ECONOMIA & SOCIEDADE
MEDO E RESISTÊNCIA Trabalhadores se expõem à ameaça do novo Coronavírus nas ruas de Manaus para garantir sustento de famílias Luciana Bezerra - Da Revista Cenarium
O vírus letal com altíssimo poder de contágio modificou a rotina dos trabalhadores e desafiou os sistemas econômico e político mundial. No Brasil, a situação emergencial serviu ainda para agravar o histórico problema da fome. Aliada à falta de apoio do governo Jair Bolsonaro aos mais vulneráveis, a ameaça da doença está acelerando o crescimento da pobreza no Brasil e já coloca o País como “epicentro emergente” da fome extrema, de acordo com relatório divulgado no início de julho pela Organização Não Governamental (ONG) Oxfam. A Oxfam é uma confederação de 19 organizações e mais de 3 mil parceiros, que atua em mais de 90 países na busca de soluções para o problema da pobreza. A ONG coloca o Brasil na mesma classificação de Índia 26
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e África do Sul em seu relatório. Em um informe lançado no dia 08 de julho sob o título de “O Vírus da Fome: Como o Coronavírus está aumentando a fome num mundo faminto”, a ONG analisa os impactos da doença em países onde a situação alimentar e nutricional já era extrema antes da pandemia. De acordo com a Oxfam, até 2018, o número de pessoas em situação de fome no Brasil aumentou em 100 mil, chegando a 5,2 milhões, devido ao crescimento nas taxas de pobreza e desemprego e a cortes radicais nos orçamentos para agricultura e proteção social. Além disso, diz a ONG, fatores como cortes no programa Bolsa Família e, desde 2019, um “desmantelamento gradual” de políticas e instituições destinadas a combater a pobreza, como o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), intensificaram a situação da fome no Brasil. A pandemia de Covid-19, diz a ONG, somou-se a essa combinação já tóxica de fatores, aumentando rapidamente as taxas de pobreza e a fome no País. Com isso, de acordo com o relatório da Oxfam, milhões de trabalhadores mais pobres, que têm poucas economias e acesso limitado a benefícios, perderam empregos ou rendimentos devido à pandemia, sem que tenham sido beneficiados por apoios governamentais. É o caso do vendedor ambulante Arilson Abreu Cavalcante, que há quase três décadas comanda uma
fOTOS: Ricardo Oliveira
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ANAUS - “Medo da Covid-19, nós temos. Quem não tem? Mas ficar em casa esperando o tempo passar, sem saber o que vai acontecer e as contas chegando no fim do mês, é muito pior”. O relato do vendedor ambulante, Arilson Cavalcante, 46, que trabalha no Centro de Manaus há 28 anos, resume o sentimento de milhões de brasileiros que não têm o privilégio de cumprir o “fique em casa” sem temer a fome. Para esses trabalhadores, resta batalhar nas ruas o pão de cada dia, mesmo estando mais expostos ao novo Coronavírus, causador da pandemia de Covid-19.