N.º 12
Maio/Junho 2022
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
PUBLICAÇÃO DIGITAL BIMESTRAL
HIPERTENSÃO: UMA DAS MAIS SILENCIOSAS DOENÇAS À ESCALA MUNDIAL
ÍNDICE SAÚDE PARA SI
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20 Dra. Nádia Noronha Directora Executiva da Tecnosaúde
As doenças cardio e cérebro-vasculares são a principal causa de morte e de incapacidade em todo o mundo. O acidente vascular cerebral (AVC) e o enfarte agudo do miocárdio constituem cerca de 85% daquelas. Ora, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 51% das mortes por AVC e 45% das mortes relacionadas com problemas cardíacos decorrem da hipertensão. Traiçoeira e silenciosa, porque os sintomas surgem já numa fase aguda, e muito democrática, porque acomete crianças, adultos e idosos, homens e mulheres, de todas as raças, classes sociais e condições financeiras, a hipertensão arterial começa a assumir contornos alarmantes. Em Angola, pelo menos, 322 mil novos casos foram diagnosticados pela Direcção Nacional de Saúde Pública, em 2021, dos quais, 1.452 terminaram em óbito. Todos os anos, a 17 de Maio, celebra-se o Dia Mundial da Hipertensão Arterial, com o objectivo de alertar e elucidar a população e os profissionais de saúde para este grave problema de saúde pública. Por isso, nesta edição, quisemos dar também o nosso contributo nesta importante jornada de consciencialização, dedicando grande parte das nossas páginas à temática da hipertensão arterial. Tanto mais que, nos últimos dois anos, fruto da pandemia, o acesso das populações aos cuidados de saúde ficou dificultado. Urge, assim, envidar todos os esforços nesta missão de consciencialização e cabe a todos nós – profissionais de saúde, entidades governamentais e sociedade em geral – contribuir para minimizar o pesado fardo trazido por este flagelo que já afecta mais de mil milhões de pessoas em todo o mundo.
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Impacto da acne na qualidade de vida
Dra. Edna de Alegria aborda os benefícios da actividade física, também na saúde mental
ENTREVISTA Dr. Eugene Nwoke fala-nos do trabalho desenvolvido pela Roche nos PALOP
Dr. Pedro Sabola aborda os desafios na prevenção, diagnóstico e tratamento da hipertensão Análise global das tendências de prevalência, detecção, tratamento e controlo da hipertensão Perfil nutricional dos doentes com hipertensão Dr. Djalme Fonseca fala as consequências, a nível ocular, da hipertensão arterial
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PERSPECTIVA
Ecoangola analisa as consequências para o país do estado de emergência ambiental global
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EDITORIAL
ENTREVISTA Dra. Fátima Caetano aborda os riscos do tabagismo para a saúde dos pulmões
Felicidade no trabalho na perspectiva do Dr. Sérgio Luciano Dr. Cláudio Osório aborda a chave para nos sentirmos motivados no trabalho A importância da farmacovigilância, nomeadamente ao nível da terapia biológica
Propriedade e Editor: Tecnosaúde, Formação e Consultoria Nacionalidade: Angolana Edifício Presidente Business Center Largo 17 de Setembro, N.º 3 - 2.º Andar, Sala 224, Luanda, Angola Directora: Nádia Noronha E-mail: nadia.noronha@tecnosaude.net Sede de Redacção: Edifício Presidente Business Center Largo 17 de Setembro, n.º3 - 2.º andar, sala 224, Luanda, Angola Periodicidade: Bimestral Suporte: Digital http://www.tecnosaude.net/pt-pt/
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
IMPACTO DA ACNE NA QUALIDADE DE VIDA QUANTO MAIS SEVERA FOR A ACNE, MAIOR IMPACTO TERÁ NA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES. A DRA. MAIZA BAPTISTA ABORDA DE QUE MODO ESTA DOENÇA INFLAMATÓRIA MULTIFACTORIAL TEM IMPACTO NA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES, COM BASE NO ESTUDO DESENVOLVIDO NAS CONSULTAS EXTERNAS DE DERMATOLOGIA DO HOSPITAL AMÉRICO BOAVIDA, EM LUANDA, EM 2017/2018.
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Dra. Maiza Baptista Dermatologista e Venereologista
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e acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a qualidade de vida (QoL) é definida como “a percepção do indivíduo da sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais vive e em relação aos seus objectivos, expectativas, padrões e preocupações” (WILLIAMS, 2000). Este é um conceito em evolução, que pode também ser lembrado como o estado de satisfação ante a doença. A acne é uma doença inflamatória multifactorial (Propionibacterium acnes- Cutibacterium acnes-, hormonal, predisposição genética) da unidade pilossebácea que mais afecta a humanidade (DURAI; NAIR, 2014; LAI et al., 2012). É caracterizada por uma variedade polimórfica de lesões, que vão desde comedões, pápulas e pústulas até nódulos, acometendo, nalguns casos, o estado geral. Observada, principalmente, em adolescentes e adultos jovens (LUPI,
2010), é de fácil diagnóstico, baseado, essencialmente, no exame clínico. Os membros da Aliança Global para Melhorar os Resultados na Acne (Global Alliance to Improve Outcomes in Acne) recomendam que seja reconhecida como uma doença crónica e que os efeitos sociais e económicos relacionados façam também dela um problema de saúde pública (GOLLNICK et al., 2008). Mais do que um incómodo e estético, a acne afecta virtualmente todos os aspectos
“OS MEMBROS DA ALIANÇA GLOBAL PARA MELHORAR OS RESULTADOS NA ACNE RECOMENDAM QUE SEJA RECONHECIDA COMO UMA DOENÇA CRÓNICA E QUE OS EFEITOS SOCIAIS E ECONÓMICOS RELACIONADOS FAÇAM TAMBÉM DELA UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA”
da vida do indivíduo (MOTLEY; FINLAY, 1989). A morbidade a si associada pode ser devastadora (LAW et al., 2009), os seus portadores podem experimentar fardos psicossociais, influenciando as actividades quotidianas, tais como isolamento social, relacionamentos com o sexo oposto, ideias suicidas, depressão, ansiedade e baixa auto-estima (GUPTA, 1998; GRANDO, 2015; DRÉNO, 2006). Estes pacientes têm, em média, um pior desempenho académico e taxas de desemprego mais elevadas, comparados àqueles sem acne (CUNLIFE, 1986). E, quando comparada com outras doenças crónicas, como a asma, a epilepsia e a diabetes, a acne causa mais impacto na saúde mental, quando se usa o Medical Outcomes Study - 36 -Item Short Form Health Survey (SF-36), (NEWTON, 1997). Instrumentos específicos já foram desenvolvidos para mensurar o impacto da acne na qualidade de
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vida, entre eles o Acne- Quality of Life (acne- QoL) (GIRMAN et al., 1996), que foi recentemente traduzido, adaptado e validado para o Português falado no Brasil por autores brasileiros, o Acne-QoL-Br (KAMIMOTO et al., 2014). A principal vantagem no uso de instrumentos específicos para a acne é a capacidade de identificar efeitos. O instrumento é composto de 19 questões, organizadas em quatro domínios referentes à acne facial: percepção própria, aspecto social, aspecto emocional e sintomas da acne, ou seja, uma avaliação subjectiva sobre a gravidade da sua acne. O “score” total do questionário varia de 0 a 114 e, para todos os domínios, os “scores” mais altos reflectem uma melhor qualidade de vida. Com o objectivo de determinar o impacto da acne vulgar na qualidade de vida dos pacientes, realizámos o estudo nas Consultas Externas de Dermatologia do Hospital Américo Boavida, em Luanda, Angola, em 2017/2018, usando a ferramenta “AcneQoL-Br”. O nosso trabalho foi pioneiro no país, uma vez que não encontrámos, na altura, estudos publicados sobre a qualidade de vida dos pacientes com acne. Foi um estudo observacional, descritivo e transversal, num
total de 113 pacientes seleccionados por amostragem não probabilística por conveniência, cujo diagnóstico clínico final foi Acne vulgar facial. Nos nossos resultados, observámos que a incidência da acne vulgar foi de 4,52% do total de patologias dermatológicas observadas. A idade média foi de 19,58±4,4 anos, houve maior participação de pacientes do sexo feminino (64,60%). O fototipo V, com 92,9%, foi o mais frequente. Estes pacientes estudavam no nível secundário (68,14%). Houve automedicação em 71,4%. O grau de severidade foi moderado, com 84,07%, e o valor médio do “score” da qualidade de vida foi de 67,87, sendo 114 o máximo da escala. No final do estudo, concluímos que, quanto mais severa for a Acne, maior impacto terá na qualidade de vida dos pacientes, o que corrobora alguns estudos onde pacientes com acne moderada/grave relataram um maior impacto na sua qualidade de vida do que os pacientes com Acne leve, ou o impacto da acne na qualidade de vida influenciado pelo grau de severidade como percebido pelo paciente (TASOULA, 2012; DUQUIA et al., 2013).
Referências bibliográficas: • Cunliffe WJ. Acne and unemployment. Br J Dermatol 1986; 115: 386 • Dréno, B. Assessing quality of life in patients with acne vulgaris: implications for treatment. Am JClin Dermatol 2006; 7: 99- 106 Duquia RP, de Almeida HL Jr, Breuning JA, Souzat PR, Göellner CD. Most common patterns of acne in male adolescents: a population-based study. Int J Dermatol 2013; 52: 550-3 • Durai PT, Nair DG. Acne vulgaris and quality of life among young adults in South India. Indian Dermatol Online J 2014; 60: 33 • Girman CJ, Hartmaier S, Thiboutot D, Johnson J, Barber B, DeMuro-Mercon C, et al. Evaluating health-related quality of life in patients with facial acne: development of a self-administered questionnaire for clinical trials. Qual Life Res. 1996;5:481-90 • Grando, LR. Tradução, adaptação cultural e validação para o português falado no Brasil do instrumento Cardiff acne disability índex (CADI). Dissertação de mestrado, Porto Alegre Brasil 2015; 14 • Gollnick HP, Finlay AY, Shear N. Can we define acne as a chronic disease?: if so, how and when? Am J Clin Dermatol 2008; 9: 279-84 • Gupta MA,Johnson AM, Gupta AK. The development of a Acne Quality of Life scale: reliability, validity, and relation to subjective acne severity in mild to moderate acne vulgaris. Acta Derm Venereol 1998; 78: 451-6 • Gupta MA, Gupta AK. Depression and suicidal ideation in dermatology patients with acne, alopecia areata, atopic dermatitis and psoriasis. Br J Dermatol 1998; 139: 846-50 • Kamimoto CSL, Hassun KM, Bagatin E;NTomimori J. Questionário de qualidade de vida específico para acne (Acne-QoL): tradução, adaptação cultural e validação para a língua portuguesa no Brasil. An Bras Dermatol. 2014; 89:520-5 • Lai JJ, Chang P, Lai KP, Chen L, Chang C. The role of androgen and androgen receptor in skin-related disorders. Arch Dermatol Res 2012; 304: 499-510 • Law MP, Chuh AA, Lee A, Molinari N. Acne prevalence and beyond: acne disability and its predictive factors among Chinese late adolescents in Hong Kong. Clin Exp Dermatol 2010; 35: 16-21 • Lupi O, Nunes S, Gomes Neto A, Péricles C. Doenças dermatológicas no Brasil: perfil epidemiológico e atitudinal. An Bras Dermatol. 2010;85:S1-20 • Motley RJ, Finlay AY. How much disability is caused by acne? Clin Exp Dermatol. 1989;14:194-8. Mosam, A. Vawda, NB, et al. Quality of life issues for South Africans with acne vulgaris. Clin Cosmet Investig Dermatol. 2015; 7: 300–307 • Newton JN, Mallon E, Klassen A, Ryan TJ, Finlay AY. The effectiveness of acne treatment: an assessment by patients of the outcome of therapy. Br J Dermatol. 1997;137:563-7 • Tasoula, E, et al. O impacto da acne vulgar na qualidade de vida e saúde psíquica em jovens adolescents na Grécia: resultados de pesquisa populacional. An. Bras. Dermatol. 2012; 87: 862-69 • Williams JI. Ready, set, stop Reflections on assessing quality of life and the WHOQOL-100 (U.S. version). J Clin Epidemiol. 2000; 53:13-7.
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
TERCEIRAS JORNADAS CIENTÍFICAS DE DERMATOLOGIA
RECENTEMENTE, O SERVIÇO DE DERMATOLOGIA REALIZOU AS TERCEIRAS JORNADAS CIENTÍFICAS COM A PARTICIPAÇÃO DE PRELECTORES NACIONAIS E INTERNACIONAIS, NOMEADAMENTE DE PORTUGAL E DO BRASIL. COM CO-ORGANIZAÇÃO DA TECNOSAÚDE E PARTICIPAÇÃO DE MAIS DE NOVE LABORATÓRIOS DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA, ULTRAPASSOU AS EXPECTATIVAS DO SERVIÇO, COM UMA MÉDIA 54 DE PARTICIPANTES NO LOCAL E 351 ONLINE.
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Dr. Juliano Vicumba Isaías Médico Dermatologista diferenciado em ImunoAlergologia cutânea e Mestre em Saúde Pública. Director do Serviço de Dermatologia do Hospital Américo Boavida e Docente em tempo parcial da Faculdade de Medicina da Universidade António Agostinho Neto.
O
Serviço de Dermatologia do Hospital Américo Boavida existe desde após a Independência, localizado no 5.º Andar, na ala B. Estruturalmente, tem uma área de consulta externa, com três consultórios, e uma área de internamento, com 23 camas e subunidades: Cirúrgica, Imuno-Alergologia Cutânea, um pequeno laboratório de Micologia e Parasitologia, Fototerapia e Vídeo Dermatoscopia Digital. O Serviço de Dermatologia apoia a pré-graduação (estudantes do 4.º e 6.º anos da Faculdade de Medicina da Universidade António A. Neto), em aulas práticas e estágio. É de referência nacional para formação de especialistas; outrossim, acolhe especialistas de distintas unidades hospitalares públicas e privadas para estágio de refrescamento de conhecimentos. Visão
Prestar cuidados assistenciais de qualidade, estabelecer intercâmbio com outros serviços nacionais e internacionais Missão
• Prestar cuidados de qualidade a cada doente, através da prática clínica integrada • Desenvolver actividade assistencial de qualidade e colaborar no ensino e investigação científica.
Dermatologia e Venereologia. Para além de conhecimentos científicos, adquiremse também boas relações interpessoais e princípios de boa convivência na adversidade. Uma das premissas do serviço é assegurar os três eixos, nomeadamente, ensino, investigação científica e extensão dos conhecimentos. No domínio do ensino, actualmente, o serviço tem um total de 28 internos de especialidade, dos quais do 1º, 2º, 3º e 4º anos, com seis especialistas formadores. Ao longo da sua história, já formou mais de 10 gerações de especialistas, colegas que estão, actualmente, a dignificar o exercício da profissão nas províncias de Huíla, Malanje e Huambo. No que concerne à investigação científica, assenta permanentemente nos trabalhos de investigação que constituem a base de desenvolvimento do serviço, quer do ponto de vista assistencial, como para o ensino. Sobre a extensão dos conhecimentos, o serviço promove workshops e jornadas científicas, ambientes onde os profissionais de saúde fazem intercâmbio de conhecimentos e trocam experiências. Também é ocasião ímpar para o serviço divulgar os seus trabalhos de investigação clínica. Recentemente, o Serviço de Dermatologia realizou as Terceiras Jornadas Científicas com a participação de prelectores nacionais e internacionais, nomeadamente de Portugal e do Brasil, destacando a participação dos internos de especialidade com comunicações livres e apresentação de pósteres e tendo havido um prémio para a melhor comunicação livre. A recente realização das Jornadas Científicas, nos dias 12, 13 e 14 de Maio, no Hotel Palmeiras, no distrito de Talatona, com coorganização com a Tecnosaúde e participação de mais de nove laboratórios da indústria farmacêutica, ultrapassou as expectativas do serviço, com uma média 54 de participantes no local e 351 online. Tradicionalmente, o Serviço de Dermatologia e Venereologia do Hospital Américo Boavida cumpre com a realização de eventos científicos de dois em dois anos, sempre que as condições objectivas e subjectivas estiverem reunidas.
Valores
O Serviço de Dermatologia é uma escola de formação para pré e pós-graduação em
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PERSPECTIVA
DERMATITE DA FRALDA MUDAR A FRALDA É UM ACTO ROTINEIRO PARA OS PAIS, CONTUDO, PODE TORNAR-SE UM PESADELO QUANDO A PELE DO BEBÉ NÃO ESTÁ SAUDÁVEL. TODOS OS PAIS JÁ SE INTERROGARAM “PORQUE É QUE A PELE DO MEU BEBÉ ESTÁ COM UMA ASSADURA? O QUE É QUE FAÇO AGORA?”.
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A
dermatite da fralda, mais conhecida por assadura da fralda, ocorre quando o bebé tem a pele muito sensível, a fralda fica húmida e existe contacto contínuo com a urina e as dejecções por muito tempo. Este problema é uma inflamação cutânea muito comum nas crianças e provoca uma sensação de desconforto e de queimadura. A dermatite da fralda pode ter origem irritativa, quando encontramos um agente causal da mesma, como é o caso da urina e das fezes em contacto prolongado com a pele, por exemplo, em episódios de diarreia. A mistura de fezes e urina origina um aumento do pH, o que activa as enzimas das fezes – lípases e protéases - que, por sua vez, são as responsáveis pela irritação da pele, deixando-a mais propensa e predisponível para a infecção por fungos (candidíase). Em casos de sensibilidade da pele, como, por exemplo, de atopia, podemos deparar-nos com dermatite da fralda devido a agentes químicos, resultante de resíduos de sabonetes, toalhitas ou outros produtos de higiene. Como prevenir a dermatite da fralda? A melhor forma de prevenir a dermatite da fralda é mudar frequentemente a fralda do bebé, especialmente aquando das dejecções. A utilização de cremes barreira também é aconselhada para proteger a pele, especialmente, quando esta já começa a dar os primeiros sinais de vermelhidão. A escolha deste deve ser de acordo com a sua composição. Os cremes que contenham na sua composição vitamina A e óxido de zinco são excelentes na reparação cutânea e na cicatrização.
Enquanto profissional de saúde, é importante desaconselhar a utilização de toalhitas que contenham álcool na muda da fralda do bebé, uma vez que vão secar, ainda mais, a pele. Quando a pele do bebé já está muito macerada e com manchas arredondadas, pode existir uma candidíase. Esta é causada por um fungo que existe no intestino sem provocar doença, mas que, na presença de dermatite da fralda, pode provocar infecção. Nesta situação, o recurso a um creme antifúngico pode ser necessário. Em suma, a vigilância e o cuidado da região da fralda é de extrema importância, para prevenir o rabinho assado dos bebés, pelo que a fralda deve ser mudada com frequência e com algum rigor. Em caso de dúvida, a consulta do dermatologista ou pediatra é sempre recomendada para manter a pele o mais saudável possível.
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
FUNDAÇÃO ANA CAROLINA, AO SERVIÇO DA CRIANÇA PORTADORA DE DOENÇAS NEUROLÓGICAS A FUNDAÇÃO ANA CAROLINA FOI CRIADA, EM 2016, POR PAULA MORAIS E FAMÍLIA, NO SEGUIMENTO DO NASCIMENTO DA SUA FILHA COM UMA DOENÇA NEUROLÓGICA. LOCALIZADA NA PROVÍNCIA DE LUANDA, A INSTITUIÇÃO TEM AJUDADO MAIS DE 50 CRIANÇAS CARENCIADAS PORTADORAS DE DOENÇAS NEUROLÓGICAS E AS SUAS FAMÍLIAS.
Objectivos Incluir Promovemos activamente a inclusão da criança na sociedade e a melhoria da sua qualidade de vida Reabilitar Oferecemos fisioterapia, terapia ocupacional e da fala, consultas de especialidade, ajudas técnicas, exames de diagnóstico, medicamentos, fraldas e outros bens de primeira necessidade Capacitar Orientação da família dentro da vivência saudável com a patologia da criança. Workshops e minicursos em diversas áreas
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3 áreas fundamentais da nossa intervenção com crianças • Fisioterapia e outras especialidades A nossa equipa acompanha e monitoriza o crescimento, estado nutricional e desenvolvimento puberal, higiene oral, evolução e aprimoramento das habilidades e competências motoras, comunicativas, funções cognitivas e habilidades socioafectivas. • Consultas de especialidade e exames de diagnótico São solicitados exames de acordo com o estado de saúde e/ou para diagnóstico da doença. A fundação custeia o pagamento dos exames, quer em entidades privadas como em públicas. Alguns parceiros disponibilizam consultas e tratamentos importantes para a saúde da criança. • Ajudas técnicas e medicamentos Algumas crianças não desenvolvem total independência em actividades como vestir, comer/beber, tomar banho, ir ao banheiro e higiene pessoal. É feita a avaliação para a prescrição de equipamentos de ajuda, como cadeiras adaptadas, de rodas, de banho, andarilhos, órteses, etc., que permitem a mobilidade e o posicionamento para ajudar na participação em actividades da vida diária. Após a avaliação médica, ajudamos a família na compra da medicação da criança e sempre em caso de doença. O apoio familiar está contemplado no cuidado integral da criança.
necessidade de construir um centro de fisioterapia e, mais tarde, a fundação. “Percebemos que as famílias estavam a enfrentar desafios enormes, devido à situação das crianças”, explica. Foi assim que, em 2016, nasceu a Fundação Ana Carolina, que através do Centro de Fisioterapia com o mesmo nome tem ajudado estas crianças na reabilitação psíquica e física nas áreas de fisioterapia, terapias ocupacional e da fala, consultas de especialidade, exames de diagnóstico, enfermagem, psicologia, ajudas técnicas, cadeiras de rodas, adaptadas e outros bens de primeira necessidade. Importância da intervenção precoce na infância. Hoje, a Fundação Ana Carolina não só tem o seu Centro de Neurodesenvolvimento, como apoia comunidades instituições que trabalham Emboraesejam muito diferentes entre si, ascom necessidades especiais, disfunções do foro neuro-cognitivo e/ou neuro-motor constituem um criançasoue perturbações famílias vulneráveis. para quem as vivência, sejam as crianças e as respectivas famílias, sejam Um dos desafio grandes objectivos da fundação os professores, educadores e auxiliares de educação, comunidade médica e em presididageral. por Paula Morais é a abertura de um centro maior, de modo a aumentar o número de Com a escolha adequada de atividades e terapias, equipamentos e programas criançasdomésticos apoiadasháe seguidas nas consultasPor deisso a nossa intervenção passa resultados surpreendestes. por trabalhar colaboração a família/cuidador especialidade e queemestas façamcom o diagnóstico de da criança. patologias. O espaço servirá, igualmente, como centro de dia para apoio escolar e actividades “As terapias estão voltadas para objectivos em de tempos livres (ATL), para um melhor termos de resultados a longo prazo e com a encaminhamento escolar e social. minimização de deformidades secundárias.”
Através de doações e parcerias, há sete anos que a Fundação Ana Carolina impacta positivamente a vida de milhares de crianças e adultos em Angola: + 113.735 em tratamentos, consultas e exames + 5.990 cestas básicas e kits anti-pobreza + 40 milhões de kwanzas angariados + 30 colaboradores (muitos de primeiro emprego), entre administrativos, médicos, técnicos e voluntários
S
egundo o último censo realizado em Angola, datado de 2014, cerca de 48,6% de crianças com deficiência apresentam deficiência a nível mental ou outras (cerca de 35%), o que pressupõe serem doenças do foro neurológico não diagnosticadas e/ou mais complexas, como, por exemplo, paralisias cerebrais, autismos, síndrome de Down, entre outras. Ana Carolina, a menina que deu nome a esta fundação, nasceu com síndrome de deficiência de transportador de glicose tipo 1, conhecida por GLUT 1-DS, uma doença neurológica rara, que causa atraso no desenvolvimento psicomotor geral e que afecta uma em cada 90 mil crianças no mundo. Travou várias batalhas e, em 2017, perdeu a vida para a doença. Paula Morais e a família mantêm viva a memória da pequena Ana Carolina, através desta fundação que apoia crianças com problemas neurológicos, principalmente, as de famílias mais carenciadas. Após o seu regresso a Angola, em 2013, depois de uma longa estadia no exterior em busca de respostas e tratamentos, e com a falta de instituições para darem seguimento ao tratamento de Ana Carolina, Paula Morais sentiu a
Como ajudar Doações mensais ou anuais para o apoio e continuidade das acções Voluntariado corporativo Facilitar o emprego aos pais de crianças da Fundação Ana Carolina Oferecer workshops para as famílias ou crianças Doações de produtos novos ou em óptimo estado (alimentos, roupas, produtos de higiene, etc.) Doações de recursos para a compra de produtos de necessidade básica
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
ESTADO DE EMERGÊNCIA AMBIENTAL GLOBAL – CONSEQUÊNCIAS PARA ANGOLA
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O NOSSO PLANETA ESTÁ À BEIRA DE UMA CRISE AMBIENTAL SEM PRECEDENTES. OS PROBLEMAS AMBIENTAIS VÃO-SE ACUMULANDO E AGRAVANDO À NOSSA VOLTA. O CRESCIMENTO POPULACIONAL, AS PRÁTICAS INDUSTRIAIS INAPROPRIADAS, A CORRUPÇÃO E A POBREZA CONTRIBUEM PARA UM CONSUMO MAIS ACELERADO DOS RECURSOS NATURAIS E A INTENSIFICAÇÃO DA DEGRADAÇÃO DO AMBIENTE. A NÃO SER QUE HAJA UMA ACÇÃO GLOBAL URGENTE, CONCERTADA E CONSISTENTE, O DESASTRE SERÁ INEVITÁVEL E O PLANETA DEIXARÁ DE SER UM HABITAT QUE PODE SUPORTAR VIDA HUMANA, ANIMAL E VEGETAL.
A
s manifestações a favor do ambiente, onde a principal preocupação são as mudanças climáticas, têm-se intensificado pelo mundo inteiro, com milhões de pessoas, na sua maioria jovens, a exigirem um compromisso mais sério por parte dos governos dos respectivos países, com acções imediatas para travar o aquecimento global e as mudanças climáticas. Mas quais são os grandes desafios ambientais actuais e as suas consequências num contexto global e para Angola? Fazemos aqui um pequeno resumo e, posteriormente, iremos publicar artigos mais detalhados sobre cada um dos desafios ambientais. Encorajamos o leitor a pesquisar e aprofundar os seus conhecimentos sobre este assunto de vital importância para as nossas vidas. Poluição A poluição é um dos maiores problemas ambientais globais. Existem várias formas de poluição: atmosférica, água, solo, sonora, luminosa, térmica e radioactiva. Todos os tipos de poluição estão interligados e influenciamse uns às outros. Por exemplo, o dióxido de carbono e o metano são gases com efeito de estufa, que têm impacto nas mudanças climáticas. Só a poluição atmosférica causa sete milhões de mortes por ano. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), Angola é um dos países africanos com maior taxa de mortalidade associada à poluição atmosférica, com 50 em cada 100 mil pessoas a morrerem devido à exposição a ar exterior poluído. A qualidade do ar nas principais cidades é afectada pelos gases produzidos pelos automóveis e geradores e pela queima do lixo. Por outro lado, as queimadas, que normalmente acontecem no final do cacimbo, geram quantidades enormes de monóxido e dióxido de carbono, que, por sua vez, podem causar problemas pulmonares e cardíacos. Mudanças climáticas Nunca na história da civilização moderna o clima da Terra mudou tão rapidamente, como está a acontecer agora, principalmente, como resultado das actividades humanas, com impactos ambientais, económicos e sociais de âmbito global e escala sem precedentes. Julho de 2019 foi o mês com a temperatura global mais alta de que há registo e o aquecimento global é o principal suspeito. Os gases com efeito de estufa são os principais causadores do aquecimento global e das mudanças climáticas, retendo o calor do sol e aquecendo a superfície da Terra.
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diariamente em, Angola, principalmente na zona Sul (províncias do Cunene, Cuando Cubango, Huila e Namibe), afectada, desde 2018, por uma seca severa. Isto constitui razão imperativa para a mobilização acelerada de recursos para mitigação e adaptação ao fenómeno.
O aumento dos gases com efeito de estufa está associado, principalmente, à pecuária (responsável por 18% da emissão de gases com efeito de estufa), à desflorestação, à destruição dos ecossistemas marinhos, ao aumento da população, à queima de combustíveis fósseis e resíduos sólidos, aos incêndios florestais e às queimadas. O aumento da temperatura global traz consequências desastrosas, colocando em risco a sobrevivência da flora e fauna do planeta, incluindo os seres humanos. Os piores impactos das mudanças climáticas incluem o derretimento da massa de gelo nos pólos, que, por sua vez, causa a subida do nível do mar, produzindo inundações e ameaçando ambientes costeiros. As mudanças climáticas aumentam a frequência e intensidade dos fenómenos climáticos (mais secas, incêndios, inundações), causam a morte de espécies animais e vegetais, ameaçam a segurança alimentar e destroem os recursos económicos. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), as alterações climáticas matam
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Degradação dos solos A degradação dos solos afecta quase metade da população do planeta. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), cerca de 33% dos solos está degradado devido à erosão, salinização, compactação, acidificação e poluição química. As principais causas são a agricultura não sustentável, a mineração, a pecuária e a contaminação química. As consequências são desastrosas, influenciando a segurança alimentar, o acesso à água limpa e ao ar respirável, que são regulados pelo solo e plantas. Isto também impulsiona migrações em massa e o aumento dos conflitos violentos. A degradação do solo também contribui para as mudanças climáticas e vice-versa. De acordo com a FAO, há três causas directas da degradação do solo em Angola: agricultura insustentável, desflorestação/ uso insustentável das florestas e sobrepastoreio das áreas de pasto. A alta taxa de crescimento populacional, as queimadas descontroladas e o efeito das mudanças climáticas também contribuem para a degradação dos solos em Angola. Gestão de resíduos O crescimento populacional e o consumo de produtos industrializados resultam no aumento do volume de resíduos (lixo) descartados anualmente. Os resíduos sólidos, normalmente, são enterrados em aterros sanitários ou incinerados, o que é extremamente prejudicial para o meio ambiente. Quando aterrados, os resíduos orgânicos decompõem-se, atraindo microorganismos (bactérias e fungos, alguns patogénicos) e insectos, que transmitem doenças (infecções e viroses). Também acabam por emitir gases tóxicos (alguns com efeito de estufa) e um odor desagradável. Por fim, os resíduos orgânicos líquidos (no processo de decomposição) podem, potencialmente, penetrar o solo e poluir as águas subterrâneas. Por outro lado, quando se efectuam queimadas, como forma de tratamento do lixo, o fumo emitido contribui para a poluição do ar.
As embalagens plásticas, os resíduos electrónicos e os resíduos nucleares (todos eles tóxicos) apresentam enormes riscos para a saúde, mas, ainda assim, grande parte do lixo gerado globalmente vai parar aos rios e oceanos. A redução ou eliminação de resíduos é um dos maiores problemas ambientais actuais. Na Europa, a taxa média de reciclagem é de 45%, enquanto em Angola é praticamente zero. Isto quer dizer que todo o lixo produzido em Angola vai parar aos aterros, ao mar ou é incinerado, incluindo o lixo tóxico. [Ver artigo A calamidade do lixo nos grandes centros urbanos em Angola] [Ver campanha da EcoAngola sobre Lixo e Reciclagem] Superpopulação A população do planeta está a atingir níveis insustentáveis, pois enfrenta escassez de recursos como água, combustível e alimentos. A agricultura intensiva, praticada para produzir alimentos, danifica o meio ambiente através do uso de fertilizantes e pesticidas químicos, da emissão de metano (gás de efeito de estufa 30 vezes mais poluente que o dióxido de carbono) da pecuária e da degradação dos solos. A superpopulação é um dos maiores problemas ambientais actuais. África e a Ásia (Sul e Este) são os maiores contribuidores para o crescimento populacional global. Angola tem uma das maiores taxas de crescimento populacional do mundo: 3,1% ao ano. Exaustão dos recursos naturais A humanidade já consome mais recursos naturais do que o planeta é capaz de repor. O planeta atingirá o limite do consumo sustentável de recursos regeneráveis disponíveis para este ano no dia 28 de Julho (o chamado dia da sobrecarga da Terra, calculado pela organização internacional Global Footprint Network). A cada ano, a população mundial consome mais terras aráveis,
água, pastagens, áreas de pesca e florestas, entre outros. Além disso, emite muito mais dióxido de carbono do que as florestas e oceanos do mundo podem absorver. Por isso, o dia da sobrecarga da Terra acontece mais cedo, a cada ano. A população mundial consome, actualmente, o correspondente a 1,75 vezes o planeta Terra. Se toda a humanidade tivesse os mesmos hábitos de consumo dos cidadãos dos Estados Unidos, teriam de ser cinco Terras. Reflexão: com o tempo, estamos a adaptarmo-nos às tecnologias e à rápida evolução da humanidade e, com isso, há um aumento significativo nos nossos hábitos de consumo. Se África seguir os mesmos estilos de vida que os países desenvolvidos (sem sustentabilidade), iremos sofrer consequências de forma catastrófica, sendo as camadas sociais mais baixas as mais afectadas (mais fome, elevados índices de mortalidade e mais pobreza). Desflorestação As florestas absorvem dióxido de carbono e produzem oxigénio, além de ajudarem a regular a temperatura e as chuvas, são reservas de biodiversidade e forma de subsistência de inúmeras comunidades fora das grandes cidades. Todos os anos, a cobertura de árvores é reduzida para dar lugar à criação de gado, plantações de soja ou óleo de palma, entre outras monoculturas agrícolas, e também para a produção de madeira e carvão. De 2001 a 2018, a diminuição de cobertura arbórea global foi de 361 milhões de hectares, equivalentes a 9% da cobertura total. Hoje, cerca de 30% da área terrestre do planeta é coberta por florestas, mas cerca de 26 milhões de hectares de floresta são destruídos todos os anos. Em Angola, as florestas estão a ser destruídas a um ritmo assustador, quer através da queima ou corte completo das árvores, para produção de lenha e carvão ou para a indústria da madeira. Entre 2001 a 2018, estima-se que Angola perdeu 2,69 milhões de hectares de cobertura arbórea. [Ver artigos sobre a Floresta da Cumbira e Queimadas: Calamidade ou Mito] [Ver campanha da EcoAngola sobre a
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Desflorestação] Perda da biodiversidade A biodiversidade é a característica mais complexa e vital do nosso planeta. Os sistemas ecológicos, que levaram milhões de anos a evoluir, desenvolver e estabilizar, encontram-se em perigo iminente. A ONU estima que cerca de um milhão de espécies estejam em risco de extinção e a comunidade científica global admite que nos encontramos no início de uma sexta extinção em massa, devido à perda massiva de biodiversidade. Ao contrário das extinções em massa no passado, causadas por erupções vulcânicas, asteroides e mudanças climáticas naturais, a crise actual é, maioritariamente, causada pelas actividades humanas. A pecuária é um dos principais factores que contribui para a perda de biodiversidade, através da desmatação para o aumento das áreas agropecuárias, contaminação do solo e da água e emissão de gases de efeito de estufa. A caça, o desmatamento e as queimadas, em Angola, põem em risco de extinção inúmeras espécies de animais e plantas, algumas das quais só existem no país, e potencialmente algumas nunca antes descobertas.
de água persiste. As secas, geralmente, são caracterizadas como períodos em que a precipitação está abaixo do normal e podem ser sazonais ou permanentes. O equilíbrio dentro dos ecossistemas e a manutenção da vegetação nas florestas são componentes críticos do ciclo da água. O desmatamento desencadeia e intensifica as secas e erosão dos solos, reduzindo a sua capacidade de reter água e permitindo que a desertificação ocorra facilmente. A seca no Sul de Angola afecta 2,3 milhões de pessoas. Para além do Cunene, que é a região mais afectada, a seca abrange intensamente também o Cuando Cubango, Huíla, Namibe e Benguela. [Ver artigo sobre as Regiões secas em Angola] Recomendações e soluções • Substituir os combustíveis fósseis por energias renováveis • Travar a desflorestação e reflorestar as zonas desflorestadas • Reduzir o consumo e produção de carne • Ajustar/adaptar os processos industriais • Aplicar práticas agrícolas sustentáveis • Reusar, reciclar e reduzir o consumo • Reduzir o consumo de plásticos de uso único (sacos, palhinhas, copos, etc.) • Promover a sustentabilidade e conservação ambiental • Promover o ecoturismo sustentável. Por fim, promover uma economia verde, baseada na partilha, colaboração, solidariedade, resiliência, oportunidade e interdependência. Pode começar o seu dever aderindo ao Movimento Verde da EcoAngola, ajudando a promover a sustentabilidade e conservação ambiental.
[Ver campanha da EcoAngola sobre Biodiversidade] Seca A seca é um desastre “natural” que pode causar graves impactos económicos e sociais, porque a vida humana, vegetal e animal depende da água. Os sistemas de produção (agricultura e outras indústrias), a população e os sistemas naturais sofrem quando a falta
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Conclusões A história de humanidade está cheia de conflitos políticos, geográficos e religiosos, mas o maior conflito que a humanidade está a viver, actualmente, é entre o homem e a natureza, que pode, a médio e longo prazo, extinguir a vida no nosso planeta (pelo menos, como a conhecemos hoje). É necessária uma acção global concertada e urgente para travar a degradação ambiental, as mudanças climáticas e o aquecimento global. Precisamos de agir localmente para evitar desastres globais. Angola necessita urgentemente de políticas e estratégias claras e consistentes para protecção do meio ambiente, apoiadas por campanhas de sensibilização e educação ambiental, envolvendo escolas e comunidades.
NOTÍCIA
99% DA POPULAÇÃO RESPIRA AR QUE EXCEDE LIMITES DE QUALIDADE QUASE TODA A POPULAÇÃO MUNDIAL (99%) RESPIRA AR QUE EXCEDE OS LIMITES DE QUALIDADE RECOMENDADOS PELA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) E PÕE EM PERIGO A SUA SAÚDE. UM NÚMERO RECORDE DE MAIS DE SEIS MIL CIDADES, EM 117 PAÍSES, ESTÁ A MONITORIZAR A QUALIDADE DO AR, MAS AS PESSOAS QUE NELAS VIVEM CONTINUAM A RESPIRAR NÍVEIS POUCO SAUDÁVEIS DE PARTÍCULAS FINAS E DIÓXIDO DE AZOTO. QUEM VIVE EM PAÍSES DE BAIXO E MÉDIO RENDIMENTO SOFRE AS MAIORES EXPOSIÇÕES.
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actualização de 2022 da base de dados sobre a qualidade do ar, publicada na véspera do Dia Mundial da Saúde, cujo tema, este, ano foi “O nosso planeta, a nossa saúde”, introduz, pela primeira vez, medições terrestres das concentrações médias anuais de dióxido de azoto (NO2), um poluente urbano comum e precursor de partículas e ozono. Inclui também medições de partículas com diâmetros iguais ou inferiores a 10 µm (MP10) ou 2,5 µm (MP2.5). Ambos os grupos de poluentes têm origem, principalmente, em actividades humanas relacionadas com a combustão de combustíveis fósseis. A nova base de dados sobre a qualidade do ar é a mais abrangente até à data, em termos de cobertura da exposição à poluição atmosférica no terreno. Cerca de duas mil mais cidades e assentamentos humanos registam, agora, dados da monitorização terrestre de partículas MP10 e/ou MP2.5, em comparação com a última atualização. Isto significa que o reporte de dados aumentou quase seis vezes, desde que a base de dados foi lançada, em 2011. Entretanto, a base de evidências sobre os danos que a poluição atmosférica causa ao corpo humano tem vindo a crescer rapidamente e aponta para danos significativos causados
mesmo por baixos níveis de muitos poluentes atmosféricos. As partículas, especialmente MP2,5, são capazes de penetrar profundamente nos pulmões e entrar na corrente sanguínea, afectando os sistemas cardiovascular, cerebrovascular e respiratório. Há também cada vez mais evidências de que as partículas afectam outros órgãos e causam outras doenças. O NO2 está associado a doenças respiratórias, especialmente a asma, que causa sintomas respiratórios, como tosse ou falta de ar, internamentos hospitalares e visitas a serviços de urgência. “Os desafios energéticos de hoje destacam a importância de acelerar a transição para sistemas energéticos mais limpos e saudáveis”, disse o Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, director geral da OMS. “Os elevados preços dos combustíveis fósseis, a segurança energética e a urgência de enfrentar o duplo desafio da poluição atmosférica e das alterações climáticas realçam a necessidade urgente de avançar mais rapidamente para um mundo muito menos dependente dos combustíveis fósseis”. Nos países de baixo e médio rendimento, menos de 1% das cidades têm qualidade do ar que cumpre os limiares recomendados pela OMS.
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ENTREVISTA
“SÃO ROBUSTAS AS EVIDÊNCIAS DA EFICÁCIA DA ACTIVIDADE FÍSICA NA SAÚDE MENTAL” AO SE ASSINALAR O DIA MUNDIAL DA HIPERTENSÃO E O DIA MUNDIAL DO NÃO FUMADOR, LEMBRAMOS A IMPORTÂNCIA DA PRÁTICA DE ACTIVIDADE FÍSICA. UMA CAMINHADA É SEMPRE UMA BOA APOSTA E NÃO REQUER GRANDE PREPARAÇÃO FÍSICA, APORTANDO GRANDES BENEFÍCIOS DA CABEÇA AOS PÉS. A DRA. EDNA DE ALEGRIA ABORDA ESTES BENEFÍCIOS, QUE SE REFLECTEM TAMBÉM AO NÍVEL DA SAÚDE MENTAL, E ALGUNS DOS CUIDADOS QUE SE DEVEM TER NA PREVENÇÃO E ALÍVIO DA DOR.
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De entre essas técnicas ou recursos, vale a pena citar a electroestimulação nervosa transcutânea, que é a aplicação de uma corrente eléctrica de baixa intensidade, através de eléctrodos aderidos na pele. Vai actuar ao nível de sistema nervoso central, para competir com as fibras que levam a informação da dor. A que tipo de sinais e sintomas os utentes devem estar atentos para consultarem um profissional?
Dra. Edna de Alegria Licenciada em Fisioterapia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, no Brasil. Pós-graduada em Fisioterapia Neurofuncional Adulto e Infantil pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais. Formada em Treinamento e Reabilitação de Atletas de Alta Performance pela Academia do São Paulo Futebol Clube, no Brasil. Fez parte da equipa médica do Comité Olímpico Angolano para os Jogos Pan-Africanos de 2018. Actua em Fisioterapia geral e específica para Neurofuncional e Desportiva.
S
ão vários os estudos que atestam a redução dos sintomas de stress, depressão, ansiedade e doença mental com a prática de exercício físico. Na sua opinião, como é que Angola encara esta situação?
No nosso país, a saúde mental não tem ainda a devida atenção e palco, para o seu adequado cuidado e prevenção. Por mais que esteja amplamente difundida como grande aliada do bem-estar, a prática da actividade física ainda se restringe muito somente ao lado físico, apesar das várias e robustas evidências sobre a sua eficácia na saúde mental, desde a prevenção ao tratamento, assim como na sua manutenção. Quais são as doenças mais comuns que afectam o aparelho locomotor e que mais incomodam os pacientes?
As doenças do aparelho locomotor que mais pacientes levam aos nossos consultórios são as Artroses (gonartroses) e as Discopatias (hérnias de disco), principalmente. Como é que podemos definir a dor e como é que a podemos aliviar e tratar?
A dor é uma alteração sensorial real, ou não muito relacionada com a capacidade de percepção de cada um, assim como da sua experiência antecedente. No tratamento da dor, o primeiro passo para o sucesso é a identificação da sua causa, mas no alívio pode recorrer-se a vários recursos médico-medicamentosos, assim como a técnicas como a acupuntura. Existem, hoje, várias técnicas e recursos a favor da fisioterapia para tratamento ou alívio da dor, que podem ser aplicadas de acordo com a causa e o nível de percepção de cada um, além do tempo de manifestação.
Deve-se consultar um profissional de saúde perante todo e qualquer sinal ou sintoma de anormalidade, pois a ajuda antecipada contribui para um diagnóstico e resolução precoces ou, até, para a prevenção de complicações. Qual a diferença entre uma lesão muscular e uma dor comum pós-treino?
A lesão muscular é acompanhada de edema à volta do local, hematoma, dor pulsátil e impotência funcional do membro. Já a simples dor pós-treino (de realçar que é, geralmente, causada por micro-lesões musculares) não vai ter, na maior parte das vezes, nenhum destes sintomas e tem a sua resolução autolimitada. Pelo contrário, a lesão muscular, normalmente, precisa de uma intervenção médico-medicamentosa, podendo, inclusive, ser cirúrgica e com consequente reabilitação para devolver a funcionalidade. É importante tomar medicação para curar a dor pós-treino ou pode recorrer-se a outros métodos?
A medicação deve ser sempre prescrita por um profissional de saúde, que deve, previamente, analisar os critérios e necessidades para uma correcta e eficaz prescrição. Para a dor pós-treino, as técnicas de recuperação, como banhos de imersão em crio e compressão com mangas, são eficazes e têm substituído bem o uso de analgésicos e anti-inflamatórios. A alimentação pode ajudar o atleta na recuperação do corpo? E antes da prática de exercício físico, o que é recomendável comer?
Uma alimentação rica e equilibrada é o principal adjuvante de quem quer ter um estilo de vida saudável e um corpo atlético. Fornece os nutrientes necessários para o combate de muitas das avitaminoses que podem estar na base da propensão a lesões. Antes da prática de qualquer actividade física, uma alimentação leve e rica em termogénicos é uma boa aposta.
AS DOENÇAS DO APARELHO LOCOMOTOR QUE MAIS PACIENTES LEVAM AOS NOSSOS CONSULTÓRIOS SÃO AS ARTROSES (GONARTROSES) E AS DISCOPATIAS (HÉRNIAS DE DISCO), PRINCIPALMENTE.
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NOTÍCIA
ATÉ 5 MILHÕES DE MORTES POR ANO EVITADAS COM MAIS ACTIVIDADE FÍSICA
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ATÉ CINCO MILHÕES DE MORTES POR ANO PODERIAM SER EVITADAS SE A POPULAÇÃO, EM TODO O MUNDO, FOSSE MAIS ACTIVA. EM PLENA PANDEMIA, A ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) LANÇOU, EM 2020, NOVAS DIRECTRIZES SOBRE A ACTIVIDADE FÍSICA E O COMPORTAMENTO SEDENTÁRIO, QUE ENFATIZAM QUE TODAS AS PESSOAS, DE TODAS AS IDADES E CAPACIDADES, PODEM SER FISICAMENTE ACTIVAS E QUE TODO O TIPO DE MOVIMENTO CONTA. FIQUE A CONHECER AS RECOMENDAÇÕES DA OMS E A IMPORTÂNCIA DO EXERCÍCIO FÍSICO NO CAMINHO PARA UMA VIDA MAIS SAUDÁVEL.
A
actividade física praticada de modo regular é essencial para a prevenção e controlo das doenças não transmissíveis. Nesse sentido, a Organização Mundial da Saúde (OMS) elaborou um referencial que estipula recomendações para a sua prática regular, de acordo com as várias fases da vida. As directrizes recomendam, pelo menos, 150 a 300 minutos de actividade aeróbica moderada a vigorosa, por semana, para todos os adultos, incluindo quem vive com doenças crónicas ou incapacidade, e uma média de 60 minutos por dia para crianças e adolescentes. A actividade física regular é fundamental para prevenir e controlar doenças cardíacas, diabetes tipo 2 e cancro, bem como para reduzir os sintomas de depressão e ansiedade e o declínio cognitivo, melhorar a memória e exercitar a saúde do cérebro. As directrizes da OMS incentivam as mulheres a manterem actividades físicas regulares, durante a gravidez e após o parto. Também destacam os valiosos benefícios para a saúde da actividade física em pessoas que vivem com incapacidades. Pessoas idosas (com 65 anos ou mais) são aconselhadas a adicionar actividades que se foquem no equilíbrio e coordenação, bem como no fortalecimento muscular, para ajudar a prevenir quedas e melhorar a saúde. “Ser fisicamente activo é fundamental para a saúde e o bem-estar e pode adicionar anos à vida e vida aos anos”, disse o director geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus. “Cada movimento conta, especialmente agora que gerimos as restrições da pandemia de Covid-19. Devemos todos nos mover, todos os dias, com segurança e criatividade”.
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Em cada fase da vida, a OMS recomenda Cada movimento conta Toda actividade física é benéfica e pode ser realizada como parte do trabalho, desporto, lazer ou transporte, mas também por meio da dança, brincadeiras e tarefas domésticas quotidianas, como jardinagem e limpeza. “Qualquer tipo de actividade física, de qualquer duração, pode melhorar a saúde e o bem-estar, mas quanto mais exercício melhor”, reforçou Ruediger Krech, director de Promoção da Saúde da OMS. “Se precisa passar muito tempo sentado, quieto, seja no trabalho ou na escola, deve praticar mais actividade física para combater os efeitos prejudiciais do comportamento sedentário”. A OMS incentiva os países a adoptarem as directrizes globais para desenvolver políticas nacionais de saúde, em apoio ao plano de acção global sobre actividade física 20182030. O documento foi aprovado por líderes globais de saúde, na 71.ª Assembleia Mundial da Saúde, em 2018, para reduzir a inactividade física em 15%, até 2030. Combater o sedentarismo De acordo com a OMS, cerca de 27,5% dos adultos e 81% dos adolescentes não praticam a quantidade necessária de actividade física para o seu grupo etário. Este facto perdura há mais de uma década, não se prevendo melhorias no curto prazo. Existem também desigualdades notáveis: os dados mostram que, na maioria dos países, meninas e mulheres são menos activas do que meninos e homens e que há diferenças significativas nos níveis de actividade física entre grupos económicos de alta e baixa renda e entre países e regiões.
DE ACORDO COM A OMS, CERCA DE 27,5% DOS ADULTOS E 81% DOS ADOLESCENTES NÃO PRATICAM A QUANTIDADE NECESSÁRIA DE ACTIVIDADE FÍSICA PARA O SEU GRUPO ETÁRIO. ESTE FACTO PERDURA HÁ MAIS DE UMA DÉCADA, NÃO SE PREVENDO MELHORIAS NO CURTO PRAZO.
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Crianças e adolescentes (5 a 17 anos) 60 minutos por dia de actividade física moderada a vigorosa, ao longo da semana, sendo que a maior parte deverá ser aeróbica 3 dias por semana de actividade aeróbica de intensidade vigorosa, assim como actividade física para fortalecimento muscular e ósseo. Em crianças e adolescentes, a actividade física melhora da aptidão física (aptidão cardio-respiratória e muscular), saúde cardiometabólica (pressão arterial, dislipidemias, glicose e resistência à insulina), saúde óssea, cognição (desempenho académico e função executiva), saúde mental (redução dos sintomas de depressão) e redução da adiposidade. Adultos (18 a 64 anos) 150 a 300 minutos de actividade física de intensidade moderada, por semana, ou 75 a 150 minutos de actividade física de intensidade vigorosa. 2 dias por semana de actividades de fortalecimento muscular de intensidade moderada ou superior, que envolvam os principais grupos musculares. Em adultos, a actividade física diminui a mortalidade por todas as causas, mortalidade por doenças cardiovasculares, incidência da hipertensão, incidência de alguns tipos de cancro, incidência da diabetes tipo 2, melhora a saúde mental (redução dos sintomas de ansiedade e depressão), a saúde cognitiva e o sono. A adiposidade corporal também pode melhorar. Idosos (+ 65 anos) 3 dias por semana de actividades físicas multimodais que promovam o equilíbrio e o treino de força, de intensidade moderada ou superior, de modo a prevenir as quedas. A par de todos os benefícios enumerado no caso dos adultos, em idosos, a actividade física também ajuda a prevenir quedas e lesões relacionadas, o declínio da saúde óssea e da capacidade funcional. Mulheres grávidas e no pós-parto 150 minutos de actividade física aeróbica de intensidade moderada. As mulheres que, antes da gravidez, já praticavam exercício de intensidade vigorosa podem continuar a fazê-lo, durante a gravidez e o pós-parto. Estas recomendações estão indicadas para todas as mulheres grávidas ou no pós-parto, caso não haja contraindicações. Nas mulheres grávidas e no pós-parto, a actividade física proporciona uma diminuição do risco de pré-eclâmpsia, hipertensão gestacional, diabetes gestacional, ganho excessivo de peso, complicações no parto e depressão pós-parto, menores complicações no recém-nascido, efeitos adversos do peso ao nascer e risco de natimortalidade.
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TEMA ENTREVISTA DE CAPA
“RECONHECEMOS A NECESSIDADE DE DEMOCRATIZAR O ACESSO AOS CUIDADOS DE SAÚDE EM ANGOLA” A ROCHE FARMACÊUTICA É, ACTUALMENTE, A EMPRESA LÍDER NOS CUIDADOS DE SAÚDE PERSONALIZADOS. OFERECE MEDICAMENTOS INOVADORES E TESTES DE DIAGNÓSTICO, DESENVOLVIDOS COM BASE NA SUA EXPERIÊNCIA CIENTÍFICA, TECNOLÓGICA E DE DADOS, ASSEGURANDO, ASSIM, QUE AS PESSOAS POSSAM TER UMA VIDA MELHOR. FUNDADA EM 1896, EM BASILEIA, NA SUÍÇA, A ROCHE CONTA COM MAIS DE 125 ANOS DE INVESTIGAÇÃO E INOVAÇÃO CONTÍNUAS, POR FORMA A ASSEGURAR O MELHOR TRATAMENTO PARA OS DOENTES EM TODO O MUNDO. EM 2021, 16,4 MILHÕES DE PESSOAS FORAM TRATADAS COM MEDICAMENTOS ROCHE E 32 DOS MEDICAMENTOS PERTENCENTES À LISTA DE MEDICAMENTOS ESSENCIAIS DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) SÃO DA ROCHE. NESTA ENTREVISTA, O DR. EUGENE NWOKE, COUNTRY MANAGER PARA OS PAÍSES PERTENCENTES À ÁFRICA FRANCÓFONA, OCIDENTAL, CENTRAL E LUSÓFONA, FALA-NOS SOBRE O TRABALHO DESENVOLVIDO POR ESTES LABORATÓRIOS, PARTICULARMENTE NOS PAÍSES AFRICANOS DE LÍNGUA OFICIAL PORTUGUESA.
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Dr. Eugene Nwoke Country Manager para os Países Pertencentes à África Francófona, Ocidental, Central e Lusófona na Roche
o talento à nossa disposição, aliado a uma vontade política significativa, podemos fazer as mudanças no ecossistema de saúde que os nossos cidadãos merecem.
Q
ue principais desafios o Dr. Eugene Nwoke já enfrentou, e continua a enfrentar, enquanto Country Manager da Roche?
É possível que sejam semelhantes aos de muitos líderes em saúde em África. Estamos perante uma situação em que os nossos sistemas de saúde não são suficientemente resilientes para fazer frente à carga de doença no continente. Temos uma infraestrutura relativamente fraca, baixa sensibilização da população sobre doenças e saúde e, desta forma, pouca tendência para procurar assistência médica. Para piorar a situação, temos a fraca capacidade do sistema de saúde, agravada pela migração de talento para a Europa e a América. Os desafios de qualquer líder em saúde em África existem neste contexto: como podemos melhorar a qualidade dos cuidados de saúde em África, enquanto se rema contra a maré? Contudo, sabemos que algumas das soluções ou ideias mais importantes desenvolvidas pela humanidade surgiram em circunstâncias muito difíceis e estou bastante confiante de que, com
Enquanto laboratório líder, de que forma a Roche investe em África, nomeadamente, em Angola, no sector da saúde?
Em África, temos uma história rica de trabalho, no sector da saúde, nos últimos 70 anos. Actualmente, estamos presentes em 40 países e, à data de 2019, conseguimos fazer chegar os nossos medicamentos a 725 mil doentes. Recentemente, colaborámos com o Instituto de Oncologia em Luanda (IACC) e participámos em várias sessões de co-criação com a Direcção Nacional de Saúde Pública (DNSP) angolana, avaliando, de forma holística, a jornada do doente no cancro e, em conjunto com as autoridades competentes, temos vindo a ser, cada vez mais, intervenientes na capacitação com infraestruturas de diagnóstico e formação de quadros, assim como na disponibilização de terapêuticas-alvo para o tratamento de vários tipos de cancro. Reconhecemos a necessidade de democratizar o acesso aos cuidados de saúde em Angola e, recentemente, apoiámos a criação das instalações de Imunohistoquímica no Lubango, o que deverá reduzir as dificuldades enfrentadas por alguns doentes, que têm de percorrer distâncias, por vezes, muito longas para aceder aos serviços de diagnóstico em Luanda.
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Que principais inovações da Roche contribuíram para o desenvolvimento da saúde da população africana?
Enquanto líder global em várias áreas terapêuticas, a Roche tem sido pioneira na inovação, com foco em áreas clínicas como a oncologia, a neurociência, a oftalmologia e a hematologia, entre outras. Só no ano passado, investimos, globalmente, cerca de 13,7 mil milhões de francos suíços em investigação e desenvolvimento, movidos pela paixão e curiosidade pela ciência e inovação, para responder a alguns dos desafios mais urgentes na área da saúde. Em Angola, temos vindo a trabalhar no sentido de melhorar as infraestruturas de diagnóstico do cancro, a disponibilização de terapêuticasalvo para oncologia, colaborando activamente na criação do Programa Nacional de Controlo do Cancro.
“CERTAMENTE QUE HOUVE PONTOS POSITIVOS E ENSINAMENTOS A RETIRAR DA PANDEMIA. PENSO, NATURALMENTE, QUE A PANDEMIA TEVE CONSEQUÊNCIAS DEVASTADORAS. PERDEMOS MILHÕES DE PESSOAS PARA ESTA PANDEMIA, A ECONOMIA GLOBAL SOFREU UM DURO GOLPE E O IMPACTO FOI TALVEZ MAIOR NAS ECONOMIAS EMERGENTES, COMO A NOSSA”. Na sua opinião, a pandemia aproximou ou prejudicou os mercados?
Certamente que houve pontos positivos e ensinamentos a retirar da pandemia. Penso, naturalmente, que a pandemia teve consequências devastadoras. Perdemos milhões de pessoas para esta pandemia, a economia global sofreu um duro golpe e o impacto foi talvez maior nas economias emergentes, como a nossa. Por outro lado, gostaria de reconhecer o enorme esforço dos profissionais de saúde e líderes locais no combate à pandemia em África. Ao que parece, a pandemia também galvanizou a vontade política de investir na saúde e eu aproveitaria esta oportunidade para lutar por ainda mais investimento público na saúde e também para apelar a todos os actores do sector da saúde que procurem formas de colaborar. Na Roche, encontramo-nos num processo activo de co-criação e colaboração com os nossos diferentes parceiros, para melhorar o acesso a cuidados de saúde de qualidade em África.
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Pode partilhar a sua opinião e perspectiva, enquanto líder no sector da saúde?
Para responder a esta questão, gostaria de realçar a necessidade de investimento no sector da saúde, por parte dos intervenientes no sector público e privado, para permitir o acesso, que tanto desejamos, dos nossos cidadãos à qualidade. Estamos habituados a olhar para os orçamentos de saúde como um custo e creio que isso limita a dimensão dos gastos que, normalmente, são feitos em saúde. Contudo, é importante mudar essa perspectiva e pensar nos gastos em saúde como o investimento de valor que são e os impulsionadores do crescimento económico exponencial que podem ser. Que impacto do seu esforço espera ver reflectido no futuro do sector da saúde nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa?
Na Roche, idealizamos um futuro com sistemas de saúde sustentáveis em África, em que todas as pessoas tenham acesso, do ponto de vista financeiro, a diagnósticos e a tratamentos inovadores, com investigação e desenvolvimento com foco nas necessidades de saúde da população africana, e que os cuidados de saúde sejam vistos como um investimento que estimula a inovação, e não como um custo numa rubrica orçamental. Este futuro que idealizamos só será possível através de parcerias sólidas com os intervenientes, em todo o percurso do doente nas clínicas, bem como com aqueles que, no ecossistema de saúde mais amplo, têm um papel a desempenhar no estabelecimento de políticas e estruturas de saúde sólidas. Quero ver um futuro sector de saúde angolano em que se construam parcerias para atingir o objectivo de proporcionar cuidados de saúde acessíveis a todos. Tendo em conta as necessidades específicas de um país como Angola, qual é a sua opinião sobre um regime contributivo para a população, como programas sociais?
Creio que temos de considerar duas questões muito importantes, quando falamos sobre a prestação de cuidados de saúde a toda a população. Como podemos disponibilizar cuidados de saúde a todos os angolanos, independentemente das suas possibilidades económicas? Como podemos garantir que o sistema funciona para todos? A segunda questão refere-se ao financiamento da inovação. Como criar um sistema de saúde comparticipado, em que se reconheça o valor da inovação na saúde, o valor de novas soluções que procuram curar algumas das doenças mais difíceis de tratar que afectam a humanidade e os nossos cidadãos? Resumindo, na minha opinião, um esquema contributivo robusto, que permita o acesso de todos, mantendo o acesso a tratamentos de qualidade, teria um impacto positivo para os nossos cidadãos.
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TEMA ENTREVISTA DE CAPA
“UM NÚMERO SIGNIFICATIVO DE HIPERTENSOS DESCONHECE A SUA CONDIÇÃO”
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relatada e taxas de controlo da hipertensão. Indivíduos de sociedades ocidentais, normalmente, têm maior prevalência de hipertensão e valores mais altos de pressão arterial do que aqueles oriundos de outras regiões do mundo, com essa diferença a diminuir à medida que os não ocidentais se adaptam à cultura e estilo de vida ocidentais. Em particular, os indivíduos mais aculturados têm uma pressão arterial sistólica (PAS) média quatro milímetros de mercúrio (mmHg) maior do que os menos aculturados. É importante lembrar que o número de adultos com hipertensão, em 2025, também foi previsto aumentar em cerca de 60%, para um total de 1,56 mil milhões.
Dr. Pedro Sabola Médico Assistente de Cardiologia e Ecocardiografia da Clínica Girassol. Membro eleito do Colégio de Especialidade de Cardiologia da Ordem dos Médicos de Angola. Membro fundador da Sociedade Angolana de Doenças Cardiovasculares (SADCV).
O DIA MUNDIAL DA HIPERTENSÃO COMEMOROU-SE A 17 DE MAIO. SENDO UMA DOENÇA TÃO PREVALENTE NO MUNDO, E TAMBÉM DAS MAIS SILENCIOSAS, ASSINAMOS A EFEMÉRIDE COM UMA CONVERSA COM O DR. PEDRO SABOLA, MÉDICO CARDIOLOGISTA, SOBRE OS DESAFIOS NA PREVENÇÃO, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DESTA PATOLOGIA QUE AFECTA MAIS DE 30% DA POPULAÇÃO ADULTA EM TODO O MUNDO.
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hipertensão afecta mais de 30% da população adulta em todo o mundo, sendo o principal factor de risco para as doenças cardiovasculares. Qual a situação epidemiológica de Angola?
A hipertensão é um sério desafio de saúde pública em todo o mundo, sendo quantitativamente o principal factor de risco para doenças cardiovasculares. O número total estimado de adultos com hipertensão, em 2000, era de 972 milhões, dos quais 333 milhões viviam em países economicamente desenvolvidos e 639 milhões em países economicamente em desenvolvimento. Portanto, em Angola, não fugimos a esta realidade. Trabalhos realizados sobre a hipertensão em Angola mostram uma prevalência entre 23% e 38,5%. É sabido que há uma variação considerável entre países e regiões geográficas para a prevalência
A aferição precisa da pressão arterial é essencial para o diagnóstico e tratamento adequados da hipertensão, sendo esta medição um dos procedimentos mais comumente realizados em medicina clínica. Na sua opinião, profissionais e utentes estão habilitados para fazer estas medições ou os erros praticados ainda são elevados?
A aferição precisa da pressão arterial é essencial para o diagnóstico. É difícil precisar se os profissionais estão a medir bem a pressão arterial ou se estão bem habilitados. Antes da pandemia de Covid-19, no último congresso de Cardiologia realizado pela Sociedade Angolana de Doenças Cardiovasculares (SADCV), um trabalho realizado pela equipa do Departamento de Fisiologia da Faculdade de Medicina de Angola mostrou como os profissionais estavam, em algumas circunstâncias, a aferir a pressão arterial sem alguns cuidados. Entre estes cuidados, consta o repouso de 15 minutos, em ambiente calmo e agradável, antes da medição. Se o utente consumiu álcool ou café, após exercícios ou se fumou, deve-se aguardar até 30 minutos para medir. Deve-se esvaziar a bexiga, usar um manguito especial para crianças e obesos, ficar sentado ou deitado e não falar durante o procedimento. O manguito do aparelho de pressão deve estar firme e bem ajustado ao braço e ter a largura de 40% da circunferência do mesmo, posicionado na altura do coração. Por fim, recomenda-se medir a pressão duas vezes no mesmo braço, com intervalo de um a dois minutos entre as medidas, e considerar a média de ambas. É possível fazermos um controlo desta patologia apenas com bons hábitos alimentares ou devemos sempre recorrer a medicação? Actualmente, qual o tratamento de primeira linha?
A hipertensão é um importante desafio de saúde pública, tanto em países em desenvolvimento, quanto em países desenvolvidos. Um número significativo de hipertensos desconhece sua condição e, entre os diagnosticados, o tratamento é frequentemente inadequado. São necessárias medidas, a nível populacional, para prevenir o desenvolvimento da hipertensão e melhorar a consciencialização, o tratamento e o controlo da hipertensão na
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comunidade. Controlar a patologia apenas com hábitos alimentares seria uma utopia. Em indivíduos já diagnosticados, seria talvez possível naqueles indivíduos pré-hipertensos e sem outros factores de risco cardiovasculares. Quanto ao tratamento de primeira linha, constitui, hoje, um desafio de complexidade crescente e depende de vários factores, que vão desde a idade (doentes idosos), comorbidades, raça (afrodescendentes), o preço/custo efectivo dos fármacos e a disponibilidade local. Porém, todas as “guidelines” recentes para níveis de pressão arterial (> 140/90 (AHA/ACC 2017 PA > ou = 130/80) já recomendam tratamento inicial com fármacos. Portanto, é responsabilidade do médico individualizar o tratamento, levando em consideração aspectos importantes, como o efeito da curva em J, a idade, comorbidades e comedicação, embora seja importante um limiar de pressão arterial sistólica de 140 mmHg para pacientes de baixo risco. Em pacientes de alto risco, há evidências de limiares mais baixos e que a monoterapia é inadequada para a maioria. Em resumo, quase todas as “guidelines” recomendam para tratamento inicial um inibidor da enzima conversora da angiotensina (IECA) ou bloqueador dos receptores de angiotensina (BRA), mais um bloqueador dos canais de cálcio ou diurético e, para tratamento sequencial, duas a três drogas dos grupos citados mais espironolactona como quarta droga (ESC/ESH 2018, AHA/ACC 2017, NICE 2019, ISH 2020), sempre tendo em conta a meta de controlo da pressão arterial. Podemos afirmar que a hipertensão é como uma epidemia com contágio cultural, pelo que os hábitos de vida são fundamentais para o controlo desta patologia? O povo angolano está consciente desta doença silenciosa?
A expressão contágio cultural é muito forte e penso que não se aplica à letra. A modificação do estilo de vida é recomendada para todos os indivíduos e é extremamente importante a divulgação deste aspecto de doença silenciosa. Aproximadamente 50% dos doentes hipertensos não é controlado e, destes, 44,8% faz o tratamento. Em Angola, a realidade não é diferente. O acompanhamento farmacoterapêutico do doente hipertenso é muito importante. Existe muito abandono terapêutico?
A Organização Mundial da Saúde (OMS) revela que mais de 700 milhões de hipertensos estão sem tratamento. O número de adultos, entre 30 e 79 anos, com hipertensão duplicou de 650 milhões, em 1990, para 1,28 mil milhões, em 2019. Entre estes pacientes, 720 milhões não estão a receber tratamento. O estudo foi produzido pela OMS e pelo Imperial College de Londres e foi publicado pela revista especializada The Lancet. Segundo a OMS, 580 milhões de pessoas que participaram do estudo não sabiam que eram hipertensas, pois nunca haviam sido diagnosticadas. É importante transmitir aos pacientes e consciencializá-los que, uma vez diagnosticada a hipertensão, deverão fazer tratamento, ao longo da vida, muitas vezes pelo resto da vida, e dos benefícios do melhor controlo da pressão arterial.
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“A OMS REVELA QUE MAIS DE 700 MILHÕES DE HIPERTENSOS ESTÃO SE TRATAMENTO. O NÚMERO DE ADULTOS, ENTRE 30 E 79 ANOS, COM HIPERTENSÃO DUPLICOU DE 650 MILHÕES, EM 1990, PARA 1,18 MIL MILHÕES, EM 2019. ENTRE ESTES PACIENTES, 720 MILHÕES NÃO ESTÃO A RECEBER TRATAMENTO”
A pandemia de Covid-19 veio também afectar o controlo dos doentes hipertensos. No seu ponto de vista, de que forma?
Claro que sim, com a pandemia, muitos doentes deixaram de ter o seu seguimento regular ambulatorial, pois estes serviços encontravam-se indisponíveis. O mercado de anti-hipertensivos é muito vasto. Como se decide qual o medicamento certo para o paciente certo?
Há evidências de que agentes específicos têm benefícios para pacientes com determinadas indicações. Por exemplo, para pacientes sem uma indicação convincente para uma determinada classe de medicamentos, com base em dados comparativos de estudos, disponibilidade e custo, uma dose baixa de diurético deve ser considerada para o início da terapia. Na maioria dos casos, um diurético tiazídico é a opção mais barata e, portanto, mais económica. Mas, para indicações convincentes de que outras classes oferecem benefícios adicionais, mesmo que mais caras, podem ser mais económicas. Em pacientes de alto risco que obtêm grandes benefícios do tratamento, medicamentos caros podem ser custo-efectivos, mas em pacientes de baixo risco, o tratamento pode não ser custo-efectivo, a menos que os medicamentos sejam baratos. São necessárias abordagens individualizadas. O médico não deve apenas prescrever/indicar o tratamento farmacológico, deve também monitorizar a adesão e controlo da pressão arterial. Naqueles doentes em que existe um óptimo controlo da pressão arterial e uma boa adesão, não precisamos fazer mudanças. Quando existe um pobre controlo da pressão arterial e uma boa adesão, o que se recomenda é intensificar o tratamento. O problema maior é em grupos em que existe má adesão e, consequentemente, pobre controlo da pressão arterial. Aí, precisamos abordar a adesão inicialmente.
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ENTREVISTA ANÁLISE
MAIS DE 700 MILHÕES DE PESSOAS COM HIPERTENSÃO NÃO TRATADA
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O NÚMERO DE ADULTOS ENTRE OS 30 E OS 79 ANOS COM HIPERTENSÃO AUMENTOU DE 650 MILHÕES PARA 1.280 MILHÕES, NOS ÚLTIMOS 30 ANOS, DE ACORDO COM A PRIMEIRA ANÁLISE GLOBAL ABRANGENTE DAS TENDÊNCIAS DE PREVALÊNCIA, DETECÇÃO, TRATAMENTO E CONTROLO DA HIPERTENSÃO REALIZADO PELO IMPERIAL COLLEGE DE LONDRES E PELA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) E PUBLICADO NA THE LANCET. QUASE METADE DESTAS PESSOAS NÃO SABIA QUE TINHA HIPERTENSÃO.
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hipertensão aumenta consideravelmente o risco de doença cardíaca, cerebral e renal e é uma das principais causas de morte e doenças, em todo o mundo. O estudo, realizado por uma rede mundial de médicos e investigadores, abrangeu o período de 1990 a 2019. Foram utilizados dados da medição e tratamento da tensão arterial de mais de 100 milhões de pessoas, entre os 30 e os 79 anos, de 184 países, abrangendo colectivamente 99% da população mundial, o que o torna na revisão mais abrangente das tendências globais da hipertensão até à data. Ao analisarem esta enorme quantidade de dados, os investigadores descobriram que houve poucas alterações na taxa global de hipertensão no mundo, entre 1990 e 2019, mas o fardo passou das nações ricas para os países de baixa e média renda. A taxa de hipertensão diminuiu nos países ricos - que agora têm, geralmente, algumas das taxas mais baixas -, mas tem aumentado em muitos países de baixa e média renda. Como resultado, o Canadá, o Peru e a Suíça tiveram uma das mais baixas prevalências de hipertensão, a nível mundial, em 2019, enquanto algumas das taxas mais elevadas foram observadas na República Dominicana, Jamaica e Paraguai, para mulheres, e na Hungria, Paraguai e Polónia, para homens.
Lacunas no diagnóstico e tratamento
Embora a percentagem de pessoas com hipertensão tenha mudado pouco, desde 1990, o número de pessoas com hipertensão duplicou para 1.280 milhões. Isto deveu-se, principalmente, ao crescimento populacional e ao envelhecimento. Em 2019, mais de mil milhões de pessoas com hipertensão (82% de todas as pessoas com hipertensão no mundo) viviam em países de baixa e média renda. Simples diagnosticar e relativamente fácil de tratar com medicamentos de baixo custo, o estudo revelou lacunas significativas no diagnóstico e no tratamento da hipertensão. Cerca de 580 milhões de pessoas com hipertensão (41% das mulheres e 51% dos homens) desconheciam a sua condição, porque nunca foram diagnosticadas. O estudo indicou ainda que mais de metade das pessoas (53% das mulheres e 62% dos homens) com hipertensão, ou seja, um total de 720 milhões de pessoas, não estavam a receber o tratamento de que precisavam. A pressão arterial foi controlada, ou seja, os medicamentos mantiveram-na em intervalos normais, em menos de uma em cada quatro mulheres e um em cada cinco homens com hipertensão. Os homens e mulheres no Canadá, Islândia e República da Coreia foram os mais propensos a receber medicação para tratar e controlar eficazmente a sua hipertensão. Comparativamente, os homens e mulheres na África Subsariana, Centro, Sul e Sudeste Asiático e nações insulares do Pacífico foram menos propensos a receber medicação. As taxas de tratamento eram inferiores a 25% para as mulheres e 20% para os homens, em vários países destas regiões, criando uma enorme desigualdade global no tratamento.
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
PERFIL NUTRICIONAL DE PACIENTES COM DIAGNÓSTICO DE HIPERTENSÃO ARTERIAL DOS 18 AOS 60 ANOS ATENDIDOS NO HOSPITAL DIVINA PROVIDÊNCIA NO 2.º SEMESTRE DE 2017 AS DOENÇAS CARDIOVASCULARES (DCV) CONSTITUEM A PRINCIPAL CAUSA DE MORTE NOS PAÍSES INDUSTRIALIZADOS E EM DESENVOLVIMENTO. SEGUNDO RAYMOND E COUCH (2012), AS DCV CONSTITUEM UM GRUPO DE DOENÇAS INTER-RELACIONADAS QUE INCLUIU A DOENÇA ARTERIAL CORONÁRIA (DAC), ATEROSCLEROSE, HIPERTENSÃO ARTERIAL, DOENÇA CARDÍACA ISQUÉMICA, DOENÇA VASCULAR PERIFÉRICA E INSUFICIÊNCIA CARDÍACA (IC). A HIPERTENSÃO ARTERIAL CONSTITUI, NOS DIAS DE HOJE, UM IMPORTANTE PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA, POR SER A DOENÇA CRÓNICA MAIS PREVALENTE DO MUNDO. ACTUALMENTE, MAIS DE 25% DA POPULAÇÃO MUNDIAL É HIPERTENSA E HÁ ESTIMATIVAS DE QUE ESTE NÚMERO POSSA CHEGAR A 29%, ATÉ 2025.
Dra. Eunice Cambua Licenciada em Nutrição e Dietética na Universidade de Belas. Nutricionista na Clínica Girassol. Nutricionista na Eucsana
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aymond e Couch (2012) definem hipertensão arterial como a pressão arterial persistentemente elevada, com os valores sistólicos iguais ou superiores a 140 milímetros de mercúrio (mmHg) e diastólicos iguais ou superiores a 90 mmHg. Isso é relatado como pressão arterial de mais de 140/90 mmHg. A sua génese é multifactorial e abrange factores como a hereditariedade, a idade, a raça, o sexo, o aumento de peso corporal, modificações metabólicas, o tabagismo, a alimentação, particularmente, o consumo de sódio, entre outros (Raymond e Couch, 2012; Mitchel e Schoen, 2010; V Directrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, 2006). A redução profiláctica da pressão arterial reduz dramaticamente a incidência e as taxas de óbito por todas as formas de patologias relacionadas com a hipertensão (Mitchel e Schoen, 2010). Para que o controlo da pressão arterial seja efectivo, é necessário que haja adesão ao tratamento, que compreende dois tipos de abordagens: farmacológica (à base de drogas anti-hipertensivas) e não farmacológica (que se baseia, fundamentalmente, em mudanças de estilo de vida, nas quais o manuseio nutricional tem um papel fundamental). A hipertensão arterial sistémica (HAS) é uma doença que apresenta elevado risco de mortalidade, em razão das suas complicações
cardiovasculares. O objectivo deste estudo foi identificar o perfil nutricional, avaliando as características sociodemográficas e económicas, estado clínico nutricional e apontando os principais factores de risco dos pacientes hipertensos atendidos no Hospital Divina Providência (HDP), no segundo semestre de 2017. Metodologia
Trata-se de um estudo de corte transversal e de natureza descritiva, a fim de propor estratégias que visem o controlo e/ ou a prevenção dos factores de risco e, consequentemente, das complicações cardiovasculares. O estudo foi realizado no ambulatório do HDP, localizado da Rua Pedro de Castro Van-Dúnem Loy, próximo ao controlo do Golf 1, no município do Kilamba Kiaxi, província de Luanda. A população estudada foi constituída por todos os adultos hipertensos de ambos os sexos, atendidos no mês de Maio de 2017, na fase da recolha de dados, perfazendo um total de 40 pacientes, conscientes e orientados para o estudo. De acordo com os objectivos traçados, foi seleccionada uma amostra de 20 pacientes, que corresponde a 50% da população estudada. Foram incluídos pacientes de ambos os sexos,
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na faixa etária dos 18 aos 60 anos de idade, com diagnóstico de HAS não complicada, com exames físicos isentos de edemas ou abdómen distendido, e que consentiram em participar deste estudo, assinando o termo de consentimento livre e esclarecido. Excluídos todos os pacientes com idades maiores de 60 anos (8), com hipertensão secundária, ou seja, com outras patologias associadas (12) e os que não aceitaram assinar o termo de consentimento livre e esclarecido (2), perfazendo um total de 20. Foram utilizados os métodos indutivo e hipotético-dedutivo. Para a recolha de dados, foi realizada uma entrevista com base num formulário pré-estabelecido, para a obtenção dos dados socioeconómicos, demográficos e o estilo de vida. Para o perfil clínico/nutricional, aferiram-se as medidas antropométricas (peso, altura, circunferência da cintura/ abdominal) e fez-se a observação da ficha de atendimento para verificar o valor da pressão arterial aferida, no mesmo dia, pela enfermeira. Todos os dados foram tabulados utilizando os programas Microsoft Excel e Microsoft Word (2010) e, assim, foram elaboradas as tabelas para melhor compreensão dos resultados obtidos. As variáveis estudadas foram idade, sexo, factores socioeconómicos, sedentarismo, excesso de peso e obesidade, pressão arterial e dietoterapia. O projecto de pesquisa foi aprovado Departamento Científico da Faculdade de Ciências de Saúde da Universidade de Belas e autorizado pelo Director Geral do HDP. Aos pacientes, foi solicitada a autorização através
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da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. Resultados e discussão
Distribuição dos hipertensos segundo a faixa etária e o sexo Dos 20 pacientes avaliados, 90% era do sexo feminino e 10% do sexo masculino. Vários estudos corroboram com este resultado e Silva (2010) explica que este predomínio marcante de mulheres com hipertensão é observado em várias pesquisas realizadas em vários países, envolvendo hipertensão arterial e outras doenças crónicas, o que se deve ao maior número de mulheres na população mundial e à maior consciencialização destas nos cuidados da saúde, associada à maior procura pelas unidades de saúde e melhor adesão ao tratamento, em relação aos homens. Quanto à variável idade, 60% encontrava-se na faixa etária dos 50 aos 60 anos e com predomínio total para o sexo feminino. Há uma tendência de aumento da pressão arterial com a idade e isso acontece, em parte, devido às mudanças no estilo de vida, pois muitas pessoas ganham peso e tornam-se menos activas, à medida que envelhecem. O documento V Directrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial corrobora os resultados apresentados neste estudo e explica que esta relação se deve às alterações da musculatura lisa e no tecido conjuntivo dos vasos, consequência do processo de envelhecimento. Porém, quando o idoso possui um estilo de vida saudável, não só na questão da alimentação, mas também em termos de actividade física, as alterações morfológicas e funcionais que ocorrem no processo de envelhecimento podem ser prorrogadas.
Distribuição dos hipertensos segundo os antecedentes patológicos familiares
A respeito dos antecedentes patológicos familiares, verificou-se que a maioria dos pacientes (70%) possuía algum familiar com a patologia. Os antecedentes familiares são um factor de risco não modificável e independente, principalmente, no parentesco de primeiro grau com patologias coronárias. Distribuição dos hipertensos segundo descrição da circunferência da cintura
Utilizando-se a circunferência da cintura, relacionando a distribuição da gordura corporal, a proporção de pacientes com obesidade abdominal foi de 45% (9), com maior frequência em mulheres (100%). Ou seja, 45% apresentou resultados normais, 10% (2) resultados elevados e 45% (9) resultados muito elevados. Recentemente, tem sido demonstrada a importância da obesidade abdominal como factor de risco cardiovascular, especialmente quando associada a dislipidémias, a intolerância à glicose e a hipertensão arterial, compondo a síndrome metabólica. Essa maior prevalência entre mulheres também foi identificada num estudo realizado no Brasil com hipertensos adultos cadastrados na unidade de saúde da família no município de Londrina, no Paraná, no qual, o resultado da circunferência da cintura elevada foi de 66,8%, sendo verificado em 87,9% em mulheres e 1% em homens. Segundo Silva (2010), a redução da sensibilidade à insulina nos tecidos periféricos gera uma resposta compensatória no pâncreas, que passa a aumentar a produção de insulina, não sendo raro que seja acompanhada de hiperinsulinémia compensatória. Essa alteração hormonal favorece o aparecimento de uma cascata de anormalidades, entre elas o favorecimento do aumento crónico da pressão arterial e o desenvolvimento da dislipidémia diabética, caracterizada pelo aumento dos triacilgliceróis e redução da lipoproteína de alta densidade-colesterol (HDL-c, high-density
lipoprotein-cholesterol). Mudanças no estilo de vida, como o aumento de actividade física, levando à adopção de um estilo de vida mais saudável, devem ser estimuladas por todos os profissionais de saúde, tanto para a prevenção da hipertensão arterial, como para o controlo da obesidade. Distribuição dos hipertensos segundo o estado nutricional e prática de actividade física
Com relação ao IMC, a prevalência de excesso de peso (sobrepeso e obesidade) entre os participantes foi de 65%, sendo 40% obesos e 25% com sobrepeso. Destes, apenas 20% praticava actividade física (caminhadas e corridas lentas). No Brasil, dados do Vigitel (2014) revelaram, entre 2006 e 2014, o aumento da prevalência de excesso de peso (IMC ≥ 25 kg/m2) de 43% para 52,5%. No mesmo período, a obesidade (IMC ≥ 30 kg/ m2) aumentou de 11,9% para 17,9%, com predomínio em indivíduos de 35 a 64 anos e em mulheres (18,2% e 17,9%), mas estável entre 2012 e 2014. O excesso de peso ocorre como resultado de um desequilíbrio entre o consumo alimentar e a actividade física, ou seja, é um estado no qual o peso excede um padrão baseado de acordo com a estatura. Já a obesidade é uma questão complexa relacionada ao estilo de vida, ao meio ambiente e aos genes, pois é uma condição de gordura excessiva, seja generalizada ou localizada (Mahan, 2012). Um importante mecanismo pelo qual o excesso de gordura corporal favorece o desenvolvimento de anormalidades metabólicas e de doenças cardiovasculares é a presença de resistência à insulina (RI), que é tipicamente definida pela diminuição da captação de glicose pelos tecidos periféricos, como o músculo, o tecido adiposo e o fígado. O tratamento da obesidade tem evoluído ao longo dos anos. Inicialmente, os médicos focavam somente na perda de peso e pouco se sabia sobre a manutenção do mesmo. Logo ficou claro que focar na perda de peso, sem atenção para a manutenção do mesmo, era inadequado, injusto e, possivelmente, prejudicial a qualquer um que tenta lidar com o seu peso. Hoje, um modelo de prevenção de
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doenças crónicas incorpora tanto intervenções no estilo de vida quanto tratamentos interdisciplinares com médicos, nutricionistas, especialistas em exercício e terapeutas comportamentais (Mahan, 2012). Distribuição dos hipertensos segundo o cumprimento do tratamento farmacológico e classificação da pressão arterial no momento da consulta de seguimento
Quanto ao tratamento farmacológico regular, podemos constatar que, dos 20 pacientes atendidos, apenas quatro (20%) apresentaram valores dentro dos parâmetros normais de pressão arterial (sistólica <130 mmHg e diastólica <85 mmHg), de acordo a classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS), descritos nas VII Directrizes
O CONTROLO DA HIPERTENSÃO POR MEIO DE MEDIDAS DIETÉTICAS ESPECÍFICAS VISA NÃO APENAS A REDUÇÃO DOS NÍVEIS TENSIONAIS, MAS TAMBÉM A INCORPORAÇÃO DE HÁBITOS ALIMENTARES PERMANENTES. A DIETOTERAPIA FAZ PARTE DE UM CONJUNTO DE MEDIDAS TERAPÊUTICAS, NÃO FARMACOLÓGICAS QUE TEM COMO PRINCIPAL OBJECTIVO DIMINUIR A MORBIMORTALIDADE POR MEIO DE MODIFICAÇÕES DO ESTILO DE VIDA.
Brasileiras de Hipertensão (2010). 11 (55%) apresentaram pressão arterial elevada e cinco (25%) muito elevada. 15 (75%) dos pacientes faziam o uso regular de anti-hipertensivos e, destes, 11 (55%) apresentaram valores elevados na aferição da pressão arterial. Isto deve-se ao estilo de vida não adequado à patologia apresentado pelos pacientes atendidos, pois, apesar de ser uma doença crónica, a hipertensão pode ser facilmente controlada através de uma alimentação saudável, acompanhada com a prática de exercício físico e o uso regular do antihipertensivo prescrito pelo médico. Cinco (25%) relataram não utilizar regularmente os anti-hipertensivos, por falta de meios financeiros, tomando-os somente na presença de alguns sintomas. Distribuição dos hipertensos segundo o acompanhamento dietético e número de refeições feitas diariamente
Referindo-se ao número de refeições, a maioria (55%) fazia apenas uma a duas refeições por dia e, destes, 25% relatou ter acompanhamento dietético com os seus cardiologistas. 45% fazia três a quatro
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refeições diárias e nenhum chegou a fazer cinco a seis refeições. Todos afirmaram que nunca lhes foi solicitada uma consulta de nutrição e que a dieta passava apenas pela restrição de certos alimentos, como kizaca e seus derivados, sal, Coca-Cola e outros. Fazendo a ligação do ponto 5 com este, podemos perceber o motivo pelo qual dos 75% de pacientes que faziam o uso de antihipertensivos de forma regular, apenas 20% apresentou valores da pressão arterial dentro dos parâmetros normais e a maioria (55%) valores elevados. Isto deve-se ao estilo de vida não adequado à patologia, pois, apesar de estarem a fazer o tratamento medicamentoso, sem uma dieta específica, para o melhor controlo e prevenção da doença, o risco de desenvolver DCV é maior. O controlo da hipertensão por meio de medidas dietéticas específicas visa não apenas a redução dos níveis tensionais, mas também a incorporação de hábitos alimentares permanentes. A dietoterapia faz parte de um conjunto de medidas terapêuticas, não farmacológicas, que tem como principal objectivo diminuir a morbimortalidade por meio de modificações do estilo de vida (Raymond e Couch, 2012). Distribuição da amostra segundo o número de refeições diárias e trabalhadores remunerados
Na amostra, a maior parte dos entrevistados não trabalhava (65%) e a maioria informou que dependia da ajuda de filhos, netos e esposos. Do total, apenas sete (35%) eram trabalhadores remunerados, mas de baixa renda, porque auferiam até, no máximo, três salários mínimos e, destes, seis (30%) faziam uma a duas refeições diárias e um (5%) três a quatro refeições. De acordo com a literatura, o nível socioeconómico mais baixo está associado à maior prevalência de HAS (V Directrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, 2006). Portanto, quanto menor o grau de instrução e a condição económica, maior a incidência de hipertensão arterial, devido ao menor nível de cuidados com a saúde (Pierin, 2004). Distribuição da amostra segundo controlo da ingestão de sal e óleo nas comidas
Grande parte dos entrevistados (90%) informou que, desde o momento que teve conhecimento da existência da patologia, passou a ter mais cuidados, restringindo moderadamente o sal, por orientações médicas. Todos afirmaram acreditar que o sal influencia directamente na pressão arterial. O consumo variou de um a 10 gramas por dia (g/dia) de sal. Do total, apenas dois (10%) ainda faziam o consumo elevado de sal (>
da pressão, fazendo o coração bombear mais rapidamente o sangue. Vários estudos randomizados confirmam os efeitos positivos da redução do sódio sobre a pressão arterial e desfechos cardiovasculares em indivíduos normotensos e hipertensos. As actuais directrizes dietéticas limitam a ingestão de sódio a 1.500 mg/dia para indivíduos com pressão arterial maior que o ideal. Para os indivíduos com pressão arterial normal, recomenda-se uma ingestão de menos de 2.300 mg de sódio, o equivalente a seis gramas de sal por dia (Mahan; Escott-Stump e Raymond, 2012). Distribuição da amostra segundo alimentos consumidos semanalmente
8 g de sal, que corresponde a uma colher de chá cheia), alegando “não sentirem gosto em alimentos preparados com pouco sal”. 16 (80%) permaneciam com a ingestão normal/ moderada de sal (5 g de sal que corresponde a uma colher de chá rasa) e dois (10%) consumiam de forma reduzida “uma pitada de sal entre os dedos” (aproximadamente a 1 g de sal, inferior a uma colher rasa de café). Quanto ao consumo de óleo adicional nas preparações, 13 (65%) dos entrevistados apresentaram um consumo elevado, quatro (20%) consumiam moderadamente e apenas três (15%) obedeciam uma restrição considerável. Quando há um consumo elevado de sódio, a ponto de chegar ao limite de eliminação pelos rins, a percentagem de sódio não eliminada fica na corrente sanguínea, concentrando-se nos vasos sanguíneos. Esta concentração faz com que haja retenção de líquido, aumentando o volume dentro dos vasos e, consequentemente, o aumento
Quanto ao questionário da frequência alimentar, 85% afirmou que não consome muita variedade de alimentos, por falta de meios financeiros. Dos cereais e tubérculos consumidos com maior frequência (> 3 vezes/semana), predominou o pão (100%), o arroz (55%), o funge (40%) e a batata rena (5%). Como podemos constatar, são cereais de fácil aquisição e de baixo custo, mas todos de alto índice glicémico e com baixo teor de fibras. Quanto às leguminosas, este grupo não foi considerado como hábito alimentar desta população, pois apenas 35% dos entrevistados consumia feijão e as demais leguminosas não eram consumidas com frequência, por serem de alto custo para esta população. Grande parte dos entrevistados (60%) consumia peixe e 40% consumia frango. Esse resultado está relacionado à renda dos hipertensos entrevistados. Em relação aos lacticínios, nenhum deles foi considerado hábito alimentar. Nas preparações culinárias, o óleo ou gordura mais utilizada foi o óleo vegetal - 95% e 90% consumiam a margarina para barrar o pão. Em relação ao consumo de bebidas como refrigerantes, sumos naturais e industrializados, verificou-se uma frequência elevada no consumo de refrigerantes, pois 45% consumia esta bebida, 30%
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DASH, a quantidade de sódio é a mesma da dieta comum, que corresponde a uma dieta normossódica. Sendo assim, a eficácia do plano alimentar DASH na redução da pressão arterial está associada ao conjunto de nutrientes e não exclusivamente ao sódio. No entanto, o sódio exerce, notoriamente, um papel importante na redução da pressão arterial e benefícios ainda maiores são alcançados quando se associa o plano alimentar DASH a uma restrição de sódio de 2.400 mg (Silva, 2010; Mahan et al., 2012). Distribuição da amostra segundo a quantidade de água consumida diariamente
consumia sumos industrializados e apenas 10% fazia o uso de sumos naturais. É de ressaltar que, de entre os entrevistados, havia dois (10%) que consumiam apenas água. No grupo das verduras, legumes e frutas, apenas o tomate, a gimboa e a rama de batata foram considerados hábitos alimentares, sendo consumidos por mais de 70% dos entrevistados. É de ressaltar que nenhum dos entrevistados consumia, pelo menos, uma fruta mais de três vezes por semana. Uma série de resultados de estudos sobre dieta e pressão arterial demonstrou que a intervenção dietética, além da redução de peso, redução da ingestão de sódio e consumo moderado de bebidas alcoólicas, reduz a pressão arterial. A dieta DASH é composta de produtos com baixa quantidade de gordura, como peixe, frango, carnes vermelhas magras e lacticínios magros, visando a diminuição do consumo de gordura saturada e colesterol e o aumento do aporte de proteína e de cálcio. Dessa forma, existe um perfil favorável de macronutrientes, que é a diminuição de gordura total e saturada e o aumento da relação polinsaturado/ saturado. É também composta de quantidade abundante de frutas, vegetais, grãos, oleaginosas, todas fontes ricas de potássio, magnésio e fibras. Uma das características de grande relevância no plano alimentar DASH está relacionada com a quantidade de sódio. Ao contrário da maioria das dietas para controlo da hipertensão, nas quais o objectivo principal é a restrição do sódio, no plano alimentar
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Quanto ao consumo de água, a maioria (75%) consumia uma quantidade aceitável de água de 1,5 a dois litros, sendo 45% para 1,5 litros e 30% para dois litros. Apenas 5% consumia uma quantidade muito reduzida de água, 500 mililitros, que corresponde a aproximadamente dois copos descartáveis grandes, alegando não sentir muita vontade de beber água. A água é o maior componente do corpo, correspondendo 60% a 70% do peso corporal total em adultos magros e apenas 45% a 55% em adultos obesos. Segundo Charney (2012), a água corporal diminui com a idade, em decorrência da diminuição da massa muscular, pois as células metabolicamente activas do músculo e vísceras têm as maiores concentrações de água. A água é essencial para os processos de digestão, absorção e excreção e actua como meio de transporte para nutrientes e todas as substâncias do corpo. Tem um papel fundamental na estrutura e função do sistema circulatório e na manutenção da temperatura corporal. Conclusão
A amostra foi constituída maioritariamente pelo sexo feminino e com maior predominância na faixa etária dos 50 aos 60 anos. A maioria da população estudada apresentou-se acima do peso e com excesso de gordura abdominal, representando um elevado risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, e grande parte da amostra apresentou um estilo de vida sedentário. Verificou-se, ainda, que a grande maioria não fazia o controlo alimentar adequado, pois associavam a HAS com a restrição apenas de sal, bebidas alcoólicas, café e cigarro e não
tinham conhecimento de outros alimentos que contribuem para a elevação da pressão arterial. Por este motivo, os hábitos tóxicos não foram marcantes nesta população, pois nenhum deles consumia café, bebidas alcoólicas nem cigarro. Mais preocupante foram as condições económicas relatadas pelos entrevistados e o facto da maior parte dos médicos continuar a fazer o papel que cabe aos nutricionistas, mesmo tendo estes na unidade hospitalar. Os factores de riscos mais alarmantes encontrados nesta população foram a alimentação inadequada à patologia (por falta de orientações nutricionais adaptadas e pelas condições económicas muito baixas), o excesso de peso e a inactividade física (sedentarismo). Diante disso, tornase necessário um acompanhamento nutricional mais intenso, realizado por um profissional nutricionista, visando o controlo do peso, a prevenção e/ou o tratamento das complicações cardiovasculares e, consequentemente, para garantir melhor qualidade de vida a essa população de baixa renda, por meio da adopção de hábitos de vida saudáveis, incluindo os hábitos alimentares, com o consumo diário de frutas, verduras, legumes e alimentos ricos em fibras (cereais integrais) e redução do consumo de alimentos ricos em gorduras, sal e açúcar, associada à prática de actividade física regular e à realização do tratamento medicamentoso adequado. Recomendações
Para prevenção do desenvolvimento da hipertensão arterial englobam-se políticas públicas de saúde combinadas com acções das sociedades médicas e dos meios de comunicação. A comissão multissectorial, coordenada por sua Excelência a Ministra da Saúde, elaborou o Plano Nacional de Saúde Pública (PNDS), para o período 2012-2025. A sua concretização passa pela implementação de nove programas, que estão subdivididos em 20 subprogramas e 47 projectos. O primeiro programa visa a prevenção e luta contra as doenças, com o subprograma 3 -
Doenças crónicas não transmissíveis -, constando no seu projecto 9 a prevenção e tratamento das doenças cardiovasculares. Portanto, as políticas públicas de saúde já estão elaboradas, sendo necessário o cumprimento das mesmas pelo Ministério da Saúde. O objectivo deve ser o de estimular o diagnóstico precoce, o tratamento contínuo, o controlo da pressão arterial e de factores de risco associados, por meio da modificação do estilo de vida e/ou uso regular de medicamentos. A maior parte das modificações de estilo de vida está relacionada ao controlo alimentar, tanto quantitativo como qualitativo. O controlo da hipertensão por meio de medidas dietéticas específicas visa não apenas a redução dos níveis tensionais, mas também a incorporação de hábitos alimentares permanentes. A dietoterapia faz parte de um conjunto de medidas terapêuticas, não farmacológicas, que tem como principal objectivo diminuir a morbimortalidade por meio de modificações do estilo de vida. Para os indivíduos hipertensos que estão acima do peso, faz-se necessária a elaboração de um plano dietético, com restrição calórica e balanceamento adequado de macro e micronutrientes, de modo que a perda ponderal seja acompanhada da incorporação de novos hábitos alimentares que permitam a manutenção do peso, a médio e longo prazo. No caso do HDP, local da recolha dos dados apresentados, é necessária, e com extrema urgência, a incorporação de nutricionistas na sua equipa multidisciplinar e a participação dos mesmos na elaboração dos manuais de orientação nutricional utilizados para as palestras antes da realização das consultas. E que as palestras de fórum nutricional sejam realizadas por um nutricionista ou por profissionais devidamente treinados, pois a dietoterapia é um conjunto de medidas dietéticas específicas para cada patologia.
Referências bibliográficas: CHARNEY, Pamela. Clínico: água, eletrólitos e equilíbrio ácido-base. In: MAHAN, L. K; ESCOTT-STUMP, S; RAYMOND, J. L. Krause: Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13ª Edição. Rio de Janeiro. 2012. MAHAN, L. K; ESCOTT-STUMP, S; RAYMOND, J. L. Krause: Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13ª Edição. Rio de Janeiro. 2012. MITCHELL, N. Richard; SCHOEN, J. Frederick. Vasos sanguíneos. In ROBBINS E COTRAN. Patologia: Bases Patológicas das Doenças. Distúrbios heritrocitários e hemorrágicos. 8ª Edição. Rio de Janeiro. 2010. PIERIN, A.M.G. Hipertensão Arterial: uma proposta para cuidar. 1ª Edição. Manole Ltda. 2004. RAYMOND, L. Janice; COUCH, C. Sarah. Tratamento Nutricional Clínico da doença cardiovascular. In: MAHAN, L. K; ESCOTT-STUMP, S; RAYMOND, J. L. Krause: Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13ª Edição. Rio de Janeiro. Elsevier. 2012. SILVA, Maria Anoia Dantas Costa e. Representações sociais da hipertensão arterial elaboradas por portadoras e profissionais de saúde: uma contribuição para a enfermagem. UFP. Teresina. 2010. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Departamento de Hipertensão Arterial. VII Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Revist Brasileira de Hipertensão.2010. Disponível em:<http://publicacoes.cardiol.br>pdf>. Acedido em: 03.02.2017, 17h:15min. V Diretrizes Brasileiras da Hipertensão Arterial. Arquivos brasileiros de cardiologia. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br>pdf>. Acedido em: 16.09.2016, 17h:13min. VIGITEL, Brasil. Vigilância de factores de riscos e proteção para doenças crônicas por inquérito telefónico. 2014. Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br/pdf> Acedido: 19.05.2017, 18h:10min.
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
A HIPERTENSÃO OCULAR NESTA EDIÇÃO DEDICADA À HIPERTENSÃO ARTERIAL, VAMOS ABORDAR, A NÍVEL OCULAR, A PATOLOGIA DA HIPERTENSÃO OCULAR. APESAR DA MESMA NÃO SER INTRÍNSECA À CIRCULAÇÃO SANGUÍNEA, A HIPERTENSÃO ARTERIAL É UM DOS FACTORES DE RISCO ELEVADOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA MESMA.
E
m primeiro lugar, vamos esclarecer em que consiste a hipertensão ocular. Esta condição acontece quando a pressão no interior do olho (a pressão intraocular ou PIO) é maior do que o normal. Para se entender, é necessário explicar o que é pressão ocular normal? A pressão ocular é medida em milímetros de mercúrio, como a forma como um termómetro mede a temperatura usando mercúrio. A pressão ocular normal é, geralmente, considerada entre 10 e 20 milímetros de mercúrio (mmHg). Ter pressão ocular muito baixa ou muito alta pode danificar a visão. Pressão ocular elevada, sem outros sintomas, é hipertensão ocular. Algumas pessoas podem ter maior pressão ocular sem danos. Outras pessoas podem perder a visão, mesmo que a pressão esteja no intervalo normal. Quando alguém tem glaucoma, a pressão ocular
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Dr. Djalme Fonseca Licenciado em Optometria e Ciências da Visão pela Universidade do Minho, Portugal. Pósgraduado em Avaliação Optométrica Pré e PósCirúrgica pela Universidade de Valência, Espanha. Founder & CEO da Óptica Optioptika
danifica o nervo óptico. Este dano reduz permanentemente a visão. Se o glaucoma não for tratado, pode levar à cegueira total. Contudo, é importante salientar que, embora a sua definição tenha evoluído, ao longo dos anos, a hipertensão ocular é comumente definida como uma condição com os seguintes critérios: • Uma pressão intraocular superior a 21 mm Hg é medida em um ou em ambos os olhos, em duas ou mais visitas ao consultório. A pressão dentro do olho é medida usando um instrumento chamado tonómetro • O nervo óptico parece normal • Nenhum sinal de glaucoma é evidente no teste de campo visual, que avalia a visão periférica (ou lateral) • Para determinar outras possíveis causas para a alta pressão ocular, um oftalmologista (médico especializado em cuidados oculares e cirurgia) avalia se o sistema de drenagem (chamado de “ângulo”) está aberto ou
fechado. O ângulo é visto usando uma técnica chamada gonioscopia. Esta técnica envolve o uso de uma lente especial para examinar os ângulos de drenagem (ou canais) nos olhos, de modo a ver se estão abertos, estreitos ou fechados • Não há sinais de doença ocular. Algumas doenças oculares podem aumentar a pressão dentro do olho.
Com hipertensão ocular, a frente do olho não drena o fluido de forma correcta. Isso faz com que a pressão ocular vá aumentando. Pressão ocular maior do que o normal pode causar uma doença denominada de glaucoma. O glaucoma é uma doença onde a pressão ocular danifica o nervo óptico, podendo causar, na sua fase final, a perda definitiva de visão. É extremamente importante salientar que a hipertensão ocular não é o mesmo que o glaucoma. Com a hipertensão ocular, o nervo óptico pode parecer normal e não haver sinais de perda de visão. No entanto, pessoas com hipertensão ocular estão em risco de desenvolver glaucoma e são consideradas “suspeitas de glaucoma”. A hipertensão ocular, geralmente, não tem sinais ou sintomas. Qualquer pessoa pode ter a pressão ocular alta e não o saber, sendo, então, muito importante efectuar exames regulares de saúde ocular, para despistar a referida doença. O que causa hipertensão ocular?
Um fluido claro, chamado de humor aquoso, flui dentro da parte da frente do olho. O olho produz continuamente este humor aquoso, enquanto uma quantidade igual flui para fora do olho. Isso
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mantém a pressão constante e saudável no interior dos olhos. Se o humor aquoso não fluir do olho correctamente, a pressão aumenta e causa hipertensão ocular. E, normalmente, a partir desse ponto, entramos num possível ciclo de perda de visão. Se a pressão está alta causa danos no nervo óptico, o que origina o glaucoma, que, por sua vez, quando não diagnosticado e tratado a tempo, leva à respectiva perda de visão. Quem está em risco de hipertensão ocular?
Qualquer um pode desenvolver hipertensão
ocular, mas algumas pessoas têm maior risco para essa condição. Entre os factores de risco mais significativos, encontramos os seguintes (não necessariamente pela importância da ordem pelos quais são descritos): • pessoas com histórico familiar de hipertensão ocular ou glaucoma • pessoas que têm diabetes ou hipertensão arterial • pessoas com mais de 40 anos • pessoas de raça negra e hispânicos • pessoas com miopia elevada • pessoas que tomam medicamentos esteroides de longo prazo • pessoas que tiveram lesões oculares ou cirurgia • pessoas com síndrome de dispersão de pigmentos ou síndrome de pseudoexfoliação. Como se diagnostica a hipertensão ocular?
Um oftalmologista realiza testes para medir a
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pressão intraocular, bem como para descartar as causas primárias de glaucoma ou o glaucoma. Estes testes são explicados abaixo: • A acuidade visual, que se refere ao quão bem podemos ver um objecto, é inicialmente avaliada • A frente dos olhos, incluindo a córnea, câmara anterior, íris e lente, são examinadas usando um microscópio especial, chamado lâmpada de fenda. • A tonometria é um método usado para medir a pressão dentro do olho. Medidas são tomadas para ambos os olhos em, pelo menos, duas a três ocasiões. Como a
pressão intraocular varia de hora para hora em qualquer indivíduo, as medidas podem ser tomadas em diferentes horas do dia (por exemplo, de manhã e à noite). Uma diferença de pressão entre os dois olhos de 3 mm Hg ou mais pode sugerir glaucoma. O glaucoma de ângulo aberto primário é muito provável se a pressão intraocular estiver a aumentar constantemente. • Cada nervo óptico é examinado para qualquer dano ou anormalidade; isso pode exigir a dilatação das pupilas, para garantir um exame adequado dos nervos ópticos. As retinografias, que são imagens do disco óptico (a superfície frontal do nervo óptico), são tiradas para referência e comparação futuras. • A gonioscopia é realizada para verificar o ângulo de drenagem do olho; para isso, uma lente especial é colocada no olho. Este teste é importante para determinar se os ângulos estão abertos, estreitos ou fechados e para
descartar quaisquer outras condições que possam causar pressão intraocular elevada. • O teste de campo visual verifica a visão periférica (ou lateral), normalmente, usando uma máquina de campo visual automatizada. Este teste é feito para excluir quaisquer defeitos visuais de campo devido ao glaucoma. Os testes de campo visuais podem precisar de ser repetidos. Se houver baixo risco de dano glaucomatoso, então, o teste pode ser realizado apenas uma vez por ano. Se houver um alto risco de dano glaucomatoso, então, o teste pode ser realizado com tanta frequência quanto a
O médico deve discutir com o paciente os prós e contras do tratamento médico versus a observação. Alguns oftalmologistas tratam todas as pressões intraoculares elevadas de mais de 21 mm Hg com medicamentos tópicos. Outros não prescrevem medicamentos a menos que haja evidências de danos nos nervos ópticos. A maioria dos oftalmologistas trata com medicamentos se as pressões forem consistentemente maiores do que 28 a 30 mm Hg, devido ao alto risco de danos nos nervos ópticos. Se o paciente experimentar sintomas como halos, visão turva ou dor, ou se a pressão intraocular aumentou recentemente e continuar a aumentar em visitas subsequentes, o oftalmologista, provavelmente, começará o tratamento médico. Relativamente à questão do laser e da terapia cirúrgica, estes não são, geralmente, utilizados para tratar a hipertensão ocular, pois os riscos associados a essas terapias são maiores do que o risco real de desenvolver danos glaucomatosos causados pela hipertensão ocular. No entanto, se o paciente não tolerar os medicamentos oculares, a cirurgia a laser pode ser uma opção e deve ser discutida. Prevenção
cada dois meses. • A paquimetria (ou espessura da córnea) é verificada por uma sonda de ultra-som, para determinar a precisão das leituras de pressão intraocular. Uma córnea mais fina pode dar leituras falsamente baixas de pressão, enquanto uma córnea espessa pode dar leituras falsamente altas de pressão. Como é que a hipertensão ocular é tratada?
O objectivo do tratamento médico é reduzir a pressão antes que cause perda glaucomatosa da visão. O tratamento médico é sempre iniciado para aquelas pessoas que se acredita estarem em maior risco de desenvolver glaucoma e para aquelas com sinais de danos no nervo óptico. Como o oftalmologista escolhe tratar é altamente individualizado. Dependendo da situação particular, o paciente pode ser tratado com medicamentos ou apenas observado.
A hipertensão ocular não pode ser prevenida, mas, através de exames oculares regulares com um oftalmologista, a sua progressão para glaucoma pode sê-lo. O prognóstico é muito bom para pessoas com hipertensão ocular. Com cuidados de acompanhamento e conformidade com o tratamento médico, a maioria das pessoas com hipertensão ocular não progride para glaucoma de ângulo aberto primário e mantém uma boa visão ao longo da vida. Se a pressão intraocular elevada não for controlada, podem ocorrer mudanças contínuas no nervo óptico e no campo visual, que poderão levar ao glaucoma. Como resumo do mais importante a reter fica a prevenção e essa só pode ser feita através de exames regulares à visão e saúde ocular.
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ENTREVISTA
“O TABAGISMO DEVE SER CONSIDERADO UMA PANDEMIA” O DIA MUNDIAL SEM TABACO É COMEMORADO, ANUALMENTE, A 31 DE MAIO PARA RECORDAR QUE ESTE É RESPONSÁVEL PELA MORTE DE METADE DOS SEUS CONSUMIDORES. A DRA. FÁTIMA CAETANO FALA-NOS DOS RISCOS DESTE INIMIGO PARA A SAÚDE DOS NOSSOS PULMÕES.
Dra. Fátima Caetano Presidente do Colégio de Pneumologia da Ordem dos Médicos de Angola
D
os 1,3 mil milhões de fumadores a nível mundial, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), apenas 60% expressou desejo de deixar de fumar e apenas 30% tem acesso às ferramentas que permitem fazê-lo com sucesso. Vários estudos apontam que as doenças provocadas pelo consumo do tabaco estão a aumentar. Fale-nos desta situação...
A OMS afirma que o tabagismo deve ser considerado uma pandemia, uma vez que, actualmente, morrem no mundo cinco milhões de pessoas por ano em consequência das doenças provocadas pelo tabaco, o que corresponde a, aproximadamente, seis mortes a cada segundo. Do total de mortes, quatro milhões ocorrem no sexo masculino e um milhão no sexo feminino. No ano de 2025, ocorrerão 10 milhões de mortes decorrentes do uso do tabaco, se não houver mudanças nesta indústria. Na Região Africana, os produtos do tabaco são consumidos por 94 milhões de homens e 13 milhões de mulheres e um em cada cinco adolescentes. O tabagismo está a aumentar entre as raparigas, com idade compreendida entre os 13 e os 15 anos, e o uso de outros produtos do tabaco, que não os cigarros,
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está a ganhar terreno. Todos os anos, 146 mil africanos morrem de doenças relacionadas com o tabagismo. O tratamento destas doenças representa 3,5% do total anual das despesas de saúde na região. A OMS refere que o cigarro é responsável por 85% das mortes por doença pulmonar crónica (bronquite e enfisema), por 30% de diversos tipos de cancro (pulmão, boca, laringe, faringe, esófago, pâncreas, rim, bexiga, colo do útero, estômago e fígado), por 25% da doença coronária (angina e enfarte do miocárdio) e por 25% das doenças cérebrovasculares (acidente vascular cerebral – AVC). Como é que o tabaco age na hipertensão arterial, uma das doenças que mais afecta a população?
O cigarro é composto por muitos produtos químicos, como a nicotina, o monóxido de carbono, o alcatrão, o polónio 210, o chumbo, o níquel, entre outros. Alguns destes compostos são provenientes do próprio tabaco e outros são adicionados ao cigarro durante a produção. A nicotina, componente do tabaco, quando inalada no acto de fumar, provoca endurecimento e constrição
foram totalmente implementadas. Não se verificou, até hoje, o maior rigor com a tributação, avisos de saúde nas embalagens de produtos de tabaco e campanha anti-tabágica realçando os malefícios do hábito de fumar para a saúde. Para além disso, os preços baixos e o fácil acesso aos cigarros impulsionam o aumento de fumadores em Angola. Na sua opinião, o que é que os profissionais de saúde precisam de fazer para ajudar a população a travar este vício?
Embora o consumo do tabaco tenha tendência a diminuir nos países desenvolvidos, em África, segundo a OMS, o hábito tabágico tende a aumentar, devido à propaganda, marketing e patrocínio de empresas tabaqueiras. Não vejo como é que os países africanos, e Angola em particular, poderão combater o tabagismo, uma vez que estão sobrecarregados com as doenças infecciosas, como a malária, o HIV Sida e a tuberculose. Contudo, deve-se investir no apelo aos pais, cuidadores e professores, no sentido de educarem as crianças sobre os perigos dos produtos de tabaco, na proibição total de fumar em locais públicos e de todas as formas de publicidade a favor do tabaco, no incentivo aos grupos de jovens para a criação de um movimento para uma geração sem tabaco, na exortação aos empresários e influenciadores à rejeição todas as formas de patrocínio da indústria do tabaco, na implementação de políticas gerais de luta anti-tabágica, conforme estipulado na ConvençãoQuadro da OMS para a Luta Anti-Tabágica, de forma a salvar vidas e reduzir os custos dos cuidados de saúde. A pandemia de Covid- 19 influenciou, de alguma forma, o consumo de tabaco? Na sua opinião, os fumadores que tiveram Covid-19 podem ficar com sequelas pulmonares?
dos vasos sanguíneos, que produzem uma redução do fluxo do sangue e o aumento da pressão arterial, causando, assim, a hipertensão arterial sistémica. 75 mil pessoas na Região Africana consomem alguma forma de tabaco. Como é que se enquadra Angola neste contexto? Como tem sido a luta anti-tabágica no país?
Os números de fumadores em Angola não são alarmantes, mas preocupam as autoridades governamentais e indicam que mais de 10% da população angolana é fumadora. Angola ratificou a Convenção-Quadro para o Controlo do Tabaco, em 2007, mas as políticas definidas que visam a prevenção e controlo eficaz do tabaco não
Não tenho dados estatísticos sobre o aumento do consumo de tabaco durante a pandemia, mas penso que vários factores inerentes às pandemias podem aumentar a necessidade de fumar, nomeadamente, o confinamento, a própria doença e a morte de amigos e familiares. A partir dos 40 anos de idade, o consumo do tabaco provoca, progressivamente, lesões brônquicas (bronquite) e alveolares (enfisema), que diminuem a capacidade da função pulmonar e que se manifestam por dispneia, tosse produtiva e cansaço. O hábito tabágico causa a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) e o cancro do pulmão em 90% dos fumadores. A asma e a DPOC são doenças que cursam com a inflamação pulmonar crónica e, por isso, consideradas como grupo de risco da Covid-19. Sendo os pulmões o órgão alvo da infecção por SARS-CoV-2, a concomitância destas doenças exacerbará a DPOC e deixará, naturalmente, sequelas no parênquima pulmonar, aumentando a insuficiência respiratória e tornando-a crónica, na maior parte dos casos.
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PUBLIREPORTAGEM
MICROBIOTA E INFERTILIDADE FEMININA
DURANTE A ÚLTIMA DÉCADA, A DISPONIBILIDADE DE ABORDAGENS BASEADAS EM SEQUENCIAMENTO DE PRÓXIMA GERAÇÃO REVELOU A PRESENÇA DE COMUNIDADES MICROBIANAS EM QUASE TODO O CORPO HUMANO, INCLUINDO O TRACTO REPRODUTIVO. QUANTO A OUTROS LOCAIS DO CORPO, ESTA MICROBIOTA RESIDENTE TEM ESTADO ENVOLVIDA NA MANUTENÇÃO DE UM ESTADO SAUDÁVEL. COMO CONSEQUÊNCIA, ALTERAÇÕES DECORRENTES DE FACTORES INTERNOS OU EXTERNOS PODEM LEVAR À DISBIOSE MICROBIANA E AO DESENVOLVIMENTO DE PATOLOGIAS. COMO A MICROBIOTA REPRODUTIVA FEMININA AFECTA A INFERTILIDADE, TRATÁ-LA TORNA-SE UM FACTOR IMPORTANTE PARA O SEU SUCESSO E NO DAS TECNOLOGIAS DE REPRODUÇÃO ASSISTIDA, COMO A IMPLANTAÇÃO DE EMBRIÕES E OS CUIDADOS COM A GRAVIDEZ.
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O
projecto do microbioma humano estimou que a microbiota vaginal representa, aproximadamente, 9% de toda a microbiota humana. Em particular, os lactobacilos foram relatados como as bactérias mais representadas neste local do corpo, sendo outros géneros representados Prevotella, Bifidobacterium, Gardnerella, Atopobium, Megasphaera, Sneathia e Anaerococcus. Essas bactérias têm sido implicadas em diferentes fases da reprodução, desde a formação de gametas, fertilização, estabelecimento e manutenção da gravidez e na colonização microbiana do feto e/ou recém-nascido.
Nos últimos anos, evidências crescentes têm mostrado a presença de microrganismos não só na vagina, mas também no sistema reprodutor feminino superior (incluindo os ovários, as trompas de Falópio e o útero), por muito tempo considerado como um nicho estéril O Lactobacillus foi identificado como a espécie mais abundante em todo o sistema reprodutor feminino. Esses micróbios residentes contribuem para a manutenção do estado de saúde e as suas alterações têm sido associadas a diversas doenças ginecológicas. De facto, os lactobacilos exercem efeitos protectores contra patógenos invasores, pois a disbiose está associada a várias doenças, incluindo endometrite crónica, endometriose, doença inflamatória pélvica e cancro ginecológico. Nesse contexto, vários estudos relataram uma correlação positiva entre a presença de bactérias específicas no útero e o aparecimento de doença inflamatória pélvica, uma inflamação do tracto genital superior, que pode levar à infertilidade [19,20]. Além disso, o aumento de Actinomyces, Corynebacterium, Enterococcus, E. coli, Fusobacterium, Gardnerella, Prevotella, Propionibacterium, Staphylococcus e Streptococcus foram associados à endometriose Em mulheres saudáveis em idade fértil, o microbioma vaginal é composto por aproximadamente mil milhões de bactérias/grama de secreções vaginais e é caracterizado por baixa biodiversidade, com as espécies de Lactobacillus representando até 95% do total de bactérias [52,53]. Apesar dessa composição bem definida, há um certo consenso de que a microbiota vaginal sofre flutuações significativas na sua composição durante a vida da mulher, a colonização por Lactobacillus começa na puberdade e, finalmente, a sua abundância diminui após a menopausa. A incidência da infertilidade aumentou tanto nos últimos anos que, actualmente, é reconhecida como um problema de saúde mundial. Um em cada sete casais é afectado pela infertilidade. Os factores femininos, responsáveis por 35% a 40% da infertilidade dos casais, podem depender de várias causas, incluindo alterações hormonais, alterações tubárias, patologias uterinas, idade materna e doenças sistémicas ou genéticas. No entanto, os mecanismos moleculares subjacentes à
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infertilidade são, muitas vezes, desconhecidos. Assim, vários estudos mostram uma correlação entre a infertilidade e a microbiota: as mulheres inférteis possuem uma microbiota diferente com uma composição bacteriana específica, seja no sistema reprodutor inferior ou superior, e essa microbiota pode afectar também os procedimentos de FIV. Por outro lado, a Vaginose Bacteriana (VB) pode causar infertilidade: as próprias bactérias não previnem a gravidez, mas os danos de uma infecção não tratada podem. A maior preocupação com a VB é que, em alguns casos, a infecção pode viajar da vagina para o colo do útero, útero e trompas de Falópio e causar uma condição dolorosa, chamada doença inflamatória pélvica, que pode bloquear as trompas de Falópio, causando infertilidade ou gravidez ectópica. Aqui, concluímos que existe uma linha ténue entre tratar a vaginose bacteriana e manter o equilíbrio no microbioma, sem prejudicá-lo ou desestabilizá-lo. O equilíbrio do ecossistema vaginal depende de lactobacilos cujo biofilme protege contra microrganismos que, normalmente, não estão presentes ou são subdominantes na flora vaginal. Os tratamentos para infecções vaginais devem eliminar patógenos, preservando a flora de Lactobacillus para prevenir recaídas ou recorrências. Para isso, durante uma infecção, é preferível iniciar precocemente o tratamento antibiótico por aplicação tópica, o que pode evitar o uso, às vezes necessário, dos antibióticos sistemáticos. A primeira escolha de medicamentos tópicos são os óvulos vaginais, com diferentes combinações (antibiótico/antifúngico com ou sem antiparasitário). Em relação a essas combinações, apenas dois dos oito produtos farmacêuticos testados não interferiram no crescimento in vitro das três cepas de Lactobacillus. Para estas duas formulações (NNP e MMPN), mas as outras seis combinações inibem o crescimento de uma estirpe com (MNN e TNN) ou de duas estirpes com acidente vascular cerebral (CK, MM e ONN) ou das três estirpes (NN) de Lactobacillus. Pode-se, portanto, supor que o uso de uma dessas combinações poderia perturbar o equilíbrio da flora vaginal, ao contrário das especialidades NistatinaNeomicina-Polimixina B NNP e Metronidazol-
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Miconazol-Polimixina B-Neomicina-Centella asiática MMPN, às quais os três Lactobacillus cepas não são afectados na concentração tópica assumida. A neomicina é um antibiótico com forte actividade Gram-positiva, mas a actividade Gram-negativa reduzida pode ser eficaz contra o Staphylococcus aureus resistente à meticilina. A polimixina B é um antibiótico para o tratamento de infecções por patógenos multi-resistentes causadas por bactérias Gram-negativas multi-resistentes (MDR). A polimixina B e a colistina (polimixina E) têm sido consideradas o último recurso para o tratamento dessas infecções. A polimixina B tem uma rápida actividade bactericida in vitro contra as principais bactérias Gramnegativas, como Pseudomonas aeruginosa, Acinetobacter baumannii e Klebsiella pneumonia. A nistatina é um antifónico que funciona impedindo que o fungo cresça e que desempenha um papel protector na defesa contra C. albicans, melhorando a resposta celular relacionada ao IFN-γ, a via de sinalização de IL-17 e, possivelmente, através do aumento da imunidade mediada por IgG derivada de VEC. Além disso, a nistatina melhora notavelmente a ultramorfologia da mucosa vaginal, através da protecção da ultraestrutura mitocondrial em VECs e inibição da adesão e invasão por C. albicans. Juntos, esses efeitos aumentam a resposta imune da mucosa vaginal contra C. albicans e protegem a ultra-estrutura do epitélio vaginal. A taxa de sucesso clínico foi maior para NNP do que para miconazol. O risco de falha do tratamento do NNP foi 36% menor do que miconazol. Queimação vaginal no dia 2 e corrimento vaginal no dia 4 foram significativamente menos intensos com NNP do que com miconazol. As reações adversas a medicamentos foram menores no NNP do que no miconazol. O uso generalizado de NNP, por várias décadas, e o seu bom perfil de eficácia e segurança, bem como as frequentes incertezas diagnósticas, devido aos diferentes patógenos, suportam o início deste tratamento empírico de amplo espectro na vaginite infecciosa.
NOVIDADE AGORA TAMBÉM NA
RUA DA MISSÃO A SAÚDE MAIS PRÓXIMA DE SI!
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OPINIÃO
ESTE É UM TEMA TÃO FASCINANTE QUANTO COMPLEXO, PORQUE ENVOLVE PESSOAS E EMPRESAS. UMAS E OUTRAS SÃO SERES COMPLEXOS, ÚNICOS, DIVERSOS E, SEGURAMENTE, COM CONCEITOS DE FELICIDADE MUITO PRÓPRIOS. COMO DEFINIR, ENTÃO, A TÃO DESEJADA FÓRMULA DA FELICIDADE NO TRABALHO?
FELICIDADE NO TRABALHO 54 SAÚDE
V
Dr. Sérgio Luciano CEO da Quilaban
amos por partes. A teoria do lucro, enquanto objectivo da existência das empresas, há já muito que foi ultrapassada, mas subsiste ainda de forma vincada no pensamento corrente. Não será estranha a esta visão a dinâmica corrente de apresentação dos resultados (e, logo aqui, começamos a pensar em lucro), assentes em dimensões de natureza económica e financeira. Esta visão inverte-se, no entanto, se pensarmos no lucro não como um fim em si, mas como uma consequência. Sim, de facto, as empresas existem para responder a necessidades fundamentais de várias entidades interessadas na sua acção, designadas, frequentemente, como “stakeholders”. Há um interesse social na acção das empresas, porque geram emprego e remuneram e tratam justamente os seus trabalhadores, porque desenvolvem e comercializam produtos e serviços úteis e com valor para os seus clientes, porque permitem aos seus fornecedores encaminhar os seus produtos e aceder aos consumidores, porque pagam os seus impostos e taxas, porque remuneram os seus accionistas, designados também como “shareholders”, gerando lucros e pagando dividendos, ou porque criam dinâmicas de desenvolvimento nas comunidades onde estão integradas. Enfim, muito para além do lucro, as empresas têm um desígnio de geração de um impacto positivo sobre um conjunto alargado de “stakeholders”. Esse é o fim a que se destinam. Da sua capacidade de articular e respeitar o interesse das diversas partes interessadas, numa dinâmica positiva e harmoniosa, dependerá a sua sustentabilidade. Para o efeito, as empresas deverão ter um propósito maior que oriente a sua acção e que se ilustra numa missão e visão claras e inspiradoras e num conjunto de valores sólidos, sempre muito presentes na sua actuação. A sustentabilidade constitui um compromisso maior, ao qual as empresas são chamadas, para com o ambiente, os colaboradores, os clientes, os fornecedores e as comunidades em que se integram e com as melhores práticas éticas e de gestão. O papel das empresas na sociedade é o de geradoras de impactos positivos e sustentáveis, capazes de promover um presente e um futuro melhores. Criar valor é isso mesmo. O lucro será uma
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consequência natural dessa dinâmica, mas constitui apenas uma parte de algo maior. O papel das pessoas nas empresas
As empresas, para desempenharem o seu papel económico e social, necessitam de dois recursos fundamentais: capital e talento. É justamente ao nível do talento que as pessoas têm um papel determinante. São as pessoas que, com inteligência, conhecimento, competências diversas e múltiplas capacidades, adquiridos quer por via da formação, quer da experiência acumulada, possuem o talento necessário para dar vida às dinâmicas que as empresas se propõem a desenvolver. Mas há muito mais para além do saber acumulado. As empresas vivem em ambientes complexos, sujeitos a mudanças constantes, a imprevistos, à alteração dos gostos e a novas formas de abordar os mercados, muito condicionadas pela forte dinâmica de mudanças tecnológicas, por factores ambientais ou por conjunturas que se alteram repentinamente, com efeitos imprevisíveis e inesperados. As pessoas são também intérpretes extraordinárias destas tendências e têm uma capacidade única de adaptação, de criatividade, de empatia, de se mobilizarem para responder a novos desafios com entusiasmo e determinação, combinando o seu talento para criar novas soluções e respostas. As pessoas são o motor da empresa. O seu desempenho, porém, depende da sua identidade com o propósito da empresa, com os seus valores e com as suas práticas. Cada pessoa tem para si um propósito de vida, mesmo que não o tenha identificado ou o verbalize objectivamente. A este propósito, é muito interessante a história do senhor que visitava a sua propriedade, onde
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estava a construir um palácio. Procurando passar incógnito entre os trabalhadores que por aí andavam, foi passeando e interagindo com eles. A um, que via com ar sofrido e gestos pesados e vagarosos, perguntou: “o que está a fazer?”. Respondeu-lhe: “não vê?! Estou a trabalhar, de sol a sol, a construir muros. Não faço outra coisa…”. A outro, que se apresentava empenhado na construção do mesmo muro e compenetrado, perguntou: “o que está a fazer?”. Respondeu-lhe: “estou a dar o meu melhor para fazer um bom trabalho. Com o meu salário vou alimentar a minha família e pagar os estudos dos meus filhos para que tenham um futuro melhor…”. A um terceiro, que, enquanto construía o muro, assobiava e cantava, perguntou: “o que está a fazer?”. Respondeulhe, com brilho no olhar: “estou a construir um palácio. O mais belo palácio da região!”. Não é indiferente o sentido que se dá ao que se faz. Cabe às empresas partilharem com os seus trabalhadores um propósito para aquilo que se propõem a fazer. Cabe às pessoas encontrarem sentido para o que fazem e descobrir motivação e encanto para além das tarefas, encontrando no que fazem também o sentido para sua vida. As empresas são (devem ser) locais onde cada um pode contribuir para a construção de um presente e um futuro melhores, através da sua acção pessoal, em equipa e dando o melhor de si, para que a comunidade empresarial e ele próprio possam prosperar. Felicidade no trabalho
Muito se fala de felicidade e a descoberta da fonte da felicidade continua a ser um desígnio que muitos perseguem. Gosto, particularmente, da visão de dois pensadores. Um vê a felicidade na descoberta de sentido para a vida. Outro encontra-a na gratidão.
Acredito que ambas as visões se relacionam com a felicidade no trabalho e podem ser dois excelentes guias para que se alcance esse desígnio. O sentido para a vida está muito ligado com o sentido que a empresa tem para a sua própria existência e com a forma como o comunica e partilha com os seus trabalhadores, sendo consistente nas suas práticas e deixando que, eles próprios, assumam esse desígnio como seu, porque acreditam nele e nele revêem também o seu próprio propósito. A gratidão funciona nos dois sentidos, dos colaboradores para com as empresas e das empresas para com os colaboradores. Ambos
descobrem e valorizam o contributo de cada um para a construção de projectos de vida mais auspiciosos e de uma sociedade mais justa, equilibrada e sustentável, reconhecendo o valor e a importância mútua. Mas a felicidade no trabalho, tal como na vida, é uma construção exigente. Importa ser prático e ter disciplina na execução. Leva tempo a alcançar e é um trabalho de todos, empresas e trabalhadores. Importa refletir: Como estão as empresas a comunicar com os seus trabalhadores? Como contribuem para a sua formação? Quão justos são os seus
salários e compensações? Como são as suas condições de trabalho? Como são valorizados e respeitados os pensamentos diversos e as opiniões distintas? Como se divulgam os resultados e as dinâmicas da empresa? Como é visto o erro? Como se consideram as circunstâncias familiares? Como se tratam, sem discriminar, homens e mulheres? E como estão os trabalhadores a contribuir
para a dinâmica da empresa? Como se envolvem nas iniciativas da empresa? Como se dispõem a aprender e a melhorar continuamente? Como colocam as suas competências e capacidades ao serviço da empresa? Como participam nos grupos de trabalho? Como interagem com os seus colegas, sendo construtivos, verdadeiros e transparentes? Como seguem as instruções de trabalho? Como apoiam os colegas com maiores dificuldades? A felicidade no trabalho é, sobretudo, o fruto de uma construção conjunta, onde empresas e trabalhadores são os actores principais, orientada para a construção de um presente e de um futuro melhores. Precisamos de pessoas felizes em empresas felizes, para que o mundo se torne melhor e o entreguemos aos nossos descendentes melhor do que o recebemos.
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ANÁLISE
PANDEMIA PÕE EM CAUSA DÉCADAS DE PRESENÇA FEMININA NO MERCADO DE TRABALHO
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DÉCADAS DE EVOLUÇÃO DA PRESENÇA DAS MULHERES NO MERCADO DE TRABALHO FORAM POSTAS EM CAUSA PELA PANDEMIA, AVANÇA A ADECCO. NA LINHA DA FRENTE EM PROFISSÕES DE RISCO, MAS TAMBÉM EM CASA E NOS CUIDADOS AOS SEUS, MUITAS ACABARAM POR DESISTIR E AINDA NÃO REGRESSARAM.
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a primeira vaga da pandemia, em 2020, houve um colapso no emprego feminino. A primeira e mais óbvia justificação é que as mulheres trabalham de forma desproporcional em sectores especialmente atingidos pela Covid-19. O relatório “Resetting Normal: Defining the new era of work”, realizado em 2021, concluiu que homens e mulheres experienciaram a pandemia de forma distinta e foram as mulheres que mais sentiram na pele as consequências: mais mulheres a sentirem-se em “burnout” (39% vs 36%), que o seu bem-estar mental declinou (34% vs 29%) e que ansiavam regressar ao escritório (46% vs 38%). Peso do trabalho doméstico
Outra parte importante da causa desta saída das mulheres do mercado de trabalho é que, em muitas sociedades, ainda são as mulheres a suportar o peso do trabalho doméstico e dos cuidados familiares, que continuam a afastá-las do regresso ao trabalho. O inquérito, também de 2021, “Mulheres na Liderança. A análise das diferenças de género no topo das empresas” confirma o fardo que recai sobre as mulheres: cerca de 28% das quase 580 mulheres inquiridas dizem ser cuidadoras, ou seja, são responsáveis por cuidar de outras pessoas que não os seus próprios filhos. A distribuição do tempo dedicado aos cuidados de outros é a variável que melhor explica o facto desta responsabilidade ser um dos obstáculos à progressão da carreira: ultrapassa as 21 horas semanais para 42% das inquiridas com filhos menores e para 34% das cuidadoras. Isto significa que é como se as mulheres trabalhadoras, para além do seu contrato a tempo inteiro, tivessem também um contrato a tempo parcial adicional não remunerado. O inquérito referido diz que um em cada quatro homens tem dificuldade em aceitar uma liderança feminina: 46% referem ser ainda menos ouvidas do que os seus pares masculinos e 38% das mulheres entrevistadas
identificam o principal obstáculo no facto dos homens, com as mesmas características (competências, qualificações, experiência, etc.), continuarem a ter o privilégio de chegar à gestão de topo. Por outro lado, para 36%, o principal obstáculo é representado pelo fardo dos cuidados com a família e pela falta de instrumentos de conciliação eficazes. Finalmente, 21% consideram o estereótipo das características masculinas impostas às mulheres que se querem afirmar como um obstáculo. Regresso a um mundo de trabalho mais digital
O regresso lento das mulheres acentua um problema crescente que a Covid-19 veio acelerar: a digitalização da economia tem vindo a excluir as mulheres, devido ao défice sistémico do sexo feminino nas formações STEM (science, technology, engineering and mathematics). “Quanto mais importante é o digital na economia, menor é a probabilidade dos cargos mais importantes serem ocupados por mulheres”, sublinha a Adecco. Para evitar que as mulheres se sintam excluídas desta rápida mudança para o digital, a consultora propõe quatro formas. Primeiro, há que definir modelos a seguir, de forma a mobilizar as jovens para estudar tecnologia. Segundo, os governos têm de acelerar a acção regulatória relativamente à discriminação salarial, solicitando, por exemplo, às empresas que provem estar a pagar a homens e mulheres de forma igual por trabalho de igual valor. “A discriminação positiva é necessária. Se continuarmos à mesma velocidade, a igualdade de géneros vai chegar dentro de 267 anos”, refere a Adecco. Terceiro, tem de se pensar em formas mais adequadas de proporcionar formação digital adequada às mulheres. Quarto, os homens têm de se questionar sobre como podem contribuir para trazer mais mulheres ao mercado de trabalho. “Ser um patrocinador é mais do que ser um aliado. Um patrocinador é alguém que fala (bem) de si quando não está presente na sala”.
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
MENTES FELIZES CONECTAM-SE POSITIVAMENTE QUAL É A CHAVE PARA NOS SENTIRMOS PLENOS E REALIZADOS NO TRABALHO? SE PERCORRERMOS A MAIORIA DA LITERATURA DISPONÍVEL, CHEGAMOS À CONCLUSÃO DE QUE TER UM TRABALHO PERFEITO É SINÓNIMO DE ENCONTRAR SIGNIFICADO NO QUE FAZEMOS. NO ENTANTO, NUM ESTUDO RECENTE (HAPPINESS GAZETTE, 2ª. EDIÇÃO, 2021), FEITO EM 51 PAÍSES PELA HAPPINESS BUSINESS SCHOOL GLOBAL PARTNERSHIP, VERIFICOU-SE QUE, EM ANGOLA, A MAIORIA DOS PROFISSIONAIS (90% DOS INQUIRIDOS ANGOLANOS) APONTA PARA A POSSIBILIDADE DE ESTABELECER RELAÇÕES AMISTOSAS NO LOCAL DE TRABALHO COMO ESSENCIAL NA SUA SATISFAÇÃO LABORAL. SERÁ, ENTÃO, QUE NÓS, “CIENTISTAS DA FELICIDADE”, TENDEMOS A SOBRESTIMAR A IMPORTÂNCIA DO “QUÊ”, AO INVÉS DE NOS CONCENTRARMOS EM “QUEM”, QUANDO NOS DEBRUÇAMOS SOB O COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL?
Dr. Cláudio Osório Co-founder & Head of Experience Design da empresa OKU HUMAN. Licenciado em Psicologia Aplicada e Mestre em Psicologia Social e das Organizações pelo Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida. Chief Hapiness Officer pela Hapiness Business School.
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a verdade, já há algum tempo que sabemos que o nosso sistema fisiológico é consideravelmente reactivo às interacções sociais que estabelecemos. Aliás, Umberson e Montez (2010) ressalvaram o impacto positivo que estas têm na nossa saúde mental, na nossa saúde física e na nossa taxa de mortalidade. Nós, seres humanos, somos dotados de redes neurais especializadas para o pensamento social, o que faz com que os nossos relacionamentos pessoais sejam responsáveis pela construção de certos sistemas biológicos que nos protegem de adversidades, como o stress, através da libertação de hormonas, como é o caso da oxitocina (Gable & Gosnell, 2011). Assim, penso ser seguro afirmar que o estabelecimento de relacionamentos positivos no local de trabalho permite que os colaboradores possam construir,
manter e reparar o seu bem-estar no geral. As interacções positivas e produtivas exigem o melhor de nós, pois são construídas através da consistência, da compaixão e do comprometimento dinâmico. Para que uma amizade, um casamento ou uma relação profissional se estabeleça, cada uma das partes deve ser um participante activo na construção de futuro para o(s) outro(s), permitindo, assim, que todos os envolvidos floresçam. As relações de entreajuda no trabalho podem refinar a compreensão do indivíduo no seu papel, reduzindo, assim, a ambiguidade e a pressão da função e, em última análise, aumentar a satisfação no trabalho e o comprometimento organizacional do colaborador (Chiaburu & Harrison, 2008). Cross, R. (2019) refere que a conceptualização individual da realização
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profissional advém tanto do próprio significado do trabalho, como dos relacionamentos que se estabelecem dentro e fora do mesmo. Pessoas cujo trabalho é comum ou exigente têm a mesma probabilidade de se sentirem motivadas e realizadas, quanto as que têm empregos dinâmicos ou inspiradores. O segredo está num investimento proactivo em relacionamentos que criem e mantenham um senso de propósito. A auto disponibilização para compromissos interpessoais sustenta a nossa energia mental e física. Os relacionamentos pessoais e profissionais ampliam a nossa perspectiva e exploram aspectos da nossa identidade que não estão directamente relacionados com o tipo de desafios com que nos deparamos diariamente no local de trabalho. Dito isto, na vivência actual, que é cada vez mais não linear e incompreensível, as lideranças deparam-se com o complexo desafio de criarem estratégias de conexão positiva nas suas equipas, que funcionem tanto em formato presencial, como em trabalho remoto (ou em modalidades híbridas). Ao aceitarem que a “elevação” das interacções é um requisito crítico para a criação de um ambiente de segurança psicológica, as organizações contemporâneas serão capazes de se adaptarem a uma cultura mais centrada na comunicação e partilha, onde a promoção de interacções positivas entre os colaboradores tornar-se-á num objectivo por si só. Planeamento de eventos colaborativos
Alocar tempo para promover especificamente interacções sociais positivas no local de trabalho pode ser uma poderosa ferramenta para garantir que a estratégia focada na comunicação e partilha não se perca no meio da pressão organizacional para o alcance de resultados. Criar oportunidades para os colaboradores interagirem. Estes eventos terão mais probabilidade de serem bem-sucedidos se se centrarem em interesses e experiências pessoais, de forma a criar consciencialização para os interesses partilhados e permitir que os colaboradores descubram semelhanças no relacionamento. Programas de mentoring e coaching
O treino e a orientação de um colaborador, para além de o tornar mais valioso para a organização, potencia o seu próprio
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desenvolvimento e aprimora as suas próprias capacidades, tanto profissional quanto pessoalmente. O estabelecimento de relações de coaching e mentoring permite que os colaboradores desenvolvam interacções “altruístas” focadas na construção de um futuro para ambos. Gamificação
A gamificação utiliza um sistema de metas, conquistas e recompensas que estimula a motivação dos colaboradores e, assim, melhora a produtividade de toda a organização.
Um sistema de gamificação é uma parte da rede global de interacções na experiência de um colaborador. Portanto, ao usarmos a gamificação nas nossas equipas ou locais de trabalho, devemo-nos lembrar da importância e do poder da positividade. Usar a experiência de gamificação como momentos de gratificação, desenvolvimento e diversão entre colegas. Actividades extra-laborais
Muitas empresas investem tempo e dinheiro em actividades de “teambuilding” para motivar os funcionários e aumentar a sua
interdepartamentais, ou ainda de estruturas organizacionais mais flexíveis (quando possível e ajustável à maturidade e dimensão organizacional), permite à empresa uma maior partilha de conhecimento e mais criatividade na abordagem aos desafios colocados ao negócio. Adicionalmente, este tipo de equipas de projecto permite que os seus elementos estabeleçam uma interacção mais empática, no sentido em que terão que compreender as dificuldades de outros departamentos, mas também, e sobretudo, porque poderão aumentar o seu conhecimento com a partilha e reconhecimento de visões inesperadas, diversificadas e valiosas. Flexibilização do horário de trabalho ou da semana laboral
produtividade. No entanto, ao fazerem isso, falham em quebrar a relação colaboradorempresa. Esta nova geração de profissionais exige mudanças e não se contenta com um piquenique ou um retiro fora do local de trabalho. Diferentes pesquisas apelidam os Millennials como a “geração dadora”. Esta geração acredita no voluntariado, na solidariedade e quer fazer parte de um negócio socialmente responsável. Projectos interdisciplinares
A promoção de projectos interdisciplinares ou
O horário flexível é um tipo de horário alternativo que dá ao colaborador maior latitude na escolha do seu horário de trabalho específico ou liberdade para mudar os horários de trabalho de uma semana para a outra, dependendo das suas necessidades pessoais. Num acordo de horário flexível, o colaborador poderá trabalhar um número padrão de horas essenciais, dentro de um determinado período, permitindo-lhe uma maior flexibilidade nos horários de início e término. A semana de trabalho comprimida é um método alternativo que permite aos colaboradores trabalharem uma semana de trabalho padrão num período menor de cinco dias numa semana ou de 10 dias em duas semanas. Ambas as estratégias facilitam que o colaborador consiga fazer um melhor balanceamento entre as actividades pessoais e profissionais e, assim, possa comprometer-se a eventos ou iniciativas que, proactivamente, gerem relações interpessoais (extra-laborais) que criem e mantenham um senso de propósito. O local de trabalho é um dos poucos ambientes onde as pessoas são “obrigadas” a terem que se relacionar. Os ambientes de trabalho são compostos por uma mistura de diferentes pessoas, muitas das quais teriam naturalmente muito pouco interesse em encontrarem-se ou socializarem livremente fora do ambiente de trabalho. No entanto, é possível desenvolver acções para incentivar a interacção dos colaboradores e desenvolver uma cultura de trabalho inclusiva. Através da promoção de relações interpessoais positivas, as interacções no local de trabalho podem ser uma fonte de crescimento, aprendizagem e empoderamento individual e colectivo.
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PERSPECTIVA ENTREVISTA
A FARMACOVIGILÂNCIA
DE ACORDO COM A ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS), A FARMACOVIGILÂNCIA É DEFINIDA COMO A CIÊNCIA QUE SE DEDICA À DETECÇÃO, AVALIAÇÃO, COMPREENSÃO E PREVENÇÃO DE REACÇÕES OU EVENTOS ADVERSOS OU OUTRAS QUESTÕES DE SEGURANÇA RELACIONADAS COM O MEDICAMENTO. A FARMACOVIGILÂNCIA ACTUA PARA VERIFICAR SE, EFECTIVAMENTE, HOUVE ALTERAÇÃO DO PERFIL DE RISCO DO FÁRMACO, COMPARATIVAMENTE AO PERFIL QUE POSSUÍA QUANDO FOI LIBERTADO PARA COMERCIALIZAÇÃO. EM ANGOLA, O REGULAMENTO SOBRE A FARMACOVIGILÂNCIA FOI APROVADO E PUBLICADO EM DIÁRIO DA REPÚBLICA NO DIA 14 DE OUTUBRO. ESTE DIPLOMA APROVA AS REGRAS PARA O EXERCÍCIO DA ACTIVIDADE DE FARMACOVIGILÂNCIA DE MEDICAMENTOS DE USO HUMANO, MEDICAMENTOS TRADICIONAIS, DERIVADOS DE SANGUE E PRODUTOS DE SAÚDE, REALIZADO PELO SISTEMA NACIONAL DE FARMACOVILÂNCIA EM ANGOLA.
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Dra. Zola Mayamputo João Técnica Média de Farmácia pelo IMS de Luanda. Licenciada pela Universidade Jean Piaget de Angola/Ciências Farmacêuticas. Agente de Segurança Higiene e Saúde no trabalho. Directora técnica da Australpharma
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oje, vamos conhecer um pouco da Terapia Biológica. Sabia que, com a introdução de terapias mais complexas, como os medicamentos biológicos, o sistema de farmacovigilância torna-se uma prática cada vez mais importante no sistema de saúde? Em comparação com os medicamentos biológicos, os medicamentos sintéticos, na sua maioria das vezes, são fórmulas simples de serem produzidas e isso faz com que tenham menos variação na sua estrutura e menor complexidade. Os medicamentos biológicos são feitos a partir de organismos vivos e as suas moléculas são muito maiores e mais complexas que as dos medicamentos sintéticos. Devido a essa grande complexidade, alguns processos, como a sua produção, transporte, armazenamento e administração, quando não realizados adequadamente, podem comprometer
a sua estrutura, a eficácia e segurança, sendo o sistema de farmacovigilância de extrema importância para garantir a qualidade, rastreabilidade do medicamento e, principalmente, a segurança do paciente. Deve-se sempre conversar com o médico quando se apresenta algum sintoma indesejado, durante o tratamento, especialmente se se utilizar um medicamento biológico. O paciente é também uma peça fundamental neste sistema. Os medicamentos biológicos são produzidos a partir de organismos vivos, como células e bactérias. Em muitos casos, têm imunogenicidade, ou seja, a capacidade de aumentar a resposta imune
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do corpo. Os biofármacos são, normalmente, administrados por via endovenosa ou subcutânea, pois, de outra forma, seriam destruídos pelo sistema digestivo. Os medicamentos biológicos estão presentes no tratamento de diversas doenças crónicas e auxiliam na melhoria da qualidade de vida dos pacientes. Começaram a ser utilizados há pouco tempo e auxiliam no tratamento de doenças, sobretudo desde os anos de 1980. O primeiro biofármaco foi a insulina humana, produzida por meio da cultura de bactérias e, logo depois, veio a hormona de crescimento. Entre as doenças onde o tratamento com medicamentos biológicos tem sido bemsucedido estão o cancro, a psoríase, a artrite reumatoide, a asma e a esclerose múltipla, entre outras. Existem, assim, diferentes complexidades de medicamentos biológicos, chegando até os anticorpos monoclonais, chamados de medicamentos inteligentes por actuarem numa característica específica de determinada doença. Efeméride:
Foi no dia 12 de Agosto de 2021, junto do Conselho de Ministros do Projecto de Decreto Presidencial, que foi aprovado o Regulamento sobre Farmacovigilância, que consiste na avaliação da eficácia e do uso racional dos medicamentos humanos, e foi anunciado que Angola poderia contar com um laboratório para o controlo da qualidade. O Governo pretende criar um laboratório central para o controlo da qualidade e dos efeitos adversos dos medicamentos humanos. O regulamento visa assegurar o acesso a fármacos eficazes e monitorizar as reacções adversas.
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Recorde-se que o país conta com uma Agência Reguladora de Medicamentos e Tecnologias de Saúde (ARMED) e possui pequenos laboratórios na central de compras de medicamentos, onde se controlam determinadas moléculas. É imperiosa a existência de um sistema de farmacovigilância capaz de informar e dar orientações, assegurar a identificação, notificação e respostas oportunas aos efeitos nocivos e adversos dos medicamentos. Estamos juntos nesse desígnio, pois somos todos pacientes deste grande circuito da saúde.
OS MEDICAMENTOS BIOLÓGICOS SÃO FEITOS A PARTIR DE ORGANISMOS VIVOS E AS SUAS MOLÉCULAS SÃO MUITO MAIORES E MAIS COMPLEXAS QUE AS DOS MEDICAMENTOS SINTÉTICOS. DEVIDO A ESSA GRANDE COMPLEXIDADE, ALGUNS PROCESSOS, COMO A SUA PRODUÇÃO, TRANSPORTE, ARMAZENAMENTO E ADMINISTRAÇÃO, QUANDO NÃO REALIZADOS ADEQUADAMENTE, PODEM COMPROMETER A SUA ESTRUTURA, EFICÁCIA E SEGURANÇA.
A saúde que a sua pele merece.
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