Escritores Brasileiros Contemporâneos - n. 17 - Novembro/2020

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ESCRITORES BRASILEIROS CONTEMPORÂNEOS EDIÇÃO 17

Nº. 17

Novembro/2020

Foto: Mauro Khouri

Revista Literária e Artística

Entrevista

PAULO BETTI


Este mês temos a grata satisfação e alegria de trazer para os nossos leitores uma entrevista com o ator e diretor Paulo Betti. Ele nos conta detalhes e curiosidades acerca da sua trajetória artística e também sobre o espetáculo Autobiografia Autorizada, de sua autoria, nos revela como está sendo atuar online. Paulo agradecemos imensamente o seu carinho e atenção. Sucesso sempre!!! Também trazemos a entrevista com a Professora Noadias Novaes, de Itapipoca, no Ceará. O seu trabalho e dedicação em prol dos seus alunos especiais é uma lição de vida! Colaboraram neste número: Alessandra Bononi, Ana Lúcia Lopes Meira, Cris Arantes, Glafira Menezes Corti, Marcinha Costa, Luiz Negrão, Maria Marlene Nascimento Teixeira Pinto, Nazareth Ferrari, Newton Nazareth, Regina Brito, Ricardo Cardoso, Ricardo Hidemi Baba, Sandra Regina Alves, Thais Matarazzo. Na próxima edição será a vez do bate-papo com a atriz e apresentadora Silvana Teixeira, a Silvana do Bambalalão! Boa leitura.

Edição 17 - Nº 17 - Ano II - Nov./2020.

A opinião e conceitos emitidos em matérias e colunas assinadas não refletem necessariamente a opinião da revista Escritores brasileiros contemporâneos. Contatos livros@editoramatarazzo.com www.editoramatarazzo.com.br Facebook: @editoramatarazzosp Instagram: @editoramatarazzo

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Revista pertencente à Editora Matarazzo. Email: livros@editoramatarazzo.com / thmatarazzo@gmail.com Telefone: (11) 3991-9506. CNPJ: 22.081.489/0001-06. Distribuição: São Paulo - SP. Diretora responsável: Thais Matarazzo - MTB 65.363/SP. Depto. Jurídico: Tatiane Matarazzo Cantero. Periodicidade: mensal. Formato: digital. Capa: Paulo Betti - Foto: Mauro Khouri

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EDITORIAL

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EXPEDIENTE

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Uma lembrança da Flipenha 2019: Coletivo São Paulo de Literatura com a querida bibliotecária Ana Lúcia Lopes Meira, CEU Tiquatira


SUMÁRIO Editorial .................................... 2

Movimento Médico Paulista do Cafezinho Literário ................ 31 Maria Marlene Nascimento T. Pinto

Entrevista .................................. 5 Paulo Betti

Em uma mulher não se bate sequer com uma “flor”! ....................... 33 Dra. Gisele Lucas

O colar ...................................... 12 Ana Lúcia Lopes Meira

Preconceito ............................... 36 Ricardo Hidemi Baba

De pranto em pranto ................ 14 Sandra Regina Alves

Flipenha 2020 ............................ 37

Entrevista ................................. 16 Professora Noadias Novaes, uma Mulher Notável Lançamentos Livros Sete gavetas, muitos poemas Um final de semana em Paranapiacaba ............................................ 24 Micelaneos ................................ 25 Alessandra Bononi Cartas ........................................ 26 Glafira Menezes Corti Isa Rodrigues ............................ 28 Thais Matarazzo

Foto: Nana Tavares

Poesia ......................................... 38 Ricardo Cardoso Poesia ......................................... 39 Newton Nazareth - Regina Brito O Artista Frente ao Espaço em Branco ....................................... 40 Nazareth Ferrari Poesia ......................................... 42 Luiz Negrão Poesia ...................................... 43 Cris Arantes Versejando com Imagens VIII.. 44 Resultado do concurso poético Poemas vencedores



Foto: Mauro Khouri


➢ Paulo, nos conte um pouco sobre o seu amor por Sorocaba. Nasci em Rafard (interior de São Paulo), vivi lá numa casa de senzala, no meio de um canavial, até os 3 anos, então nos mudamos para Sorocaba. Fomos para a Vila Leão, que na época, por volta de 1955, era uma espécie de quilombo, com quatro ruas de terra, como num jogo da velha. Era um lugar mágico, vendedores de amendoim, benzedeiros, escolas

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nos conta um pouco mais sobre sua carreira e essa nova experiência online em um bate-papo gostoso. Vamos lá!

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É

um dos artistas mais queridos do público brasileiro, com 48 anos de atuação nos palcos, teatro, televisão e cinema, Paulo Betti também se adaptou aos novos tempos, devido à pandemia da Covid-19, e passou a fazer teatro pela internet. Apresenta o monólogo Autobiografia Autorizada, escrito pelo próprio ator, inspirado em sua trajetória, no qual representa pessoas da sua família de origem italiana. É emocionante! Passa para o público a importância da empatia, do trabalho social e da valorização do ser humano. Determinado e bem-humorado com o seu trabalho, Paulo Betti

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Foto: Mauro Khouri

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➢ Após sua formação na Escola de Arte Dramática, em 1975, além de atuar, você também se tornou professor na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Comente um pouquinho sobre essa experiência. Quando nos formamos na EAD, permanecemos unidos, pois saímos com um grupo e uma peça montada. Isso foi muito importante, a escola, e principalmente o Celso Nunes, grande professor, que nos ajudaram nessa transição para o emprego, um grupo. Então, o Celso Nunes foi contratado pra formar o Departamento de Teatro da Unicamp e nos levou. Ele tinha verba pra contratar três doutores,

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➢ Qual foi a sua primeira peça profissional? Foi Victor ou As Crianças no Poder, do francês Roger Vitrac, montagem do grupo Pessoal do Victor, nossa peça de formatura da EAD-USP (Escola de Arte Dramática, da Universidade de São Paulo), saímos da escola com a peça direto para o teatro profissional.

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➢ Como surgiu a oportunidade para ingressar no teatro amador? Ao mesmo tempo em que frequentava essa excelente escola pública, nos finais dos dias eu ia ao Projeto Social dos Salesianos, eles incentivavam o esporte com futebol, tênis de mesa, e também o teatro, que já era minha paixão. Desde pequeno, fiz teatro no quintal, usava bonecos, cobrava ingresso. Nos padres, tínhamos espaço para ensaio e mimeógrafo pra imprimir os textos, uma mão na roda. Eles tinham um Cine Clube. Assisti O Pagador de Promes-

sas (1962) e me apaixonei pelo cinema.

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de samba, batuque, festas de São João. A vila ficava numa baixada, e nossa casa no lugar mais baixo, sempre tínhamos que olhar pra cima quando batiam palmas no portão. Minha mãe era benzedeira e vendia verduras da horta que tínhamos no quintal. Ela foi trabalhar como empregada doméstica na casa de uma família que tinha alguns livros. Fui matriculado numa excelente escola pública, aos 5 anos, fui sendo educado em tempo integral, sortudo. Daí vem minha paixão por Sorocaba, por terem me proporcionado excelente educação gratuita.

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➢ Você gosta mais de fazer comédia ou drama? Quando posso fazer comédia é o que mais gosto. Nada é mais prazeroso do que fazer as pessoas darem risadas. ➢ Dos personagens que você já representou nos seus mais de 40 anos de trajetória artística, tem

➢ Agora, dando um salto para a atualidade: Paulo, como surgiu a ideia da criação do monólogo Autobiografia Autorizada?

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➢ O filme CAFUNDÓ (2006) é espetacular! Traz para o público a história do líder espiritual João de Camargo. Como surgiu a ideia para a produção e direção deste longa-metragem? Conte-nos sobre o processo. A igreja dedicada ao líder João de Camargo ficava no caminho da roça do meu avô! Ele me levava para aquele lugar encantador, misterioso, sincrético. Eu me apaixonei. O processo foi longo, riquíssimo. Muita pesquisa. Foram de extrema valia os trabalhos de Florestan Fernandes e José Carlos de Campos Sobrinho, e seus escritos sobre o tema!

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➢ Cinema, teatro e televisão: dos três formatos, qual você tem preferência em trabalhar? Gosto de atuar, representar, pesquisar, estudar. Em qualquer desses espaços é possível fazer isso e eu gosto muito, sem distinção. Sempre é bom quando envolve bons temas e os colegas são bons. A televisão tem resposta imediata do público. O cinema tem a espera, a convivência, o teatro é onde afiamos nosso instrumento de trabalho, ou seja, nosso próprio corpo e voz.

algum (ou alguns) que te cativou (cativaram) mais? Sempre me apaixono pelos meus personagens. O último foi na novela Órfãos da Terra, era um filho de emigrante libanês. Eu adorava o Miguel Nasser. Lamarca, Ed Mort, Mauá, foram papéis que gostei muito de fazer no cinema. E Timóteo e Téo Pereira foram muito populares na TV.

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mas preferiu levar o grupo todo. Dedicamo-nos com afinco e criamos o curso da Unicamp, baseados na experiência que tínhamos acabado de vivenciar como alunos da EAD-USP. Qual o curso ideal que queríamos montar? Foi fascinante!

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➢ Como sentiu o feedback do público virtual? Muito forte! Gente dos lugares mais remotos, e do exterior também. Todos dizem que querem ver também ao vivo, presencial. Acho que o teatro vai ganhar público com isso.

➢ Nesse período de isolamento social devido à pandemia da Co-

➢ Você pretende transformar a peça em livro? Sim, estou escrevendo. Tudo que cortei pra peça,volta no livro. ▄

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➢ Poder dividir com o público as próprias memórias é delicioso e emocionante. Em cena, ao falar dos seus familiares que já não estão entre nós, você sente a presença carinhosa deles ao seu lado no palco? Sim! É uma homenagem aos meus ancestrais, aos meus parentes mais próximos. Eu os recebo, os reencarno. Sem misticismo. É teatro!

➢ Você gostou dessa experiência no formato online? Faria novamente? Estou fazendo. Essa forma veio pra ficar, é o que podemos fazer no momento.

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vid-19, semanalmente você apresenta Autobiografia Autorizada, com transmissão online do Teatro Pedra Gold. Qual é a sensação de atuar sem a presença das pessoas na plateia? É como se eu estivesse entubado, respirando por aparelhos. Os câmeras que me filmam são os controladores do oxigênio.

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Eu queria ter um monólogo para viajar, fazer debates. Pensei em montar um de um amigo meu, quando comecei a ensaiar, percebi que devia escrever sobre meus tempos de menino e adolescente. Fui buscar as memórias, falei com minhas irmãs e irmãos, tinha muita coisa anotada. Escrevi uma coluna semanal para o jornal Cruzeiro do Sul durante 25 anos! Estava tudo escrito. Eu era um escritor e não sabia, ou pelo menos não me considerava. O texto saiu rapidamente, o difícil foi cortar, enxugar. Em cinco anos, o monólogo que tinha 2 horas passou para 50 minutos.

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Foto: Mauro Khouri


Silvana Teixeira Atriz e Apresentadora de TV Destaque da edição de dezembro da EBC

► Minissérie Iaiá Garcia (1982), TV Cultura

Com diversos trabalhos realizados na televisão, teatro e espetáculos, Silvana Teixeira tem um baú de histórias, por isso, será a nossa entrevistada especial na edição de dezembro. Foi apresentadora do Bambalalão, ao lado de Gigi Anhelli, na TV Cultura, sucesso nos anos 80. Outro destaque foi o programa BambaLeão & Silvana... e... muito mais curiosidades, Silvana nos contará. Não perca! ☺☺☺

◄ Silvana, o boneco BambaLeão e Chiquinho Brandão, no Bambalalão


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A biblioteca é um espaço interessante quando as narrativas se entrelaçam com as literaturas dispostas nas estantes aparentemente estáticas. Porque de repente pode ocorrer um movimento imprevisível em que os personagens reais surgem e alteram a ordem pré estabelecida do funcionamento da biblioteca. Neste momento iniciase uma crônica a ser escrita entre bibliotecários e frequentadores do espaço da biblioteca, evidentemente dependendo do olhar e análise da situação daquele quem pretende ser o narrador do fato. Certo dia, por volta das doze

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Ana Lúcia Lopes Meira Bibliotecária

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O C olar

horas e trinta minutos, chegou um grupo de crianças em uma das bibliotecas do Centro Educacional Unificado, pois há o costume do público infantil, bem como de adolescentes e adultos chegarem um pouco mais cedo, entre horário de saída e entrada das aulas nas escolas para passar na biblioteca. As crianças por muitas vezes são protagonistas das histórias que acontecem dentro da biblioteca, portanto neste dia não foi diferente. O grupo de crianças aparentemente estava interessado num livro de literatura infantil, pois solicitaram que a bibliotecária lesse uma história do livro que haviam escolhido. Então, todos após escolherem o livro, sentaram-se em volta da bibliotecária para ouvir a história selecionada pelo grupo, porém, durante a atividade uma das crianças interrompeu a leitura e perguntou: - Tia, a senhora é macumbeira? A bibliotecária de súbito pensa e interroga a si mesma: “O que levou a criança a fazer aquela pergunta?”. Visto que a história ali apresentada não tinha relação com a pergunta da ouvinte. Então ela respondeu a criança com outra pergunta para compreender o seu pensamento. - Por que?

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de matrizes africanas como o candomblé e a umbanda. Enfatizou que as religiões de matrizes africanas foram incorporadas a cultura brasileira desde muito tempo, quando os escravizados desembarcaram no Brasil e encontraram em sua religiosidade uma forma de preservar suas tradições, idiomas, conhecimentos e valores trazidos da África. Falou sobre o respeito que devemos ter por todas às crenças religiosas e valorizar a diversidade. O grupo ficou atento ao diálogo que ali se estabelecia a partir daquela curiosidade. Interessante que a conversa não se relacionava com a história que estavam ouvindo. As crianças também não pediram para que a bibliotecária retornasse para a leitura que havia sido interrompida. O relógio já marcava 13h10, hora do grupo de crianças partirem para escola e não chegarem atrasadas. No dia seguinte o mesmo grupo retornou à biblioteca com muita euforia e ao adentram a biblioteca disseram: - Tia, queremos ver o livro do feitiço! A bibliotecária percebeu que o grupo referia aos volumes da Enciclopédia Barsa, pois ao falarem apontaram para estante em direção à coleção. Mas, por que será que utilizaram o termo livro do feitiço?

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A criança respondeu que era por causa do colar que a bibliotecária usava. Se o colar era da macumba! As outras crianças do grupo de repente também fixaram o olhar no colar da bibliotecária e ficaram esperando por alguma resposta. A bibliotecária levou as mãos até o pescoço e tocou no colar que usava. Era um lindo adereço marrom, feito com sementes grandes de aproximadamente dois centímetros cada uma! O colar tinha certo brilho, ela havia ganhado de presente de uma amiga artista plástica. Um colar chamativo e imponente circundava seu pescoço que agora tinha ganhado atenção das crianças e roubado a cena da leitura da escrita de códigos a serem decifrados. A bibliotecária levantouse e caminhou até a estante onde localizava os dezoitos volumes da Enciclopédia Barsa de encadernação luxuosa preta. Retirou um dos volumes da estante, caminhou até a mesa, sentou-se na cadeira e agora reunida com as crianças, abriu o volume na página do verbete sobre macumba. Ela explicou que macumba é um instrumento de percussão de origem africana, semelhante ao instrumento reco-reco. Informou que o termo é frequentemente utilizado erroneamente como uma designação genérica para as religiões

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De Pranto

em

Pranto

Sandra Regina Alves A dor cutucou o olhar Provocou um pranto só Pranto que veio molhar Pranto que veio sem dó Para marcar e machucar

Pranto da agonia No silêncio dos aflitos Liberdade alforria Os sonhos dos desvalidos O poema se encena De pranto em pranto Em versos carregados Por uma vida terrena De tristezas e desencantos

Perfil Pessoal Facebook sandrareamoura Página da Cantora Facebook sandrareginaalvessamba Instagram sandrareginaalvessamba Whatsapp (11) 98672-2249 E-mail sandraamoura5@gmail.com

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Pranto sem lástima Os olhos de candura Mergulhados em lágrimas Entre lamentos e doçuras

Página da Poeta Facebook sandrareginaemmusicaepoesia

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Veio em forma de oração: Oh, Virgem do Pranto Pranto da última hora Para Nosso Senhor Por Nossa Senhora

Sandra Regina Alves

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Veio em forma de poesia Comoção do canto No descarrego da noite pro dia Em prece, se derramando força da reza que alivia

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Marcinha Costa Aonde quer que eu vá Por onde eu caminhar Minha pressa de chegar É para ocupar meu lugar. Cansei de esperar, Se não me dão espaço Eu vou adentrar No trono eu também quero estar.

Aonde quer que eu vá Por onde eu caminhar Vou gritar: Dandara e Zumbi Vocês me trouxeram até aqui. E nesse aquilombamento Vou empretecendo o movimento Exaltando meus heróis negros Mostrando quem somos e o que queremos.

Não vou recuar Nem esmorecer Vou encarar o opressor E o sistema combater. Pela estrada árdua Vou fincando raízes Encontrando minhas origens E mostrando meu poder.

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Vou me reerguer Me refazer De folhas me benzer E dos perigos me proteger.

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Com passos firmes Vou marchar, me levantar Confiar em mim E na caminhada jamais desistir.

Marcinha Costa Baiana de Feira de Santana. Caçula de quatro irmãs. Atriz, professora da Rede pública, mestra em Estudos literários com ênfase em Literatura preta africana / moçambicana (UEFS). Publica poemas em coletâneas. Mulher preta em constante transformação. E-mail: marcianeide@gmail.com Instagram: @marcinha1407

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Lugar de Aquilombamento

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Noadias toca para seu aluno e seus irmãos durante uma das aulas em domicílio Foto: @Vaguinhofotografia

E ducação / E ntrevista

P rofessora N oadias N ovaes , uma mulher notável


seu nobre trabalho, como nos conta na entrevista. As fotos que ilustram a entrevista são de @Vaguinhofotografia

Como sua mãe é professora, ela te influenciou na escolha da profissão? Sim. Pela convivência e as oportunidades que surgiam na época talvez houvesse uma determinada influência para que eu também seguisse a carreira do magistério, e que escolha maravilhosa que fiz! Tenho até a sensação de que foi o magistério que me escolheu. Minha mãe era professora da zona rural, que na época recebia a conotação

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a semana em que se comemorou o Dia dos Professores, vários telejornais deram destaque ao projeto fabuloso e emocionante da Professora Noadias Castro Braz de Novaes, mais conhecida como Noadias Novaes, moradora do distrito de Betânia do Cruxati, Itapipoca, Ceará. Noadias é uma força da Natureza: rompe barreiras, vai além da sua vocação, a dedicação, estudos, carinho, determinação, perseverança e a crença em seu ideal fazem com que a professora supere qualquer empecilho. Noadias transforma seu trabalho em um amor incondicional à educação de crianças especiais! Começou o projeto sem nenhuma pretensão, mas repercutiu nacionalmente, e não se engane: a educadora não perde o foco, para ela o que interessa é continuar o

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Conte-nos um pouquinho sobre a sua infância. Desde pequena já pensava em ser professora? Na minha infância sempre via a minha mãe Lígia, que era professora (hoje aposentada), em sua rotina diária em planejamentos das aulas, correções dos trabalhos dos alunos e, sempre que possível, também a acompanhava na escola, mas nunca pensei que um dia poderia estar também na frente de uma lousa dando aulas. Lembro também que brincávamos de “escolinha” com minha irmã e primos, mas sempre como aluna.

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Ao ter contato com os alunos especiais, você buscou por cursos em formação específica? Sim. Acho que pelo meu desempenho visto na Educação Infantil, fui convidada pela Secretaria de Educação, em 2011, para fazer cursos de formação na Capital, em Fortaleza. A Prefeitura cedia o transporte e durante cinco anos, uma vez por semana, eu e um grupo de professores íamos estudar

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cionar? A primeira oportunidade para lecionar surgiu em 2005, como professora temporária, em turmas do Ensino Médio em uma escola pública, cerca de 7 quilômetros distante do local onde moro. No primeiro mês de salário, financiei uma motocicleta em 48 meses, aprendi a andar de moto nas estradas indo à escola, onde levava muitas quedas. Nessa escola passei um ano, no ano seguinte fui transferida para uma escola situada na minha localidade, Betânia, onde fiquei por 12 anos. Lembro que o salário que recebia era pra investir nas tecnologias do momento para melhorar na ministração das aulas como: retroprojetor, reagentes e produtos acessíveis para as aulas de química, Datashow etc. Eu ficava muito satisfeita com a reação dos alunos quando chegava com algo moderno, moderno pelo menos para nós (risos).

Como surgiu a chance de trabalhar com alunos especiais? Finalmente, me efetivei como professora de Educação Infantil na Rede Municipal de Itapipoca. Na primeira turma do Pré II (atualmente Infantil V), tive a oportunidade de encontrar entre os matriculados um aluno com Síndrome de Down. Aquele ano foi de grande desafio para minha carreira profissional, primeiro tive que buscar conhecer o que era essa síndrome e como a pessoa que a possui aprende. Em seguida, tive que planejar as aulas sempre tendo cuidado de contemplar também esse aluno. Não imaginaria jamais que este seria um de muitos desafios que viriam e que decidiriam definitivamente o que realmente me realizaria profissionalmente e pessoalmente.

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➢ Quando você começou a le-

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de “Regente Rural”, ela não possuía condições financeiras para financiar um curso universitário para mim, então, minhas tias se reuniram e pagaram minha faculdade de Pedagogia.

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➢ Qual a dinâmica do seu trabalho junto aos alunos no Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Sala de Recursos Multifuncionais Especiais? No primeiro mês do ano letivo, faço o levantamento dos alunos matriculados na escola e avaliação dos encaminhamentos dos professores da sala regular, feito isso, traço um plano de atendimento individualizado, em

de Covid-19, os estabelecimentos de ensino foram fechados. Foi então que você teve a ideia de levar as aulas do AEE para seus alunos em domicílio. Como se deu o desenvolvimento desse projeto super especial? A pandemia nos pegou de surpresa e com o fechamento da escola veio o grande desafio de como continuar com as aulas durante esse período. Elaborei um projeto chamado AEE na Quarentena, onde previa várias situações que poderiam ocorrer nesse período, como desmotivação dos alunos com as atividades escolares em domicílio, falta de acesso à internet, sintomas da Covid-19 etc. Assim como também contemplar estratégias para atender às possíveis ocorrências e otimizar

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➢ Com a chegada da pandemia

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➢ Trabalhar com a inclusão se tornou uma missão para você? Com lágrimas nos olhos lhe respondo que sim! Ao longo da minha carreira profissional, tive grandes oportunidades de lecionar em uma universidade pública, no Ensino Médio, passei em um vestibular para Enfermagem em uma universidade pública aqui no Ceará, mas, o que realmente me realizou foi trabalhar com pessoas com deficiências. Este sentimento me move todos os dias, já se tornou parte da minha vida.

que se fará atividades que atendam a especificidade de cada aluno. Com um calendário pronto, os atendimentos são realizados no contraturno de suas aulas na sala regular. E todo o final de semestre, é feito um relatório individual com os aspectos afetivo-social, cognitivo, psicomotor que foram observados durante todo o período e entregue às famílias, aos professores e ao núcleo gestor da escola.

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sobre Libras, Deficiência Intelectual, Braille, autismo, Atendimento Educacional Especializado (AEE). Mais tarde, fiz especialização em Educação Especial e atualmente faço especialização em Neuropsicopedagogia.

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Você canta e toca violão, seus alunos devem amar suas performances. Apesar de não saber tocar muito bem, eu gosto muito de música e meus alunos amam cantar. Então eu junto tudo isso e fazemos da música momentos maravilhosos de aprendizado e afeto.

➢Sabemos que no Brasil o professor é muitas vezes desvalorizado e não bem remunerado. Entretanto, o melhor pagamento da sua dedicação é notar o envolvimento do aluno com o aprendizado e os lindos sorrisos que eles te presenteiam no dia a dia?

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➢ Para que você possa visitar todas as residências dos alunos, como se dá o deslocamento? Tenho alunos que moram aqui mesmo na minha localidade, para estes, eu vou a pé mesmo. Porém, tenho outros que moram distantes, a cerca de 4 km, que vou de bicicleta.

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➢ Nesse projeto, você conta com o auxílio de outros parceiros? Sim. Para que isso acontecesse, fui em busca de parceiros que poderiam contribuir e todos possuem funções específicas dentro do projeto. Na área da saúde, conto com ajuda de um microbiologista que me orienta nos atendimentos na casa dos alunos a respeito do distanciamento permitido, esterilização e higienização de materiais, uma enfermeira que orienta as famílias para possíveis sintomas da Covid-19 e higienização correta, uma psicóloga que atende possíveis doenças de ordem emocional entre todos envolvidos no projeto, duas agentes de saúde comunitária que fazem o acompanhamento dos alunos na suas áreas de atuação, quando os mesmos encontram algum problema no aparelho celular. Na área da comunicação, um

radialista que manda recadinhos às famílias e aos alunos durante seu programa para incentivá-los e estimulá-los na execução das atividades. Enfim, o núcleo gestor da minha escola que concede alguns materiais que necessito.

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o acompanhamento pedagógico durante esse período. Alguns dos meus alunos não têm acesso à internet e não têm outro meio para comunicar-se (nem por agente comunitária de saúde), outros possuem Transtorno Opositor Desafiador-TOD, o qual dificulta que as famílias consigam executar junto ao me deslocar até suas residências para ministrar as aulas.

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Para terminar a entrevista, a Professora Noadias revela outros resultados positivos e especiais do seu projeto: “Durante esse período de pandemia, na execução do projeto AEE na Quarentena, outros fatos importantes foram ocorrendo. Temos duas mães que pediram para estudar e quatro irmãos que estavam sem estudar, então agora todos são meus alunos, possuem materiais produzidos por mim de acordo com seus níveis de aprendizagens. Muito satisfeita por essas adesões. Me sinto abençoada com tudo isso.”

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Se formos olhar para o salário e o que dizem negativamente do professor (principalmente nesse período), o sentimento será de tristeza mesmo. Porém, prefiro manter o foco nos meus alunos e no meu trabalho, me sinto feliz e realizada com isso. Não tem preço ver os alunos e as famílias tendo orgulho dos avanços em cada atividade realizada. Essa é a minha energia para suportar o sol quente, a canseira e a poeira a cada dia. Oro ao Senhor para que me dê mais um dia com saúde, para que eu consiga alcançar minha meta.

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CANÇÃO PARA O AEE Música e letra: Profº Paulo Anderson Muniz *

No olhar de uma criança eu posso perceber Uma força de vontade... vontade de aprender. Abra seu olhar... abra seu coração Abra sua mente e viva a inclusão.

Diga não ao preconceito, diga não a solidão Não enxergue o problema... enxergue a solução. Abra seu olhar... abra seu coração Abra sua mente e viva a inclusão. AEE... AEE... Viva a inclusão... alegria de aprender. AEE... AEE... Viva a inclusão... alegria de aprender * Letra e Música de um amigo da Professora Noadias Novaes que partiu ainda muito jovem.

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AEE... AEE... Viva a inclusão... alegria de aprender. AEE... AEE... Viva a inclusão... alegria de aprender.

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Não tire da criança o direito de sonhar Vamos dar as mãos, vamos juntos caminhar. Diga não ao preconceito, diga não a solidão Não enxergue o problema... enxergue a solução.

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AEE... AEE... Viva a inclusão... alegria de aprender. AEE... AEE... Viva a inclusão... alegria de aprender.

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P essoas

que transformam vidas :

assim ĂŠ a professora noadias novaes ! Foto: @Vaguinhofotografia


Um final de semana em Paranapiacaba

muitos poemas (2020) ISBN 978-65-86348-29-3 Poemas de Thais Matarazzo Ilustrações de Ulysses Galletti Esse o segundo livro da autora repleto de poemas inspirados nas artes digitais de Galletti. São poemas simples e cheio de metáforas. Os temas abordados são a amizade, solidariedade, diversidade, amor, respeito e o bom humor. Os livros no formato e-book podem ser baixados gratuitamente no site da escritora: https://www. thaismatarazzoescritora.com.br/p/ biblioteca-digital-thais-matarazzo. html

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gavetas ,

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S ete

Folhetim infanto-juvenil estrelado pelos personagens Anita, Madame Jalloul e Mister Cardoso. Ambientado na década de 1940, no Alto da Serra, atual Paranapiacaba, durante uma visita do casal Jalloul e Cardoso à vila ferroviária, pertencente à extinta São Paulo Raiwlay, SPR. Anita é uma garota carismática e comunicativa, levará os visitantes para um tour pelos principais cartões postais da vila.

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(2020) ISBN 978-65-86348-28-6 Folhetim de Thais Matarazzo Ilustrações de Camila Giudice

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Miscelaneos

Poemas de Alessandra Bononi

Ilustrações de Vitória Oliva Perricci

Lançamento! ►

Para adquirir a obra entre em contato com a poeta e historiadora através dos seguintes canais:

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@livromiscelaneos ► E-mail: ale.historianaveia@gmail.com

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► Instagram:

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Gramado, primavera de MMXIX. Cara amiga distraída, Esse ímpeto teleguiado pela emoção, não pronunciada, nem escrita, sentida, cujo significado provém do chamego puro e sublime, comandado pelo coração cativado e por uma fascinada dedução, que alguns dão a alcunha de Amor é um sentimento que distrai o pensamento e leva a emoção para os misteriosos e secretos refúgios da razão. Esse ímpeto, que alguns chamam de Amor, espeta e bombeia o coração com tanta força que o transverti em um combativo órgão, capaz de vestir-se e desvestir-se de paixão, conforme o comando da orquestra dos hormônios; se na adolescência vem como touro bravo e decidido, rende por inteiro o corpo, a alma, como nunca se viu ou experimentou em tempos de lucidez monótona. O

Ilha de Paquetá, verão de MMXVIII. Escreva sempre Ápis querida, Foi uma surpresa muito agradável receber a sua carta e os comentários sobre meus livros. Esse meio de comunicação que usou me emocionou, a julgar por tantos outros recursos disponíveis pela atual tecnologia. Saber que você está bem e de sua vontade de Paquetear qualquer dia desses aumentou a minha alegria. Ao receber a sua correspondência, pelo correio, escrevi uma breve crônica sobre essa prática preterida. Será um bom pretexto para uma nova carta. Nessa, responderei à indagação que faz sobre nós, os autores que leu: se ao comporem seus textos, em suas obras, os redigiram a partir de fatos e sentimentos de sua vida real. Deixarei aqui, parte de um capítulo do meu último livro

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der enorme de revelação. Cheias de significados, alegram, entristecem, modificam, expressam os nossos desejos, nossos medos e nos caracterizam através de nossas escolhas e usos, tanto na fala quanto na escrita. Usando desse atributo de revelação da palavra e de seu uso democrático, partilho esses dois textos numa tipologia pouco usada, atualmente, mas que me encanta, além de me trazer boas recordações.

dia a dia gira em torno dele e sob a sua direção, nenhum momento de distração tira-lhe o foco do sentir absoluto e pleno. Querer brecar esse ímpeto...é chover no molhado, e como criar empecilhos em meio à areia movediça. Ela carrega o discernimento, as justificativas, as tolerâncias e deixa a razão ao léu, em papos de aranha, perdida e desconectada da sua coerência. Com chamego, Glaphira

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As palavras têm um po-

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E.T. Mandarei esse meu livro para a sua apreciação, juntamente com a crônica.

Contatos E-mail: glafira@zipmail.com.br @glafiramenezescorti Facebook: @glafiramenezescorti

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Sou avó, paulistana, borboleta catadora de palavras. Gosto de dar novos significados às palavras, que me seduzem a revelar o meu jeito de pensar a comunicação social. Sou a palhaça Pitanga para as crianças e para os idosos, durante o meu trabalho voluntário. Como contadora de história minha imaginação viaja, sempre que fizio e quizio a narrativa contagiar.

Novembro/2020

Glafira Menezes Corti

Escritores brasileiros contemporâneos

“A pulsação da palavra solta”. Espero com ela colaborar para a sua reflexão, nesse quesito. “...O escritor, como um ardoroso apaixonado pela palavra, cria intimidade com ela, toma posse de cada significante, para explorar o seu significado e expressar, fielmente, a sua imaginação criadora no contexto textual escolhido, de maneira sui generis. Diz Machado de Assis que as palavras têm sexo, amam-se umas às outras, casam-se. O casamento delas é o que se chama estilo. O escritor reinventa a realidade e transforma-a livremente em sua obra. Seu compromisso com o leitor extrapola o julgamento do real ou irreal. Esse artista, em seu ofício, se beneficia de sopros de inspiração, para compor o seu trabalho artesanal, cujo objetivo não é o de revelar-se ao leitor, mas o de entretê -lo...” Ápis, teremos um debate sobre esse assunto, aqui, na Ilha de Paquetá, no próximo final de semana. Caso tenha interesse posso inscrevê-la. Com apreço, Glaphira

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lá passava o dia conversando com os artistas residentes: cantores do rádio, circenses e atores do teatro. Algumas vezes o amigo Gabriel Gonzaga me acompanhava nessa aventura. A Isa Rodrigues era a mais comunicativa do grupo, estava sempre sentada na varanda da sua casinha na companhia da cachorrinha Gigi. Quando a conheci, já tinha 80 anos, possuía baixa estatura, magrinha, com o cabelo chanel pintado, usava grandes óculos escuros e vestido longo. Puxadora de conversa, falava alto para quem quisesse ouvi-la. Aí já viu, não é? Encontrou uma boa ouvinte para suas histórias! Quer dizer, a gente não sabia

(24/10/2020)

Thais Matarazzo

Hoje, me lembrei pela manhã da atriz Isa Rodrigues. Ela era tão divertida e alegre! Que saudades! Existem pessoas que conhecemos e não existe nenhum estranhamento, não há filtros, a empatia é “direta e reta”. São pessoas que você não vê com frequência, mas quando encontra, é aquela festa! A troca de energia é tão boa que a prosa vai longe... Conheci Isa no Retiro dos Artistas, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Sempre que viajava para lá, tirava um dia para visitar o Retiro e

Novembro/2020

Isa Rodrigues

nº.17

Isa Rodrigues e Moacyr Franco, 1964

Escritores brasileiros contemporâneos

Isa Rodrigues em 1937

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Novembro/2020 nº.17

Morou em São Paulo até os 9 anos de idade, lembrava-se vivamente da pensão da d. Adelaide, onde residiam vários artistas, na Av. São João, próxima à Rua Frederico Steidel. Como os pais trabalhavam bastante, quem tomava conta de Isa e seus irmãos era a dona da pensão. Ela tinha uma filha chamada Haydée, que ensinou a pequena Isa a cantar, sambar e sapatear. Nessa altura da conversa ela parou e perguntou: “— Você já ouviu falar da Casa do Ator?”. Respondi que no bairro da Vila Olímpia existia uma rua com essa denominação, porém não sabia quase nada sobre a história do lugar. Isa revelou que começou no teatro para arrecadar dinheiro para o projeto. Sem Benito e Alzira saberem, Nino Nello, ao final do espetáculo, pegava Isa, a colocava no palco e pedia para ela cantar e dançar. Era uma loucura. Pediam bis! O público jogava moedas no palco, o padrinho recolhia a féria e a destinava à Casa do Artista (que só seria inaugurada parcialmente em 1938). “— O meu pai estava no fundo do teatro e escutava aqueles aplausos fora de hora, vinha correndo ver o que era. Ele ficava danado, não queria que eu fosse artista. Sabia das dificuldades da classe teatral”, comentava.

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se escutava ou se ria, porque ela era engraçadíssima e performática ao contar os seus causos! Excelente papo de comadres. Recordo-me como se fosse hoje a primeira vez que a vi, quando ela soube que eu era paulistana, foi logo dizendo: “— Eu também! Nasci em São Paulo na Rua da Glória, sou uma velha paulistana apaixonada pela minha terra!”. Um dia, pedi um autógrafo em um livro e ela escreveu assim: “De uma velha paulistana para uma jovem paulistana”. Uma graça! Narrava com empolgação sobre seu glorioso passado artístico. Que memória fotográfica Isa possuía: recordava fatos da sua infância com riqueza de detalhes, passagens ocorridas há 70 anos estavam tão frescas em sua memória! Falava que seus pais eram atores mambembes. O pai, Benito Rodrigues, era espanhol, a mãe, Alzira Rodrigues, portuguesa. Eles imigraram para Belém, PA. Casaram-se e foram ser artistas. Tiveram vários filhos, cada um nascido em um estado. Foram descendo para a região Sul. Em 1926, estabeleceram-se em São Paulo, fizeram amizade e passaram a trabalhar na companhia do ator e empresário Nino Nello. Isa nasceu no ano posterior, em 17 de julho. Nello foi seu padrinho de batismo, ela sentia grande orgulho disso, mas lamentava que o padrinho fosse uma personalidade esquecida.

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Novembro/2020 nº.17

construção de novas casas no Retiro, nunca imaginou que um dia iria para lá. Isso aconteceu em 2003, já estava viúva. Tantas e tantas passagens ela narrava com o seu bom humor. Em outra ocasião, perguntei para Isa como ela encarava a velhice, ela respondeu. “— Acho bom, agora não faço nada. Trabalhei muito e ajudei minha família. A cada ruga nova digo, ‘seja bem-vinda!’. A vida é essa: tudo passa e temos que nos conformar. Não sou saudosista, mas sinto muitas saudades do meu marido, dos meus pais e dos irmãos, todos já partiram desse mundo. Meu filho e minha neta vêm me visitar a cada duas semanas. Estou satisfeita. Amo morar aqui no Retiro e daqui ninguém me tira!!!”. Como fiquei muito empolgada com nosso primeiro bate-papo, ela me forneceu o número do seu telefone. Recomendava que ligasse de vez em quando para a “velha paulistana” aos domingos de tarde, porque lá no Retiro tudo estava mais pacato. Essa querida artista brasileira faleceu aos 88 anos, em dezembro de 2015. Na tarde de hoje, assisti ao filme Marido de Mulher Boa (1960), Isa contracena com grandes personalidades como Zé Trindade, Renato Fronzi, Otelo Zeloni, Wilson Grey, tudo muito divertido! Foi ótimo recordar Isa Rodrigues!

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No final de 1936, a Companhia Nino Nello foi desfeita, a família Rodrigues resolveu tentar a sorte no Rio de Janeiro. A consagração de Isa veio rapidinho: após atuar na festa artística da atriz portuguesa Eva Stachino, no Teatro República, precisou trisar o seu número, cantou uma música do repertório de Carmen Miranda. Foi de anônima a revelação em uma noite! “— Eu cantei, sambei e mexi com a plateia, tudo que eu tinha aprendido com a Haydée. A plateia me adorou e fui fartamente aplaudida. O empresário e teatrólogo Freire Júnior estava lá. Imediatamente, foi falar com o meu pai e acabou contratando a família toda para trabalhar na sua companhia no Teatro Recreio. Seu sócio era o Luiz Iglésias. Passei a ser chamada de ‘Shirley Temple brasileira’!”. A partir de então, não parou mais: várias peças foram escritas para que Isa fosse protagonista. Atuava com Oscarito e Eva Todor. Gargalhava ao contar que, para ficar mais parecida com atriz mirim norte-americana, mandaram pintar seus cabelos de loiro e fazer ondulação permanente. Seu pai ficou louco! E o salão de beleza que fez o serviço ficou tão famoso que Isa virou nome de penteado. Isa Rodrigues teve uma carreira longa e bastante interessante: foi amiga próxima de Dercy Gonçalves. Ela que ajudou na campanha para

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nº.17

O Movimento Médico Paulista do Cafezinho Literário (MMCL) foi criado, no auditório da Associação Paulista de Medicina, na Capital, em cinco de maio de 2005, durante os festejos do 40º Aniversário da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores (SOBRAMES). Nas cidades de Santos, São Caetano do Sul, Sorocaba, Santo André e Piracicaba, aconteceram as primeiras reuniões, e como não poderia deixar de ser, foram coroadas de pleno êxito. Taubaté teve o privilégio de ser uma das cidades escolhidas, pelas entidades médicas, para propagar esse fato memorável. O Coordenador Estadual

e Idealizador desse movimento é o Sr. William Moffitt Harris, de Campinas, Professor e Doutor aposentado da USP e Membro Titular da SOBRAMES. A imprensa, falada e escrita, dá ampla cobertura e noticia as suas reuniões, em todas as cidades em que são realizadas. Em Taubaté, esse Movimento acontece, a cada três meses, na Associação Paulista de Medicina (APM), seção Regional de Taubaté, situada na Rua Fernando de Mattos, nº 134, centro, sempre às 14 horas. No início, a coordenação ficou ao encargo do Dr. Arnaldo Ferreira dos Santos (já falecido) e, após, ficou sobre a responsabilidade do Dr. José Paulo Pereira, Acadêmico Titular da Academia Taubateana de Letras, ATL. Esse encontro é informal, sem regras fixas, envolvendo um

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Movimento Médico Paulista do C afezinho L iterário

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Cafezinho Literário Foto: Maria Marlene N. T. Pinto

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Novembro/2020 nº.17

lado das diversidades artísticas que fazem parte desse encontro artístico-cultural. A apresentação de música aliada à Literatura proporciona um espetáculo do mais refinado gosto. Ao terminar a programação, um gostoso cafezinho é servido. Realmente, esses encontros são norteados não só para o aprimoramento cultural, como também para a convivência com pessoas de variadas profissões, comprometidas com a arte literária, sobremaneira, irmanadas com um único propósito: desenvolver a espiritualidade artística, com a convicção que o nosso mundo conturbado só será salvo, se a poética literária estiver atuante. A espiritualidade artística tem um relevante papel na formação da personalidade do ser humano, tornando-o mais dócil, compreensivo e empenhado em espargir o amor na face da Terra. O Dr. William é um ser é um ser iluminado que se dedica de corpo e alma, para levar adiante o seu Projeto: A Arte Literária acessível a todas as camadas da sociedade! Que esse movimento se alastre pelo mundo inteiro!

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agrupamento de múltipla entrada. Fazem parte, além dos Médicos, Acadêmicos da ATL, Trovadores, Advogados, Professores, Músicos e convidados especiais. Cada pessoa, participante da tarde literária, ao chegar, registra o trabalho a ser apresentado, com a Secretária da APM. Quando começa a sessão, propriamente dita, é chamada à frente para apresentar as suas performances que podem constar de quaisquer modalidades literárias: poesias, contos, haicais, trovas, sonetos, causos, etc. O auditório torna-se testemunha de um ecletismo considerável que desfila por toda à tarde, travestida da criatividade que emana das inspirações dos poetas e dos artistas. O amor apresenta-se sem candeias, nas linhas dos versos declamados, tornando o ambiente agradável e descontraído. O humor, também, faz-se presente, nos contos e causos, apresentados por alguns escritores. Nos intervalos das apresentações, livros e prendas são sorteados para todos os participantes. O estreitamento dos laços de amizade, o respeito mútuo e a troca de experiências contracenam ao

Por Maria Marlene Nascimento Teixeira Pinto Presidente da Academia Taubateana de Letras, ATL

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Desde o início do isolamento social imposto pela Pandemia do COVID-19, aumentou absurdamente o índice de mulheres vítimas de Violência Doméstica e Familiar. Segundo dados da Polícia Militar o aumento foi de 44%. O Ministério Público

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Dra. Gisele Luccas

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EM UMA MULHER NÃO SE BATE SEQUER COM UMA “FLOR”!

de São Paulo emitiu nota dizendo que 66% dos Feminicídios consumados ou tentados, foram praticados na casa da própria vítima. Os motivos do aumento desse alarmante índice decorre, em parte, da maior dificuldade de acesso as Delegacias, somado ao medo que a vítima tem em denunciar o agressor, que permanece 24h sob o mesmo teto. Convém destacar que ao referir-se a Violência Contra a Mulher, não está associando-se somente a idéia de violência física, mas também a violência moral

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Artigo

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Novembro/2020 nº.17

telefonema. Embora muitas pessoas desconheçam, a Lei Maria da Penha foi alterada em 2018, inserindo o artigo 24-A que transforma em CRIME o descumprimento da Medida Protetiva pelo agressor, impondo uma pena de 3 meses a 2 anos. O Feminicídio é o assassinato de mulheres, simplesmente pela condição de MULHER, ou seja, um crime caracterizado pelo gênero feminino. Trata-se de um crime de ódio e encontra-se elencado entre os Crimes Hediondos, que são apenados com mais severidade dada a periculosidade do agente. No Crime de Homicídio, o agressor mata “alguém”, independente de ser homem ou mulher, ou seja, independente o gênero sexual e não existe vínculo de relacionamento afetivo entre ambos. A pena para este crime é de 6 a 20 anos. No Crime de Feminicídio a vítima sempre é

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(xingamentos depreciativos), violência psicológica (uma tortura mental que faz com que a vítima fique completamente dominada pelo medo), violência patrimonial (o homem controla todos os gastos e ganhos da mulher a ponto da mesma passar necessidades) e a violência sexual (obrigar a mulher a praticar atos sexuais que não deseja). Todas as formas de violência descritas acima, encontram-se na Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340/2006, e passíveis de expedição de Medida Protetiva. São Medidas que o Juiz concede visando proteger e garantir a integridade física da mulher. Dentre elas: afastamento do agressor do lar, distanciamento da vítima e de seus familiares, suspensão do porte de arma. Importante frisar que na vigência da Medida Protetiva, o agressor não pode manter qualquer contato com a vítima, seja por Whats, Facebook, e-mail, instagran ou

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Novembro/2020

É Advogada, Especialista em Direito Médico, Pós Graduanda em Perícia Criminal e Ciências Forenses, com Capacitação em Psicopatologia Forense, Mediadora Judicial e Privada cadastrada no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Palestrante, Colunista e filha de “Zezinho” (in memoriam).

nº.17

Dra. Gisele Luccas

Escritores brasileiros contemporâneos

MULHER, existindo entre agressor e vítima um relacionamento doméstico ou familiar que os envolve, incluindo também namorados. A pena para este crime é de 12 a 30 anos. Vale destacar que com a atual vigência do Pacote AntiCrime, o máximo de cumprimento da pena passou de 30 para 40 anos de reclusão. Toda violência doméstica e familiar deve ser denunciada. Rompa o silêncio e peça ajuda. O Feminicídio é uma morte que pode ser evitada. Registre um Boletim de Ocorrência e peça a Medida Protetiva, para que você não vire mais um dado estatístico entre tantos outros. Todos que souberam do sofrimento de uma mulher vítima de violência, DENUNCIE, mas não seja cúmplice por omissão!!!! Disque 180!!!!

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C rônica R icardo H idemi B aba

nº.17 Escritores brasileiros contemporâneos

Sempre acreditei não haver preconceito, mas me deparei com este triste fato. Em um dia, uma colega chegou em sala de aula abalada devido a frases racistas e chulas escritas nas portas dos banheiros da faculdade. Fiquei indignado! O fato parecia prever! Meses depois, iniciava-se um módulo, o qual por ironia se chamava “Cidadania”. O professor simplesmente ignorava minhas intervenções. Foi um módulo difícil sem poder perguntar tampouco se manifestar, fato que me incomodava. Acontecer isso em um curso de nível superior, para mim, seria inaceitável. Para finalizar a matéria em questão, o famigerado professor propôs um seminário como avaliação. A apresentação seria o desafio, mais um em minha vida! Chegou o último dia e o momento da minha apresentação. Tive problemas com software, aumentando meu nervosismo, mas um colega me ajudou! Comecei a explicar meu trabalho e o professor sequer se esforçava para compreender minha fala, ele conversava com outros alunos, postura completamente incompatível para a função de docente. Mais uma vez, outra amiga interveio e passou a apresentar o seminário comigo, buscando me auxiliar devido a minha dificuldade de fala, mas o comportamento do dito professor persistiu. Concluí minha exposição, e assisti as outras apresentações. Voltei para casa no silêncio da tristeza e da reflexão. Percebi que já havia passado por momentos discriminatórios e, mesmo não considerando preconceito doeu, mas superei. E, desta vez, não seria diferente. No dia da minha defesa de tese, avistei o professor e apenas acenei! Eu concluí o curso, havia vencido! Discriminação existe e precisa ser superada!

Novembro/2020

P reconceito

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Novembro/2020 nº.17

Em sua terceira edição, contou com programação totalmente gratuita e online de 13 a 17 de outubro. Foram homenageadas duas importantes escritoras: Ruth Guimarães que neste ano celebramos sua obra e o centenário de seu nascimento e a escritora chilena Gabriela Mistral, primeira mulher a receber o prêmio Nobel de Literatura. Organizada por coletivos culturais e educadores do bairro, a FLIPENHA tem como objetivo movimentar uma discussão sobre literatura através da produção cultural; promovendo formação de leitores; o encontro de moradores de diferentes gerações e grupos sociais; e o intercâmbio entre profissionais de diversas linguagens como bibliotecários, agentes

culturais, ilustradores, editores, pesquisadores, poetas, entre outros. Nesta edição online aconteceram bate-papos com escritores e pesquisadores, recitais, rodas de conversa, saraus, oficinas, shows e contações de história. No dia 16 foi apresentada a mesa A escritora chilena Gabriela Mistral, com mediação de Ana Meira, bibliotecária do CEU Tiquatira, participaram Víctor Barrionuevo (professor, escritor, editor, livreiro), Thaís Matarazzo (jornalista, escritora, editora, pesquisadora), e Sandra Trabucco (pós-doutorada em Literatura Comparada, escritora, produtora e apresentadora do programa Mega Séries). O Coletivo São Paulo de Literatura encerrou a programação com um Sarau muito animado, com muita poesia e lembranças do território da Penha.

Escritores brasileiros contemporâneos

A Festa Literária da Penha – FLIPENHA 2020

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P oesia R icardo C ardoso C oletivo S ão P aulo

mulher

L iteratura

R omanesco

Onde está você

Quem sou

Doce menina mulher

Poeta ou sonhador

Que me fizeste amar

Sedutor ou conquistador

Onde está o sorriso

Sou eu um sonhador A eterna procura de um amor

Onde está o olhar Que me encantou

Pintor dos sonhos perdidos Escultor da natureza morta

nº.17

Poeta será que sou

Onde está o abraço

Quem sou

Escritores brasileiros contemporâneos

Que me conquistou

Pintor ou escultor

Novembro/2020

Menina

de

Sedutor, já nem tanto

Que me fez sonhar Onde está a doce menina

Conquistador, acho que não

Que me fez feliz

Poeta, pintor e escultor

Onde está a menina mulher

Ou só um sonhador!

Que me fez Poeta!

Talvez um sonhador,

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AMOR! AMOR! AMOR! Não há outra explicação Para o seu louvor! Solto ao vento, Vou navegar em teu mar. Preso no tempo, Mais uma vez serei seu par. Newton Nazareth: carioca, com formação em Arquitetura, o sobrinho bisneto de Ernesto Nazareth dedicou-se intensamente à Música durante três décadas para finalmente descobrir-se na Literatura, mais uma vertente que extravasa a sua paixão pela Arte.

Muitas tristezas acontecem Acontecem muitas felicidades TAMBÉM! Tudo é questão de tempo TEMPO tão esperado TAMBÉM! Se meu momento é o AGORA Abençoados Unidos e tardio TAMBÉM! Só aqueles que alimentam seus sonhos Através do TEMPO TAMBÉM! TAMBÉM, também... Ai! TAMBÉM feliz estou! Regina Brito: Professora de Literatura, contista, escritora, poeta e atriz. Nascida na cidade do Rio de Janeiro.

Novembro/2020

Salve, Rainha! Reina em meu coração. Doce Regina, Sal que escorre em minhas mãos Transformando O deserto em luz, Carregando o AMOR Que me seduz.

Regina Brito

nº.17

Newton Nazareth

A Dois

(1º/11/2020)

Escritores brasileiros contemporâneos

R egina

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Nazareth Ferrari Como é difícil enfrentar o nada, romper o vazio, desvirginar o imaculado e fazer brotar nele as nossas ideias, nossos conceitos, retratar o nosso “EU”, projetar nossas opiniões, enfim, expor o que verdadeiramente somos e o que sentimos, desvendando nossa alma ao mundo, parindo nossa criação.

Novembro/2020

O espelho projeta nossa imagem externa, mas não desnuda nossa alma, por isso não temos medo de olhar para ele. Mas o espaço em branco que espera o desenho, a tinta; o papel que espera as palavras do escrito, a pedra bruta que espera ser rompida, lapidada, transformando nosso pensamento em algo palpável em algo palpável, em matéria, tirando as cortinas de nosso invólucro material (corpo físico), são muralharas difíceis de transpor. Vencer o vazio, despir nossa alma, se expor a sociedade

nº.17

O Artista F rente ao E spaço em B ranco

Escritores brasileiros contemporâneos

Nazareth Ferrari e suas obras no Salão da Criança

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Natural de Taubaté, SP. É pintora, escultora, escritora, professora, Pós-Graduada em História da Arte, Engenheira Civil e Membro Titular da Academia Valeparaibana de Letras e Artes. Conquistou inúmeros prêmios em literatura e artes visuais, possuindo obras na Alemanha e na França.

nº.17

Nazareth Ferrari

Novembro/2020

de criar, o medo de dar o primeiro passo no desconhecido, na estrada sem multidão e passemos a sermos nós mesmos, defendendo nossas ideias e ideais, quem sabe caminharemos muito quilômetros em estrada vazia, mas talvez um dia no final dela divise uma nova multidão, que resolveu seguir pela nossa mesma estrada. Mas se ao chegarmos ao final de nossa jornada, e isto não acontecer, valeu a pena defender nossos pontos de vista e continuarmos sendo autênticos, deixando para trás a muralha fantasmagórica do medo.

Escritores brasileiros contemporâneos

e suportar as críticas que ferem, machucam, pesam muito e muitas das vezes inibem, atrofiam a criação ilimitada do artista, porque sendo o homem um ser que faz parte e vive em sociedade, muitas vezes ele a teme e prefere se tolher em sua timidez e caminhar junto a multidão, que está cheia de regras, imposições, tabus, conceitos e preconceitos pelo simples fato e medo de “não agradar” a opinião geral. Frente ao espaço proposto, as mãos, os pensamentos, as palavras, quantas e quantas vezes se atrofiam no medo de romper do nada a exposição do tudo. Felizes aqueles que conseguem enxergar através dos olhos da alma. Deus iluminou o artista para que ele como uma lanterna seguisse a frente da multidão, fazendo ver e levar à mensagem aos menos favorecidos. Por isso é comum, ao as pessoas ao ouvirem uma boa música, ao entenderem a mensagem de uma obra de arte, ler e interpretar um pensamento ou um poema exclamar: “Eu nunca percebi isto, como é verdade”! Então rompamos o nosso “medo”, o medo de nos expormos, o medo da crítica, o medo

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P oesia L uiz N egrão

VIRANDO AS PÁGINAS

ZUMBI DOS PALMARES

Em pedras, pedaços de argila Couro e papel, Em rolos e nos Códices Com a imprensa nos livros Há poucos anos em e-books Histórias, informações e dados Vêm com conhecimento e emoções!

Zumbi, um líder que se libertou, Um mártir de um sistema falido Morreu pela causa impossível, Batalha contra a força desproporcional, Inspira muitos ao mundo livre!

NOVEMBRO

NOVEMBRO AZUL

Falta pouco para acabar o ano E parece nem ter começado A primavera se faz inverno e verão As pessoas não entendem Que a mudança começa por elas mesmas.

Homens fazem chacota Muitos não se cuidam O corpo é frágil E não há outra oportunidade O preconceito não vence a Ciência Desde que o homem use a razão.

FINADOS A vós juntamos as mãos De joelhos a gratidão Vem a intenção a antepassados Por dias abençoados.

Novembro/2020

L iteratura

nº.17

de

Escritores brasileiros contemporâneos

C oletivo S ão P aulo

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P oesia C ris A rantes C oletivo S ão P aulo

de

L iteratura

Reencontro

Vida difícil

Quando teus olhos Encontraram com os meus Senti meu corpo desmoronar Fiquei pensando Nos carinhos teus Como foi bom Reencontrar-te Não nos víamos Há muito tempo Nosso reencontro Foi acidental Como é bom Esses momentos Aconteceram, deixaram de acontecer por motivo banal esse reencontro veio apagar todas as mágoas que não estavam esclarecidas e selar o nosso amor esse amor é muito forte só a morte irá acabar, mas ele é tão forte que resistirá, apesar dos tempos apesar das vidas, apesar de outras vidas permanecerá

As palavras saem duras da garganta do cantador, que fica na sombra da noite, a cantar e tocar a sua dor. Palavras doídas cantando a miséria, a fome e a sede no sertão. Chorando

Cada gota de água é venerada, será uma ilusão degenerada? Quando terão água corrente na torneira? Quando acabar a roubalheira É como um rio de ilusão nos tortura o coração. Muitos já morreram e não viram. Quando isso acontecer quero ver. Quero ter o prazer de abrir a torneira. E a água a jorrar como uma corredeira.

nº.17

esquecido.

Escritores brasileiros contemporâneos

dores desse povo sofrido, há muito

Novembro/2020

com as cordas do violão, todas as

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Versejando com Imagens VIII Poemas vencedores

Realização


O Brasil é um país no qual a diversidade e o sincretismo religioso é muito grande. Segundo o Censo do IBGE, em 2010, apenas 8,0 % da população brasileira se declarou sem religião. A liberdade de culto é aceita pela Constituição Federal. O brasileiro pode escolher qual crença e fé professar. É o princípio do Livre Arbítrio dado ao Homem. Sendo assim, cada um, individualmente, escolhe e se expressa de forma diferente por sua fé e, consequentemente, pela doutrina que segue. Uns dançam, outros rezam. Alguns se retiram para lugares isolados. Cada indivíduo tem uma forma de manifestar sua religiosida-

Novembro/2020

Projeto Expressões de fé Marcia Costa

nº.17

Trata-se de um concurso promovido pela Editora Matarazzo de São Paulo, Coletivo São Paulo de Literatura, e as Fotógrafas Marcia Costa e Nana Tavares, para a fomentação e valorização da Poesia, da Literatura, da Língua Portuguesa e da Fotografia. A primeira edição do certame aconteceu em 2017, sendo os poemas vencedores publicados em nossas antologias. Para cada edição buscamos parcerias culturais. Desta feita, tivemos 12 poemas contemplados e que constam nas próximas páginas da revista. O nosso júri foi formado por três membros, sendo pessoas ligadas à Literatura e às Artes: Ricardo Cardoso, do Coletivo São Paulo de Literatura e presidente da ONG Centro de Educação da Zona Leste; Karina Pereira Issamoto da Academia Taubatena de Letras; e a artista plástica Camila Giudice. Recebemos poemas de vários estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Bahia e Ceará. Foi difícil fazer a seleção dos poemas, conformem afirmam os jurados. Que sufoco! Agradecemos todos os par-

Escritores brasileiros contemporâneos

Versejando com Imagens VIII - 2020

ticipantes e parceiros do Versejando VIII. Enviamos as congratulações para os poetas contemplados. Encerramos o projeto com uma live transmitida pelo Facebook no dia 1º de novembro. Os poetas contemplados gravarão vídeos e postaram na página do Versejando para apreciação dos internautas.

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Novembro/2020

É Empreendedora e Especialista em Artes Visuais formada pela UNESA/RJ, onde também formou-se em Fotografia e atua na

Nana Tavares

Formada em jornalismo, trabalha na área de assessoria de imprensa e mídias sociais. Apaixonada por fotografia, Nana Tavares atua na fotografia de retratos, seu principal objeto é empoderar pessoas através da fotografia. Sua outra paixão é a fotografia de paisagem e natureza, tem um olhar atento ao detalhes, capturando através de suas lentes as belezas naturais dos lugares onde passa. Participa de exposições como convidada e curadora. Nana Tavares também atua como professora auxiliar no Curso de Fotografia Grande Angular, no Rio de Janeiro, ensinado a arte fotográfica e auxiliando na formação novos fotógrafos.

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Marcia Costa

área há mais de 20 anos. Diretora e professora no Curso Grande Angular é membro do Grupo Fotógrafas Brasileiras, Repórter Fotográfica na Secretaria de Estado de Educação / RJ e Ministra as disciplinas de Introdução a Fotografia, Fotojornalismo, Photoshop e Fotodocumentário no Curso de Comunicação Social da Faculdade Pinheiro Guimarães/RJ e professora de Fotografia na Escola de Rádio/ RJ.

Escritores brasileiros contemporâneos

de e fé. A exposição “Expressões da Fé” tem por objetivo mostrar essa crença em diversos segmentos religiosos e de que forma cada indivíduo manifesta sua fé. A fotógrafa Marcia Costa buscou retratar como e em quê cada fiel, independente de sua convicção, acredita e deposita sua fé em seus momentos de oração, culto ou adoração ao Deus que segue. Para realização desse projeto, saídas fotográficas foram realizadas em diversas igrejas, templos e eventos religiosos para captação de imagens de manifestação de fé e adoração de seus seguidores e adeptos de diferentes segmentos para melhor mostrar esses momentos de prática de religiosidade e fé.

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Honra Paulo Bomfim BALAIO DE MINHA MÃE PRETA Márcia Neide dos Santos Costa Feira de Santana / BA

De amarelo Oxum vou cuidar do Orí que me banha me guia me dá energia para cuidar de mim e de outras pretas rainhas.

nº.17 Escritores brasileiros contemporâneos

Não vou abastecer a casa grande para matar a sede dos brancos que se dizem importantes. Vou sim, carregar o balaio para embelezar minha mãe preta levar espelhos, rosas, perfumes e pentes receber seu abraço e caminhar em frente.

Novembro/2020

Em respeito ao mar pelo azul de Iemanjá pela fé nos orixás pelos meus ancestrais, não vou mais carregar lata d’água na cabeça para sinhozinho se agradar e de mim debochar.

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Honra Tatiana Belinky A COR Elisa Cunha Itabuna / BA A cor pulsante da flor vem de vรกrios cantos Os cantos se entrelaรงam pra colher encantos Encantos que percebo dentro dos meus olhos Os olhos que nem sempre apontam pro horizonte O horizonte brinca com a vida da gente A gente que cultiva, que planta semente Sementes que sozinhas Nรฃo fazem canteiro Canteiro que assume A cor do mundo inteiro



Honra Carolina Maria de Jesus

SONETO DO RIO VAZIO Aparecida de Sousa Castro São Paulo / SP

Junção das peças do tabuleiro Solução gosmenta, pororoca Resíduo a margem pipoca. Expressivo rio, paira vazio Quase plano feito terreiro Primo, oh primo, rio terceiro...

nº.17 Escritores brasileiros contemporâneos

Saudades, fatal atração Barco vizinho, cardume Flutua no vazio boia,chorume Flutua no vazio espuma,devastação.

Novembro/2020

Flutua no vazio, vazio rio Divertido, livre, cúmplice Eterna onda tríplice Arco-iris refletido fio a fio.

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Honra Luiz Vieira

O “EU” NOVO DE CADA DIA Isabel Cristina Nogarotto Tremembé / SP

Em cada novo acalantar Seja a inspiração da fé Na carestia dos corações Seja a prece da esperança... O amor!

nº.17 Escritores brasileiros contemporâneos

Em cada novo despertar Seja a direção do sol Nos caminhos do infinito Seja o reflexo do bem... O horizonte!

Novembro/2020

Em cada novo amanhecer Seja a vibração das cores No interior da alma Seja a essência dos olhos... A vida!

O “Eu” novo de cada dia! 54



Honra Conceição Evaristo

A FLOR SOLITÁRIA

nº.17 Escritores brasileiros contemporâneos

A flor solitária despontou do nada, florescendo em solo duro, cinzento, arenoso, dando um colorido especial à paisagem sombria e silenciosa. Apesar de tão minúscula e das lutas travadas, insistiu, persistiu, resistiu, com toda a sua garra, às intempéries da vida! Ei-la! Sobrevive, com todo o seu esplendor. Explosão de puro êxtase! Centelha divina do criador! Obra-prima da natureza! É a flor da gratidão, da superação, do otimismo, que mesmo solitária torna o mundo mais feliz, irradiando a sua vivacidade por todo lugar. Sua beleza capturada por lentes sobrenaturais, testemunharão este deleite celestial, eternizando a sua imagem, com todas as suas nuances, antes que desvaneça e sua ventura chegue ao fim. Mas, ainda tem tantos encantos a oferecer... — Flor solitária, não se vá! Fique mais um pouco! Permita-me embarcar na sua luz!

Novembro/2020

Maria Marlene Nascimento Teixeira Pinto Taubaté / SP

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Honra Ademir Medici AMÉM Glafira Menezes Corti São Paulo / SP Santa mãe Maria. Sei, queres descer, com teu povo caminhar, sentir teu corpo energético na defesa de tua gente; comemorar. Com as mulheres lutar pelo pão de cada dia, ansiar

Matrona querida, queres conosco cantar, sonhar, nossas queixas escutar, as dores abrandecer. Legislar, o povo defender, sem estátua permanecer, nem desejos congelar; a vestimenta trocar. Professar na arte de compor e versar um jeito de aliviar, transformar, o ser humano fortalecer, para que possa esperançar, o caminho seguir; ao compartilhar o amor dignidade honrar,

nº.17

sem nada censurar o jeito de falar, experimentar.

Escritores brasileiros contemporâneos

Seguir rotina, subir a colina, o corpo cansar

Novembro/2020

a família alimentar, seu valor exaltar, reagir.

sem vantagens aliciar, nem princípios negociar. 58



Honra Glafira Menezes Corti

MÃO SUPREMA Fernanda Luiza de Souza Farias São Paulo / SP

Que minhas mãos poderosas E com punho fechado A frente São Jorge me guia Ogum do meu lado calçado Sou sua ancestral de alma preta retinta Porque alma é essência imanada Pensamentos e sensíveis afetos Se essência é potência, amor, então a minha é preta.

nº.17 Escritores brasileiros contemporâneos

Ogum no terreiro plantado Jorge no templo contemplado Na essência de quem acredita Faz morada és alento, transita

Novembro/2020

Mãos de luta, mãos que afagam Seguras, do facão e da lança Na minha andança diária Carrego no coração esperança

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Honra Germano Gonçalves

À DERIVA Sílvia Rodrigues São Paulo / SP

O amor em duo, sempre ele, fará o mar transbordar... Surpreendendo-nos, aproximando-nos, fazendo-nos melhores que ontem...

nº.17

Velejarão lado a lado onde o mar, será a única testemunha.

Escritores brasileiros contemporâneos

Estão ancorados onde aguardam seus ocupantes.

Novembro/2020

Dois barcos,dois corações parecem à deriva! Só que não...

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Honra Verônica Marcílio

UMA FOTO Vicente Janotti Rio de Janeiro / RJ

O sol é o meu coração O mar é todo o meu ser As cores são minhas alegrias Que a Deus quero agradecer O horizonte é minha vida O céu e o reflexo, minhas paixões Isso é tudo que o Poeta imagina Realidades, sonhos, ilusões...

nº.17

Relatar o que desta foto? Ela é puro encantamento Preenche a minha visão Sem precisar de lente de aumento

Escritores brasileiros contemporâneos

Reflete a beleza da alma Completando o meu momento Com a delicadeza que acalma E com a emoção do sentimento

Novembro/2020

De tudo o que já escrevi Ou uma foto descrevendo Esta agora, pode ser Uma das mais lindas que estou vendo

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Honra Ana Jalloul

SANSÃO Rossidê Rodrigues Machado Caldas Novas / GO

Um privilégio de sua existência, pincelar inspiração onde deixa sua pegada, assim, pelo chão, pelo muro, colorindo tela, versejando a literatura. Sansão, ilumina também o dia! Um bichinho de estimação, do coração! Que se assemelha à candura de um anjo. Orgulhosa o chamo de meu amigo!

nº.17 Escritores brasileiros contemporâneos

Ninguém o vê! Apenas um clarão está lá. Uma poesia no brilho de seu olhar! No ruído da brisa que embala um canto; no silêncio da noite, magia que encanta.

Novembro/2020

Sansão. Meu gato! Com sua negritude vaga pelo escuro; seus olhos se confundem com o luar, espalha luz por onde passa.

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Honra Cruz e Souza

SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS Benedito Dimas Ferreira Taubaté / SP

Nos raios vermelhos o Espírito Santo! Com a cruz eu penso mais, e medito sobre Jesus! No fogo, o Senhor Deus Pai, a quem amo tanto! Os três são especiais, cada qual com a sua luz! Ao ler “Acolhimento” penso em melhorar sem “Arrependimento”. Nada acontece por acaso... foi o padre quem falou. A Procissão chegou sem atraso, e desesperado já não estou! Porque a coroa de espinhos e o ferimento me fizeram lembrar de Jesus e de tudo o que Ele teve que passar.

nº.17

Sim, é o dia de Corpus Christi! Quanto trabalho, e que cuidado! A fé do povo, que ainda existe, move o mundo, pois o Senhor é tão amado!

Escritores brasileiros contemporâneos

De repente... vejo a rua enfeitada. É a Procissão que vai passar. Da vida não espero mais nada. Mas esta imagem veio a me acalmar.

Novembro/2020

Caminho pela rua todo desorientado. Sem noção do que a vida quer de mim. Meu coração palpita desesperado. Parece um sofrimento que não tem fim.

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Honra Gabriela Mistral

APELO Nilza Freire Rio de Janeiro / RJ Quero a placidez de um lago claro em meio à exuberante floresta Sem a tribulação do bicho-homem que desmata e destrói

Em comunhão com a mãe natureza que me envolve e enlaça Não sinto frio nem o calor abrasador dos arbustos ardentes Não quero nada a que não tenha direito todo tipo de planta ou raça Acho que não peço muito ao destino, tudo que fiz foi nascer Vim ao mundo para enfeitá-lo com minha plumagem colorida Os animais inocentes em uníssono querem saber o porquê Por que a ambição dos humanos vale mais que as nossas vidas?

nº.17

Não existe solitude, navego numa tela de Monet viva e imponente

Escritores brasileiros contemporâneos

E o Sol possa se por juntamente com o mal que apavora e corrói

Novembro/2020

Santuário oculto onde reine a beleza pujante, em paz e em festa

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