Consciência e Liberdade N.º 21 (2009)

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Estudos A representação da laicidade como “excepção francesa”* Jean Baubérot** No Outono de 1989 aparece uma fórmula que vai fazer furor: a laicidade é uma “excepção francesa”. Rapidamente é posta em evidência, até pela sua repetição constante. Assim, um jornal diário pediu-me um artigo sobre a laicidade. Intitulei-o “A Laicidade não é uma excepção francesa” e foi publicado com o título “Laicidade, a excepção francesa inscreve-se nos valores universais”, amputado de passagens, tornou-se incongruente. O México imitador da França … ou o inverso? A expressão “laicidade excepção francesa” é talvez menos frequentemente utilizada hoje. Não há necessidade de a repetir tanta vez porque se tornou uma representação implícita largamente dominante em França, a ponto de fazer com que pessoas que pretendem ter autoridade na matéria escrevam coisas falsas. Assim, o Haute Conseil à l’Intégration (HCI) afirma, desde 2007, no seu Projecto de Carta da laicidade nos serviços públicos, que “objecto de admiração para o mundo, a lei de separação (de 1905) suscitou émulos e faz aparecer imitações”. E dá, como exemplo o México. Ora este país estabeleceu a separação em … 1861 e reforçou-a em 1874. Longe de ter imitado a França, o México constituiu uma referência na elaboração da lei francesa da separação das Igrejas e do Estado. O relatório da Comissão Parlamentar, redigido por Aristide Briand cita, de resto, longamente a lei mexicana da separação de 1874. E conclui: “O México possui, assim, a legislação laica mais completa que até hoje foi posta em vigor; este país libertou-se há trinta anos da questão clerical e pôde dedicar-se, inteiramente, ao seu desenvolvimento económico: ele conhece, realmente, a paz religiosa.” Esta passagem termina um capítulo consagrado às “Legislações Estrangeiras”. Neste capítulo Briand distingue, segundo uma perspectiva evolutiva, três fases: “A primeira fase, teocrática, ou quase teocrática, na qual o Estado é, senão subordinado à Igreja, pelo menos estreitamente unido a ela.” A Espanha e Portugal católicos, a Rússia e a Grécia ortodoxas, a Suécia e a Noruega protestantes parecem ilustrar este regime. A segunda fase é a da “semi-laicidade”, na qual os Estados proclamam “os princípios da liberdade de consciência e de culto, mas consideram, apesar disso, certas determinadas religiões, como instituições públicas que eles reconhecem, 7


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