A morte e o falso culpado no cinema do jovem Hitchcock Sérgio Alpendre
No livro sobre Alfred Hitchcock escrito por Noël Simsolo, lançado pela editora Record no início da década de 1970, temos uma bela amostra de como o diretor de Psicose (Psycho, 1960) era visto por críticos e cineastas nos anos 1950 e 1960. Robert Aldrich e Samuel Fuller, por exemplo, insistem na tecla de que o diretor fazia filmes apenas para divertir o público. Otto Preminger reconhece em Hitch um truqueiro genial. Diz que adorou Psicose, mas que este filme não pode ser analisado, pois foi baseado apenas em truques. O crítico Jacques Doniol-Valcroze aponta como um sério problema a submissão aos desejos do público, e lamenta que um certo humor presente em sua fase inglesa tenha sido esquecido em favor da “ideia geral” que o considera um mestre do suspense. É interessante essa observação de Doniol-Valcroze. Primeiro porque há humor também na fase americana (em grandes doses, podemos dizer), mas também porque ele aponta, já em 1955, um esquecimento da fase inglesa. Nos últimos anos pudemos observar que esse esquecimento continuou a nortear os trabalhos feitos sobre sua obra, enquanto o endeusamento justificado de sua fase americana ganhou cada vez mais corpo. É evidente que as condições de filmagem com grandes orçamentos e a maior visibilidade que Hollywood proporcionava foram importantes para que a fase americana ficasse muito mais conhecida e reverenciada. Mas seria imprudente ignorar que as principais marcas de seu estilo já estavam sendo desenvolvidas desde o início. Alexandre Astruc, por exemplo, escreveu, também nos anos 1950, mas já consciente da genialidade do cineasta, que só há um tema na obra inteira de Hitchcock: uma alma envolvida com o mal. Nesse grande tema, estão contidos, como muitos já escreveram1, alguns outros temas interessantes, como por exemplo o simbolismo psicanalítico e religioso, presentes em uma enormidade de filmes; o tema do falso culpado, que está, portanto, envolvido indiretamente com o mal (iniciado em O inquilino/ The Lodger: A Story of the London Fog, 1926 e aperfeiçoado sobretudo em Jovem e inocente/ Young and Innocent, 1937; Sabotador/ Saboteur, 1942; A tortura do silêncio/ I confess, 1952; O homem errado/ The Wrong Man, 1957 e Intriga internacional/ North by
....................................................................................... Ver Jean Douchet, Inácio Araújo, Raymond Durgnat, Chabrol e Rohmer, Truffaut, Bazin e o próprio Simsolo, entre outros.
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