, portador de um machado e com cicatrizes pelo corpo. Le Bon, “bretão magricela e ruivo com cavanhaque e suíças bem desenhados” e “de índole um tanto acovardada”, era um artista mulherengo afeito a beberagens que, após ser condenado na França, acabou tendo de seguir viagem com Villegagnon para não perecer nas prisões de seu país. Grégoire era o escriba que relatava o que ia encontrando pelo caminho, enquanto Le Gros, com espírito de liderança, sempre colocava ordem no grupo. Já Gonzagues, o crédulo timoneiro, e Paskou, o cozinheiro, contavam histórias de arrepiar.
Dentre as personagens femininas, destaca-se María Del Mar e sua loucura progressiva. A ressentida catalã com corpo de matrona, sempre magoada com as demais mulheres que vieram da França para o Brasil, era apaixonada por Le Bon, que preferiu o amor de uma índia. Um ponto a se destacar é que os personagens da obra demonstram que o encontro entre tupinambás e franceses já se fazia há algum tempo, antes mesmo da chegada de Villegagnon: uns e outros conheciam costumes e hábitos mutuamente. Os indígenas, por exemplo, usavam ferramentas e armas de metal que lhes foram presenteadas pelos europeus, assim como os estrangeiros aprendiam as artes da caça e da pesca nativa.
Ambientação e tempo da narrativa Os personagens de O grumete e o tupinambá recebem um forte impacto da ambientação, como se esta lhes influísse diretamente. A viagem marítima e a instalação da colônia na ilha próxima ao litoral em que desaguava o rio de Janeiro, bem como a Mata Atlântica – densa e cheia de vida, em meio à qual se erguiam aldeias em enormes clareiras –, compõem a ambientação tropical e exuberante do livro. Marcos geográficos que hoje são recortes na paisagem urbana carioca emergem na narrativa com o frescor dos primeiros tempos em
que os europeus aportaram naquelas terras. Essa paleta de tons e texturas participa ativamente na composição da cor local, a qual ajuda a dar o tom aventureiro ao romance histórico. Em termos de época, a história se passa durante o período em que a França tentou fundar uma colônia na baía de Guanabara. No próprio livro, precedendo os capítulos iniciais, há informações que auxiliam na contextualização sobre a ambientação e o tempo.
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Propostas de Atividades 1
Linguagens e suas tecnologias: Língua Portuguesa
Pré-leitura Professor, a pré-leitura é o momento em que você apresentará a obra aos alunos. Você pode realizar, nesse momento, um bate-papo em que ressalte aspectos históricos da França Antártica. Pode ainda falar de Villegagnon, dos tupinambás e de seu chefe Cunhambebe, e até mesmo do conhecido episódio da prisão de Hans Staden pelos indígenas no litoral brasileiro. Todos esses são tópicos que dialogarão com o conteúdo do romance de Adriano Messias. Você pode ainda exibir, para sua turma, algum trecho de um dos filmes que constam na seção “Sugestões de referências complementares”, página 26. Também não deixe de aproveitar as dicas bibliográficas que estão no final do material, assim como os textos da seção “Aprofundamento”, página 22. Tudo isso serve como ponto de apoio para você desenvolver boas ideias que estimulem os estudantes à leitura do livro. Algumas das atividades propostas neste material podem até mesmo ser adaptadas por você para etapas de pré-leitura.
Leitura Por se tratar de um romance, combine com os seus alunos um prazo específico para que eles possam ler O grumete e o tupinambá (uma a duas semanas, por exemplo). Neste momento, enumere no quadro alguns aspectos que os estudantes podem observar na narrativa à medida que forem avançando na leitura: a) tempo e espaço; b) tipo de narrador; c) eixo temático principal; d) aspectos históricos abrangidos pela obra.
Peça também para que eles estabeleçam relações do livro com outras obras que retratam o Brasil no século XVI.
Pós-leitura Professor, no Ensino Médio, todo momento de pós-leitura de um livro deve se voltar ao exercício da capacidade crítica, expressiva e avaliativa dos alunos. Como jovens, eles podem ser opinativos e ter suas preferências de uma maneira muito clara, mas nem sempre conseguem expressá-las a contento. Portanto, a melhor maneira de realizar esse encontro é solicitando que todos façam comentários de maneira espontânea, porém, com um mínimo de direção de sua parte, como orientador. Pense em estabelecer previamente alguns critérios que os estudantes devem analisar ao lerem a obra, mas, ao mesmo tempo, fuja de algo muito didático, como fichamentos e resumos. A leitura literária deve ser um momento de fruição e, se os adolescentes forem fazê-la pensando em uma prova ou exame, não será tão prazerosa. No dia em que promover um primeiro debate sobre o livro, explique que não basta dizerem se gostaram ou não. Os comentários têm de ir além do gosto pessoal: devem refletir algo da própria personalidade de quem leu a obra. As atividades a seguir consideram que os alunos já tenham lido a obra. São, portanto, atividades complementares que vão funcionar a partir da leitura realizada. Apesar de algumas propostas serem sugeridas tanto para leitura quanto para pós-leitura, sinta-se livre para fazer as adaptações que julgar convenientes.
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Atividade 1: I-Juca-Pirama – os timbiras de Gonçalves Dias e os de hoje Professor, esta atividade é sugerida para pré-leitura. Entretanto, você pode adaptá-la para uma atividade de leitura ou de pós-leitura. Um trecho do poema I-Juca-Pirama, de Gonçalves Dias – escritor filho de uma guajajara com um português – antecede a primeira parte do livro O grumete e o tupinambá. Apesar de formalmente assumirem a função de epígrafe, os versos escolhidos vão além, contextualizando previamente o leitor sobre o tipo de encontros que o livro propõe. Leia com seus alunos o excerto em questão, que se encontra na página 21 da obra de Adriano Messias. Pergunte a eles se já haviam lido aquele trecho. Depois, informe que se trata de uma das incursões de Gonçalves Dias, poeta da primeira fase do Romantismo brasileiro, no campo do indianismo.
COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 1
Compreender o funcionamento das diferentes linguagens e práticas (artísticas, corporais e verbais) e mobilizar esses conhecimentos na recepção e produção de discursos nos diferentes campos de atuação social e nas diversas mídias, para ampliar as formas de participação social, o entendimento e as possibilidades de explicação e interpretação crítica da realidade e para continuar aprendendo. HABILIDADE
(EM13LGG103) Analisar o funcionamento das linguagens, para interpretar e produzir criticamente discursos em textos de diversas semioses (visuais, verbais, sonoras, gestuais).
Professor, para saber um pouco mais a respeito do assunto, leia na página 22, em “Aprofundamento”, o texto “Gonçalves Dias e o indianismo”. Em um segundo momento, os estudantes irão escutar uma leitura do poema. A campanha Pequenas leituras, promovida pela Academia Brasileira de Letras, a ABL, oferece a declamação de parte de I-Juca-Pirama pela atriz Dira Paes, e está disponível no link: https://www.youtube.com/watch?v=ikQjXEZEW0 A seguir, ofereça à turma o texto informativo “Timbira”, disponível no link: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Timbira. Ele compõe uma enciclopédia virtual sobre as etnias indígenas em nosso país. Neste site dos Povos Indígenas do Brasil, o PIB, você ainda vai encontrar muitos outros textos bastante elucidativos. Após as três etapas anteriores terem sido realizadas, peça aos alunos que façam compara-
ções e atualizações sobre como os indígenas são descritos no texto literário e no informativo. O objetivo aqui é também mostrar que textos são como janelas para se ver e entender o outro.
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Um quarto momento será o da leitura em voz alta, realizada por algum aluno, dos seguintes textos introdutórios do livro O grumete e o tupinambá: “Escritor navegante” (páginas 8 e 9), a nota sobre a palavra “grumete” (página 7), a relação das figuras históricas presentes na obra (páginas 10 e 11) e as “Notas explicativas” (página 13). Ao finalizar esse breve conjunto de leituras, pergunte aos estudantes que impressões prévias eles conseguem ter sobre O grumete e o tupinambá. Trata-se de uma atividade de pré-leitura, mas é possível que eles comentem, por exemplo, sobre o texto da quarta capa ou
sobre as ilustrações, já que sempre se dá uma folheada em uma obra antes de ela ser lida. Também os estimule a tecer relações entre a epígrafe de I-Juca-Pirama e o provável panorama geral que já pode ser apreendido do livro de Adriano Messias. Professor, para esta mesma atividade, você também pode ler outro texto que está disponível na seção “Aprofundamento”, página 23, intitulado “Breves comentários sobre representações dos índios na literatura brasileira”. E, se quiser, também o use como um enriquecimento para a turma.
Atividade 2: Outro? Para quem? Depende do ponto de vista Professor, esta atividade é sugerida como atividade de leitura ou de pós-leitura, mas você pode também adaptá-la para pré-leitura. Ela também é sugerida como atividade externa, motivando os alunos a irem ao encontro da comunidade. Para aprimorar essa discussão com sua turma, você pode fazer a leitura prévia do texto “Alteridade”, que consta na página 24 da seção “Aprofundamento”. Você vai precisar das imagens a seguir, as quais pode obter pesquisando na internet por nome do artista e obra: • A primeira missa (1858-1860) Victor Meirelles • Desembarque de Cabral em Porto Seguro em 1500 (1922) Oscar Pereira da Silva • Fundação de São Vicente (1899) Benedito Calixto
COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 2
Compreender os processos identitários, conflitos e relações de poder que permeiam as práticas sociais de linguagem, respeitando as diversidades e a pluralidade de ideias e posições e atuar socialmente com base em princípios e valores assentados na democracia, na igualdade e nos Direitos Humanos, exercitando a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, e combatendo preconceitos de qualquer natureza. HABILIDADE
(EM13LGG203) Analisar os diálogos e os processos de disputa por legitimidade nas práticas de linguagem e suas produções (artísticas, corporais e verbais).
• Caça ao tigre (1835) Rugendas • Cena de canibalismo ou Canibais (1592) Théodore de Bry • Aldeia de caboclos no Cantagalo (séc. XIX) Debret
Peça aos alunos para apreciarem as representações dos indígenas nas obras (você pode empregar outras pinturas, se quiser).
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Após escutar os comentários, explique a eles que uma das estratégias de se dominar os povos ameríndios – o “outro” para os europeus – foi retratá-los, por um lado, como seres inferiores (a exemplo das gravuras de antropofagia dos tupinambás de Théodore de Bry). Outras perspectivas empregavam um olhar mais positivo, o que se dava por um viés mitológico e idílico. Após finalizadas as considerações, escreva no quadro algumas questões para o registro das apreciações sobre as imagens históricas. Peça que cada aluno as responda individualmente e por escrito. Elas também servem de orientação para que você conclua a atividade: a. Como o outro/ a alteridade (o indígena) está representado(a) em cada imagem? Destaque representações que poderiam ser associadas a caricaturas do “bom selvagem” e do “mau selvagem”. b. Quais das obras apresentadas poderiam ser exemplos do chamado indianismo patriótico ou nativista (aquele que exaltava o indígena como figura mítica para a constru-
ção de uma certa identidade brasileira)? c. Se o artista da obra fosse um indígena retratando a presença do invasor, que elementos você imagina que estariam presentes na imagem produzida? Quais seriam as possíveis diferenças de perspectiva? d. Como as visões de mundo e o contexto social e histórico do pintor se refletem em cada obra? e. De que maneira imagens como essas orientaram determinadas visões sobre os índios que até hoje permanecem entre nós? f. Essas representações pictóricas vão ao encontro de sua imagem pessoal sobre os indígenas? Você tem uma visão diferente da dos pintores? Explique-a. A atividade será encerrada com uma exposição, na comunidade, de reproduções de imagens históricas contendo as análises realizadas pelos alunos. Ela pode ser realizada em local público: centro social ou cultural, salão de eventos, praça, etc.
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Atividade 3: O dinamismo histórico e social da língua: antropofagias Professor, esta atividade é sugerida como atividade de leitura ou de pós-leitura. O livro O grumete e o tupinambá permite várias intertextualidades e interdiscursividades com a literatura brasileira. Além da primeira estrofe de I-Juca-Pirama, de Gonçalves Dias, você encontra uma segunda epígrafe na página 75, na forma de breve citação do artigo de Oswald de Andrade, quando este foi publicado no primeiro número da Revista de Antropofagia, em 1928. Também existem outras alusões a textos literários, como no primeiro parágrafo do primeiro capítulo do livro: “Estávamos em pleno mar”, que repete o mote dos primeiros versos das quatro primeiras estrofes do poema O navio negreiro: Tragédia no mar, de Castro Alves: “‘Stamos em pleno mar… Doudo no espaço”; “Stamos em pleno mar… Do firmamento”, “Stamos em pleno mar… Dois infinitos” e “Stamos em pleno mar… Abrindo as velas” (cf. ALVES, 1971, p. 189).
COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 4
Compreender as línguas como fenômeno (geo)político, histórico, social, variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso, reconhecendo suas variedades e vivenciando-as como formas de expressões identitárias, pessoais e coletivas, bem como agindo no enfrentamento de preconceitos de qualquer natureza. HABILIDADE
(EM13LGG401) Analisar criticamente textos de modo a compreender e a caracterizar as línguas como fenômeno (geo)político, histórico, social, cultural, variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso.
Primeiramente, pergunte aos alunos quais intertextualidades implícitas e explícitas eles podem detectar em O grumete e o tupinambá. É possível que eles lhe tragam até mesmo outras referências. Em seguida, ofereça a eles trechos dos três textos mencionados e peça para que analisem, por escrito, a pertinência de cada um deles no enredo de O grumete e o tupinambá. Oriente-os a salientarem a presença dos excertos como parte do instrumental dinâmico de reflexões e alterações históricas e sociais que é um idioma. Como sugestão, deixamos estas perguntas: a. Qual a relação da primeira epígrafe (primeira estrofe do poema I-Juca-Pirama) com a primeira parte do livro de Adriano Messias? b. Qual a relação da segunda epígrafe (a citação do Manifesto Antropófago ou Manifesto Antropofágico) com a segunda parte do livro de Adriano Messias? c. A qual tipo de antropofagia o poema I-Juca-Pirama se refere?
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d. A qual tipo de antropofagia o texto de Oswald de Andrade se refere? e. Como cada um dos tipos de antropofagia (a da ritualística tupinambá e a da cultura brasileira) está manifesto e exemplificado no livro de Adriano Messias? f. Que tipo de intertextualidade há entre a primeira linha do primeiro capítulo de O grumete e o tupinambá, “Estávamos em pleno mar”, para com os versos-mote das quatro primeiras estrofes do poema O navio negreiro: Tragédia no mar, de Castro Alves? g. De que maneira as obras literárias contemporâneas se tornam influenciadas pelas do passado, ou homenageiam obras de outras épocas? Dê exemplos de outros livros que você tenha lido e que tenha proporcionado este mesmo tipo de reflexão.
Ouça as respostas dadas por seus alunos e encerre a atividade fazendo um resumo no quadro do que os alunos escreveram individualmente.
Língua Portuguesa: Todos os campos de atuação social Atividade 4: O livro, o leitor, a leitura Professor, esta atividade é sugerida como atividade de leitura ou de pós-leitura. Professor, este é um exercício de caracterização e análise do livro O grumete e o tupinambá, e seu objetivo é revelar o entendimento da obra pelo leitor. Para isso, peça aos alunos que explorem o livro em sentido amplo. Eles deverão, em pequenos grupos, responder o questionário a seguir: a. Como se dá a produção de um livro? Quais são as etapas pelas quais um livro passa desde o original até sua comercialização?
PRÁTICAS
Leitura, escuta, produção de textos (orais, escritos, multissemióticos) e análise linguística/semiótica. HABILIDADE
(EM13LP01) Relacionar o texto, tanto na produção como na leitura/escuta, com suas condições de produção e seu contexto sócio-histórico de circulação (leitor/ audiência previstos, objetivos, pontos de vista e perspectivas, papel social do autor, época, gênero do discurso etc.), de forma a ampliar as possibilidades de construção de sentidos e de análise crítica e produzir textos adequados a diferentes situações.
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b. Como eram os livros voltados para jovens há cem anos? E há cinquenta anos? E há dez anos? O que será que mudou em termos de formatos e conteúdos? c. Já houve censura em obras literárias brasileiras ou estrangeiras em nosso país? Quando? Por quê? Dê alguns exemplos. d. Você acha que o brasileiro é um bom leitor? O que mais se lê em nosso país? e. A obra de Adriano Messias está voltada a um público específico? Ou vários públicos podem lê-la? Fale um pouco sobre o(s) tipo(s) de leitor(es) previsto(s) por uma obra. f. A qual época o livro O grumete e o tupinambá pertence? g. Qual o gênero do livro? E o(s) subgênero(s)? h. Quais são os principais pontos de vista do livro no que diz respeito à relação entre os colonizadores franceses e os indígenas tupinambás? Como suas interações se deram no enredo? Como as questões ligadas à alteridade foram construídas pelo autor e como elas se resolvem? Existem conflitos culturais? Como eles se manifestam? Quais seriam os principais “encontros” e “desencontros” de alteridades presentes na obra? i. Quais reflexões o livro de Adriano Messias lhe permitiu sobre a época da presença francesa no litoral fluminense? Para que os alunos respondam as questões a) e b), eles podem fazer pesquisas na internet em busca de mais conhecimentos.
5ª edição da pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil”, disponibilizado no site a seguir: https://www.prolivro.org.br/5a-edicao-deretratos-da-leitura-no-brasil-2/a-pesquisa5a-edicao/. Basta que eles preencham uma ficha com nome e e-mail para terem acesso ao download de todos os resultados. Esta pesquisa oferece um panorama do que e do quanto o brasileiro tem lido.
Uma excelente fonte para os alunos, sobretudo para a questão d), é o contato com a O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica – Material Digital do Professor
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Língua Portuguesa: Campo das práticas de estudo e pesquisa Atividade 5: Reportagem científica Professor, esta atividade é sugerida como atividade de leitura ou de pós-leitura. Nesta proposta, seus alunos irão produzir um breve texto científico que pode ter viés ensaístico. Ele pode ser realizado em duplas ou individualmente, mas evite grupos grandes. O objetivo é despertar o gosto pela pesquisa e pela capacidade de se ler, pensar, fazer aferições, considerações e tirar conclusões. Uma das carências de muitos estudantes que entram no Ensino Superior no Brasil está relacionada à interpretação de textos. Como material de leitura, você pode empregar alguns dos livros sugeridos na bibliografia comentada. Ainda que os alunos leiam, por exemplo, um capítulo de dois livros diferentes para realizarem uma análise comparativa, isso é muito melhor do que lerem apenas resumos ou resenhas. Estimule-os a valorizarem o tempo de leitura e pesquisa e explique como isso será relevante para a vida profissional deles. Algumas sugestões de temas que podem ser abordados nos textos analíticos: a) as peculiaridades da França Antártica; b) a França Antártica e a França Equinocial; c) a literatura de aventura; d) romances históricos na literatura brasileira; e) filmes que retratam o Brasil no século XVI; f ) visões sobre os indígenas no Brasil colônia e no Brasil contemporâneo; g) panorama das etnias indígenas no Brasil; h) políticas de inclusão para os povos indígenas brasileiros. Os estudantes podem ainda escolher outro tema, sempre buscando áreas de interesses pessoais – o que torna a pesquisa muito mais interessante.
PRÁTICAS
Leitura, escuta, produção de textos (orais, escritos, multissemióticos) e análise linguística/semiótica. HABILIDADE
(EM13LP34) Produzir textos para a divulgação do conhecimento e de resultados de levantamentos e pesquisas – texto monográfico, ensaio, artigo de divulgação científica, verbete de enciclopédia (colaborativa ou não), infográfico (estático ou animado), relato de experimento, relatório, relatório multimidiático de campo, reportagem científica, podcast ou vlog científico, apresentações orais, seminários, comunicações em mesas redondas, mapas dinâmicos etc. –, considerando o contexto de produção e utilizando os conhecimentos sobre os gêneros de divulgação científica, de forma a engajar-se em processos significativos de socialização e divulgação do conhecimento.
com seus alunos formulações de raciocínio lógico e dedutivo e estabeleça um número mínimo de caracteres por texto, explicando as regras básicas de citação bibliográfica da ABNT. Você deverá estabelecer um cronograma para que a turma realize a leitura, a pesquisa e a escrita dos textos. Nesse ínterim, os alunos podem recorrer a você para obterem mais orientações. Em uma data determinada, os textos devem ser apresentados em mesas de discussão na forma de um seminário em que todos debaterão.
O texto produzido deve ter minimamente a estrutura de um texto científico. Trabalhe O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica – Material Digital do Professor
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Língua Portuguesa: Campo artístico-literário Atividade 6: Literatura e visões de mundo Professor, esta atividade é sugerida como atividade de leitura ou de pós-leitura. Esta proposta implica em relacionar O grumete e o tupinambá a outras obras literárias no que diz respeito ao encontro entre o colonizador europeu e o indígena. Uma sugestão é a turma se dividir em pequenos grupos e cada um analisar o livro de Adriano Messias e alguma outra obra de livre escolha. Por exemplo, partindo-se do encontro de alteridades simbolizado pela amizade entre Jean e Îagûanharõ em O grumete e o tupinambá, os alunos podem fazer comparações com encontros de alteridades simbolizados por:
PRÁTICAS
Leitura, escuta, produção de textos (orais, escritos, multissemióticos) e análise linguística/semiótica. HABILIDADE
(EM13LP52) Analisar obras significativas das literaturas brasileiras e de outros países e povos, em especial a portuguesa, a indígena, a africana e a latino-americana, com base em ferramentas da crítica literária (estrutura da composição, estilo, aspectos discursivos) ou outros critérios relacionados a diferentes matrizes culturais, considerando o contexto de produção (visões de mundo, diálogos com outros textos, inserções em movimentos estéticos e culturais etc.) e o modo como dialogam com o presente.
a) Robinson Crusoé e Sexta-feira em algum capítulo de Robinson Crusoé, de Daniel Defoe; b) Iracema e Martim em algum capítulo de Iracema, de José de Alencar; c) Hans Staden e Cunhambebe em algum capítulo de Duas viagens ao Brasil, de Hans Staden. Os estudantes podem ainda analisar a defesa que Padre Antônio Vieira faz dos indígenas em Sermão de Santo Antônio aos peixes, e compará-la com o capítulo dezesseis de O grumete e o tupinambá, “A deglutição do Bispo Sardinha”. Sobre este sermão, você pode ler um breve texto na seção “Aprofundamento”, página 24. Outra sugestão seria compararem a representação dos indígenas no primeiro capítulo de A muralha, de Dinah Silveira de Queiroz, com as representações dos tupinambás no livro de Adriano Messias. Professor, ao propor a atividade, considere a estrutura da composição formal de cada texto, além do estilo (de época e de autor) e os aspectos discursivos que salientem, no âmbito
da exegese textual, visões de mundo por parte dos personagens, por exemplo. É também pertinente fazer com que os alunos estabeleçam reflexões que cheguem até o panorama atual, ou seja, que eles compreendam de que maneira pensamentos dos séculos XVI, XVII ou XIX ainda se manifestam nas mentalidades brasileiras. Oriente seus alunos para que eles consigam identificar e separar diferentes visões de mundo de acordo com sua época e lugar.
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Propostas de Atividades II Ciências Humanas e Sociais Aplicadas
Atividade 1: O perspectivismo ameríndio Professor, esta atividade é sugerida como atividade de leitura ou de pós-leitura. O vídeo que pode ser assistido a partir do link a seguir serve como elemento motivador e desencadeador para esta atividade: “Tolerância e intolerância”, por Lilia Moritz Schwarcz – Café Filosófico CPFL – https:// www.youtube.com/watch?v=N67j5Ah9nc&t=332s O objetivo desta proposta é permitir aos alunos identificarem, contextualizarem e compreenderem as oposições dicotômicas historicamente criadas em torno de índio/ não índio; “selvagem”,“bárbaro”/“civilizado”; “natureza”/“cultura”. Estes opostos marcam notadamente a construção histórica do Brasil. As expressões anteriores estão entre aspas justamente para reforçarem o aspecto altamente imaginativo e tantas vezes preconceituoso em torno de cada conceito.
COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 1
Analisar processos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais nos âmbitos local, regional, nacional e mundial em diferentes tempos, a partir da pluralidade de procedimentos epistemológicos, científicos e tecnológicos, de modo a compreender e posicionar-se criticamente com relação a eles, considerando diferentes pontos de vista e tomando decisões baseadas em argumentos e fontes de natureza científica. HABILIDADE
(EM13CHS105) Identificar, contextualizar e criticar tipologias evolutivas (populações nômades e sedentárias, entre outras) e oposições dicotômicas (cidade/ campo, cultura/ natureza, civilizados/ bárbaros, razão/ emoção, material/ virtual etc.), explicitando suas ambiguidades.
A expressão-chave para o desenvolvimento deste estudo é o chamado “perspectivismo ameríndio”, de acordo com estudos do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, explicitado sobretudo no texto “O mármore e a murta: sobre a inconstância da alma selvagem” (vide Bibliografia Comentada). Professor, para que você tenha um breve apanhado sobre as ideias do pesquisador, leia o texto “O perspectivismo ameríndio – uma introdução ao conceito”, na página 25 da seção “Aprofundamento”. Se quiser, também empregue este texto em sala de aula com seus alunos. Partindo do livro O grumete e o tupinambá, os estudantes deverão salientar quais aspectos da história colocam as duas culturas – a francesa e a indígena – na dualidade
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apontada por Viveiros de Castro. Também permita que eles avancem na discussão, comentando porque os tupinambás serviram de modelo para o desenvolvimento dos pensamentos do antropólogo. Aproximando o debate da época em que vivemos, peça para a turma estabelecer as principais dualidades que podem ser detectadas na cultura brasileira. Por exemplo: ainda se entende a natureza como apartada do mundo
humano (natureza x cultura)? Quais implicações isso traz para nossa visão de mundo e para o nosso estar no mundo? Se os brasileiros adotassem uma visão próxima ao perspectivismo ameríndio, como seriam, por exemplo, os hábitos de consumo de bens materiais e imateriais e nossa relação com o meio ambiente? A atividade finaliza com um relatório comum, que os alunos organizarão à medida que as conversas forem fluindo.
Atividade 2: Filmes para se pensar a violência contra os indígenas Professor, esta atividade é sugerida como atividade de leitura ou de pós-leitura. Você também pode adaptá-la para atividade de pré-leitura. O livro de Adriano Messias propõe uma reflexão sobre o choque cultural entre alteridades (no caso, os europeus e os indígenas). Esses encontros, que podem ser considerados muito mais “desencontros” no sentido do impacto que causaram aos povos americanos, se fazem sentir até hoje. Visões do outro como sendo menos importante, inferior, desvalido, etc., ainda se mostram presentes nas estruturas sociais do Brasil. O objetivo desta atividade é, portanto, permitir que os alunos analisem as dinâmicas que engendraram o Brasil de nossos dias, sobretudo no que tange ao extermínio de povos indígenas (seja por desapropriação de terras, doenças, destruição de culturas ou mesmo genocídios). Para isso, eles deverão assistir a algum dos filmes mencionados a seguir e que constam na seção “Sugestões de referências complementares”, página 26: Brincando nos campos do Senhor, Aguirre, a cólera dos deuses, Fitzcarraldo e A missão. Professor, você pode tanto organizar sessões para que eles assistam ao(s) filme(s) quanto
COMPETÊNCIA ESPECÍFICA 2
Analisar a formação de territórios e fronteiras em diferentes tempos e espaços, mediante a compreensão dos processos sociais, políticos, econômicos e culturais geradores de conflito e negociação, desigualdade e igualdade, exclusão e inclusão e de situações que envolvam o exercício arbitrário do poder. HABILIDADE
(EM13CHS201) Analisar e caracterizar as dinâmicas das populações, das mercadorias e do capital nos diversos continentes, com destaque para a mobilidade e a fixação de pessoas, grupos humanos e povos, em função de eventos naturais, políticos, econômicos, sociais, religiosos e culturais, de modo a compreender e posicionarse criticamente em relação a esses processos e às possíveis relações entre eles.
apenas exibir alguns trechos em sala de aula. Considerando que os alunos muitas vezes não mantêm muito contato com a linguagem cinematográfica antes da era digital do cinema, pode ser muito válido assistirem os filmes em sua integridade. Em todas as obras sugeridas, é possível se analisar a presença do invasor e sua relação destruidora para com povos indígenas em vários âmbitos: como vetor de doenças, como
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doutrinador impositivo da religião cristã e de seus modos de vida, como violentador, como assassino, como usurpador, como saqueador, como destruidor do meio ambiente. Como complementação, fica sugerida a leitura de algumas partes do livro As veias abertas da América Latina, de Eduardo Galeano, um
clássico dos estudos americanos e cuja referência se encontra na “Bibliografia Comentada”. Na primeira parte desta obra, o autor rememora o percurso histórico dos invasores do continente americano a partir de ciclos de exploração econômica – a prata, o ouro, o açúcar, o cacau, a borracha, o algodão, o café, etc. –, explicitando o alto preço que os nativos e os escravos africanos pagaram para que as nações europeias se enriquecessem. Um paralelo com as tramas dos filmes se torna muito pertinente: Aguirre, a cólera dos deuses trata da busca do El Dorado, Fitzcarraldo retrata a época dos seringais, Brincando nos campos do Senhor aborda a imposição da fé evangélica a povos amazônicos e seu consequente genocídio, enquanto A missão mostra a escravização dos guaranis pelos espanhóis e portugueses. Você também pode pedir à sua turma que se divida em grupos. Então, cada qual se incumbirá de assistir um filme e abordá-lo, fundamentando-se em algum texto da obra de Eduardo Galeano. Os estudantes devem demonstrar capacidade analítica e conclusiva ao aproximarem o texto teórico da obra cinematográfica e vice-versa. Uma das formas de se finalizar a atividade pode ser uma aula na forma de seminário, em que cada grupo apresentará seus comentários a partir do filme escolhido. Professor, nas atividades voltadas para a Língua Portuguesa foram propostas muitas formas de análise das diferentes imagens que são historicamente construídas sobre os povos indígenas em textos literários, informativos e em obras de arte. As duas atividades propostas para que você desenvolva com a turma são complementares a este trabalho. Neste sentido, talvez seja interessante que você se reúna com os professores de Língua Portuguesa e pensem de que forma poderia ser estruturada uma mostra cultural com a temática indígena na escola.
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Aprofundamento Gonçalves Dias e o indianismo No famoso poema de Gonçalves Dias (18231864), I-Juca-Pirama, o índio tupi que dá nome à obra teria sido aprisionado pelos timbiras, e o destino que estaria reservado a ele seria a morte por meio de um ritual antropofágico. Antes, porém, o prisioneiro deveria cantar suas proezas, pois, assim, toda a sua coragem passaria para os inimigos devoradores. I-Juca-Pirama vai então falar de sua coragem, de suas andanças, do encontro com tribos inimigas, dos embates contra os aimorés, mas, ao se lembrar do pai cego e doente, pede que lhe deixem viver, o que vem a ser interpretado como um ato de covardia. Por isso, o chefe timbira manda soltá-lo para que volte ao lar. O pai de I-Juca-Pirama se decepciona com a atitude do filho, e ele mesmo o conduz de volta aos rivais para que o destino seja cumprido com honradez. Para mostrar que não é covarde, o filho vai à tribo timbira e começa a atacar a todos, até que o chefe pede que aquilo cesse. E assim a honra do herói vem a ser recuperada. O mote “Meninos, eu vi!” – que provém da boca de um eu lírico timbira que guardou a história de I-Juca-Pirama em sua memória – também é empregado no livro O grumete e o tupinambá, mas, vindo da boca do personagem narrador. Se, por um lado, representa perplexidade, por outro, esse recurso estilístico revela um desejo de que o leitor não duvide das coisas que serão narradas, alusivas aos tempos em que Jean ingressou em terras brasileiras. Neste sentido, e alusivamente, pode-se considerar que o adolescente protagonista é propositalmente colocado na situação de alguém que narra feitos memoráveis aos futuros leitores.
Em I-Juca-Pirama, nota-se que a visão de Gonçalves Dias sobre o indígena é idealizada, mas, ao mesmo tempo, há uma busca de certo realismo pelo poeta, o que se dá na descrição dos costumes nativos. Já no poema Os timbiras, o autor romantiza o índio ao nível dos heróis gregos, deixando evidente que a chegada da civilização europeia lhes roubou as terras e lhes afetou enormemente a cultura. Gonçalves Dias na poesia e José de Alencar na prosa são os consolidadores do Romantismo nacional, adotando o culto ao bom índio, símbolo de brasilidade em um país cujas elites sempre se esforçaram por detrair as próprias origens.
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Breves comentários sobre representações dos índios na literatura brasileira No século XVIII, o poeta árcade Basílio da Gama escreveu seu épico O Uraguai, que descreve a disputa entre jesuítas, outros europeus e indígenas em Sete Povos das Missões. Na corrente indianista do século posterior, destacam-se Gonçalves Dias e José de Alencar, ambos em busca de uma identidade nacional baseada na ancestralidade ameríndia que, apesar de às vezes serem inspiradas por relatos etnográficos, condensavam visões muito estereotipadas. Destacam-se, na prosa do indianismo romântico, obras como O Guarani, Iracema e Ubirajara. Na poesia, temos I-Juca-Pirama, Marabá e Os Timbiras, por exemplo. Na terceira geração do Romantismo, Sousândrade, com Guesa errante, mostra-se uma exceção na perspectiva indianista dos oitocentos. Tanto é que esta obra só foi reconhecida mais de cinquenta anos depois de escrita. No poema, o autor problematiza a questão da inter-etnicidade a partir de uma narrativa em que um indígena foge de um ritual andino para morar em Wallstreet, Nova York. Ainda no século XIX, a potiguar Nísia Floresta, primeira educadora feminista brasileira e amiga pessoal de Nietzsche, defendia os di-
reitos das mulheres, dos índios e dos escravos. Dentre seus trabalhos, salienta-se A lágrima de um caeté (1849), obra peculiar em que se conciliava o drama do índio espoliado pelo colonizador e o dos liberais derrotados na Revolução Praieira, em Pernambuco. Na década de 1930, os artistas modernistas propuseram novas visões em relação às culturas indígenas, coincidindo com a profusão de pesquisas etnográficas publicadas à mesma época. Além do clássico Macunaíma (1928), de Mário de Andrade, temos Cobra Norato (1931), de Raul Bopp, um poema épico em torno de mitologias amazônicas. Também merece destaque Oswald de Andrade, mentor do Movimento Antropofágico demarcado pelo Manifesto Antropófago (1928) e pelos textos da Revista de Antropofagia (1928-1929), da qual ele próprio foi o editor. O Manifesto representou um alerta para se pensar a presença europeia no Brasil: por um lado, opressora e genocida; por outro, colaboradora na formação do país. O escritor defendia um pensamento não colonizado. Guimarães Rosa, em 1963, publicou o conto Meu tio o iauaretê, que está na obra póstuma Estas histórias. Nele, o escritor mineiro descreve uma experiência de oncificação (ou jaguarização) de um sertanejo, temática metamórfica muito presente em variadas mitologias. Neste caso, trabalha-se com as dimensões internas indígena e jaguar, um devir animal, conforme o pensamento do filósofo francês Gilles Deleuze. E não podemos nos esquecer do romance Maíra (1976), de Darcy Ribeiro, que diz respeito à convivência do autor com os índios: narrativa admirável em que o mitológico, o social e o individual se cruzam para formarem um novo espaço.
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Alteridade Reduzir ou sublimar o outro é uma maneira de desumanizá-lo e, com isso, justificam-se atos de violência: se o colonizador entende que um índio é um “bárbaro” desprovido de entendimento da “civilização”, pode servir-se disso para descaracterizá-lo, vilipendiá-lo e desterritorializá-lo, por exemplo, dentre outras atrocidades. Não por acaso, na época da colonização, muitos índios foram levados à Europa como curiosidades – meras figuras fantasiadas, desprovidas de interesse maior que não o de deleitar as cortes do velho continente. Como ainda não existia a fotografia, diversos viajantes, por meio de desenhos e pinturas, expressavam um imaginário fértil em torno dos povos encontrados do lado de cá do Atlântico.
Além disso, filósofos e pensadores se inspiraram na figura do nativo do Novo Mundo, dentre eles, Montaigne (Ensaio sobre os canibais) e, posteriormente, Rousseau (Do contrato social). Ambos transitaram pelo mito do “bom selvagem”. O segundo adotou um olhar que predizia que o homem era inocente e bom ao nascer, vindo a se corromper com a vida em sociedade, assim como os indígenas se corromperiam mediante o contato com o europeu. De tal formulação proveio o chamado “indianismo ideológico”. Já na Carta do achamento do Brasil, de Pero Vaz de Caminha ao rei Dom Manuel, há descrições sobre aspectos físicos e culturais dos índios. O escriba salientava a necessidade da imposição da religião cristã para que aqueles povos se tornassem aculturados e civilizados.
O “Sermão de Santo Antônio aos peixes” O “Sermão de Santo Antônio aos peixes” foi pregado em São Luís do Maranhão em 13 de junho de 1654. Seu contexto está ligado às lutas que dividiam jesuítas e colonos em relação aos índios. Três dias após proferi-lo, o Padre Antônio Vieira foi para Portugal às escondidas, a fim de negociar com a metrópole uma lei para a regulamentação da liberdade indígena na colônia ultramarina.
aos índios, mas criticava duramente os pregadores que agiam em benefício próprio. A alegoria dos peixes foi muito pertinente: em primeiro lugar, o escritor coloca os animais aquáticos acima dos humanos para, em seguida, apontar-lhes alguns defeitos, os quais, evidentemente, seriam faltas de virtudes dos próprios colonos maranhenses para com os índios.
Homem de seu tempo, Padre Vieira entendia que o cristianismo tinha de ser apresentado O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica – Material Digital do Professor
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O perspectivismo ameríndio – uma introdução ao conceito Eduardo Viveiros de Castro e Tânia Stolze Lima desenvolveram o conceito do “perspectivismo ameríndio” para pensarem as relações dos amazônicos com os demais seres da floresta. A perspectiva filosófica desses povos torna os humanos, os outros animais, os espíritos e os encantados – e até mesmo os não humanos – uma espécie de “humanidade compartilhada”, o que se dá também pela partilha dos corpos. Aqui não se trata do conceito de humano como entendemos na filosofia ocidental, mas da consideração do outro (o animal não humano, a pedra, o rio, o tempo, etc.) como dotado de uma subjetividade partícipe da construção da chamada realidade. Neste sentido, a realidade ameríndia sempre dependeria da existência de um sujeito para interpretá-la e dar-lhe sentido. Além disso, uma variedade de naturezas emergiria dos corpos dos seres que se reconheceriam mutuamente como humanos (e não o contrário), o que tem raiz nas próprias mitogêneses amazônicas, nas quais bichos e coisas falavam e se entendiam antes do surgimento das especiações. O perspectivismo ameríndio aponta para uma descolonização do pensamento, colocando em xeque os pontos de vista da cultura ocidental. Não por acaso, o Padre Antônio Vieira havia denominado de “inconstância” a “incapacidade” de os indígenas assimilarem e reterem permanentemente os costumes europeus. Os nativos até se permitiam evangelizar, mas, em seguida, despojavam-se do que foi aprendido com imensa facilidade – o que criava um desafio à catequização. Foi daí que surgiu a metáfora da murta e do mármore: ou seja, evangelizar os pagãos do Velho Mundo, para o jesuíta, era difícil, mas o “resultado” perdurava e resistia como o mármore. Já os índios do Novo Mundo seriam como a murta – um arbusto muito maleável à poda, mas que, ao menor descuido, já esparrama novos
galhos, não retendo a forma que o jardineiro quis lhe dar. Para Padre Vieira, a catequização não parecia tão difícil, porém, seu impacto não era duradouro entre os americanos, que, assim que possível, retornavam a seus costumes e tradições – de onde a necessidade de “reevangelizações” era constantes. Esta e outras questões indígenas, sobretudo entre os tupinambás (como a da antropofagia ritualística, a da vingança como questão de honra, a do hábito coletivo da beberagem do cauim, etc.) foram desafiadoras para o colonizador/ explorador/ invasor, demonstrando que o confronto com outras culturas não se dá passivamente. Outro jesuíta, Manuel da Nóbrega, foi mais otimista – ao menos em um primeiro momento –, acreditando que os tupinambás seriam como homens de cera, em cujas almas poderia se inscrever qualquer coisa. É que os recém-chegados da Europa foram incapazes de perceber que, talvez mais do que afirmações identitárias – uma das características da noção de cultura no Ocidente –, os indígenas valorizavam as trocas e o consumo de conhecimentos e de tecnologias, por exemplo, sem se preocuparem com um poder centralizado, com um deus total, com uma divindade única e, consequentemente, também não se importavam em obedecer cegamente ao outro. Para ilustrar esse pensamento, além do artigo de Eduardo Viveiros de Castro – sugerido na bibliografia –, não deixe de assistir os filmes Brincando nos campos do Senhor, Aguirre, a cólera dos deuses e Fitzcarraldo, todos comentados na seção “Sugestões de referências complementares”, páginas 26 e 27.
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Sugestões de Referências Complementares Filmes brasileiros O cinema nacional tem algumas obras referenciais e já clássicas que abordam o primeiro século da colonização e exploração das terras brasileiras. Algumas foram realizadas durante a ditadura, a qual tendia a censurar menos obras artísticas de cunho histórico. Professor, é importante que você trabalhe com seus alunos os “modos de ver”, muito mais do que os conteúdos das narrativas: ou seja, tente facilitar e orientar uma visão crítica dos jovens espectadores sobre as produções elencadas a seguir. Assim como um romance histórico, podemos dizer que filmes históricos são factions – isto é, uma confluência do factual com o ficcional (fact + fiction). Também é importante salientar que a nudez em filmes que tratam de tribos que andavam despidas deve ser entendida com naturalidade pelo espectador/ estudioso. Brincando nos campos do Senhor (At play in the fields of the Lord, Héctor Babenco, 1991)
Como era gostoso o meu francês (Nelson Pereira dos Santos, 1971)
Filme extremamente atual e pertinente nas questões que propõe: territorialidades, identidades, ideologias e genocídio indígena. No enredo, um casal de missionários evangélicos fundamentalistas americanos e seu filho entram na selva amazônica brasileira para converterem índios arredios à noção cristã de Deus. Ao mesmo tempo, um pequeno avião pilotado por contrabandistas pousa em Mãe de Deus, um vilarejo remoto, e, com os passaportes apreendidos e sem gasolina, terão de realizar uma “troca de favores” bombardeando uma tribo cujas terras são desejadas economicamente por um comandante.
A iconografia do filme foi baseada nos trabalhos do gravurista belga Théodore de Bry, que, apesar de nunca ter cruzado o Atlântico, ilustrou figuras do Novo Mundo e ajudou a espalhar a visão do Brasil como terra de exotismos e mistérios.
Hans Staden (Luiz Alberto Pereira, 1999) O filme narra a história de Hans Staden, soldado e marinheiro alemão que, no início do século XVI, foi sequestrado por uma tribo tupinambá. É um dos únicos filmes falados praticamente em idioma tupi e foi baseado na obra Duas viagens ao Brasil, de Hans Staden. Para a filmagem, foi construída uma réplica de uma aldeia tupinambá. Indígenas de várias etnias participaram do elenco.
Com diálogos em língua tupi, a história deste filme se passa em 1594 e foi baseada no famoso diário de Hans Staden, que, no filme, é representado por um personagem francês prisioneiro dos tupinambás. Este veio a ser confundido com um português, inimigo daquela etnia. Por isso, seria preciso devorar o inimigo para adquirir seus poderes, no caso, aprender a usar a pólvora e os canhões. Para a produção, uma aldeia tupinambá foi construída nos arredores de Parati, Rio de Janeiro, local isolado e livre dos olhos da censura durante a ditadura. No filme, também há influência dos relatos do sapateiro e seminarista francês Jean de Léry, que esteve na França Antártica.
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Anchieta, José do Brasil (Paulo Cesar Saraceni, 1977) Chegado ao Brasil em 1553, o padre José de Anchieta aprende a língua dos índios tupis e elabora uma gramática. Atento observador dos costumes e do mundo natural, negocia a paz durante a intervenção francesa. Caramuru, a invenção do Brasil (Guel Arraes, 2001) Esta comédia, baseada em uma minissérie homônima, trata de Diogo Álvares, artista português que, após um naufrágio na costa brasileira, vive um triângulo amoroso com a índia Paraguaçu e a irmã desta, Moema. Os três viviam harmonicamente ante os olhares do cacique Itaparica.
Filmes estrangeiros Vermelho Brasil (Rouge Brésil, Sylvain Archambault, 2014) Tanto em sua forma de minissérie quanto de filme de aventura, Vermelho Brasil foi baseado no romance homônimo de Jean-Christophe Rufin. O enredo trata da expedição francesa de Nicolas Durand de Villegagnon ao litoral fluminense durante a década de 1550.
Fitzcarraldo (Werner Herzog, 1982) Outra das obras máximas do diretor alemão Herzog, este filme traz como personagem principal Fitzcarraldo – apelidado de “conquistador do inútil” –, um fã de Enrico Caruso que sonha em construir uma ópera em Iquitos – Alto Amazonas – após falhar na construção da ferrovia transandina e de uma fábrica de gelo. Com dinheiro emprestado pela amante, a dona de um bordel, ele compra um barco para transportar borracha. Embriagado pelos próprios delírios, fará dezenas de indígenas deslocarem a enorme embarcação por sobre um morro de mata fechada para alcançar um braço de rio. A missão (The mission, Roland Joffé, 1986) Este filme retrata a época da expulsão dos jesuítas devido à crise nas relações entre a coroa portuguesa e a Companhia de Jesus. Nesse contexto, um mercador de escravos, movido pelo sentimento de autopunição por ter matado o próprio irmão, vai para uma missão jesuítica conviver com os indígenas, ou seja, com aqueles que até há pouco tempo ele caçava para escravizar.
Aguirre, a cólera dos deuses (Aguirre, der Zorn Gottes, Werner Herzog, 1972) Obra de arte do cinema alemão, este filme imperdível retrata uma expedição espanhola enviada por Pizarro que, em 1561, desce os Andes até o rio Orinoco em busca do lendário El Dorado. O grupo é chefiado por Don Pedro Urzúa e pelo segundo em comando, o cruel Lope de Aguirre. Em uma enorme balsa fluvial, europeus, indígenas e um escravo negro enfrentarão corredeiras, o ataque de tribos e perecerão ante a própria ambição humana.
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Bibliografia Comentada ALVES, Castro. O navio negreiro. Tragédia no mar. In: Antologia poética. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1971. Este poema é citado na terceira atividade proposta, ao se tratar das intertextualidades de O grumete e o tupinambá com outras obras da literatura nacional. BELLEI, Sérgio Luiz Prado. Monstros, índios e canibais. Ensaios de crítica literária e cultural. Florianópolis: Editora Insular, 2000. Este livro trabalha com esses “habitantes de fronteiras” que foram culturalmente definidos a partir da monstruosidade, do primitivismo selvagem e do canibalismo. A obra discute a necessidade de se legitimar práticas culturais que foram excluídas por séculos a favor do modo de vida europeu – considerado superior e civilizado – e, ao mesmo tempo, pretende denunciar as numerosas violências cometidas contra povos os mais diversos. BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de História. Edição crítica. São Paulo: Alameda, 2020. Este livro reúne, pela primeira vez, a tradução em nossa língua das quatro principais versões das famosas teses de Walter Benjamin sobre a História. Nos textos, está a urgente necessidade de se repensar a História pelo ponto de vista dos vencidos.
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasília, MEC/ CONSED/ UNDIME, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_ EF_110518_versaofinal_site.pdf Acesso em: 23 dez. 2020. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica. CASTRO, Eduardo Viveiros de. O mármore e a murta: sobre a inconstância da alma selvagem. In: A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2002. Este texto é uma excelente referência para se pensar o perspectivismo ameríndio em nossos dias. O pesquisador parte de fatos históricos: ao tentarem catequizar os tupinambás, os jesuítas tinham dificuldades quanto à “inconstância” daqueles índios, pois, ao mesmo tempo em que absorviam aspectos culturais novos, retornavam aos seus costumes. O ensaio também trabalha com os sentidos de vingança e antropofagia. DAHER, Andrea. Brasil francês - As singularidades da França equinocial (1612-1615). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. Neste livro, é analisada a cristianização e a ocidentalização de indígenas brasileiros a partir de um estudo da colônia francesa do Maranhão. A obra também acompanha o destino de seis tupinambás em Paris, onde chegaram levados por padres. Em busca de se entender melhor os confrontos entre alteridades, os relatos de viajantes da época são uma fonte preciosa em nossos dias.
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DEL PRIORE, Mary. Monstros e maravilhas no Brasil colonial. In: Esquecidos por Deus. Monstros no mundo europeu e ibero-americano (séculos XVI-XVIII). São Paulo: Companhia das Letras, 2000. Esta obra oferece um panorama das mentalidades que ajudaram a criar um extenso imaginário em torno da fauna e da flora do Novo Mundo, revelando em que medida nossa espécie é capaz de projetar medos e angústias em suas próprias fabulações. O texto sugerido é referência para os que desejam entender o imaginário do Brasil colonial. DIAS, Gonçalves. I-Juca-Pirama, seguido de Os Timbiras. Porto Alegre: L&PM, 1997. Neste poema épico-dramático está a trajetória da recuperação da honradez de I-Juca-Pirama frente a seu pai e à tribo dos timbiras. Este poema é mencionado em algumas atividades deste material. FONSECA, Pedro Carlos Louzada. Visões fundadoras da bestialização da antropofagia ameríndia; Hans Staden e a retórica do canibalismo em carne e osso. In: Bestiário e discurso do gênero no descobrimento da América e na colonização do Brasil. Bauru: Edusc, 2011. Os dois textos sugeridos trazem uma crítica ao androcentrismo europeu que imperou durante os diferentes processos de colonização nas Américas, com destaque para o peso da visão moralizadora cristã dos invasores sobre os modos de vida de povos que eles encontravam, sobretudo os praticantes de rituais antropofágicos.
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Porto Alegre: L&PM, 2010. Este livro é um clássico sobre a dependência e a vassalagem da qual a América Latina tem sido vítima há séculos: espanhóis, portugueses, ingleses, holandeses, franceses e, no século passado, os norte-americanos, são alguns dos povos que, para o autor, propiciaram cenários de submissão e espoliação nos países pobres do Novo Mundo. LESTRINGANT, Frank. A oficina do cosmógrafo ou A imagem do mundo no Renascimento. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009. Esta obra traz interessantes capítulos sobre a visão Renascentista que imperou na exploração do Novo Mundo, com destaque à chamada “invenção do Brasil”. MARIZ, Vasco; PROVENÇAL, Lucien. Villegagnon e a França Antártica. Uma reavaliação. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. Este livro é um estudo biográfico sobre o líder da expedição francesa que aportou à Baía de Guanabara para instalar uma colônia. MESSIAS, Adriano. O monstruoso e o fantástico na estranheza das Américas. In: Todos os monstros da Terra: bestiários do cinema e da literatura. São Paulo: Educ/ Fapesp, 2016. Neste capítulo, o autor discorre sobre a presença do imaginário europeu amalgamado ao imaginário autóctone americano para a conformação de visões de mundo que nos assombraram por séculos: preconceitos em relação aos indígenas, entendimentos deturpados da fauna, da flora e do relevo estão entre os pontos de análise.
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NAGIB, Lucia. Werner Herzog. In: O cinema como realidade. São Paulo: Estação Liberdade, 1991.
THEVET, André. As singularidades da França Antártica. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1978.
A pesquisadora analisa com propriedade vários filmes do alemão Werner Herzog, com destaque para Aguirre, a cólera dos deuses e Fitzcarraldo.
Nesta obra clássica, o cronista e naturalista André Thevet oferece a narração de sua viagem de ida da França até o litoral brasileiro e a busca pelo polo antártico. O itinerário implica na chegada à Baía de Guanabara e na fundação do Forte Coligny. Há relatos de usos e costumes indígenas, bem como descrições da fauna e da flora, dentre outros.
QUEIROZ, Dinah Silveira de. A muralha. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1969. O primeiro capítulo deste romance está indicado como sugestão na atividade 6 de Língua Portuguesa, página 18. SÁ, Lúcia. Literaturas da floresta: textos amazônicos e cultura latino-americana. Rio de Janeiro: Eduerj, 2017.
TODOROV, Tzevetan. A conquista da América. A questão do outro. São Paulo: Martins Fontes, 2019.
As quatro partes desta obra aludem às quatro tradições da planície amazônica que mais influenciaram os escritores sul-americanos: macro-caribe, tupi-guarani, sistema tukano-arauaque do Alto Rio Negro e arauaque ocidental.
Todorov conta a história da descoberta e conquista da América para tratar da questão do outro: o encontro entre o “civilizado” mundo cristão europeu e o “selvagem” Novo Mundo pagão é, para o autor, o fato mais importante da história ocidental. A partir desse paradigma, ele trata da complexa questão do choque de culturas.
TAUNAY, Afonso d’Escragnolle; Mary del Priore (Org.). Monstros e monstrengos do Brasil. São Paulo: Editora Schwarcz, 1998.
VIEIRA, Padre Antônio. Sermão de Santo Antônio. In: Sermões. Texto integral. São Paulo: Três Livros e Fascículos, 1984.
Este livro traz compilações da fauna fantástica brasileira, nas quais o pesquisador Afonso de Taunay – filho do visconde de Taunay – confere respeito e valor cultural ao imaginário sobre nosso país, demonstrando simpatia pelos relatos antigos.
Este sermão está indicado como sugestão na atividade 6 de Língua Portuguesa, página 18, e sobre ele há um breve texto na seção “Aprofundamento”, página 24.
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Este Material Digital do Professor foi elaborado por Adriano Messias. ADRIANO MESSIAS é pesquisador nas áreas de semiótica, educação e ciências da comunicação. Tem pós-doutorado e doutorado em comunicação e semiótica, tendo sido pesquisador visitante em várias universidades estrangeiras, dentre elas, a Universidade Paris 8 e a Universidade Autônoma de Barcelona. É também autor de mais de cem livros de ficção e ganhou prêmios importantes, como o Jabuti. Conteúdo baseado na obra O grumete e o tupinambá – romance da França Antártica, do autor Adriano Messias, com ilustrações de Carlos Caminha.
Créditos do Material Digital Editor: Rafael Borges de Andrade Supervisão pedagógica: Maria Zoé Rios Fonseca Assistente editorial: Olívia Almeida Preparação de texto e revisão: Alice Bicalho e Olívia Almeida Ilustrações: Carlos Caminha Diagramação: Mário Vinícius Silva
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